Capítulo 9: Respostas Vagas.
Marine chegou a uma sala de espera, posicionando-se ao lado de Claire, que estava falando com dois médicos. Susan necessitava de uma transferência devido à gravidade, iria para Cork. A garota se dispôs a acompanhar a amiga, no entanto, a senhora negou, afirmando que ela precisava descansar e tomar os remédios receitados. Iriam para casa, pois precisava pegar alguns documentos necessários.
A garota insistiu, em vão. Alegaram que precisava de repouso, boa alimentação e dos remédios prescritos.
Encaminharam-se diretamente para a residência de Claire, muito bem localizada, diante de uma praça georgiana com uma igreja medieval ao centro, que seguia o estilo arquitetônico gótico irlandês. Ao redor, um extenso jardim esmeralda com flores típicas da região e, ao fundo, um imenso bosque, cercado pela imensidão da floresta. Automaticamente, aquele lugar lhe remeteu ao seu pai. Observou alguns pubs, restaurantes, brechós, livrarias, era como se a cidade estivesse em expansão gradativa.
Ao descer do automóvel, Marine deslumbrou-se com as inúmeras casas enfileiradas de clássicas arquiteturas coloridas que se alastravam por todo seu campo de visão.
— Seja muito bem-vinda — Claire disse cordialmente.
— Obrigada — respondeu, observando a casa branca de varanda acinzentada e com um modesto jardim.
As duas percorreram o caminho de pedras marrons e atravessaram a pequena varanda. A porta abriu-se, revelando Thereza, a amiga diarista de Claire, que cumprimentou Marine como se a conhecesse.
Claire entrou e encaminhou-se para o escritório, destrancando-o. Marine a seguiu até a sala, observando os detalhes da casa aconchegante e uma bela criança de 2 anos na cadeirinha ao lado do sofá. Chamava-se Alice, tinha os olhos verdes e cabelo muito escuro.
Thereza a tomou nos braços, levando-a até Marine, que logo brincou com a menina.
Claire saiu do escritório com uma pasta em mãos, trancou a porta e disse para Thereza levar Marine até o quarto e preparar um belo jantar.
— Um rapaz trouxe seus pertences, senhorita Talbott.
— Pode me chamar de Marine — pediu cordialmente, notou as malas — agora surradas — próximas à lareira, e recordou-se de que William as havia reunido.
Claire parou diante de Marine e disse, tocando-lhe no ombro:
— Sinta-se em casa, minha querida.
Marine a agradeceu com um sorriso luminoso, em seguida pegou suas malas empoeiradas e seguiu Thereza pela escada. O quarto reservado a ela tinha uma grande janela que ficava de frente para a praça, estava bem equipado com uma cama de casal, escrivaninha e um armário ao lado da porta do banheiro.
— Qualquer coisa é só chamar — despediu-se a mulher de semblante angelical.
A garota agradeceu e observou o quarto assim que Thereza fechou a porta. Dirigiu-se até a janela e contemplou a bela paisagem, encostando a testa no vidro da janela.
— Meu pai passou por aqui. — Não conseguiu conter o sorriso, enquanto os olhos varriam o amplo lugar.
As pessoas em movimento, o céu carregado de nuvens volumosas, a brisa gélida, o cheiro da flora, cada detalhe estimulava seus sentidos e a afetava diretamente, fazendo-a dividir-se entre o passado e o presente. Tinha uma sensação incompreensível de que já estivera ali.
Após o capotamento do veículo, uma sensação de déjà-vu se repetia em cada lugar que adentrava, tudo parecia uma cópia de algo até então jamais vivido, porém sentido.
O toque do celular fez a conexão da garota se dissipar, principalmente ao observar o nome de Joanne na tela. Ignorou a chamada e sentou-se na confortável cama, puxando uma das malas para perto de si.
Alocou alguns itens de higiene pessoal sobre o lençol e agrupou algumas mudas de roupa, caminhou até o armário, o abriu e constatou que estava vazio.
Decidiu então depositar todo o conteúdo da mala na cama e guardar no armário. No momento em que um pensamento lhe passou pela mente, fazendo-a paralisar de medo, espalhou tudo rapidamente, procurando pela pedra entregue à Susan, em Dublin.
— Não, não... Não pode ser! — gritou frustrada. — Não está aqui! — Apertou alguns suéteres e os jogou no chão na tentativa de se acalmar e raciocinar claramente. Afastou-se da cama e colocou as mãos na cabeça, refazendo seus passos mentalmente.
— Eu não esqueci! — afirmou ofegante. — Perdemos no acidente?
Não poderia estar fadada a uma sucessão de erros.
Procurou o celular entre seus objetos e buscou a chamada perdida de William, extremamente nervosa.
No terceiro toque, atendeu.
— Senhorita Talbott? — parecia surpreso e animado.
— Olá, Collins. Tudo bem? — falou rápido.
— Estou bem, aconteceu algo? — preocupou-se.
— Em tese. — Procurava palavras. — Gostaria de saber se quando você agrupou nossas malas, você as abriu? Quer dizer, estavam abertas? Nossos pertences espalhados pelo chão?
— Não abri sua mala. — Riu nervoso. — Estava tudo do jeito que encaminhei para a casa da senhora Claire.
— Não pode ser. — Suspirou aflita. — Tem algo meu que sumiu.
— Senhorita, eu cuidei disso pessoalmente e não abri as malas de vocês — foi enfático.
— Então como sumiu?
— O que exatamente sumiu?
— Não interessa — respondeu depressa e logo arrependeu-se. — Desculpe, é algo importante, extremamente importante. Onde você está agora?
— Em uma loja — respondeu devagar.
— Você está ocupado?
— Não. Por quê?
— Você poderia me levar até o local do acidente?
O jovem se prontificou a levá-la, pedindo uma margem de 30 minutos até sua chegada. Foi tempo o suficiente para um banho, uma troca de roupa às pressas e uma descida à cozinha para pedir uma fruta à Thereza, a qual recomendou que ela descansasse, em vão. Marine a convenceu que era algo importante.
William mandou uma mensagem de voz informando que já a aguardava.
Ela saiu quase correndo. Ao abrir a porta, o avistou dentro de um carro preto diante da casa, tentou disfarçar sua inquietação. Foi até ele quase tropeçando em seus próprios pés e agradeceu pelo apoio.
Colocou o cinto de segurança, desejando ela mesma dirigir para arrancar a toda velocidade e chegar o mais rápido possível.
— Você está bem? — William virou-se no assento para encará-la, franzindo a testa.
— Estou sim, pare de me perguntar se estou bem a toda hora — assim que falou, percebeu quão rude havia sido e mordeu a língua, segurando outro xingamento.
— Como quiser — respondeu ele, com o rosto esquentando.
William deu partida, observando-a de soslaio.
Marine olhava com atenção as ruas e cruzamentos, já traçando o curso que seguiria para caminhar sozinha em busca de respostas.
Os dois mantiveram-se em silêncio até a chegada ao local, alguns destroços do automóvel ainda permaneciam no acostamento.
Antes mesmo de estacionar, Marine abriu a porta, desceu do veículo e começou a busca pelo objeto.
William desligou o carro e aproximou-se, atento. Perguntou se poderia ajudá-la.
Marine não o ouviu se aproximando, enquanto vasculhava o ambiente, chutando folhas, galhos e detritos no caminho.
— Marine? — chamou-a. — Se você me disser o que é, posso te auxiliar — falou solícito.
— Não — respondeu sucinta, quase agachada tocando em algumas pedras.
Então William encostou-se no carro e cruzou os braços, com uma expressão de frustração e preocupação.
A jovem varreu todo o lugar com os olhos e as mãos, sujando-as com lama e poeira, frustrando-se ainda mais. Aquela era a última pista que possuía, se não estivesse lá, ela tinha perdido tudo.
— É algo muito importante? — arriscou William.
Marine o encarou com os olhos semicerrados e aproximou-se devagar, quase como um predador faria, várias emoções empurrando-a para a borda. Ela respondeu que era um objeto de suma importância.
A misteriosa conexão entre eles se acendeu novamente.
— Se você me contar o que é... — ofereceu-se para ajudar.
— Onde está o seu amuleto?
As mãos ávidas da garota foram até o pescoço de William na procura pelo objeto. Não encontrou.
— Deixei em casa depois que tomei banho — respondeu atônito. — Por que você perguntou a respeito dele?
Não conseguia fazer rodeios, aquilo estava lhe absorvendo por inteira.
— Por nada, você como sempre escapando das minhas perguntas — bufou de raiva, descontando sua frustração nele.
— Eu lhe respondi — reclamou ele, de forma defensiva.
— Respostas vagas — concluiu, agitando a mão em desdém.
Os olhares cada vez mais intensos.
— Eu acabei de lhe falar! — Agora William também estava irritado.
— Tudo bem. Se não quer responder, pelo menos não me atrapalhe — demandou enfática.
— E se não quer minha ajuda, vou aguardar aqui. — Crispou os lábios, descontente.
Marine praticamente constatou que existia alguma coisa a mais dentro daquele olhar de William, no entanto, não iria confrontá-lo por enquanto, precisava encontrar o objeto. Ainda o procurou por mais alguns minutos e parou diante do jovem ao constatar que revirara cada centímetro daquele lugar. Decepção caiu sobre ela. Decidiu parar e pediu para partirem, absurdamente frustrada.
Entraram no carro silenciosamente, ambos olhando para frente. Em poucos minutos já estavam diante da casa da avó de Susan. Marine agradeceu e ele respondeu esboçando um singelo sorriso.
Novamente, a ausência de palavras os preenchia. Marine suspirou, exausta e apática ao descer do veículo.
— Admito que fui grossa. — Fechou a porta e apoiou as mãos, curvando-se e o fitando gelidamente. — Desculpe.
William apenas a observou, tecendo algumas opiniões silenciosas a seu respeito.
— Creio que o acidente realmente afetou alguma coisa na sua cabeça — disse ele em um tom divertido, apenas para corar, arrependido.
Marine o observou com o semblante desafiador, porém não tinha forças para uma discussão no momento.
— Você ficou ofendida? — William perguntou, segurando levemente sua mão.
Ela o encarou, tentando entender a personalidade confusa dele: ora fazia piada, ora corava, ora era gentil, ora extremamente irônico. Por fim, negou, puxou a mão e despediu-se.
Assim que entrou na casa após três batidas na porta, Thereza informou que os remédios estavam na mesa e que era de vital importância tomá-los.
Marine esboçou um sorriso, concordando a contragosto. Thereza a encaminhou até uma pia na parte de trás da casa e ela lavou os braços.
Após tomar o medicamento foi para o quarto e estudou todo o recinto. Repousou o olhar na janela de vidro, observando o dia lá fora.
Pegou o telefone e movimentou os dedos pelo registro de chamada, focalizando no número de William, salvou o contato na agenda e atualizou o Whatsapp. Mirou silenciosamente na foto dele, traçando inúmeras teorias. Coçou a nuca, trocou de roupa e deitou-se na cama, olhando para o teto e refletindo a respeito das respostas vagas dadas por ele.
Seria ele um bruxo?
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