13 - A Mestiça
EU FIQUEI VENDO as pessoas entrando nas salas, mas não me movi.
— Não vai entrar? — Samael me perguntou com as mãos nos bolsos com uma sobrancelha erguida.
Notei que algumas pessoas passavam por nós e olhavam Samael. E as meninas... Ah, prefiro nem falar.
— Você vai ficar visível? — falei baixo, com o rosto ainda corado.
Ele inclinou a cabeça.
— É... Acho que vou te fazer companhia de verdade hoje.
Deu de ombros e caminhou até a sala, parou um pouco antes e me olhou : Você vai vir? Eu ri e entrei na sala. Ele me seguiu e todos na sala ficaram olhando. Como um Pop-Star, deve ser algo do lance divino.
Sentei e Samael ficou do meu lado, confesso que quando o olhava tinha que segurar uma risada, era meio engraçado. O rosto das meninas exibidas nos olhando foi impagável.
Estávamos na aula da professora de português e ela já havia entrado na sala. Ela ficou um bom tempo olhando para Samael com aqueles olhos o julgando. De repente Carly entrou na sala em um movimento rápido. A professora teve um sobressalto e a olhou com certo ressentimento.
— Quase quinze minutos atrasada, Jacques.
Carly mal a olhou.
— Ah, então ainda estou no horário.
A escola tinha uma tolerância de quinze minutos para entrar na aula. Mas a professora parecia não estar de acordo. É, ela realmente odiava Carly.
— Irei descontar isso da sua nota.
Carly revirou os olhos e veio na minha direção enquanto a professora reclamava baixo. Samael riu baixinho e foi quando Carly parou ao vê-lo, um pouco tensa.
— Olá? — Samael falou com ela.
Carly não respondeu e se sentou em outra cadeira ao meu lado. Ela se aproximou e falou por baixo dos outros cochichos da sala.
— Esse é o cara que o Jacob não gostou?
Ele foi correndo falar para ela? Ele tem quantos anos?
— Ele foi atrás de você para reclamar?
— Não, nós nos encontramos e ele estava meio transtornado. Eu perguntei e ele me contou. — Ela deu uma pausa, e olhou rapidamente para Samael. — Se eu tivesse gostado da cara dele, iria infernizar Jacob.
Olhei para ela surpresa. Ninguém gosta do Samael?
Deve ser a coisa da morte.
— Mas, por quê? — perguntei falando mais baixo.
— Sinto uma coisa ruim vindo dele. — Ela fez uma careta. — Você deveria se afastar dele — Carly falou séria.
Eu queria. Mas não dá.
Ela abriu o bloco de desenho por cima do caderno da escola, e começou a traçar linhas soltas sobre a folha. Eu endireitei a coluna e me virei para Samael. Ele estava de modo preguiçoso com o rosto apoiado em sua palma e o cotovelo em cima da mesa. Samael me olhou de canto de olho e se virou para mim. Viu Carly curvada sobre os desenhos, e esboçou um sorriso ao dirigir seu olhar para mim novamente.
— Sim?
— Samael — eu disse meio baixo para não ser chamada atenção. — Ela poderia sentir algo vindo de você? Algo ruim.
Ele faz uma careta e volta a olhá-la.
— Não deveria. A menos que eu quisesse.
Franzo o cenho e volto a observar o desenho dela. O balanço contínuo do lápis sobre o caderno, seus olhos concentrados em cada traço, as mechas do cabelo escuro caindo de leve em seu rosto.
O movimento suave acaba com um arrepio forte que a faz borrar a linha por toda a folha. Eu mesma quase pulei de tão brusco que foi. Logo, ela levanta a cabeça meio exaltada, e acompanho seu olhar. Foi quando eu verdadeiramente dei um mini pulo da minha cadeira.
Eu preciso começar a me acostumar com essas coisas.
Na mesa à nossa frente estava sentado Mammon. Ele está virado para nós, ou seja, de costas para o quadro e professora, de maneira desleixada com uma expressão de tédio. Pude sentir uma tensão vindo de Samael que, consegui perceber, retomou àquela postura mais séria.
Seu demônio inconveniente.
Carly se afastou na própria cadeira, pegando seus cadernos. Notei também um certo tremor em suas mãos. Ele estava visível. O que deu neles hoje?
As pessoas que estavam em volta começaram a olhá-lo sem disfarces. Mammon por sua vez devolveu o olhar, por um instante achei que seus olhos tinham ganhado um brilho. Como pequenos sóis. A luz de uma faísca que poderia queimar toda a escola. Ao mesmo tempo, todos pararam de nos encarar.
— Então — Ele devagar virou-se para mim. —, houve algo de interessante que eu tenha perdido? — Havia aquele ácido sorriso nos lábios.
Achei que Samael fosse falar algo mas não abriu a boca. Quem falou foi a Carly.
— Você o conhece, Amélia? — ela perguntou cautelosa, com a voz meio rouca.
Foi quando Mammon a dirigiu um olhar pela primeira vez desde que havia entrado. Sem sorrisos, ele a analisou minimamente com olhos implacáveis. Sem perceber já tinha prendido a respiração.
Mammon se inclinou na direção de Carly, ainda a encarando, e fez seus olhos brilharem avermelhado. Como um espelho, os olhos da Carly tomaram o mesmo brilho para si.
Meu coração palpitava e minha boca já estava seca. Aquilo durou um instante; um momento longo e pesado sobre minha pele.
— Vejamos o que temos aqui — dizia Mammon já sem o brilho nos olhos e uma pequena risadinha. — Que raridade encontrar uma mestiça hoje em dia, e com essa facilidade.
— Mestiça? — Carly perguntou confusa.
Quando estava prestes a dizer algo, Samael colocou a mão no meu ombro e se aproximou mais de mim; tentando participar seja lá do que estivesse acontecendo.
— Uma corrompida? — ele disse com a voz grave por trás de mim e precisei de calma para não estremecer.
— Você não tinha percebido? — Mammon falou debochado.
— Os senhores — a professora começou a falar de repente em um tom alto e desaprovador. —, gostariam que eu parasse de falar para a conversa de vocês ficar melhor?
Mammon revirou os olhos.
— Na verdade, eu adoraria — ele disse ainda de costas para a mulher. — Podemos continuar nossa conversa fora desse lugar?
Mammon perguntou para nós, mas seu olhar foi para Samael, que concordou com a cabeça. O demônio sorriu e um arrepio passou pela minha pele. Minha visão ficou turva por instante antes de perceber que estava no meu quarto.
Eu estou sentada em uma ponta da cama e Samael está em pé ao lado da janela, Mammon está sentado na minha cadeira; parece que estou tendo um dejavu. Exceto por Carly que está sentada na outra ponta da minha cama.
Seus olhos estão arregalados em exclamação. Eu já começo a falar para tentar acalmá-la mas não sei bem o que dizer.
— Carly, calma. Eu vou te explicar... Er... Não se preocupe, tá bem?
— Que porra é essa Amélia?! Vocês me drogaram? — ela se exalta intercalando o olhar em todos nós.
— Não querida, você sabe como é estar chapada, e não é assim — quem disse foi Mammon.
A Carly corou e pareceu ficar meio desestabilizada. Ela já usou drogas? Sério, a gente tem que conversar mais sobre experiências. Samael ainda estava parado na janela do mesmo jeito e eu não sabia bem o que iria fazer até que ele falou:
— Diga a ela. — Direcionando sua atenção para Carly em seguida.
Carly voltou para mim. Ok... Por onde eu começo? Eles bem que podiam fazer isso, esse bolo todo é sobre eles.
Então eu contei por alto e de modo resumido e objetivo para ela toda essa loucura. Enquanto eu falava eu tomei noção (mais uma vez) do quão doido isso tudo é, e do quão maluca eu estava parecendo. Tanto que, ela começou a rir. Muito.
— Pera... — Ela colocou a mão no peito tentando recuperar o fôlego. — Ele é um anjo e ele é um demônio. — Apontou para Samael e Mammon. — Ele veio até você para te matar e...
— Eu não vim matá-la — Samael corrigiu ríspido. — Eu vim coletar a sua alma quando isso acontecesse.
— Tá, tá legal anjinho.
Mammon soltou uma risada mal contida.
— Acho que eu gosto dela.
Samael lhe deu um olhar mortal, e o demônio arranhou a garganta parando de rir.
— Você veio coletar a alma dela, mas não conseguiu e agora você tá afim dela. — Mammon voltou a rir — E esse cara aí é um demônio que se chama Mamão.
Acho que eu nunca vi Samael rir tanto. Juro, ele ficou até vermelho
— Mammon — o demônio falou em uma voz grave. E pude sentir que a seriedade finalmente tinha chegado na Carly. — E você sabe que é verdade.
— Amélia, — Carly se voltou para mim. — isso não é cabível!
— Oh, e as coisas que vê são cabíveis? — falou Mammon, se levantando da cadeira. — As pessoas que vê, os monstros nelas...
Talvez pela minha nova sensibilidade à luz, eu estava sentindo o poder de Mammon com mais clareza. Podia sentir aquilo se revirando dentro dele enquanto ele se aproximava.
Mammon foi até a Carly.
— Isso é cabível para você? — seus olhos novamente brilharam.
Tudo aquilo estava me deixando enjoada e instigando algo em mim que eu estava começando a conhecer. Minhas costas ficaram sensíveis e coçando.
Carly afastou o rosto, e pude ver seus olhos magoados e quebrados.
— O que você sabe sobre isso? — Carly falou devagar.
— Tudo — Mammon disse.
— Vamos esclarecer tudo isso — agora quem falava era Samael, saindo de perto da parede e ficando ao lado da cama. E me dando um olhar de cumplicidade. — Carly, isso tudo que você vê e sente é por você ter sangue demoníaco.
Ele tentou ser o mais gentil possível. Mas o impacto não foi gentil.
Carly era a representação perfeita de um ponto de interrogação, não que eu também não estivesse do mesmo jeito.
— Demoníaco...? — Carly ela falou com o cenho franzido.
Samael concordou de leve. Eu logo direcionei minha atenção para Mammon. Carly é como ele? Ele já estava novamente sentado na minha cadeira, se balançando para os lados.
— Sim, — Mammon falou. — mas você não é como eu, não mesmo. — Ele balançou o dedo indicador. — Eu sou um demônio, você só tem sangue demoníaco. Acredito que seu pai ou sua mãe devam ser demônios. — Parou de se balançar, e focou nos olhos de Carly. — É por isso que pode ver as coisas que vê.
Ninguém falou nada e a tensão estava pressionando meu pescoço.
— Que coisas — eu perguntei. — Que coisas você pode ver?
A boca dela tremia, e ela não me olhava nos olhos, encarava o lençol como se os segredos do universo estivessem ali. Me direcionei para os outros dois, Samael travou a mandíbula por um momento e Mammon deu uma volta completa com a cadeira giratória.
— Ela vê os mortos, Amélia. — Samael começou a me explicar.
Eu realmente estava ficando enjoada.
— Ela pode ver as almas que ficaram presas aqui, os demônios que circulam por aí. Consegue até ver os pecados em sua forma bruta dentro das pessoas. — Carly ainda encarava o lençol e suas mãos tremiam agarradas à cama. — Ela é a transição do mundo invisível para este.
Minha pele estava muito sensível, como se fosse papel manteiga. Manteiga se derretendo.
— Carly... — eu não consegui dizer mais nada.
Ela me olhou e seus olhos estavam marejados, e percebi que minha visão estava embaçada pelas minhas próprias lágrimas. Eu a puxei para um abraço bem forte. Eu queria passar aquela luz para ela, que a enchesse por dentro e tirasse aquela escuridão que agora, eu podia sentir. Era algo horrível e tenebroso, denso que se prendeu por todas as partes. Acho que consegui passar um pouco de luz para lá, dando espaço suficiente para que a própria Carly lutasse contra aquilo.
— Por que não me contou ? — balbuciei.
Ela me deu um olhar de compaixão, do qual eu não entendi muito bem.
— Pelo mesmo motivo que você não falou deles. — Fez uma indicação do anjo e ao demônio.
E agora? Ela vai simplesmente saber de tudo isso e continuar a vida dela vendo mortos por aí? Talvez se nós encontrarmos alguma solução... Uma batida na porta. Meu coração chega a dar um pulo.
— Amélia...? É você? — ouço a voz do meu pai vindo do outro lado.
Momento perfeito.
— É, o que você quer? — pergunto alto ainda ao lado da Carly.
— Você não deveria estar na escola? — ele pergunta.
Merda. Tinha me esquecido da escola.
— Eu não estava me sentindo bem.
Ele tenta abrir a porta, mas a chave (que estava do lado de dentro do quarto) se vira rapidamente trancando a porta e não o deixando entrar. Olho para o lado e vejo que tinha sido Samael, consegui sentir.
— Você não quer ajuda com algo? Talvez um remédio, não sei.
— Não, obrigada. Eu já estou me sentindo melhor.
— Que bom, querida.
Ele deu uma pausa e já estava vendo que viria mais por aí.
— Nós temos que conversar, Amélia.
Eu mal posso descrever como me senti. Envergonhada parecia eufemismo. Depois do nosso episódio de ontem a noite, é claro que ele quer conversar. Pela sua voz ele ainda não bebeu, e dado todo o contexto, ele vai vir dizer que não vai mais beber, que vamos recomeçar nossas vidas e que ele vai ser um pai de agora em diante. E de quebra, com Samael, Mammon e Carly de plateia.
— Por favor, abra essa porta — a voz dele estava cansada.
Eu me virei para Samael e os outros, mas eles estavam neutros, esperando que eu fizesse algo.
Me levantei da cama meio incerta e fui até a porta, a destranquei e a abri minimamente. Meu pai dá um passo para trás e fica passando o peso de uma perna para outra. Ele está com a barba feita, com pequenos cortes recentes no queixo, e com seu óculos; que não usa com muita frequência.
— Bom, eu... — Ele estava meio incerto do que falar — Eu fui ao AA. — Ele tira do bolso uma pequena ficha brilhante, da qual eu já conheço bem. — Vinte e quatro horas sem beber.
Fico olhando para ele e para a ficha. Enquanto finjo que ele não está me encarando.
— Dá só para você falar algo? Mais que droga, Amélia. — Ele aperta a ponte do nariz, frustrado.
No impulso, eu passo pela porta e bato com ela por trás de mim, ficando de frente para ele.
— Você quer que eu diga o que? — eu posso ter falado de modo um tanto agressivo e ele vacilou por um instante. — Bom pai, bom mesmo você não ter bebido e ter ido ao AA. Mas você se lembra de quantas vezes você já fez isso? De quantas vezes nós passamos por isso? Desculpe, mas vinte e quatro horas não são nada em comparação de anos.
Ele recuou até a parede, e passou a encarar o chão. A minha respiração estava ofegante.
— Você — ele começou a falar, e fungou. — Você tem razão. — Meu pai levantou a cabeça. — Mas tudo que eu posso fazer no momento, é pedir perdão.
Meus olhos se encheram d'água. Eu não conseguia dizer aquilo, era muito difícil. Então eu voltei para dentro do quarto sem falar nada, e tranquei a porta. Ele não tentou entrar, e também não disse mais nada.
Um furacão não se compararia a mim naquele momento. Eu estou conturbada, eram tantas, tantas coisas juntas... eu só queria derramar tudo aquilo pelo chão e evaporar. Algo em mim começou a se agitar, mas eu gritei internamente para que ficasse quieta.
Ainda tinha gente ali.
Minhas costas doem, como um rasgão pela minha coluna. Reprimo uma careta, e fingindo não estar sendo observada por três pares de olhos, vou até a minha escrivaninha e pego dois analgésicos e os engulo de uma vez só, sem água. Depois disso nós conversamos por muito pouco tempo. Carly falou que queria ir para casa e Mammon a teletransportou para fora, e se foi junto. Samael que ficou me olhando por um tempo, se sentou na cama comigo. Estávamos sozinhos. Muito perto um do outro. A minha coluna voltou a doer.
— O que houve?
— Só uma dor nas costas, logo passa — respondo.
Eu me lembro de hoje mais cedo, no corredor da escola. Quando eu achei que nós fossemos nos beijar. Mas pensando melhor agora, acho que eu estava enganada. Sinto o meu rosto esquentar de leve, e abaixo a cabeça.
— Se eu puder perguntar, e você e o seu pai? — Samael falou tranquilo, sem me olhar.
Acho que ele não queria trazer aquele peso para o momento.
— Eu não sei... A gente já passou por isso tantas vezes, me pergunto quando finalmente vai ser verdade.
— Eu acho que dessa vez ele vai mudar — ele fala baixo.
— E por que você acha isso?
— Uma coisa que eu aprendi foi que se uma pessoa realmente quer algo, ela consegue. O ser humano é persistente, mas às vezes ele cansa e precisa de uma ajuda para continuar.
Entendo o que ele quer dizer, mas é tão difícil. Eu também estou cansada, e quem está me ajudando? Samael me olha, e eu aproveito para contemplar aqueles olhos lindos, que parecem caçar cada pensamento meu.
Algo se instiga no fundo do meu peito. Ele fica muito próximo de mim, mas sem me tocar. Toda essa provocação começou a fazer a minha pele se arrepiar, e formigar. Eu tento me acalmar, e com esforço faço essa energia fluir.
Samael me observa de perto e sorri de lado.
— Conseguiu controlar sozinha, incrível.
Ele fez uma pausa que causou um terremoto no meu peito, e se aproximou mais, centímetros curtos do meu rosto. Sua respiração na minha. Eu ia explodir.
— Agora vamos para o próximo nível — sussurrou, e com a ponta dos dedos levou uma mecha minha de cabelo para trás. — Tente continuar controlando...
Agora a sua voz não pertencia mais a um anjo, em nenhuma cultura o tom dele seria associado a algo puro. Sua palma foi para a lateral do meu rosto. E o esforço de continuar fazendo a luz fluir calmamente, e de não delirar com ele desse jeito em mim, era enorme. Meu coração poderia ser confundido com de um rato de tão rápido que batia.
Devagar, desesperadamente lento, ele trouxe seus lábios para os meus. Eu nunca vou conseguir fazer uma descrição que chegue perto de como foi aquilo.
Seus lábios eram macios e doces, me faziam suspirar e derreter. Nos primeiros instantes eu me senti assustada, mas logo deixei ser guiada naquele beijo molhado e sensual. Sua mão se mantinha sobre meu rosto, alisando minha pele. Mas eu ainda tentava, quase inutilmente, me manter sã e não queimá-lo. Mesmo com meus esforços, a energia fugiu do meu controle e me percorreu por inteira.
Passei a me sentir mais leve e impulsiva, poderosa. Levei as minhas mãos ao seu rosto para senti-lo. A mão direita foi para seus cabelos negros e saboreei a sensação dos fios espessos entre os dedos e enganchei o braço esquerdo em seu pescoço. Eu não vou deixá-lo se afastar, não agora. Não agora que a minha razão foi embora e deixou o desejo por conta própria.
Mas ele não queria fugir. Samael também colocou uma mão em meu cabelo, o bagunçando, mas sempre gentil. Apesar da gentileza começar a ir embora entre nossas bocas. Ele agarra minha cintura, e a aperta. Eu me separo minimamente e suspiro. Suas mãos firmes me causando arrepios, grudando nossos corpos, sem querer deixar o calor que irradiava entre nós.
Procurei pelos seus olhos verdes e eles me perfuraram como nunca antes. Samael passou os dedos por entre meus cabelos os juntando e levou sua boca para o meu pescoço. Eu comecei a alucinar com a sensação dele explorando minha pele da orelha até o ombro.
Eu estava deixando ele me consumir a cada instante.
Foi quando toda a energia que se agitava dentro do meu corpo se focou nas minhas costas em forma de dor. Foi tão horrível que superou o prazer que estava sentindo com Samael, e de modo involuntário, eu cravei as unhas em sua pele e tentei engolir a dor.
— Fiz algo errado? — Samael tentou entender o que acontecia.
Se afastou da minha pele notando meu desconforto. Infelizmente não consegui impedir os resmungos de dor quando senti minhas costas sendo perfuradas.
Lágrimas desciam quentes pelo o meu rosto e Samael me olhava muito preocupado. Algo estava acontecendo em mim e eu não sabia o que era, estava ficando desesperada. Meu peito ficou em alerta, e meus olhos não paravam de se encher. A dor só aumenta, e é insuportável. Samael me agarra firme pela cintura, me abraçando, deixando que eu (sem realmente querer) o machuque um pouco.
— Respira, calma...
Mesmo com aquela dor tomando meus sentidos, consegui notar que Samael estava transmitindo sua energia para mim. Talvez tentando parar com meu sofrimento, afinal ele é um anjo, consegue fazer milagres. Mas não funcionou nenhum pouco, pelo contrário, piorou e eu comecei a me contorcer um pouco; Samael parou instantaneamente e continuou tentando me acalmar verbalmente.
Ele repetia tente se acalmar, respire, me balançando um pouco como uma criança. Porém, quando a dor chegou em seu ápice e ele simplesmente emudeceu, eu fiquei desesperada de verdade. Meus lábios já estavam machucados de tanto os morder impedindo gritos. E Samael estava começando a me agarrar forte demais. Mas que merda tá acontecendo comigo!?
Essa mesma dor, antes agonizante, se dissipa aos poucos, deixando meu corpo mole nos braços do Samael e minha cabeça tombando em seu ombro. O mesmo que ainda não havia voltado a falar.
Senti, então, um peso a mais sobre mim, e se Samael não me segurasse eu teria caído. Eu saí dos seus braços ainda com o rosto molhado pelas lágrimas e vejo Samael surpreso, atrevo-me dizer, com medo.
Escuto pequenos ruídos por trás de mim, e na borda da minha visão enxergo algo branco. Arregalo os olhos ao ver um par de asas presos às minhas costas e não quase não percebo o grito que dei.
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