Capítulo 64


Oliver

Assim que chego, percebo que a festa está acontecendo no quintal, avistando alguns dos meus amigos jogados em um banco de madeira com almofadas brancas.

O quintal está decorado com pisca-piscas e lanternas espalhadas pelo espaço.

Procuro Emily pelo quintal, ansioso e ao mesmo tempo nervoso, mas não a vejo em lugar algum, aceno para algumas pessoas do colégio e para meus amigos. Enquanto ando, sinto meu corpo colidir com o de alguém, me fazendo parar.

— Olha por onde anda — uma voz feminina e aguda reclama.

Olho para a menina à minha frente, uma carranca se formando em seu rosto. Ela ajeita o cabelo crespo, como se ele tivesse sido bagunçado por culpa do nosso esbarrão.

— Qual é o seu nome? — pergunto, tentando saber de onde a conheço. O rosto dela me é familiar.

A garota me encara de cima a baixo, parecendo ser mais alta que eu, com meus quase um e noventa de altura. Ela deve ter no máximo doze anos.

— Por que quer saber? — ela devolve, os olhos se estreitando na minha direção.

— Estou tentando ser simpático — respondo. — Meu nome é Oliver.

— O Hugo contou de você, eu sou a Ágata.

Meus olhos se arregalam, em reconhecimento. Esse é o nome da irmã da Emily. Nunca a encontrei pessoalmente, mas Emily falava dela o tempo inteiro. Pelo que eu entendi, as duas não se viam com frequência porque Emily não se dava bem com a mãe, mas se amavam muito.

— Você e a Emily são irmãs, não é? — questiono para confirmar e ela revira os olhos.

— É assim que você quer namorar a minha irmã? Não sabendo quem sou eu? Já começou mal, cara — Ágata retruca, me fazendo rir um pouco.

— Ela tem razão — Scott responde, surgindo da cozinha.

— Eu sempre tenho — a mais nova sorri, orgulhosa.

— Onde está sua irmã, Ágata? — pergunto o que eu quero saber.

Ágata e Scott se olham, indecisos, acho que ponderando se devem falar ou não.

— Eu acho que no banheiro — Ágata diz.

— Ela disse que não estava se sentindo muito bem e resolveu se arrumar para deitar — Scott completa.

Assinto, agradecendo aos dois e saindo a procura dela.

Chego ao banheiro do primeiro andar, vendo Emily sentada na tampa do vaso, com a escova presa aos dentes.

Fito cada pedaço dela, absorvendo todos os detalhes dos quais eu senti tanta falta, antes que ela perceba a minha presença. Ela está olhando para o teto como se ele fosse a coisa mais interessante do mundo.

Emily está com os cabelos cacheados soltos, com duas presilhas amarelas de um lado do cabelo, o vestido branco está amassado e subiu um pouco, deixando a mostra mais da pele negra e das coxas grossas.

— Emily... — a chamo, um pouco incerto.

Ela parece despertar do transe, reparando em mim.

— Isso é uma miragem? — ela pergunta, balançando os pés descalços.

Sorrio, ao ver a confusão no rosto dela.

— Até onde eu sei, sou de verdade — retruco e ela me encara desconfiada, igual sua irmã fez a cinco minutos atrás.

— Para de sorrir. Ainda estou puta com você — Emily devolve, voltando a escovar os dentes.

Ela levanta, um pouco cambaleante, indo para a pia de mármore.

— Vim pedir desculpas.

— Não quero suas desculpas.

— Sério?

— Não — ela choraminga, me olhando pelo reflexo do espelho.

Sorrio de novo, sem conseguir me conter.

— Definitivamente não era assim que eu imaginava que isso fosse acontecer — digo.

— Eu não sabia que você vinha, em minha defesa.

— O Hugo disse que você me convidou — rebato, confuso com o embaraço no rosto dela.

— Aquele filho da puta... — ela xinga, pensando o mesmo que eu.

Hugo trapaceou, mentindo e me fazendo acreditar que Emily me chamou, porque sabia que se não fosse assim eu não toparia vir.

— Ele foi mais esperto que nós dois juntos — Emily diz e concordo com ela.

Ficamos em silêncio, um olhando para o outro. Compreendo, pela forma que ela me olha, que nem tudo está perdido.

— Tô com sono — ela fala, após algum tempo.

Emily passa por mim, me olhando por cima do ombro, pedindo silenciosamente para que eu a siga e eu obedeço.

Ela me olha, percebendo para onde me trouxe, se tornando mais cautelosa.

— Você deveria ter vindo mais cedo, assim eu estaria sóbria o suficiente para brigar com você do jeito que você merece.

Emily resmunga, me dando as costas, indo abrir as janelas. A tensão irradia de seus ombros, preenchendo o quarto e se misturando ao meu nervosismo.

— Nisso eu posso te dar razão. Eu errei, mas não do jeito que você está pensando. E eu posso explicar, se...

— Acho difícil — ela me interrompe, voltando a me encarar.

Se você prometer me ouvir e não me enxotar para fora. Precisa me deixar falar tudo o que eu preciso e depois, se você ainda quiser que eu vá embora, eu vou.

Emily cruza os braços, me dando um olhar sem confiança.

— Pode começar a falar.

— Agora? — pergunto, surpreso.

— Perdeu a coragem? — ela desafia, erguendo uma sobrancelha.

Imito sua pose, cruzando os braços como ela.

— Nunca — rebato e ela sorri, satisfeita.

Tento saber se ela está bêbada, mas pela forma que está falando e me respondendo tão rápido, o álcool já está baixo em seu sangue.

— Acho melhor começar pela nossa briga na despedida de solteiro. Viagra? Tipo, sério!? Por que não me disse nada antes? Era só dizer que não queria nada, porra! Mas não, me deixou seguir em frente e depois se trancou no banheiro por horas como um covarde!

A voz dela soa acusatória, a mágoa mal escondida brilha em seus olhos, fazendo com que eu me sinta ainda mais filho da puta por magoá-la.

— O Viagra não era meu, Emily, era da outra pessoa que estava no quarto antes de mim, tanto que na gaveta tinha cigarros e um cortador de unha, além do remédio. Eu não fumo. Odeio o cheiro, você sabe. Pode perguntar ao Enzo.

— Sei, mas isso é loucura. Essa história toda parece mentira e é óbvio que o Enzo te encobriria se precisasse.

— Eu nunca precisei disso com você. Nunca. Você tem que acreditar em mim.

Me aproximo com cautela, dando tempo para ela se afastar se quiser, mas Emily não o faz.

— Não sei se consigo — ela admite. — Tudo fez tanto sentido, todas as outras vezes em que você me afastou quando eu estava perto de tocar em você.

— Faz sentido sim, mas não pelo mesmo motivo que você pensa — asseguro, apertando a mão dela.

— E por qual outro seria? Você mostrou que não se interessa completamente por mim.

— Emily, isso é ridículo, ok? — sou sincero. — Não quero contar vantagem, mas eu me interessei por você primeiro, te quis mesmo quando você nem ligava pra mim e achava que eu era só mais um idiota.

— Isso não é verdade — ela se defende e eu lhe lanço um olhar incrédulo, fazendo com que seus ombros caiam. — Ok, dessa vez você está certo.

— Até que enfim — sou irônico e Emily revira os olhos. — Eu sei que vai parecer clichê, mas eu não funciono como as outras pessoas.

— Explique — ela ordena, antes de sentar na ponta da cama, me levando junto.

Que Deus me ajude.

🔆

Emily

Pisco para espantar a confusão da mente, focando em prestar atenção em Oliver.

Ele me olha e eu vejo o quão difícil é para ele falar sobre isso abertamente, o que amolece um pouco o meu coração.

Faço carinho nas costas de sua mão, tentando demonstrar apoio. Quando pensei na minha conversa com Oliver, eu imaginava que estaríamos gritando mais do que conversando, eu estaria chorando e ele implorando o meu perdão, bem dramático. Mas ao vê-lo parado no batente do banheiro, eu entendi que não seria assim, isso não é nenhum pouco o nosso estilo.

Ainda não acredito que é ele mesmo aqui, sentado à minha frente. Meu corpo dói de saudade e eu preciso me lembrar a todo momento que estamos aqui para nos resolvermos, antes de qualquer coisa. Tanto tempo se passou que eu quase me esqueci do motivo de ter estado tão brava.

— Quando eu digo que não funciono como as outras pessoas — Oliver começa, me trazendo de volta para o presente. — Quero dizer que não me atraio sexualmente por alguém a não ser que eu tenha sentimentos por ela. Eu sou demisexual, Emily.

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