Capítulo 38: O Assassino de Dylan Talbott.


Os fones de ouvido foram colocados e o volume elevado ao máximo no celular para não ouvir mais nada no caminho até a recepção em busca de Josh. Sarah e William não responderam suas mensagens.

— Cabelo molhado? — brincou ele.

— Mais um aprendizado com Sayne. E acredite, recebi discretamente um elogio.

Josh surpreendeu-se verdadeiramente e afirmou ter receio de Sayne. Marine confirmou seu medo em não avançar na Congregação.

— Ela me passa livros escritos em latim. Imagina a minha dificuldade em interpretar os rituais caseiros.

Josh riu e voltou para o computador. Estava inserindo no sistema mais informações a respeito de Taylor Greene.

Marine observou a foto e ajuizou silenciosamente o quanto era bonita. No seu íntimo, sentia que a conhecia.

— Sinto que a conheço de algum lugar. Você a conhecia antes?

— Sim. Ela é aprendiz do Guardião de lá, Methos — informou Josh, catalogando as informações repassadas por Hellen.

Marine baixou o olhar, reflexiva, e logo comentou:

— Você pode consultar qualquer informação pelo sistema?

— Praticamente tudo... Pelo menos o que é inserido no sistema pelo Conselho. — Riu.

Josh a quis nortear.

— Por exemplo, as decisões secretas do Conselho não são registradas, assim como das assembleias dos sete Guardiões, Censoras e Sacerdotes. No resto, tudo — explicou abrindo algumas páginas e mostrando certos horários que variavam de exercícios com Guias, Mestres e pequenos detalhes do exército, regido por Peter Davin, como expressava no cabeçalho.

— Já consto no sistema? — investigou Marine com um sorriso discreto.

— Claro! Os iniciados são registrados após a cerimônia. Tudo tem um histórico.

Josh clicou em Arquivos de Aprendizes, digitou seu nome completo e logo sua foto e todos os detalhes desde sua entrada apareceram.

— Viu, da entrada até hoje. — Apontou.

— Oitavo nível? — Ergueu as sobrancelhas.

— Sim. — Bufou, balançando a cabeça negativamente. — Não passei no início do ano e tive de refazer. Além do mais, meu Mestre está em retiro espiritual na Espanha... Volta apenas em agosto. Mas pelo menos trabalho... Tenho muita coisa para fazer, o que me afasta do tédio, além dos rituais que ele deixou para eu praticar. — Bocejou.

— Entendi... E como você conseguiu trabalhar aqui? — algumas dúvidas surgiram.

— Demorei bastante para alcançar este cargo. Apesar de não aparentar, é de confiança. — Esboçou um largo sorriso. — Todos os aprendizes podem conseguir trabalho, porém a partir do sexto nível... Lançam um edital anualmente e sempre tem muitas funções... Há vagas em muitas esferas.

— Muito interessante!

— E como te disse, moro na Congregação, o que foi mais fácil, pois as vagas nos são ofertadas primeiramente, em seguida aos demais membros. E o melhor, pagam bem e a mensalidade foi dispensada.

Os dois riram.

— Então um dia posso conseguir...

— Claro que pode! Há muitas vagas, basta ficar atenta. A Congregação possui muitos programas de acolhimento. Até os que não têm dinheiro para pagar se beneficiam, como bruxos solitários que moram em outras cidades — explicou detalhadamente. — O intuito da Congregação é levar a Magia a todos que realmente desejam, por exemplo, os Adquiridos, que não nascem com nenhum dom, mas amam a Magia e exercem uma função vital aqui. O poder da mente é um dos mais fascinantes.

Marine ficou abismada com todas as informações. Era uma sociedade secreta devidamente hierarquizada e organizada e que ainda ajudava os membros necessitados de amparo e prática em Magia.

— Você não sente falta de casa?

— Às vezes, mas me habituei com a distância, principalmente após a morte do meu pai. A gente vai vivendo, não é...

— É como me sinto depois da morte do meu — revelou ternamente. — Meu pai pertenceu à Congregação.

— Qual era o nome completo dele?

Assim que Marine falou, Josh digitou e o histórico e a foto surgiram na tela.

O coração da garota acelerou ao ver o rosto de Dylan na tela. Aproximou-se devagar e tocou no monitor como se nele tocasse.

— Ele pertencia ao Conselho com um excelente currículo. Era muito inteligente, Marine — analisou Josh, abismado com os demais cursos no histórico. — Era membro do Conselho Supremo até...

— Morrer? — A voz dela travou. — Há seis anos, quase sete — informou ela, mirando a foto.

Josh franziu a testa.

— Curioso... — Comprimiu os lábios.

— O quê? — indagou ela.

— Ele morreu de quê? — Voltou-se para ela.

Aquele assunto fazia o corpo de Marine travar.

— Bem, a nossa casa foi invadida por assaltantes e ele morreu ao me defender — a língua pesava... Lágrimas cristalizavam em seus olhos.

— Estranho... Causa de morte desconhecida. — Josh ergueu as sobrancelhas. — Existe um outro Talbott no sistema, Owen. Mas a causa é indicada, em partes. "Desaparecimento." — Apontou na tela.

Marine vincou a testa e olhou para o rapaz, sem entender.

— Seu pai era um membro ativo e todos são catalogados desde a entrada até o desligamento, e quando morrem, a causa é inserida no sistema — buscava mais informações. — É a primeira vez que não encontro a causa, apenas à data.

Com os olhos cerrados, Marine fixou na tela enquanto Josh revirava os arquivos atrás de mais informações e nada constava.

— Todas as mortes, mesmo as de causas naturais, são catalogadas? — continuou ela.

— Sim... Depois que ingressamos na Congregação tudo é listado. O que se faz no mundo real é também inserido — explicou ávido em encontrar a resposta para o mistério. — Nada... Pesquisei por data e não encontrei nada relacionado ao seu pai... Apenas outra morte no mesmo dia. — Indicou na tela.

O nome Bernard Milligan fez os olhos de Marine saltarem.

— Bernard Milligan? — Um frio intenso subiu pela espinha e a imagem de Hellen evocando o espírito dele imperou em seu cérebro. — No mesmo dia? De que?

Josh estranhou o tom e abriu o arquivo. No exato momento que a foto do homem brotou, Marine afastou-se assustada e lembranças indesejadas a apoderaram.

O sangue nascia do pescoço de Dylan e fluía pela sala da casa dos Talbott, enquanto Marine, aos treze anos, mantinha-se petrificada também caída, em choque. Bernard segurava o athame gotejante e avançou para a adolescente proferindo inseguro:

— Você está viva....

O presente regressara ao seu redor e Josh a segurava pelo braço, preocupado.

— O que houve, Marine? — disparou aflito com o semblante dela.

— Ele matou o meu pai! — Apontou com os dedos trepidantes.

Josh encarou Marine, impressionado. Delineou um sorriso nervoso e perguntou de imediato, sem entender.

— Quem? — Esquadrinhou atribulado.

O estômago de Marine pareceu despencar, sentia o peito em brasas, o chão sumindo debaixo dos seus pés. As memórias voltavam e se dissipavam, como em um sonho. Aquilo de fato aconteceu, possuía absoluta certeza.

— Onde Dhorion está? — Apertou com força o braço de Josh. Havia raiva em seus olhos.

Ele a observou, unindo as sobrancelhas.

— Não sei... Acho que ele foi para a sala dele — balbuciou.

Marine rodeou o balcão e disparou pelo átrio, como se estivesse fugindo de algo letal. O ardor do desespero que a consumia era latente. Excluindo o tato, os demais sentidos desapareceram. Sua visão era interna, narcotizada naquela cena, ao passo que seus membros se moviam automáticos, destinados a encontrar as respostas, as quais prevaleciam como uma doença terminal, em busca de uma cura iminente.

Ele não vai fugir das respostas, ajuizava ela.

Seus passos eram ouvidos à distância, lágrimas desciam pelos seus olhos vermelhos. Um ardor intenso eclodiu em seu corpo. Subiu a escada de mármore e avançou pelo corredor ignorando todos que recriminaram sua presença. Localizou a sala ao fim e foi apanhada por um vigilante que foi repelido metros distante.

Uma energia impedia que todos se aproximassem enquanto ela batia violentamente na grande porta o chamando.

Segundos depois, a porta se abriu e fechou atrás dela.

Marine ignorou a presença de Hellen Donnell, que informava a Dhorion a respeito do ensinamento com Taylor. Cumprimentou Marine e assustou-se com o semblante desfigurado da garota, que parecia estar possuída.

— Por que Bernard Milligan matou o meu pai? — inquiriu Marine diante de Dhorion, que cerrou os olhos com certa aflição. — Não adianta você dizer que estou confundindo sonhos com realidade, porque eu lembrei, Dhorion! — afirmou com precisão e praticamente histérica. — Aquele homem parado diante de mim, dentro da sala da minha casa. Ele assassinou meu pai, e você não vai fugir das minhas respostas ou adiá-las para o final da merda desse aprendizado. Por quê? Eu preciso saber agora por que ele fez isso.

Hellen olhou para Dhorion assustada.

— Primeiramente, fique calma, Marine — pediu o Guardião, cautelosamente. — Hellen, nos deixe a sós.

— NÃO! — gritou a garota. — Ela não sai daqui até me explicar por que evocou o espírito do assassino de meu pai.

— Por favor, baixe o tom — solicitou ele com cautela.

Marine fechou os olhos vermelhos em um misto de sensações e proferiu:

— Dhorion, se você não me responder agora o porquê Milligan matou o meu pai, vou partir em busca de respostas plausíveis com Notwen, Encapuzado, ou quem quer que seja, pois estou cansada de ser feita de idiota — ameaçou severamente.

Dhorion a contemplou encurralado. Fugiria da verdade?

Hellen perguntou ao Guardião se era realmente para ficar e ele confirmou com um gesto de cabeça.

— Como sabe, você foi bloqueada para avaliarmos com cautela seus dons peculiares — sibilou temeroso. — Em mãos erradas, você poderia ser uma arma perigosa e até se autodestruir. Pactuamos isso depois que você nasceu, quando seu pai começou a relatar suas manifestações dualistas. Para fazer o bloqueio, ele recorreu a mim e, junto de Claire, Martha e Mel, prometemos lhe proteger até mesmo depois que ele morresse; sim, ele intuía que algo poderia acontecer, como você leu na carta póstuma. Ele sabia que manter este segredo poderia lhe custar a vida, bem como sentia que, de uma forma ou de outra, você nos encontraria até na ausência dele.

Marine o observava oscilante.

— Ocultar você do Conselho Geral das Congregações era o nosso dever e, ao mesmo tempo, se descoberto, pesava como um fardo espinhoso sob os nossos ombros — Dhorion tentava usar suas melhores palavras dentro do turbilhão de pensamentos que o colapsava. — E semanas antes de Dylan morrer, Bernard descobriu meu relacionamento com Martha.

Hellen baixou os olhos, visivelmente constrangida.

— Ele seguiu a esposa em um encontro secreto com Dylan para tratar de assuntos referentes a você e desvendou sua existência. — Seus dedos agitaram-se. — E obviamente para me destruir, quis revelar ao conselho sua dualidade e nossa proteção.

Marine baixou os olhos, balançando, energicamente, a cabeça de forma negativa.

— Por isso ele foi a sua casa e ambicionou sequestrá-la para expor ao Conselho, e infelizmente matou seu pai — concluiu com extremo pesar.

Marine olhou para o teto irrequieta, inalando um ar gélido, como sua alma. Queria gritar.

— Então meu pai foi morto não apenas para me proteger, mas por vingança — bradou efusivamente. — A culpa não é só minha como pensei e carreguei por todos esses malditos anos. É sua! — acusou severamente.

— Marine, veja bem — tentou argumentar, porém foi verbalmente interrompido.

— Cala a boca! — A garota aproximou-se da mesa e olhou-o fixamente. — Se você fosse realmente fiel aos seus amigos, porque foi isso o que li no diário de Claire, você e Milligan eram amigos — apontou rudemente —, meu pai estaria vivo.

Dhorion a estudava em silêncio.

— Se a sua fraqueza não tivesse te dominado por todo esse tempo, pois o caso de vocês vem de antes de eu nascer — continuou no mesmo tom —, tudo seria diferente.

Dhorion, extremamente ofendido, cruzou a mesa e ficou diante da garota. Questionou:

— Será que realmente seria diferente, Marine? Isso nunca saberemos, uma vez que as escolhas já foram feitas e as consequências vivenciadas. Se eu não tivesse sido fraco, como você diz, isso anularia a morte de seu pai? Que datou a carta muito antes de Bernard descobrir tudo — equilibrou o tom. — Há fatos que são traçados pelo universo e não importa o quanto arrisquemos fugir, fatalmente o inevitável acontecerá.

Marine baixou a cabeça, hesitante.

Hellen ponderou:

— A carta póstuma que você leu, Marine, prova bem isso. — Mantinha-se receosa quanto a reação da garota. — Ele escolheu te proteger até o fim. Pelo o que interpretei, Dylan sabia que de qualquer forma não estaria aqui. Seria por um assassinato, ou simples atravessar de rua.

Lágrimas silenciosas desciam como cascatas pelo rosto desolado de Marine, que não conseguia assimilar tudo de uma só vez.

— É por isso que o guardião pediu para eu me comunicar com Milligan e também com seu pai; afinal, eles morreram no mesmo dia. Talvez as respostas de todas as nossas dúvidas estejam em outro plano.

Marine a olhou, vincando a testa.

— Sim, eu tento me comunicar com Dylan há anos, mas é como se a alma dele estivesse entrelaçada na de Milligan. Presos pelo carma que os tiraram dessa vida — revelou Hellen com tristeza aparente no rosto.

A garota voltou a olhar para Dhorion, que fez um movimento com o braço e uma caixa de vidro surgiu atrás dos grossos livros na estante e foi trazida até suas mãos.

— Essa arma vinda do mundo dos mortos foi disparada contra Milligan horas depois que ele matou Dylan. Aqui, na minha sala. — Gesticulou. — Sou acusado injustamente até hoje por isso.

O homem moveu os dedos e o vidro transformou-se em poeira; a garota repousou o olhar na arma escarlate, reconhecendo-a de imediato.

— A mesma arma que foi usada contra você em Glendalough. — Ele abriu o cilindro do revólver com cuidado e mostrou duas câmaras concêntricas vazias.

A conexão de olhares entre o Guardião e a garota se reestabeleceu.

— Milligan foi encontrado com um tiro nas costas e a arma na mão. Desde então foi mantida em uma sala secreta em Dublin, até ser usada contra você — continuou Dhorion despejando informações.

— Balas que carregam o peso da morte — concluiu Hellen.

Marine ajuizava tudo como se não existisse gravidade. Parecia estar perdida entre a realidade e um pesadelo.

— Então como não morri? — A pergunta demorou a ser feita.

Dhorion aproximou-se dela com cuidado e sibilou:

— Somente você tem essa resposta. Mas acreditamos que a sua dualidade a salvou — respondeu sombriamente.

Marine sentiu um peso insuportável sobre seus ombros. Não se resumia apenas em culpa, mas no caos que sua vida representava a todos os envolvidos e, principalmente, aos que a cercavam. O desconhecido se tornara ainda mais letal e devastador. Não suportaria.

Engoliu uma saliva corrosiva e tocou no peito, suas mãos tremiam muito até um rompante assustador a dominar e fazê-la tomar a arma de Dhorion. Seus olhos ávidos de um para o outro, afastando-se e apontando-a para sua cabeça.

Hellen desesperou-se, e Dhorion petrificou-se.

— Então, se eu apertar o gatilho, essa anormalidade elemental vai me salvar? — Olhou para os dois completamente entregue ao ódio que consumia suas veias. — O que isso significa? O que há comigo? Por que não posso morrer? — Tocou no gatilho.

A porta abriu-se, e Sayne adentrou aturdida e bradando:

— E você ridicularizaria o sacrifício de seu pai? — inquiriu assombrada. — É isso o que você quer, sua garota estúpida? Desonrá-lo por um impulso grotesco e infantil e, sobretudo, expor um Conselho que te acolheu exclusivamente por causa dele, não por você — acrescentou com raiva enquanto a garota virava-se para encará-la. — A nossa mobilização é em prol da memória de Dylan, que foi um homem honrado e fiel até o último instante de sua vida. E para quê? — perguntou com raiva.

Marine a encarava regressando vagarosamente à sanidade.

— Para você em qualquer situação atípica manifestar seu desequilíbrio emocional e, principalmente, sua falta de inteligência?

A garota abaixou o revólver e Dhorion o tomou, surpreso com a atitude de Sayne.

— Honre o que fizeram por você e agradeça de joelhos o pai irrevogavelmente perfeito que teve — continuou a Guia, abaixando o tom e olhando-a com bastante raiva. — Porque se dependesse da minha vontade, você ainda continuaria presa no seu mundinho de páginas, enclausurada em seu quarto, no inferno, ou em qualquer lugar bem distante de mim.

Hellen chocou-se com tudo o que ouviu e se encolheu, com os olhos lunáticos girando nas órbitas.

— Nosso aprendizado acaba aqui — ressaltou bem próxima de Marine, segurando-a pelo queixo. — Procure alguém para me substituir, Dhorion, pois não sei lidar com fracos.

Ao dizer a última palavra, Sayne saiu a passos largos e bateu a porta da sala com bastante força.

Hellen pediu autorização para sair e prometeu não comentar nada. Praticamente correu.

Logo após a mulher sair, Marine ainda continuou petrificada no mesmo lugar, presa ao chão como uma árvore sem vida.

Dhorion deixou a arma sobre a mesa com os olhos perdidos. A poeira apareceu e a caixa de vidro foi lacrada e posta magicamente no lugar. Em seguida, sentou-se no trono, respirou profundamente estudando a garota de costas e pronunciou com dificuldade:

— Saia, por favor.

Marine atendeu de imediato, voltando a sentir as pernas e dirigiu-se à porta, que se fechou após cruzá-la. Mirou no corredor escuro.

"Será possível sofrer mais do que estou sofrendo agora?", ajuizava após correr e apoiar-se no corrimão da escada de mármore. Um dos vigilantes a aguardava no primeiro degrau e vociferou que a levaria para casa. 


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