🌺 Capítulo 15 - Ovelha negra 🌺
__ Quer dizer que estudou em Yale?! O que cursou lá?__ Anette apoia o queixo em uma das mãos e observa Kalled deslumbrada.
Ele passou um dos braços por trás de sua cadeira e a mantém presa em seu olhar sedutor que parece fazer muito efeito com Anette.
__ Fiz Relações Públicas. Mas a escolha do curso está mais relacionada à minha família e as responsabilidades que querem que eu assuma, do que com o que realmente gostaria de ter feito.
__ Sério? E o quê queria ter feito?__ Anette solta um sorrisinho. Depois bebe um gole do drinque e mantém o canudo na boca de forma insinuante.
Reviro os olhos começando a ficar entediada.
__ Ah, na verdade, gostaria de não ter feito nada e muitas coisas! __ Kalled joga os braços para trás da cadeira.
__ Quê?! Como assim?__ Anette sorri flertando abertamente com ele.
__ Não tinha ainda certeza do que queria. Fui para a universidade mais por pressão de meu pai e depois de Khan, que quando assumiu o sultanato, se achou no direito de opinar em minha vida.
__ E o que pretendia?__ Anette insiste.
__ Princesa, veja se não concorda comigo...Há muita coisa incrível para ser vista neste mundo para vivermos presos em escritórios ou nesse palácio.
__ É claro! __ Anette concorda com tudo que Kalled diz.
__ Então! Tem coisa melhor do que ser livre? Ir e vir para onde quiser. Conhecer gente nova, só fazer o que gosta, sem burocracias, nem estresse. É isso que quero para mim. __ Cruza os braços por trás da cabeça.
__ Acontece que nem todos tem uma vida de privilégios para fazer só o que gosta. __ Minha opinião sai espontânea.
Lembro da rotina corrida de minha irmã há algum tempo. Abigail chegou a se desdobrar em três funções: a administração da lavanderia da família, cuidar de nossos avós e cursar a faculdade de Design a noite. Ainda encontrava tempo para se preocupar com meus problemas. Minha irmã é uma heroína. Merece toda felicidade do mundo junto com Kayke e Susu.
Anette solta um muxoxo ao me ouvir criticar as ideias de Kalled.
__ Então, quer dizer que é a "ovelha negra" da família?__ Segura o queixo de Kalled e puxa em sua direção, já que ele me observava confuso.
Como sempre viveu cercado por luxo, Kalled não entende minha observação
Desisto da conversa e volto a circular a borda de um copo deixando que meus pensamentos se distanciem novamente.
__ Que nada! Eu até que sempre fui bem flexível! A verdadeira "ovelha negra" da família sempre foi Khan. __ Kalled sorri sarcasticamente. __ Vocês não fazem ideia do que meu irmão já fez antes de se tornar Sultão.
Meus olhos se erguem interessados.
__ Sério?__ Anette o incentiva e eu a agradeço em silêncio.
__ Sério.__ Kalled se aproxima e diminui a voz em tom conspiratório. __ Khan sempre foi mais selvagem. Logo cedo se interessou pela vida no deserto. Ainda adolescente acompanhava as tropas em missões. Até que em uma dessas viagens algo aconteceu...
__ O que aconteceu?__ Minha atenção agora é toda direcionada ao que Kalled diz.
__ Parece que Khan se perdeu do grupo de soldados de confiança de meu pai. Ficou sumido mais ou menos umas quatro semanas. Pensamos que nunca mais o veríamos. Nossa mãe tinha morrido há pouco tempo, então meu pai ficou devastado com aquela segunda perda.
__ Onde ele estava?__ Fico cada vez mais curiosa.
__ Khan foi encontrado por um grupo de nômades perambulando no deserto. Já se encontrava bem desidratado e com queimaduras no corpo. Eles o levaram e cuidaram dele.
__ Ainda bem que foi gente de bem que o encontrou! Poderiam ter feito alguma maldade com o garoto ou até pedido resgate quando descobrissem que era filho do Sultão. __ Anette faz uma observação relevante.
__ Realmente, não fizeram nenhum mal a Khan, mas isso foi um milagre, porque o grupo não tinha boa fama.
__ Não?__ Ergo as sobrancelhas.
__ Eram beduínos. __ Kalled diminui mais a voz como se falasse sobre algo proibido.
__ Beduínos são aquele povo nômade que perambula pelo deserto, não é?__ Anette afirma mais do que pergunta.
__ Sim, mas esse não era um grupo qualquer de nômades. Tratava-se da tribo mais sanguinária que já se ouviu falar nesse país. Eles são uma espécie de "piratas do deserto", entende?
__ Nossa! E como ele fez para fugir desse grupo?__ Anette questiona.
__ Não fugiu. Eles o levaram de volta para o palácio. Na verdade, acho que Khan preferia ter continuado vivendo com eles.
__ Por quê?__ Franzo a testa.
__ Khan nos falou pouco sobre eles. Mas tenho certeza que mantém contato até hoje. O que sei é que se trata de uma espécie de clã com suas próprias leis, ética e costumes.
__ De certa forma, parece que se tornaram amigos importantes para ele.__ Concluo.
__ Mais do que isso. Khan passou a considerá-los família. E isso começou a incomodar meu pai. Apesar da gratidão inicial que meu pai nutria pelo grupo, começou a investigá-los após a insistência de Khan em querer se juntar a eles.
__ Onde já se viu, o filho do Sultão virar um nômade!__ Anette demonstra indignação.
__ Não é?! Então, meu pai proibiu que Khan os encontrasse novamente. Mas ele sempre fugia. Acabou se tornando um defensor fervoroso desse povo. Só não se juntou a eles de vez porque teve que assumir precocemente o lugar de nosso pai.
__ Que história incrível...__ Sussurro perdida em pensamentos.
Por mais que relute, tudo o que se refere a Khan me instiga. Gostaria de ter mais tempo para entender sua história e conhecê-lo de verdade. Porém sei que é arriscado. Já me envolvi mais do que deveria. Deixei que se aproximasse mais do que qualquer um se aproximou. E todo esse convívio pode me trazer consequências dolorosas. Não posso "baixar as guardas". Preciso ser forte. De todos os homens que tentaram se aproximar, Khan é o mais perigoso, porque tudo nele me atrai...
Começo a me sentir arfante com a lembrança de nosso último confronto.
__ Acho que vou caminhar um pouco. __ Levanto do assento do restaurante.
Preciso tirar Khan de meus pensamentos.
__ Não é aconselhável que ande sozinha pelas ruas da cidade. __ Kalled me observa incerto.
__ Não se preocupe. Trouxe meu hijabe. Estarei anônima. __ Passo o tecido pelos cabelos e cubro o rosto.
__ Quer que a acompanhemos, amiga?__ Anette começa a levantar.
__ Não se preocupe. __ Toco em seu ombro. __ Aproveitem mais um pouco.__ Pisco para ela.
__ Valeu, Drica.__ Anette retribui a piscada e senta novamente.
Kalled ainda me observa com expressão preocupada, mas também não insiste.
Saio do restaurante e começo a caminhar vagarosamente pelas calçadas. O comércio está menos movimentado nesse horário, pois nessa região a população é adepta à siesta, período de descanso após o almoço por causa do calor.
Tomo bastante cuidado onde piso por causa de meu tornozelo doente. Alguns poucos vendedores ambulantes ainda insistem em trabalhar. Mercadorias variadas são estendidas a minha frente. Recuso com um aceno de cabeça e sigo meu caminho.
Viro em uma ruela menos movimentada para cortar caminho até o palácio. Ouço um assobio discreto. Olho para trás, mas não vejo ninguém na rua. Apresso o passo, pois começo a me sentir desconfortável. Ao atravessar a rua, noto o movimento de alguém se esgueirando pelas paredes dos prédios e das casas. Suspeito estar sendo seguida.
Olho para trás antes de virar à esquina. Mas antes de alcançar a calçada do palácio dou de encontro com um cidadão que surgiu de repente em minha frente. Seu rosto está encoberto por um chapéu Panamá.
Imediatamente me vem a lembrança de já ter visto alguém usando o mesmo acessório. Foi no dia em que vim ao vilarejo com Aiyra. Enquanto ela discutia com o boticário, surpreendi um homem me observando do outro lado da rua. Ele usava um chapéu como esse.
O cidadão a minha frente leva a mão ao chapéu em um cumprimento. Logo depois puxa a peça para trás e revela o rosto.
__ Como está passando, senhorita Machado?
Meus olhos arregalam...
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