Capítulo 18
Oliver
— E aí você pode fazer uma entrada triunfal com vários efeitos e tudo mais, sabe? – Lara sugere, toda animada e eu assinto, fingindo interesse
Se eu soubesse que a garota não me deixaria em paz, não teria prometido gravar esse bendito vídeo.
— Acho ótimo, Lara, mas não precisa de tudo isso, uma entrada normal já está bom. Não sou nenhuma celebridade. – digo e meus olhos acompanham os movimentos de Emily por cima dos ombros de Lara
A garota olha para o celular como se ele fosse algum tipo de alienígena e joga a cabeça para trás, apoiando-a no banco de cima. Por um instante acho que ela vai começar a chorar ali, como aconteceu na sua casa, mas ela simplesmente deitou no ombro de uma de suas amigas, a Nina, e permaneceu assim, puxando a barra da bermuda de Educação Física ora para baixo, ora para cima, com o olhar ainda grudado no teto, parecendo estar em qualquer lugar, menos ali.
— Vou ao banheiro, já volto. – Lara avisa, me tirando do transe
Pelo menos ela não percebeu que eu não estava prestando atenção.
Me aproveito do momento e saio do meu lugar indo me sentar ao lado de Emily, que me olha de cara feia mas não diz nada.
— O que você quer agora, Oliver? – pergunta, mas não me olha, o que é bom, porque dessa vez quem faz careta sou eu
— Não seja grossa. – Nina a repreende, ganhando um olhar ácido
Mas ao contrário do que eu espero que faça, Emily balança a cabeça concordando — a contragosto, claro — e se vira para mim.
— Desculpe, Oliver. — lança um olhar enviesado à amiga, me fazendo sorrir, afinal a garota não se dobra nem com os irmãos
Pelo jeito eram muito amigas mesmo, talvez de anos, não sei dizer.
— Sem problemas. — encaro Nina — Acho que seremos bons amigos. – digo e a menina dá uma risadinha, concordando
— Já volto. – Emily anuncia, pegando sua mochila e se levantando
— Ela não vai voltar, não é? – me dirijo a Nina, que abre um sorriso triste
Arqueio uma sobrancelha, para mostrar que estou esperando por uma resposta.
— Ela sempre faz isso, se acostume. — diz, mas não parece que terminou, então espero que se ajeite e vire para mim, com pernas de índio. — Sabe o que ela vai fazer agora? — nego com a cabeça — Emily vai ao banheiro e vai trocar a bermuda, que deveria ser um short, mas a mãe comprou grande demais para que durasse até o último ano e ela odeia isso. Depois ela vai se esconder na biblioteca porque descobrimos seu esconderijo no banheiro.
— Ou seja, ela foge? – minha pergunta soa mais como uma afirmação, mas Nina assente mesmo assim
— Emily não é muito fã de demonstrar qualquer coisa.
— Onde fica a biblioteca, afinal? Nem sabia que tinha.
— No final do corredor do nosso andar. Tem até uma plaquinha no corredor. – conta e eu balanço a cabeça em concordância
— Ela vai ficar muito puta se eu for? – pergunto mesmo não me importando muito se ela iria gostar ou não
Antes que Nina possa me responder, Lara aparece, afobada, sentando-se no local vazio entre nós.
— Quem vai ficar muito puta? – a loira pergunta
Abro a boca para responder, mas o olhar feroz que Nina me lança faz com que eu dê de ombros e saia dali antes que o que quer que fosse sobrasse para mim.
Faço o caminho até o segundo andar, como Nina explicou e encontro uma plaquinha com uma setinha, que aponta para p final do corredor, escrita Biblioteca.
Estaria mentindo se dissesse que já tinha conhecimento de que aqui tinha uma biblioteca. Abro a porta com cuidado, para não fazer barulho ou chamar atenção. Ao que parece, deu certo.
A biblioteca está mais para sala de leitura ou algo assim, as paredes laterais têm estantes que vão do chão até o teto, cada uma de uma cor diferente. De frente para a porta fica uma mesa retangular e diferente das outras, julgo ser o lugar que a bibliotecária — ou sei lá como a chamam, fica. A sala é ocupada por mesas redondas com um grupo de quatro cadeiras cada uma. Emily está sentada em uma mesa no canto da parede, em frente a estante lilás, percebo que está ouvindo música, já que não percebeu minha chegada.
A mesa que ocupa está lotada. Se Nina não tivesse me dito que Emily vem para cá para ficar sozinha, eu poderia jurar que tem alguém com ela. A imensa mochila preta com coraçõeszinhos amarelos, verdes, vermelhos e azuis está escancarada. Na mesa, o estojo está aberto e caído de lado, Emily está de costas para mim, balançando a cabeça no ritmo da música que provavelmente sai de seus fones, ela escreve algo em um caderno, mas de onde estou não consigo ver nada além da borracha presa em seu lápis.
A observo mais um pouco, o laço de hoje é de um amarelo quase dourado, a única coisa com cor que eu consigo ver. Emily veste uma calça de modelo largo, mas que ainda sim marcam sua cintura — não que eu consiga ver alguma coisa nesse momento —, daquelas que parecem velhas mas não são, estilo vintage? Não sei. A blusa do colégio é larga também, me pergunto se ela usa as blusas do irmão, porque realmente são enormes.
Dou passos propositalmente barulhentos, para anunciar que estou ali, o que funciona, porque Emily tem um sobressalto e olha para trás assustada.
— Ah, puta que pariu! Como me achou aqui? – indaga, parecendo realmente lamentar minha presença, algo com o qual eu já comecei a me acostumar
Dou de ombros.
— Ora, um jovem como eu não pode ir até a biblioteca procurar um livro que enriqueça seu intelecto já rico?
— E vai ler o que? Princesa e o Sapo? – debocha, voltando a se concentrar no caderno
Observo melhor as estantes, e realmente, só tem livro infantil.
— O que você está fazendo, em? – pergunto, me aproximando e olhando por cima do ombro dela
Franzo o cenho. Contas?
— É dever? – sento ao seu lado, que suspira percebendo que eu não vou embora
— Não, não é dever. É só uma forma de distração. — arqueio uma sobrancelha para ela, que entende minha pergunta silenciosa e revira os olhos — Eu gosto de matemática, fazer o quê?
— É meio... – penso em uma que combine
— Nerd? Estranho? Acredite, eu sei, escuto isso sempre.
Meu olhar recai no colo de Emily e eu deixo que minha risada saia. Em seu colo tem uma caixa de panetone aberta.
— Panetone, Emily, sério isso? – pergunto ainda rindo – Panetone é coisa que a gente só deve comer no Natal!
— Deixe de ser chato! – bufa – Você e essa mania de se meter no que eu como. E não é panetone, é chocotone! – defende-se
— Mesma merda. – digo, mais para irritá-la que outra coisa
Emily fecha o caderno e começa a guardar o material na mochila, vejo que dentro dela tem oito cadernos, dois livros grossos da escola e mais um pequeno, que eu imagino que seja de leitura. Estremeço só com a visão, se meus três cadernos mais os dois livros já pesam, imagina oito? Deus me livre.
Ela puxa o celular, fingindo estar concentrada em algo, mas eu sei que só está tentando me ignorar para que eu desista de ficar aqui.
Para a infelicidade de Emily, eu não vou a lugar nenhum.
Ainda não sei o que me atrai nela. Seria porque me trata mal? Não, acho que não, não sou tão masoquista assim. Seria por que ela é uma incógnita? Seria por, às vezes, se vestir como as senhorinhas da minha igreja? Eca. Com certeza não. Seria por eu ter me tornado amigo do irmão dela e agora quero sua amizade também? Seria a curiosidade em descobrir qual é a verdade por trás de todas as histórias que a cercam? Seria por eu querer descobrir logo o que Garret fez, já que ninguém me conta?
A resposta me atinge com força quando Emily me olha constrangida por saber que a estou encarando.
São os olhos.
Dizem que os olhos são a janela para a alma e eu particularmente nunca acreditei muito nisso. Quer dizer, não teria como. As pessoas quase nunca se olham nos olhos, eu mesmo ainda não sei como funciona isso. Nos livros de romance que Anitta me obrigava a ler junto com ela, os casais viviam falando sobre "olhar nos olhos", mas como faz isso? No fundo, sempre achei meio psicopata e estranho, por que, como se olha "no fundo dos olhos" de alguém? Você encara a pessoa e fixa o olhar nos olhos dela esperando por uma mensagem subliminar?
Mas ao prestar mais atenção em Emily, consigo entender o que os livros queriam dizer, não são somente os olhos, é a maneira como eles se movem, se fecham e como parecem me dizer tudo o que a dona não quer deixar que eu veja.
Emily é contraditória, enquanto seu rosto e sua linguagem corporal não me mostram quase nada, seus olhos me dizem tudo. Eu vejo tristeza, desconfiança, insegurança e até um pouquinho de medo.
Medo do quê? De quê? Não faço ideia.
Talvez de Garret? De sua mãe? Do futuro, do agora, do passado?
Faço uma careta para os meus pensamentos, mamãe brigaria comigo se pudesse os ouvir.
"Deixe de ser tão sentimental, isso não é coisa de homem."
— Eu...hm... Vou ao banheiro, já volto. – Emily sai da sala quase correndo e eu rio de sua reação
Pelo menos ela deixou a mochila, significa que vai voltar.
O celular de Emily acende várias vezes, indicando a chegada de uma nova mensagem e a curiosidade me atinge. Olho ou não olho? Não olho ou olho?
Uma olhadinha não vai fazer mal. Repito isso para mim enquanto olho a barra de notificações.
Franzo o cenho confuso ao ler as mensagens, são de pessoas diferentes, mas todas parecem falar sobre a mesma pessoa.
"Bom dia, Emily! Como está Rodrigo?"
"Como ele está? Podemos ir visitá-lo?"
"Bom dia, Emily! Há algo que possamos fazer para ajudar o Rodrigo?"
"Quando Rodrigo vai voltar à ativa?"
"Bom dia, Rodrigo já está curando? Por onde ele anda?"
Quem caralhos é Rodrigo? Será que eu já o conheci e não sei? Pelas mensagens, Emily e ele são próximos, será que é algum namorado? Ou ex? Que seja ex. Visitá-lo? Será que está doente?
Largo o celular na mesa assim que ouço o som da porta batendo, visto minha maior cara de inocente e Emily parece comprá-la.
— Você não comeu meu chocotone não, né? – pergunta desconfiada, conferindo, ela mesma, se eu comi
— Não, não comi. — encaro o relógio em meu pulso — A gente precisa ir agora se quiser almoçar ao invés de só engolir a comida.
— Você também tem aula a tarde hoje? – pergunta e eu assinto
— Até cinco e meia. – informo e ela resmunga um "eu também"
— Vamos? – Emily abre a porta para que eu passe e a tranca depois, colocando a chave em um gancho do lado de fora
A sigo em silêncio, indo em direção a entrada do colégio, onde nossos amigos estão.
ooooi, amores
finjamos que domingo ainda significa "durante a semana" KKKKKKKKKKK
e que Rodrigo seja ex, amém! 🙏
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