Emily

23/03 – quarta-feira

11:45

— Infelizmente, a professora de Educação Física não vai poder dar aula hoje para vocês, por isso, vocês vão ter esse horário vago, podem ficar aqui na quadra mesmo, não tem problema. Só peço para que se comportem – assim que a coordenadora sai, os alunos começam a gritar e comemorar e eu rio.

É uma raridade algum dos nossos professores faltarem, ainda mais a de Educação Física, que dá aula para as duas turmas do terceirão juntas, ou seja, quase 80 cabeças. 

— E o que a gente vai fazer para aproveitar essa benção divina? – Lara pergunta, toda animada.

Olho em volta e vejo que a maioria dos alunos está jogando alguma coisa. Pela quadra ser bem grande, todos nós cabíamos sem maiores problemas e ainda sobra espaço. As pessoas estão separadas em pequenos grupos em cada parte da quadra, um grupo está jogando futebol, o outro basquete, o outro jogando vôlei, o outro queimado.

Instintivamente procuro por rostos familiares em cada grupinho. Encontro Hugo no basquete, tentando — e falhando — acertar uma cesta, Enzo está no futebol e desisto de continuar procurando pelos outros. Enzo corre atrás da bola numa velocidade absurda — pelo menos para mim, que não consigo correr nem por cinco segundos sem me cansar muito.

— Emily, meu Deus! Seja mais discreta! – Alice me balança, conseguindo atrair minha atenção.

— Desculpa — peço. — Ele é muito lindo, amiga, não consigo resistir! – choramingo e ela ri

— Aquieta esse cu, garota, pelo menos um pouco. Você estava secando ele sem nem disfarçar! – ela diz, se divertindo as minhas custas.

— Tem razão, daqui a pouco ele vai achar que eu sou alguma psicopata.

— Não poderia concordar mais – Alice passa seu braço por meus ombros.

— Já sei! A gente pode assistir aquela série que a Mila fica falando! Acho que o nome é Gilmore Girls, eu baixei no tablet esses dias, e por sorte eu o trouxe! – Lara sugere já abrindo a mochila em busca do tablet.

As meninas se animam junto com ela e eu acabo me deixando levar também, afinal não tem nada melhor para fazer.

Tento resistir a vontade de olhar novamente para Enzo, mas como a carne é fraca, eu acabo procurando por ele de novo, mas ao invés de achá-lo, eu vejo Oliver segurando o celular como se estivesse tirando uma foto, mas do nada ele começa a gesticular, falar e sorrir para a tela, como se sua vida dependesse disso. Sinto vontade de rir, mas me seguro. É fofo.

— Gente, o que o Oliver tá fazendo? – aponto para ele, que agora está mandando um beijo para a tela, me fazendo sorrir mesmo sabendo que o beijo não é para mim.

Mesmo que eu não goste de admitir, Oliver pode ser uma pessoa cativante quando quer, fora a paciência que ele tem comigo, que não facilito em nada a aproximação dele.

— Você não sabe? — Davi, que surge não sei de onde, me pergunta e eu nego. — Ele é influencer, tem um monte de seguidor no Instagram – não faço questão de esconder a surpresa.

— Influencer? — confirmo e ele assente sorrindo.

Volto a fitar Oliver que agora estava andando pela quadra, sem deixar de olhar para a tela. Umas duas meninas se aproximam dele e começam a sorrir, pegando nos próprios celulares.

Nunca imaginei que ele pudesse ser algum influenciador digital, porque o garoto é um pouco tímido e não é muito falante — isso na frente de muitas pessoas, claro, porque perto de mim, Oliver não consegue (infelizmente) se manter quieto por muito tempo —, só falava de maneira solta se tivessem menos de sete pessoas a sua volta.

— Eu já ganhei cinquenta seguidores só porque ele me marcou no stories quando foi lá em casa! E ele prometeu fazer um vídeo comigo, para ajudar no meu engajamento! – Lara diz empolgada e eu sorrio para ela, me perguntando quando essa foto tinha sido tirada, que eu não vi.

No meio do ano passado para cá, Lara vem tentando ser influencer e grava vídeos de maquiagem e os posta no YouTube, mas ainda não está fazendo tanto sucesso quanto gostaria. Ela sempre foi a mais ligada a rede social do grupinho, sempre em busca de mais e mais seguidores e com uma mania horrível de se importar demais com a sua aparência e em como as pessoas a enxergam. Claro que todas nós temos essa preocupação, admitindo ou não, mas Lara está um nível acima.

— Ele tá vindo para cá! – a loira ajeita os cabelos abrindo um sorriso imenso, pelo jeito já tinha até esquecido da série.

— Pelo visto nenhuma de vocês consegue ser discretas, puta merda. – Alice resmunga indo se juntar com o restante das meninas e eu decido acompanhá-la.

Não estou com a menor vontade de aparecer em uma das filmagens dos dois. Ou melhor, em nenhuma filmagem.

Mila dá play no episódio e elas começam a assistir. Eu? Bem, eu voltei a olhar para o Oliver, que está mantendo uma conversa animada com Lara e Davi.

Bufo diante da minha curiosidade excessiva que facilmente pode ser chamada de fofoqueirisse.

Antes que eu possa continuar bisbilhotando, meu celular acende pela chegada de uma mensagem, olho descobrindo que é de Scott. Ignoro outras mensagens, pensando que já está na hora de iniciar uma nova sessão de "ele está bem, obrigada", "não, a gente não tá precisando de ajuda, mas obrigada, que Deus lhe abençoe" "ele não dá mais palestras, mas obrigada". Obrigada, obrigada e obrigada, quando tudo que eu gostaria de fazer é mandá-los tomar no cu.

scott 💛:

Oi, Emy, tá tudo bem por aí?

Passei em casa agora e o Brian não tava lá.

Ele te mandou alguma mensagem? Estou preocupado.

Se cuida e vê se não esquece de me responder, beijo.

Deixo meus ombros caírem de frustração, sem conseguir conter um gemido de tristeza. Ao contrário de Scott, que é novo nisso, eu já sei como funciona. Brian tinha saído no sábado e não voltou até agora e nem mandou nenhuma mensagem. Scott tenta a todo custo fingir que não está preocupado, dizendo para si mesmo e para Hugo que ele deve estar na casa de um amigo nesses quase cinco dias, mas esqueceu de avisar. O que talvez realmente tenha acontecido, mas eu duvido muito.

Pondero por alguns segundos o que dizer ao meu irmão, a verdade ou algo que acalmaria o coração dele?

Opto pela verdade.

Você:

oi, mano, tá tudo bem sim

a prof faltou aí a gente tá com aula vaga

o Brian não mandou mensagem não

e não fique preocupado, quando o dinheiro acabar, ele volta.

Scott me responde com um emoji de "joinha". Suspiro um pouco triste, toda vez que meu irmão usa esse emoji, significa que a resposta não o agradou nem um pouco. Sei que não é isso que alguém deseja ouvir em um momento desses. Mas o que eu posso fazer se essa é a verdade? Quando o dinheiro dele e talvez até dos amigos, acabar, Brian voltará para casa como se nada tivesse acontecido.

Tenho medo de, realmente, Brian ficar como o nosso pai. Eu amo tanto Brian quanto Ágatha, que eu conheço desde o berço, sendo que só tomei ciência da existência de meu irmão quando tinha 12 anos e mesmo assim, não sabia que ele era sangue do meu sangue.

Nunca fui de acreditar que existe amor à primeira vista, mas desde que conheci os três patetas que eu chamo de irmãos, abri uma exceção à regra. Continuo não acreditando em amor à primeira vista, mas talvez com irmãos que não sabem que são irmãos seja diferente, né? Nunca se sabe!

eai, galerouss

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por hoje é só, até semana que vem, pessoal