V -Consultório-

     Em uma de minhas poucas saídas diárias do quarto, minha mãe me para e diz que precisa conversar comigo.

— Não aguento mais te ver trancado naquele quarto. 

    A ignoro, entro no banheiro e tranco a porta. Após alguns minutos saio e caminho de volta ao quarto, porém sou interrompido novamente.

— Se você não tomar um banho e se arrumar para ir ao consultório de Lenin por vontade própria, vou precisar obrigá-lo — ela diz com o tom de voz alterado.

    Não respondo, apenas pego a toalha e entro novamente no banheiro. Prefiro não contrariá-la para evitar que me levem a força, imagino vários seguranças me arrastando. Joana faz de tudo para não ser contrariada. Ligo o chuveiro e passo alguns minutos sob a água gélida, porém, nem mesmo o banho consegue esfriar minha cabeça. Depois de alguns minutos estou pronto e prestes a entrar no carro.

— Acorda. Chegamos. — Minha mãe balança o meu ombro esquerdo enquanto chama.

    Saio e caminho em direção ao enorme prédio onde fica o consultório. Na entrada, um balcão exageradamente grande! A recepcionista me passa a frente de alguns outros pacientes e, pela fisionomia deles, são todos loucos.

    A porta do consultório se abre e Lenin me cumprimenta com um aperto de mão.

— Não imaginava te rever aqui — diz ele com um singelo sorriso.
— Acredite, eu também não! — digo com certa aspereza.
— O que está acontecendo?

    Quando começo a pensar no que responder percebo que minha mãe tomou a iniciativa.

— Ele passou por um grave problema recentemente que tem feito ele se isolar, mas, antes disso, as crises voltaram.
— As crises? — ele pergunta surpreso. — Por causa daquele problema do passado?

    Minha mãe confirma com a cabeça e sai da sala cabisbaixa. Então agora somos só nós dois — penso.

    Estar sentado nessa poltrona me faz lembrar de tantas coisas ruins. Esse assento, antes cinza e agora branco, me remete a longos dias nessa sala. Lembro das perguntas incessantes, dos remédios tarja preta e da agonia de perder meu tempo nesse lugar.

— Você já deveria ter se recuperado de tudo aquilo. Quer ter que retornar com os remédios?
— Não — respondo convicto.
— Comece falando sobre o que tem feito você se isolar.

    Depois de uma certa objeção, falo tudo sobre Clarice. Digo que ela destruiu minha imagem com um vídeo e que não tenho coragem de reaparecer. Digo que cancelaram a maioria dos meus shows e, mesmo se não tivessem cancelado, não teria coragem de fazer. Até com a justiça estou tendo problemas. A única coisa que almejo é sumir, concluo.

   Ele diz que preciso me acalmar e aceitar tudo que aconteceu, pois não tem como ser revertido.

— E a crise que você teve? — pergunta.
— Foi antes disso tudo acontecer. Só estava um pouco cansado.
— E o que aconteceu que te descontrolou?
— Estava passando um show dele na Tv. — Paro e olho para o teto incolor. —  Não aconteceu nada demais, só quebrei um controle.
— Depois de meses com o tratamento não imaginei que ele ainda te afetaria.
— O que ele fez nunca deixará de me afetar. — me  irrito.
— Realmente você decidiu abster tudo que conversamos durante aqueles meses. Você não pode direcionar a culpa de um acidente a alguém dessa maneira.
— Por que todos pensam que aquilo foi um acidente? — altero o tom de voz. 

   Seu olhar direcionado à mim é gélido, quase que intimidador.

 — Meu tempo acabou — pronuncio enquanto saio da sala sem nenhuma tentativa de impedimento por parte de Lênin.

    Na recepção não encontro minha mãe. Caminho até meu carro e sou informado pelo meu motorista que ela precisou sair para revolver algo, sendo assim, irei sozinho para casa. Me preparo para entrar no carro e é quando percebo uma movimentação estranha na rua. Dois grupos, de mais ou menos umas dez pessoas cada, se aproximam. Alguns seguranças do local também se aproximam de mim e fazem uma escolta. Entro no veículo e o meu motorista acelera para longe daqui e, enquanto nos afastamos, tento esquecer as rudes palavras pronunciadas por aquelas pessoas. 

    Como os seres humanos conseguem ser tão frios? Por que a natureza humana é tão predisposta a julgar e a humilhar? 
" Cachaceiro " , " alcoólatra " , " maconheiro", " Viciado " , " Não tem vergonha de se expor daquela maneira? " , " E seus familiares? Aposto que eles também estão enojados"... Essas foram algumas das palavras direcionadas a mim. 

    Me afundo no banco do carro almejando desesperadamente chegar em casa.

    Tento fazer esforço para escalar as paredes e sair desse imenso buraco invisível ao qual me afundo cada vez mais, porém, para sair de um poço, é requerido bem mais esforço do que para cair em um.


.....

Mesmo que tenha passado muito tempo na sala do consultório, Jhon não se acostuma com o lugar.
É compreensível, não é? Deve ser perturbador.

Que passado complicado que esse cantor tem, não é?!

O que acham que aconteceu? Digam aí...

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