O Galpão

 

   O motor da camionete rugia, ecoando nas ruas desertas de Salvador. Josué dirigia com uma expressão dura, desviando de veículos abandonados e atropelando os mortos que se colocavam no caminho. No banco do passageiro, Diego observava o horizonte com o rosto tenso, enquanto Larissa e Victor estavam na caçamba, tentando se equilibrar a cada solavanco.

— Para onde estamos indo? — perguntou Larissa, agarrando-se na lateral da caçamba.

Josué lançou um olhar rápido pelo retrovisor.

— Tenho um refúgio. Nada grande, mas é seguro. Pelo menos por enquanto.

Victor olhou para Larissa, a desconfiança evidente em seus olhos.

— Por que ele nos salvaria? — sussurrou, inclinando-se para mais perto dela.

Larissa deu de ombros, os olhos fixos na figura de Josué.

— Não faço ideia, mas se ele quisesse nos prejudicar, já teria feito.

A tensão pairava no ar como uma faca afiada. A cidade parecia uma sombra do que um dia foi, com prédios grafitados e ruas repletas de destroços. O som ocasional de gemidos distantes lembrava-os de que o perigo nunca estava longe.

— Espero que esse refúgio valha a pena — murmurou Diego, quebrando o silêncio enquanto a caminhonete atravessava uma rua cheia de carros abandonados.

Josué soltou um riso seco.

— Não é um hotel cinco estrelas, mas já me manteve vivo até agora.

O galpão industrial surgiu à vista após uma curva apertada. Grandes portões de metal reforçados dominavam a entrada, com barras de aço soldadas e arames farpados improvisados para evitar invasões. Uma plataforma no alto do portão servia como mirante, equipada com uma cadeira de madeira e uma luneta antiga.

— Chegamos — anunciou Josué, desligando o motor e saltando do veículo.

Larissa e Victor desceram com cuidado da caçamba, os olhos varrendo o ambiente. Diego permaneceu parado por alguns instantes antes de seguir os outros, ainda desconfiado.

Josué caminhou até o portão e bateu três vezes em um padrão rítmico. Uma pequena abertura se abriu, revelando os olhos desconfiados de uma mulher de meia-idade.

— Quem são eles? — perguntou ela, o tom sério e firme.

— São comigo, Dona Célia. Sobreviventes que eu encontrei pelo caminho — respondeu Josué.

— Mais gente? — Célia abriu o portão com relutância, deixando que os três entrassem. — Espero que saibam se comportar. Aqui ninguém vive de favor.

Ao entrarem, os recém-chegados se depararam com um espaço simples, mas organizado. O galpão estava dividido em áreas: uma pequena cozinha improvisada, camas feitas com colchões velhos e mantimentos armazenados em caixas de plástico. Uma fogueira apagada ocupava o centro do local.

Pelo menos cinco outras pessoas estavam no galpão. Um homem corpulento afiava uma faca próximo à cozinha, enquanto duas mulheres discutiam em sussurros, organizando mantimentos. Dois adolescentes jogavam cartas em um canto, seus rostos marcados pela exaustão, mas com sorrisos tímidos.

— É aqui que você vive? — perguntou Larissa, examinando o local com curiosidade.

— Melhor do que lá fora, não acha? — rebateu Josué, cruzando os braços.

Victor franziu o cenho, desconfiado.

— E por que arriscar a vida para nos salvar?

Josué deu um passo à frente, fixando os olhos nele.

— Não sou nenhum herói, garoto. Mas eu conheço bem esse mundo. Quanto mais pessoas úteis eu tiver ao meu lado, melhor. Vocês me devem uma agora.

Dona Célia limpava uma espingarda sentada em um caixote. Ela olhou para os recém-chegados com desconfiança.

— Trabalharão para pagar essa dívida, não é? Ou vai me dizer que trouxe mais bocas para alimentar sem utilidade?

— Eles vão ajudar — respondeu Josué. Ele virou-se para os três. — Espero que saibam se virar. Aqui, todos têm um papel.

— Ajudar como? — perguntou Diego, cruzando os braços.

— Procurar mantimentos, armas, combustível. Serão batedores — explicou Josué, o tom firme.

Larissa ergueu as sobrancelhas, indignada.

— Batedores? Quer que arrisquemos nossas vidas enquanto você fica aqui no conforto?

Josué soltou um suspiro cansado.

— Eu saio quando preciso. Mas vocês são novos aqui, precisam provar que não serão um peso. É isso ou podem procurar outro lugar para se esconder.

A tensão aumentou, mas Victor, percebendo que não tinham escolha, deu um passo à frente.

— Tudo bem. Nós ajudaremos.

Dona Célia riu pelo nariz, enquanto o homem corpulento na cozinha apenas lançou um olhar rápido antes de voltar à faca.

— Veremos se vocês sobrevivem ao primeiro dia — disse Célia, levantando-se e indo para outro canto do galpão.

A noite no Galpão...

Mais tarde, Larissa, Victor e Diego estavam sentados em um canto, conversando em sussurros.

— O que acha deles? — perguntou Larissa, olhando discretamente para os outros sobreviventes.

— Josué parece saber o que faz, mas aquela Célia... ela é perigosa — respondeu Victor.

— Todos aqui parecem perigosos — murmurou Diego. — Mas precisamos disso. É melhor do que ficarmos sozinhos.

Josué os observava de longe, ouvindo fragmentos da conversa. Ele sabia que conquistar a confiança dos três seria um desafio, mas precisava deles tanto quanto eles precisavam dele.

No canto oposto, os adolescentes riam baixinho de algo nas cartas, mas o som foi abafado por um grito distante vindo de fora. Todos ficaram tensos. Josué ergueu uma mão.

— Só um errante perdido — disse ele, a voz calma. — Eles sempre aparecem.

Aos poucos, a tensão diminuiu, mas todos sabiam que o perigo nunca estava longe.

Continua...

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