Capítulo 19 - Atlântida
https://youtu.be/RnBT9uUYb1w
- "Aquele era o último dia em que Maré teria as suas pernas. Assim que o sol se pusesse no horizonte ela nunca mais olharia para baixo sem ver a sua lindíssima cauda cor de laranja.
Maré poderia ter escolhido ficar com Alex, aproveitar os últimos momentos do seu dia com ele, mas ela não o fez. Alex ia casar naquele dia. Àquela hora, enquanto ela olhava o pôr do sol já ele estava a entrar numa igreja vestido com diamantes, os quais ele nunca tinha imaginado sequer poder tocar, e entrar no altar e ver a rapariga com quem passaria o resto dos seus dias. Não era Maré. Era uma Carmen qualquer coisa.
Ela sabia que estava a chorar, mas não era por Alexandre se casar. Ela sempre soube que isso um dia iria acontecer. Ela sempre soube que um dia alguma coisa os iria separar de vez. Não ia quebrar os sentimentos que tinham, mas a sua relação nunca mais seria a mesma. Ela tinha de ter limites, para Alex e, para si mesma, porque Maré sabia que se continuasse a demonstrar o amor com os mesmos gestos, Alex separarar-se-ia da sua mulher sem pestanejar. Ele fá-lo-ia e ela sabia, mesmo que isso implicasse a sua vida tendo nada mais que areia e peixe.
Para ele, ela era tudo. Mas para ela, ele também o era. E quem ama deixa ir.
Ela já o tinha feito uma vez, sentido uma vez, podia fazê-lo novamente. Até porque naquele mesmo dia teria de contar a Poseidon quem era. A partir daquele mesmo dia ela já não era apenas a Maré, ela seria a princesa Maré. Com responsabilidades e deveres. E um deles era o motivo pelo qual ela chorava. Éris.
Saber que não podia ficar com Alex era uma coisa, mas saber que passaria o resto dos seus dias ao lado de um outro homem, era outra. Ela não sabia qual era essa realidade, o que iria sentir, e apesar de ser corajosa, o seu ponto fraco eram os sentimentos que ela não conhecia.
Mas primeiro ela tinha outra coisa a fazer. Tinha de falar com a sua mãe e com a sua irmã. Sim, porque elas tinham vivido aqueles últimos três meses a pensar que ela estivera apenas noutra cidade. A verdade é que aquela era uma desculpa muito fácil desdobrar e, talvez até a sua mãe tivesse entendido logo que não fora lá que Maré tinha estado, mas o medo de falar com a filha depois da verdade havia sido grande demais. Ainda bem.
Maré sorriu ao pensar na irmã já crescida, da mesma idade que ela quando beijara Alexandre pela primeira vez. Pensar que se ela tivesse resistido e não tivesse lido a história da Rapunzel à sua irmã naquela fatídica noite, nunca saberia que era uma princesa sereia e nunca teria tido a oportunidade de quebrar a maldição de Zeus, de ver Alexandre à sua frente novamente. Maré riu por entre o choro e limpou o nariz ranhoso com o braço. Olhou o horizonte já vermelho e o mar negro. Se tivesse ido mais cedo então entraria em águas límpidas e cristalinas, ajudando a motivá-la para navegar naquilo a que chamava de casa, mas o seu ser não a deixou. Ela precisava de ver uma última vez aquele pôr do sol, naquele lugar, com aquele cheiro, com aquele mesmo sentimento. Maré preferira ver o amor uma última vez pintado no céu e entrar nas águas do seu fim, do que entrar tentando camuflar tudo o que sentia. Isso simplesmente não fazia sentido.
E então, com esforço, o corpo mais pesado do que alguma vez o sentira devido a tanta emoção aos reboliços dentro de si, levantou-se e deixou-se deitar mais algumas lágrimas antes de ir. Quando sentiu que era o momento, quando o sol já passava de menos da sua metade no horizonte, Maré remexeu os seus dedos na areia sorrindo e sentindo os grãos a percorrerem a pele fina dos seus pés fazendo-lhe um misto de comichão e cócegas. Inspirou fundo entranhando ainda mais mar dentro de si e ouviu o cantar das gaivotas como se fosse o adeus de Alexandre que nunca iria ter. Sim, porque voltar depois daquilo estava fora de questão. Depois de tudo o que acontecera seria demais. E ela não ia fazer Alexandre sofrer dessa maneira. Maré só queria a sua felicidade.
No último minuto, avançou e atingiu a areia molhada aquecendo-a de tão quente que estava. Mal entrou na água os seus pés começaram a sentir as cócegas das bolhas a envolverem-nos e, mal chegou uns metros mais à frente, as bolhas desvaneceram-se na sua bela cauda. E foi assim até que, no último momento, Maré quis sorrir, mas só conseguiu soltar uma lágrima antes de desaparecer nas águas do oceano.
- m -
-Olá, mãe - Bryanna estava sentada na poltrona do seu grande hall de entrada que se juntava com a enorme sala, quando Maré chegou. Num relance, ajeitou os óculos de leitura para ver se estava a ver bem e pousou o livro nadando rapidamente até Maré.
-Maré? - os seus braços estavam a esmagá-la, mas Maré não sentia raiva de Bryanna, apenas pena - Nunca pensei que voltasses! Nunca pensei que me chamasses mãe novamente!
-Porque é que eu não haveria de voltar para casa e chamar mãe à minha mãe? - perguntou com um sorriso como se não se passasse nada tentando despreocupá-la.
-Porque tu descobriste a verdade! Tu és a princesa de Atlântida e não és minha filha!
-A minha mãe morreu. - disse pensando como seria a sua mãe, Anfitrite. Seria ela parecida consigo? Teria ela a mesma teimosia? Ela nunca o iria saber porque Anfitrite morrera quando Maré nasceu. - Além disso, uma mãe não é apenas aquela que te dá a vida, uma mãe é quem te dá o amor que precisas, que te apoia nos momentos maus, que te educa para seres a melhor pessoa que há em ti, e que cuida e se preocupa contigo mais do que consigo mesma. Essa mãe és tu.
Bryanna só a abraçou com mais força e soltou uma lágrima borrando o seu lápis preto sempre impecável. Ela não lhe respondeu, não era preciso. Ao mesmo tempo, Bryanna também sabia o que realmente trouxera Maré a casa. Bryanna conhecia a filha que criara e sabia que Maré nunca fugiria às suas responsabilidades por mais difíceis que estas fossem.
-Onde está a Pérola? - perguntou olhando para a escadaria e vendo a porta do quarto da irmã fechada.
-A Pérola está bem. Agora meteu na cabeça que quer ser uma grande escritora e por isso tranca-se no quarto e não deixa ninguém entrar.
-Eu vou lá.
-Espera. - Bryanna agarrou no braço de Maré e olhou-a nos olhos - Desculpa ter pegado em ti quando caíste da carruagem naquele dia. Desculpa não te ter entregue ao teu pai quando descobri quem eras. Desculpa não ter sido corajosa, mas ver-te nos meus braços foi a maior prenda que eu podia ter tido naquela altura.
-Chega de desculpas, mãe. - disse Maré com lágrimas nos olhos ao ouvir a verdadeira história de como tinha ido parar àquela casa - Eu não quero que te desculpes. Não tens nada a desculpar. Eu não mudaria nada do que aconteceu na minha vida. É isso que a torna única. Ser imprevisível.
-Ser imprevisível. - Bryanna riu-se - Está bem, então vai lá ser imprevisível com Poseidon e contar-lhe que a sua filha ainda está viva.
Maré deu-lhe mais um abraço, olhou de relance para o quarto de Pérola que ela decidiu não ver naquele momento. Ela sabia que se fosse ver a irmã o seu coração iria amolecer ainda mais e uma decisão daquelas não podia ser deixada para tomar mais tarde. Saiu de casa e mirou o enorme palácio ao qual ela nunca tinha dado importância. Em breve seria a sua casa.
- m -
-Boa noite, eu gostava de ter o privilégio de falar com o Rei. - pediu educadamente a um dos guardas da porta principal. Ambos de gostas eretas e expressão cerrada com tridentes nas mãos. Não metiam medo nenhum a Maré, nem sequer o respeito que deviam receber, mas Maré sempre fora um pouco ingénua no que tocava a essas coisas.
-O Rei não pode receber visitas no momento. - disse o mais novo da direita, de cabelos loiros e ainda sem rugas na cara para os seus quarenta anos. Não podia?
-Desculpe se me intrometo, mas porquê?
-Assuntos de extrema importância para o futuro do reino. Extremamente confidenciais. - respondeu o outro, moreno e com o bigode assanhado. O quê? Nada era mais importante do que o que ela lhe tinha para contar. Mas o guarda não sabia.
-O que eu tenho para lhe dizer também é extremamente importante para o futuro do nosso reino. Eu juro-lhe.
-De nada me serve as vossas juras menina. - Ai ai ai, o tom de ignorância do guarda mais velho de bigode curvo já a estava a chatear. E não era pouco.
-Eu não sei se me fiz entender bem, mas eu tenho algo de extrema urgência para contar ao Rei.
-Eu já lhe disse que não pode. O Rei neste momento tem visitas. - disse o outro mais paciente, suspirando. Claramente ela estava a ser um fardo para eles. Mas, visitas? Não...aquilo queria dizer que ele estava provavelmente a prescindir do trono ou a colocar em risco a independência de Atlântida! Maré não podia esperar mais!
-Não! Não ele não pode fazer isso! - disse entre dentes olhando por entre os guardas à sua frente para a enorme porta por detrás deles.
-Ele? Como é que a menina se atreve a falar do Rei nesses termos? - perguntou o carrancudo indignado.
-Deixe-me passar! - gritou tentando esquivar-se dos tridentes que lhe impediam o caminho.
-Menina. esses modos merecem pena de prisão! - avisou o guarda com a voz preocuapada e gentil que colocou as mãos à volta dos ombros de Maré.
-Largue-me! Eu preciso de falar com o meu pai! - os olhos de ambos estatuificaram. Nenhum deles pestanejou. Maré olhou para um e para outro seguidamente e sentiu os braços do homem a quebrarem a sua tensão.
-Seu pai? Mas que barbaridade! - gritou-lhe o velho.
-Deixe-me entrar! - o guarda gentil estava visivelmente a tentar não usar força a mais com ela, mas não passar não a estava a deixar mais feliz.
-O que é que a menina andou a beber? Está completamente bêbeda! - o moreno carrancudo que também nada fazia, cruzou os braços indignado.
-Deixe-me entrar! Largue-me! - continuava Maré a gritar, o máximo que ela podia tentar era que alguém a ouvisse.
E ouviu. As portas abriram-se atrás dos guardas e uma figura exuberante e digna de respeito surgiu. Ela já o tinha visto em fotos nos manuais da sua escola, mas agora ele estava diante de si. O seu pai estava à sua frente e a olhá-la profundamente nos olhos.
-Meu senhor, meu lorde... - gaguejou o guarda moreno - Esta jovem merece pena de prisão! Primeiro exige saber as informações confidenciais acerca do que se passa na sala do trono com o senhor, depois exige falar consigo, mesmo sabendo isto, e pior que tudo, meu senhor, esta jovem diz ser...
-Cala-te! - a voz de Poseidon era ainda mais grave e intimidadora do que Maré imaginava. Os seus olhos arregalaram-se e pôde sentir as mãos do guarda a tremer e os seus olhos cheios de medo. Poseidon olhava para si, e não ficou muito tempo sem falar. - Os meus olhos não estão a ver bem...
-Porque não, meu senhor? - perguntou Maré tentando ser o mais neutra possível.
-Quem diz a menina ser? - estranhamente as palavras dele tinham medo nos seus significados mais profundos.
-Eu sou a sua filha.
***
E agora? Será que a história deles acaba assim? Alex entregue ás mãos de Carmen e Maré destinada a casar com Éris? Tudo pode mudar, mas como? Ou será que não? Ou será que sim?
Bem, têm de ler para descobrir meus fofinhos!
Espero que estejam a gostar até agora, por favor deixem a vossa estrelinha e comentem que significam muiiiito para mim as vossas opiniões. Ok?
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