DOZE

Posso resumir esses últimos três dias em duas palavras: Correria e estresse.

Foi realmente muito difícil organizar tudo. Por um momento achei que não ia conseguir, mediante todas as coisas que tive que fazer, mas felizmente deu tudo certo e finalmente o grande dia chegou. O dia do baile.

Sei que hoje também é o meu aniversário, mas não me culpe pela falta de animação. Se eu pudesse, estaria com a minha família neste exato momento e tenho certeza de que estaria mais feliz.

E ainda para completar, estou um pouco preocupada, pois Adam me disse que irá embora amanhã e que hoje, após o baile, ele me dirá tudo o que terei que fazer aqui no Palácio.

Bem, pode-se dizer que hoje é um dia importante e por isso me encontro nervosa neste momento.

E é perdida nesses pensamentos que abro a porta para entrar em meu quarto.

- Ainda bem que você chegou Julie! Venha sente-se - Brenda aponta a cadeira em frente à penteadeira- Já estamos um pouco atrasadas com isso!

- Eu estava apenas conferindo como estão as coisas no salão e não vi a hora passar- falo, observando o pôr do sol que refletido nas janelas de vidro, traz uma coloração alaranjada ao quarto.

- Tudo bem! Ainda temos um tempinho até os convidados começarem a chegar. Vou buscar o seu vestido- ela fala e entra no closet.

Me sento na cadeira à sua espera e começo a olhar as joias em cima da penteadeira. E só então me dou conta de uma caixa vermelha aveludada com um pequeno bilhete em cima, eu o pego e leio.

Feliz aniversário Julie! Espero que goste do meu presente.
Adam

Abro a caixa, curiosa quanto ao seu conteúdo e me deparo com um lindo colar de pedras azuis.

Fico admirada com tamanha beleza.

Mas isso deve ter custado muito caro e definitivamente eu não posso aceitar.

Tenho que devolve-lo agora mesmo!

- Que lindo esse colar!- ouço a voz de Brenda atrás de mim, e só então percebo sua presença- Ele combina perfeitamente com o seu vestido. Vai usa-lo hoje não é?

- Não pretendo- falo fechando a caixa.

- Como não? Ele é maravilhoso! Bem deixe-me ver- ela pega o bilhete de minhas mãos e eu não tenho nem tempo de reagir- É um presente de seu primo! E ele com certeza ficará  muito feliz se usa-lo.

- Acho melhor não- digo tentando me esquivar do assunto.

- E por que não?

Brenda me encara com seus olhos intrigados esperando a minha resposta e consequentemente me deixando sem saída.

- Okay, eu me rendo, usarei o colar- falo e sorrio para disfarçar.

Brenda bate palminhas animada e eu me levanto indo até a cama onde está o meu vestido.

Dentre todos os que mostraram, este me chamou mais atenção, nunca havia visto algo parecido. O brilho prata e a cor azul, se constrastam como um céu cheio de estrelas e em minha opinião é o vestido perfeito.

O pego e vou ao banheiro me trocar.

Saio e calço meus saltos pretos.

Me sento novamente em frente à penteadeira onde Brenda já começa  a me fazer uma maquiagem leve e a  arrumar meus cabelos com movimentos ágeis e rápidos.

E enquanto isso aproveito para colocar as jóias. Pulseira, brincos e o  colar que Adam me deu, e que em breve irei devolve-lo.

Em pouco tempo ela termina e eu observo o resultado.

Meus longos cabelos pretos estão soltos e ondulados e alguns fios de ouro se entrelaçam com meus fios em uma trança, simulando uma coroa.

- Está simplesmente espetacular!- falo me levantando e fitando meu reflexo no espelho.

- Bem, você já está pronta! - Brenda fala sorrindo- Vou leva-la até a entrada, acho que todos já devem estar lá.

- Espere!- vou até o closet e pego a surpresa que preparei- Por acaso achou que eu ia deixar que a minha melhor amiga não participasse desse baile? Pegue é seu! Na escolha dos vestidos, eu vi o quanto este te agradou- falo e estendo o vestido à ela.

- Oh, eu estou sem palavras. Obrigada! - ela vem e me abraça- Mas acho que terei que recusar, pois os criados não podem participar dos bailes.

- Para com isso Brenda! Você é minha amiga e não minha criada. E você vai sim à esse baile! Fique tranquila e se alguém te perguntar, diga que eu te convidei.

Brenda me olha indecisa, mas a animação e a felicidade são evidentes em seu rosto.

- Agora vá se arrumar e nos vemos no salão!

Ela assente.

- Obrigada mais uma vez! E parabéns pelo seu aniversário, você merece toda a felicidade do mundo!- fala sorridente e se vai.

Começo a andar em passos lentos até a escada onde entraremos no salão.

Lembro de que Matthew me disse que fará desse dia o mais infeliz possível para mim.

Tento evitar de pensar nisso me concentrando no meu discurso, mas isso só faz o meu nervosismo aumentar e as minhas mãos suarem.

Nunca falei em público mas já estou odiando isso.

De longe já avisto rei Ignatius, rainha Angelique e Matthew me esperando, minha vontade é de sair correndo, mas respiro fundo e acelero o passo.

- Aqui estou! Boa noite.

Matthew é o primeiro a me olhar e parece ficar vidrado ao fazer isso.

- Julie, você está esplêndida!

- Concordo com Angelique! - rei Ignatius fala- E você Matthew, diga alguma coisa!

O príncipe parece voltar a si e murmura algo como: Você está linda! e me estende o braço.

E a atenção que antes fora destinada a mim agora se volta para o salão.

Daqui de fora consigo ouvir as pessoas conversando e se divertindo, mas de repente tudo se silencia e então já sabemos que chegou a hora.

O rei e a rainha são os primeiros a entrar e uma salva de palmas ecoa pelo lugar.

Matthew e eu ainda continuamos parados, esperando a nossa vez e é então que um guarda acena com a cabeça nos indicando que podemos ir.

Assim que aparecemos no topo da escada as pessoas já nos lançam olhares admirados, ouço vários elogios e ao descermos recebemos uma salva de palmas.

- Jóia bonita essa em seu pescoço! Por acaso faz parte do pagamento pelo nosso noivado?- Matthew fala em meu ouvido.

Ignoro-o à fim de não começar uma briga, e sorrio para os rostos desconhecidos que nos encaram.

- É melhor você tomar cuidado para não tropeçar na barra de seu vestido, pois seria uma pena se você caísse da escada. Será que o estrago seria grande?- ele fala e começa a rir como se tivesse acabado de me contar uma piada.

Sinto que recebi uma pequena ameaça e se o objetivo dele é me colocar medo, está conseguindo.

Desço o último degrau da escada e respiro aliviada.

As pessoas nos cercam gentilmente nos parabenizando.

Apenas sorrio e aceno com a cabeça. Hoje farei o máximo possível para me manter calada e não precisar espalhar as mentiras que já fazem parte de minha vida.

Me sinto estranha no meio daquelas pessoas que me analisam de cima a baixo, que sorriem falsamente e que tentam se aproximar de mim para ver com seus próprios olhos, quem é a tal condessa interesseira que aceitou assumir um noivado com o principe mais mulherengo e mimado de todos os reinos. É, eu realmente acho que a minha fama entre eles não é a das melhores.

Até que de relance vejo um rosto conhecido tentando se aproximar, foco o olhar e vejo que é Adam.

Ele chega até mim.

- Só queria te parabenizar pessoalmente- ele olha para o colar em meu pescoço e sorri ao olhar em meus olhos.

- Obrigada Adam, mas eu que...
Sou interrompida por um homem baixinho e barrigudo com uma coroa na cabeça, certamente monarca de algum reino próximo, que chama Adam para ir onde ele está.

- Aproveite o baile Julie!- Adam diz e se afasta.

A música começa a ressoar pelo salão e eu aproveito que Matthew está distraído conversando e me disperso entre o povo em busca de espaço.

Agora, dando uma olhada geral, vejo que a decoração ficou ótima. Lilás e dourado são as cores que escolhi. E que diga-se de passagem foi uma ótima escolha.

Estou quase chegando na mesa de bebidas, quando alguém puxa o meu braço.

- Por acaso não sabe que temos que ficar juntos, querida?

- E por acaso eu estou colada a você? Não. Então posso ir aonde quiser - falo, puxando meu braço das mãos de Matthew.

- Pelo menos saiba fingir então. Não se esqueça de que as pessoas estão nos olhando!

Vejo que ele tem razão, pois até o rei e rainha nos observam sentados em seus tronos, nos lugares reservados. Por isso trato de colocar um sorriso no rosto.

- Vou pegar alguma bebida, não precisa ir junto comigo. Já volto!

- Okay, vou espera-la aqui- ele fala com um sorriso maroto.

Vou me aproximando da mesa, mas sinto algo que me impede de andar, tento levantar o pé para desviar e acabo tropeçando em meu próprio vestido.

Sei que vou cair, por isso tento segurar em algo ou alguém, mas não encontro nada.

Quando dou por mim, ouço um barulho estridente e me apoio na beirada da mesa me equilibrando.

Em minha tentativa de não me esborrachar no chão, acabei derrubando bandejas com várias taças de vinho e outras bebidas que desconheço. Meu braço está todo sujo e grudento.

Matthew aparece magicamente ao meu lado me erguendo. O salão está em completo silêncio, até os músicos pararam de tocar.

- Está tudo bem? Acho que você tropeçou.

- Você acha? Eu tenho certeza- respondo ríspida.

- Julie, pegue esse pano para se limpar. Você está machucada?- Brenda vem correndo ao meu lado preocupada.

- Não- respondo atordoada- por sorte não me cortei nesses vidros.

Olho ao redor e vejo todas aquelas pessoas desconhecidas me encarando como se eu fosse uma desastrada.

- Por favor, mande os músicos voltarem a tocar! - cochicho no ouvido de Brenda e ela assente, indo.

Começo a me limpar de cabeça baixa, me segurando para não despejar a raiva que sinto.

Conforme a música preenche o silêncio do salão, as pessoas vão se esquecendo do ocorrido e se distraindo novamente.

- Foi você! - acuso Matthew.

- Eu?- ele sorri cínico- Não tenho culpa se você não olha por onde anda.

- Você colocou o pé na minha frente para me fazer cair! Não tente disfarçar.

- Pode pensar o que quiser!- ele ri- Só sei que essa cena ficará para sempre em minha cabeça, foi muito engraçado!

- Engraçado? Eu poderia ter me cortado nesses vidros. Isso não é engraçado, isso é grave Matthew!- falo séria.

- Isso é grave Matthew! - ele imita o que eu falei com uma voz de babaca- Eu não estou nem aí para isso.

De longe avisto rei Ignatius se ajeitando no palanque pronto para começar o seu discurso.

Deixo Matthew para trás e ando até o palco, ficando ao lado da rainha.

A sensação de vergonha apenas se intensifica ao ver que estou diante de tantas pessoas. O meu maior medo nesse momento é esquecer de tudo o que eu terei de falar, e ao invés das mentiras, soltar verdades em meu discurso.

- Reis, rainhas e demais nobres aqui presentes! Como todos já sabem, meu filho Matthew, futuro rei de Cancordion, está noivo! Mas, o baile que hoje se realiza não é apenas por esse motivo, há um outro muito especial, que é o aniversário de minha querida nora, a condessa Julie.

Uma salva de palmas ecoa pelo salão. Sorrio para o público e para o rei, enquanto este retoma o seu discurso.

Matthew aparece ao meu lado sorridente e segurando um taça com um líquido laranja, o qual suponho ser suco.

- Tome! Trouxe para você- fala colocando a taça em minhas mãos.

- Não quero!- tento devolver mas ele a empurra de volta.

- De longe se percebe que você está nervosa. Beba! Irá te ajudar- sua voz é doce e convidativa.

- Venham aqui à frente!- rei Ignatius nos chama e quando nos aproximamos ele continua- Agora sem mais delongas, passarei a palavra a condessa Julie.

Sem pensar duas vezes dou um grande gole no suco em minha taça, numa tentativa de dissipar meu nervosismo.

Me arrependo amargamente no momento em que sinto minha garganta queimar, isso me faz afogar e começo e tossir descontroladamente.

Matthew colocou pimenta no meu suco?! Que ordinário.

Respiro fundo tentando me controlar e vejo ele segurando o riso.

Todos estão me olhando, esperando o meu discurso. Para eles, apenas me afoguei com o suco, mas não fazem ideia do quanto minha garganta está ardendo agora.

Coloco a taça em uma mesa próxima e me dirijo ao palanque.

- Desculpe-me- apenas um fio de voz sai de minha boca, inaudível até para mim- Meu nome é Julie, sou a Condessa de Airmont- tenho que tossir novamente- e eu agradeço a presença de vocês aqui neste dia- paro de falar.

Parece que tem um pato entalado em minha garganta. Minha voz está toda embolada devido ao esforço que eu estou fazendo para não tossir.

Terei que diminuir o discurso, ou então virarei piada entre os nobres, se é que já não sou.

- Bom, sou prima de Adam rei de Oryon e estou encantada por Cancordion. E muito feliz com o meu noivado com o principe Matthew.
É só o que tenho a dizer. Aproveitem o baile!- falo em um fôlego só.

Todos batem palmas e a música começa a tocar novamente.

Desço praticamente correndo do palco buscando por água, ou qualquer outra coisa que possa me aliviar.

Só me acalmo, no momento em que sinto a água descer pela minha garganta.

E ao estar completamente recomposta, decido conversar com as pessoas ao meu redor, para talvez amenizar a péssima impressão que acho, que já possuem de mim.

Recebo abraços, sorrisos, olhares tortos, cochichos maldosos, de tudo um pouco. Mas não me incomodo pois sei manter a educação, mesmo não sendo da classe Alta.

Fico pensando, o que será que eles diriam se soubessem que sou da classe Baixa?

Pois na visão deles é inconcebível que alguém da minha classe queira se "igualar" a eles. Mas em minha visão eles não passam de pessoas superficiais que se preocupam apenas com si próprios, e fazem apenas o que lhes convém.

Matthew por exemplo, aceitou esse noivado apenas para forjar uma responsabilidade inexistente e fazer o seu pai acreditar em sua maturidade.

Sabe, eu sinceramente temo por Cancordion, pois com um futuro rei como Matthew pode-se esperar o pior.

E eu sei exatamente o que ele está tentando fazer hoje. Afinal ele já havia me deixado de sóbrio aviso.

Quer me deixar infeliz, mas não irá conseguir. Ficarei mais esperta.

Tomo mais uma taça de água e começo a observar os nobres.

Vejo Adam no meio da multidão, conversando e se divertindo, penso em ir até ele, mas me detenho.

Ficarei aqui, em meu canto, até conseguir uma oportunidade de sair sem ser percebida.

Me sinto completamente sufocada e deslocada nesse salão.

- Bem- a voz de Matthew ressoa no ambiente e eu o avisto no palanque- quero convidar a minha noiva para uma dança.

Todos os olhares são direcionados a  mim novamente e as pessoas abrem espaço, facilitando minha passagem.

Relutante, caminho até Matthew que me espera no centro da pista de dança ajeitando seu terno preto. Fixo o olhar na coroa reluzente em sua cabeça.

Quando me aproximo o suficiente, ele estende uma mão e me olha.

- Me concede esta dança?

Seus intensos olhos azuis me fitam esperando a resposta.

Não!

É a única palavra que vem em minha cabeça. Mas sei que todos à minha volta nos enxergam como um casal.

Não tenho escolhas.

Então, solto a resposta óbvia que todos esperam ouvir.

- Sim!
















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