O Primeiro Desafio Real

Mary Li Wang

Enquanto cavalgávamos pelo árido deserto do Texas, a figura de Speedy Shot à minha frente era um constante lembrete das histórias fantásticas que eu ouvira a seu respeito. Ele manejava Silver Bullet com uma habilidade inegável, mas eu ainda não estava convencida de que sua reputação era merecida. Era difícil reconciliar a imagem do destemido caubói com o homem que agora cavalgava ao meu lado, especialmente sabendo que fora preso pelo xerife Lawyer.

Meus pensamentos vagavam, e inevitavelmente retornavam a Hannah. Minha amiga, minha parceira na caça de recompensas, tinha me golpeado e me trancado em casa para me proteger de uma busca cega por vingança. O pai dela, o xerife, entendera melhor do que ninguém o perigo de perseguir Winona "Bloodmaid" Blackriver sem um plano sólido. Mas agora, sabendo que Hannah estava sozinha e em perigo, eu não podia mais hesitar.

Um movimento à minha direita chamou minha atenção. Olhei para Speedy Shot e percebi que ele também estava atento ao nosso redor. De repente, vimos ao longe uma caravana sendo assaltada. Os bandidos cercavam as carroças, roubando e aterrorizando os viajantes. Speedy Shot pareceu hesitar, mas antes que ele pudesse sugerir qualquer coisa, tomei a decisão.

— Vamos, temos que ajudá-los! — gritei, já avançando com meu cavalo.

Ele não teve escolha a não ser me seguir. Aproximando-nos, pude ver que eram cinco bandidos, todos armados e prontos para lutar. O medo que talvez Speedy Shot sentisse não parecia afligi-lo agora, e quando ele sacou suas pistolas, fiquei impressionada com a rapidez e precisão dos seus movimentos. Era a primeira vez que eu via a lenda ganhar vida.

Eu, por minha vez, saltei do cavalo com uma agilidade treinada e me lancei contra os bandidos com golpes de Kung Fu. O elemento surpresa estava a nosso favor. Um dos bandidos tentou me acertar, mas desviei e o derrubei com um golpe certeiro. Outro veio em minha direção, mas uma bala disparada por Speedy Shot o desarmou antes que ele pudesse me atingir.

Os outros três bandidos perceberam que tinham subestimado sua presa e tentaram recuar, mas Speedy Shot, agora mais confiante, usou seu laço para derrubar um deles, enquanto eu cuidava dos outros dois com uma combinação de chutes e socos. Em poucos minutos, a luta estava terminada, e os bandidos estavam todos desarmados e subjugados.

— Parece que você sabe realmente se virar, Speedy Shot— comentei, ainda ofegante da luta.

Ele deu um sorriso modesto, mas havia um brilho de satisfação em seus olhos.

— Você está vendo a lenda com seus próprios olhos, Mary

Os viajantes da caravana nos agradeceram profusamente, e enquanto Speedy Shot conversava com eles, garantindo que estavam bem e que os bandidos não voltariam, eu me permiti um momento de reflexão. Speedy Shot tinha provado seu valor, pelo menos naquele confronto. Ainda assim, a jornada até San Francisco seria longa e cheia de perigos. Se ele poderia realmente ajudar a encontrar Hannah e enfrentar Winona Blackriver, ainda estava por ver. Mas por agora, eu estava grata por sua presença e sua habilidade com as armas.

Quando retomamos nossa viagem, o deserto parecia um pouco menos desolado, e eu sentia uma pontinha de esperança de que, juntos, poderíamos vencer os desafios que nos aguardavam. Eu não confiava completamente em Speedy Shot, mas estava disposta a dar-lhe uma chance. Afinal, a vida no Velho Oeste era cheia de surpresas, e cada aliado, por mais improvável que fosse, poderia fazer a diferença entre a vida e a morte.

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Winston White

Enquanto cavalgávamos pelo deserto após nosso confronto com os bandidos, minha mente girava a mil por hora. Mary mantinha seu olhar fixo à frente, os olhos penetrantes e determinados, como se nada pudesse abalá-la. Eu, por outro lado, lutava para manter a postura de caubói destemido que construíra ao longo dos anos. Cada batida do meu coração parecia um trovão em meus ouvidos, e minhas mãos, embora firmes nas rédeas de Silver Bullet, ainda tremiam levemente da adrenalina do combate.

Eu nunca tinha estado em uma situação tão real antes. Os tiros, os gritos, o perigo iminente de ser atingido – tudo isso era novo para mim. Sempre fui um artista, um ilusionista do Velho Oeste, e minhas "aventuras" anteriores não passavam de truques e encenações. Mas ali, enfrentando aqueles bandidos ao lado de Mary, percebi que a linha entre a lenda e a realidade era muito mais tênue do que eu imaginava.

Lembro-me do momento em que vi Mary se lançar contra os bandidos sem hesitar. A determinação e a coragem dela eram palpáveis, e eu sabia que precisava estar à altura. Quando saquei minhas pistolas e mirei, a confiança que mostrava externamente não passava de um reflexo condicionado dos anos de prática teatral. Internamente, eu estava apavorado. Cada disparo que eu fazia era uma aposta desesperada de que a bala acertaria o alvo antes que eu fosse acertado.

Porém, algo curioso aconteceu durante aquele confronto. À medida que os minutos passavam e os bandidos caíam um a um, comecei a sentir uma mudança dentro de mim. O medo ainda estava lá, claro, mas ele estava sendo sobrepujado por uma sensação nova, algo que eu nunca havia experimentado em nenhuma das minhas performances: a verdadeira confiança. Cada tiro certeiro, cada movimento bem-sucedido com o laço, fazia com que eu começasse a acreditar que talvez, apenas talvez, eu fosse mais do que um personagem criado para entreter multidões.

— Parece que você sabe realmente se virar, Speedy Shot — Mary disse após a luta, ainda ofegante. Havia uma nota de reconhecimento em sua voz que eu nunca esperava ouvir.

Sorri para ela, mas não era o sorriso confiante e presunçoso de antes. Era um sorriso genuíno, cheio de uma nova compreensão sobre mim mesmo. — Você está vendo a lenda com seus próprios olhos, Mary — respondi, mantendo a fachada.

Continuamos nossa jornada, e eu refletia sobre o que aquilo significava. Não podia deixar de sentir um certo orgulho, não só pelo que havia conseguido, mas pela forma como consegui. Não era apenas sorte ou teatro, mas sim habilidade real que eu possuía, mas nunca havia usado objetivamente.

Ainda assim, o medo permanecia ali, uma presença constante e silenciosa. Eu sabia que aquilo era apenas o começo. San Francisco estava a uma longa distância, e o caminho até lá seria repleto de perigos e desafios que testariam não só minhas habilidades, mas também minha coragem e determinação. E além de tudo isso, havia a presença intimidante de Winona "Bloodmaid" Blackriver, uma adversária cuja fama de letalidade superava em muito a minha própria.

Quando a noite caiu, armamos acampamento em um pequeno vale. Mary fez uma fogueira, e nos sentamos ao redor dela, o silêncio confortável entre nós. Eu observava as chamas dançarem, o calor reconfortante contrastando com o frio que começava a descer sobre o deserto.

— O que te fez aceitar essa jornada? — Mary perguntou de repente, quebrando o silêncio. Seus olhos brilhavam à luz do fogo, cheios de curiosidade.

— Apesar de tudo o que as histórias contam sobre os meus feitos, há um elemento que nunca aparece em nenhuma delas — respondi, jogando mais um galho na fogueira. — Speedy Shot, já salvou muitas vidas, mas sempre o fez para mostrar suas habilidades e ganhar fama. Nunca houve um propósito nobre por trás das minhas intervenções em conflitos. Às vezes eu sinto que nada do que eu fiz foi real e de que eu não passo de uma lenda fabricada.

Ela me observou por um longo momento antes de assentir lentamente. — O que você fez hoje foi real, Speedy Shot. Se outra pessoa me contasse sobre o modo como desarmou aqueles bandidos sem matá-los com seus tiros certeiros, eu certamente diria que era uma história para se contar em Saloons e ao redor de fogueiras, mas eu vi tudo. Não sei se quem estava ali era o Speedy Shot, ou se era o Winston White, mas eu sei que era um caubói corajoso e habilidoso.

Enquanto me deitava para dormir, com o som distante dos coiotes como pano de fundo, fechei os olhos e respirei fundo. O medo ainda estava lá, uma sombra persistente no canto da minha mente, mas agora havia algo mais para equilibrá-lo: esperança. Se consegui enfrentar um bando de bandidos ao lado de Mary, talvez, só talvez, eu pudesse realmente ser o herói que todos acreditavam que eu era.

E assim, com a mente dividida entre o medo e a esperança, senti que estava adormecendo aos poucos. Estava pronto para enfrentar os desafios que o amanhã traria. As palavras de Mary ecoavam em minha mente, junto com o seu rosto lindo e gentil. Certamente teria bons sonhos.

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A alvorada do dia seguinte trouxe consigo um novo fôlego para Mary e Winston, enquanto se preparavam para retomar a viagem. O sol nascia lentamente, tingindo o horizonte com tons de dourado e laranja, e as sombras das montanhas distantes pareciam se alongar, como guardiãs silenciosas do deserto.

Ao longo dos dias que se seguiram, a vastidão do deserto texano revelou sua majestade imponente e desolada. Dunas ondulantes, cactos imponentes e formações rochosas esculpidas pelo vento tornavam a paisagem tão fascinante quanto implacável. Mary mantinha o olhar fixo no horizonte, seus pensamentos divididos entre a busca por Hannah e a vigilância constante contra possíveis ameaças. Ao seu lado, Winston, embora ainda tentando provar a si mesmo, parecia mais à vontade a cada dia que passava.

O calor do dia era quase insuportável, e ambos precisavam fazer pausas frequentes para que seus cavalos, Silver Bullet e Starfire, recuperassem as forças. O brilho ofuscante do sol fazia a areia reluzir como se fosse um mar dourado, e a ausência de qualquer sinal de vida humana reforçava a sensação de isolamento. À noite, as temperaturas caíam drasticamente, e o céu, livre de qualquer poluição luminosa, se tornava um manto negro pontilhado por incontáveis estrelas, trazendo um estranho consolo aos viajantes exaustos.

Em uma dessas noites, acampados em uma pequena depressão protegida do vento, Mary e Winston compartilharam histórias de suas vidas. Ela, de seu treinamento rigoroso em artes marciais e de sua parceria com Hannah. Ele, da parte de sua vida que era verdade — sua infância e adolescência no circo e o treinamento com seu pai.

Ali, ele evitava se gabar ou alimentar a lenda. Por algum motivo, sentia vontade de contar toda a verdade para ela, mesmo a conhecendo por pouco tempo. Os olhos sinceros e carregados de justiça de Mary, eram um convite à verdade e ele não sabia por quanto ainda conseguiria manter a fachada.

Após vários dias de viagem, avistaram finalmente as primeiras construções de madeira de uma pequena cidade que parecia brotar do deserto como uma miragem. Ao se aproximarem, a presença de patrulheiros na entrada deixou claro que algo de grave havia acontecido. Os habitantes da cidade, preocupados, se reuniam em pequenos grupos, trocando murmúrios ansiosos.

Mary e Winston desmontaram de seus cavalos e se dirigiram ao xerife, um homem corpulento e de olhar cansado, que discutia com seus homens. Ao ouvir o nome de William H. Lawyer, o homem imediatamente passou o relatório, mostrando o quanto o nome era respeitado. A notícia era alarmante: um bando de foras-da-lei havia abordado um trem de passageiros que seguia para San Francisco. Mary sabia que aquele era o trem onde estava Hannah.

O coração de Mary apertou ao ouvir aquilo. Mesmo sabendo que a sua amiga era habilidosa o suficiente para ocultar a sua verdadeira identidade, se os bandidos soubessem que ela era filha do xerife Lawyer, certamente poderiam querer algum tipo de vingança. Sem hesitar, decidiu seguir os patrulheiros que partiriam em busca dos bandidos. Winston, percebendo a determinação inabalável de sua companheira, sabia que não poderia deixá-la enfrentar esse perigo sozinha.

— Nós vamos com vocês — Mary afirmou, sua voz firme e determinada.

O xerife olhou para ela com uma mistura de ceticismo e respeito, reconhecendo a seriedade em seus olhos.

— Eu já ouvi falar sobre você, senhorita Wang, mas quem é esse homem negro ao seu lado? — ele respondeu, acenando com a cabeça na direção do companheiro dela.

— O senhor tem algum problema com a cor da pele dele, xerife? — Mary perguntou, visivelmente irritada com o modo como o homem falou e completou de modo irônico: — Talvez tenha algo a falar sobre a minha “pele amarela” e meus olhos puxados também.

— Me perdoe, senhor… — o oficial desculpou-se, desconcertado.

— White, Xerife. Winston White. — Speedy Shot respondeu, dando ênfase em seu sobrenome, que por diversas vezes gerou piadas racistas em sua vida, mas que ele tinha bastante orgulho de dizer.

— Peço perdão novamente se o que eu disse soou preconceituoso — o xerife falou, com os olhos arregalados por perceber quem era o caubói que estava na sua frente —, eu não fazia ideia de que estava na presença do lendário Speedy Shot.

— Mesmo que fosse um caubói comum, xerife, não justificaria esse tipo de tratamento — a jovem completou, com um tom repreensivo —, o senhor fez um juramento de defender a lei e após a promulgação da 13° Emenda Constitucional, ela passou a ser para todos os povos.

— Está tudo bem, Mary — Winston disse calmamente, sentindo seu coração aquecer com a defesa veemente dela —, eu acredito que o xerife não fez por mal e que não irá repetir isso.

— Certamente, me perdoem mais uma vez. — o homem disse envergonhado — A ajuda de vocês será muito bem-vinda.

Enquanto os patrulheiros montavam seus cavalos e se preparavam para partir, Mary e Winston se posicionaram a uma distância segura, prontos para seguir o grupo. A poeira levantada pelos cascos dos cavalos desaparecia rapidamente no horizonte, mas o caminho diante deles estava claro: encontrar os bandidos e salvar Hannah.

A jornada seria longa e cheia de incertezas, mas Mary sabia que não poderia falhar. Com Winston ao seu lado, um aliado inesperado mas agora indispensável, sentia-se preparada para enfrentar qualquer desafio. O deserto, com toda a sua beleza e brutalidade, seria apenas mais um obstáculo a ser superado na busca por justiça e pela segurança de sua amiga.

E assim, ao seguir os patrulheiros à distância, Mary e Winston cavalgavam em direção ao desconhecido, determinados a confrontar o perigo e a cumprir seu destino no implacável Velho Oeste.

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