Capítulo 27

          Vítor Hugo

      Merda, praguejei mentalmente.

      Beto sorriu desafiadoramente assim que entrou na sala. Ele mediu a Danny da cabeça aos pés, suspirando com desprezo em seguida.

      O garoto louro deixou pender um sorrisinho de puro atrevimento ao ver a Danny, o que me irritou. Esse súbito sentimento de irritação era incomparavelmente maior que o de ontem, quando ela e o Angel ensaiaram e dançaram o pas de deux de Diana e Acteon. 

      — Bom dia, meninos — Carlos Amaral abriu uma pasta e pôs na cadeira ao lado do suporte do som. — Já se aqueceram?

      — Sim — respondi por mim e pela Danny, que só assentiu com um gesto positivo.

      — Ótimo. Não precisam ficar nervosos por Beto assistir ao ensaio de vocês — o coreógrafo apontou para o pederasta filho da puta.

      Me virei ao ter meu braço segurado pela Danny.

      — Quem é Beto? — perguntou baixinho.

      — Diretor da Alliance Produções Artísticas — respondi no mesmo tom de voz.

      — Ah!

      Carlos não ignorou o estranhamento da minha partner.

      — Este é Odin Dressler, modelo e filho da Tânia Dressler, dona da Promoarte SP — continuou.

      Me ocorreu que eu já havia visto aquele cara. Como eu não havia me lembrado de seu rosto? Odin era um jovem modelo, famoso por sempre participar de campanhas publicitárias no Brasil e no exterior, e tinha fotos em outdoors.

      — Uau! — Danielle fez baixinho.

      Odin lançou um olhar cheio de malícia para a Danielle. Suas sobrancelhas inclinadas e finas, o sorriso perfeito e cheio de confiança, todo seu conjunto físico, deram um golpe na minha auto estima.

      Beto e o modelo se sentaram em cadeiras ao lado de Amaral.

      — Danielle, você ensaia sua variação primeiro — Carlos sentenciou.

      Fazendo um sinal pra eu sair e sorrindo, Danny se posicionou no centro da sala, e a música tocou. Seus movimentos suaves, leves e graciosos, as pernas levantadas até o alto, me deixaram em estado de torpor. Os braços dela eram asas de um cisne, havia amor e esperança em cada gesto, embora seus lábios não tivessem sorriso.

      Odin, que até então teclava o celular sem muito interesse no ensaio da Danny, entreabriu a boca quando ela se aproximou dele dançando. Ele olhava para o corpo dela, claro. Para as coxas e pernas compridas cobertas com polainas.

      O modelo não devia entender nada de balé, mas era homem, e devia gostar do sexo feminino.

      Merda! O filho da puta se encantou pela Danny.

      — Muito bem, Danielle  — Carlos fez sinal para a mulher que entrou com ele se aproximasse da loura.

       — Não tensione muito seus ombros  — Danny teve seus pulsos segurados pela mulher. — Está muito bom, mas seja um pouco mais natural. Mais paixão. 

      Enquanto Danny seguia a orientação de erguer e abaixar os braços, como um cisne faz ao bater asas, pedi permissão ao diretor para tomar água.

      — Volta logo — sua voz saiu com irritação. — Vou “limpar” a menina, ensaiar mais uma vez, e depois é sua vez.

      Assenti com aborrecimento e passei em frente ao Beto e ao Odin. Bati a porta atrás de mim e comecei a andar apressadamente, resistindo ao impulso de olhar para trás, como se eu estivesse sendo seguido.

      Inclinei meu corpo, apertei o botão do bebedouro e a água gelada refrescou minha garganta. Aproveitei para encher minha garrafa pet.

      Ouvi passos cadenciados se aproximando de mim. Um calafrio percorreu meu corpo. Então, alguém passou a mão na minha bunda.

      — Não tem ninguém aqui, se quiser podemos dar uma rapidinha — a mão indiscreta do Beto acaricia minhas nádegas, desce pela minha fenda glútea e aperta meu pênis.

      Ele só podia estar louco.

      — Aqui não — neguei veementemente sem olhar para Beto, enquanto meu sexo era massageado e apertado. — Alguém pode aparecer.

      Beto deixou escapar um risinho de pura maldade. Senti seu hálito quente no meu pescoço e seus lábios tocarem o lóbulo da minha orelha esquerda.

      Meu pau ficou duro por causa do estímulo das suas mãos nojentas, e isso me fez sentir nojo de mim mesmo.

      — Claro que não vou fazer nada aqui, lindo. Acha que sou um adolescente idiota que fode com garotas num quartinho?

      Meus olhos se arregalaram de espanto e medo. Ele sabia o que a Danny e eu tínhamos feito.

      — É com aquela moça que está ensaiando Odette?

      Minha voz não queria sair. A mão dele apertou meu pênis com mais força, puxando-o como se quisesse arrancá-lo.

      — Ela é muito gata, tenho que reconhecer. Poderia ser uma modelo. Você tem muito bom gosto. Mas isso tem que acabar.

      — Quem te contou? Quem? — perguntei.

      — Tenho olhos e ouvidos no estúdio da Agatha, querido.

      Abri a boca, abismado com a revelação. 

      — O sucesso de um homem depende de muitos fatores, querido Vítor. Se cercar das pessoas certas, gente de confiança, é um deles.

      Subitamente, ambas as mãos dele seguram meus ombros e me fazem girar, e ficar de frente para seu semblante. Os olhos dele eram frios, porém havia raiva por trás de sua aparente calma.

      — Não quero que você se envolva com garota alguma, está me ouvindo? — a exigência dele tinha um claro teor de ameaça. — Eu não aceito. Você é meu. Eu custeei suas viagens para disputar competições no exterior. Eu o apadrinhei para conseguir bons patrocínios. Eu fiz você e mereço sua lealdade.

      — Não tenho nada com a Danielle. Nós só…

      — Poupe-me dos detalhes sórdidos. Não precisa me contar nada. Eu sei. Ela é especial, não é? Ela te enfeitiçou. O lobo se apaixonou pelo cordeiro. Vítor Hugo, o pegador, se apaixonou por alguém . Não é irônico?

      A cólera começou a se acumular no meu peito, misturada com medo. Alguém do estúdio da Agatha havia posto Beto Corrêa a par do meu caso com a Danny, e eu tinha sérios motivos para acreditar que esse alguém era a Micaela.

      Beto deu um sorrisinho cínico, acariciando meu rosto. Fez menção de me dar um beijo, mas desviei. 

      Ele soltou um suspiro profundo, se distanciou  um pouco e puxou um maço de cigarros do bolso. Tirou um cigarro e acendeu-o.

      — A vida de um bailarino é solitária — ele murmurou. — Não temos tempo para namoro. Ou para o amor. Amor…! Quem precisa? Você é muito jovem para se prender a alguém.

      Meus punhos se fecharam.

      — E depois… Você vai estudar em Londres. Realizar seu sonho de ser bailarino de uma companhia profissional. Que futuro você espera de uma relação que vai acabar daqui a algumas semanas? 

      Futuro, repeti mentalmente para não esquecer.

      — Eu gosto de você — ele acarinhou meu rosto. — Como a pessoa que mais acreditou no seu potencial, te dou um conselho: não se envolva com aquela garota. Não jogue fora todo o seu trabalho e o dinheiro que a Alliance investiu em você.

      Me segurei para não dar um soco em Beto, e estava prestes a fazê-lo, mas uma coisa chamada instinto de sobrevivência gritou dentro de mim para que eu não me precipitasse. Ele era mais forte que eu. Muito. Quando nos deitávamos, ele segurava meus braços por trás, apertando-os, não me dando outra escolha senão aceitá-lo.

      Inequívocamente, aquele homem havia feito muita coisa pela minha carreira, me levando a lugares que eu nunca sonhara ir. Fiz cursos com os melhores professores, participei de festivais internacionais e ganhei técnica. Eu tinha uma dívida com ele, sim. 

      Mas que preço eu estava pagando? Como garoto de programa? Como um cãozinho amestrado, que quando o dono estala os dedos, corre ao seu encontro?

      Relaxei os ombros e abri as mãos, fechando os olhos e soltando todo o ar. Derrotado. Sem esperanças. Beto tinha razão, minha relação com a Danny não tinha futuro. Logo iríamos nos separar. Eu nunca mais a veria. Não valia a pena se anular por uma garota que logo seria lembrança.

      — Parece que coloquei um pouco de juízo na sua cabeça — a satisfação era visível no semblante duro do ex- bailarino. — Eu sei que você não é burro. Nós somos muito mais parecidos do que você imagina. Somos homens obcecados pelo sucesso.

      — Eu não tenho nada em comum com você — minha voz saiu mais atrevida do que eu pretendia.

      — Temos, sim. Para comemorar nosso reencontro — Beto tirou um cartão do bolso da camisa — , vá até este endereço, depois que ensaiar com aquela bostinha. É o hotel onde estou hospedado. Quero me divertir um pouco com a sua bunda antes do espetáculo.

      Olhei o logo do hotel, que parecia ser caro. Amassei-o e guardei-o no bolso.

      Beto riu, balançando a cabeça negativamente, com cara de deboche. Saiu do caminho e fez uma mesura, estendendo o braço direito para que eu fosse na frente.

      Segui de cabeça baixa pelo corredor. Vários sentimentos lutavam dentro de mim, ferindo minha consciência, aniquilando meu amor próprio. Ódio, vergonha, frustração, tristeza. Duvidei que conseguisse fazer um bom ensaio com a Danielle. 

      Queria sair correndo dali e usar uma droga bem forte para me esquecer de tudo, desaparecer.

      Uma palavra definia tudo o que eu sentia. Remorso. Pior que arrependimento. 

      Eu estava fodido. O menino que um dia foi levado pela Micaela para conhecer o estúdio da Ágatha, usou um collant emprestado de uma das meninas e fez aula com elas, e decidiu que queria ser bailarino, não mais existia.

      As lições de vida, ensinadas pelo meu pai, sobre respeito, humildade e compromisso com o mundo, não foram aprendidas. Não consegui olhar para o mundo. Só para o meu umbigo. Eu só pensei em mim.

      O que me restava de uma vida dedicada à dança e a satisfazer os desejos do meu corpo? O que poderia mudar minha vida? 

      Ao virar o corredor, dei de cara com ela e obtive minha resposta.

      — Você estava demorando, por isso vim te chamar — Danny sorriu. Aquele sorriso cheio de pureza e bondade, forte o suficiente para amenizar todo tipo de tristeza, só de estar perto dela.

       — Vamos? — ela me estendeu a mão.

      Sorri timidamente e entrelacei meus dedos aos da bailarina, entrando com ela na sala. Carlos Amaral andava de um lado para o outro, impaciente, murmurando palavrões.

      — Tempo vale mais do que dinheiro, sabiam? — ele bateu os braços nas pernas e sentou-se em sua cadeira de diretor. —  A Danny já está pronta para brilhar amanhã. E você?

      Não sei, respondi mentalmente. 

      Bailarinos não devem trazer emoções negativas para uma sala de aula, isso atrapalha a concentração. Olhei para a Danny, e senti medo. E se eu a derrubasse? E se ela se machucasse?

      Desistir do ensaio?

      Danielle segurou minha mão e um calor revigorante percorreu meu corpo. Nossos olhares se encontraram. 

      — Vai ser nosso melhor ensaio. Confie em mim — ela pediu. 

      A doçura do olhar e do sorriso da Danny se apossou de mim, indo de encontro à minha falta de disposição e me devolvendo o ânimo. Senti que era capaz de dar um passo a mais.

      — Confie em mim — ela repetiu.

      Assenti positivamente, abri um sorriso.

      Nos posicionamos para dar início ao pas de deux.

      Amaral ligou o som. E a mágica entre Danny e eu se fez.

      Dançamos com perfeição. De uma forma linda, sublime. Cada toque das minhas mãos no corpo da Danny, a cada momento que nossos olhares se encontravam, e eu via sua expressão de dor e tristeza, mas esperançosa, minha alma ganhava ânimo. Não era ela que precisava do amor verdadeiro para ser livre. Eu é que sempre precisei desse amor.

      Foi por apenas alguns minutos. Um tempo muito pequeno, mas me senti vivo de novo, com vontade de brigar com o mundo e recomeçar, voltar ao início e fazer as coisas de modo certo.

      Tentei tocar o rosto da bela Odette, e senti seu perfume selvagem, de fera, de mulher transformada em ave. O tempo para nós dois era muito curto e não podíamos esperar para ser felizes. Só podemos ser felizes quando tocamos o rosto da pessoa que amamos e sentimos seu calor. Se fosse possível, queria segurá-la para sempre em meus braços, tocar todas as partes do corpo, receber a doçura de seu beijo nos meus lábios e vislumbrar toda a beleza de seus olhos.

      Fiz ela girar várias pirouettes, perfeitas. Ergui-a por sobre minha cabeça, me deleitando com seu contato gostoso e aprazível aos meus sentidos, e desejei possui-la ali mesmo. Para sempre.

      Não era apenas desejo.

      Tinha algo mais.

      Os olhos dela e os meus se encontraram e meu coração sentiu uma força que nunca experimentei antes. Me senti indefeso, vencido, dominado por aquela garota tão especial entre todas as mulheres que passaram pela minha vida.

      Dei uma olhada fugaz na direção onde Beto Corrêa estava sentado. Obviamente, ele odiou me ver com cara de apaixonado, e soltando um grunhido, se retirou da sala acompanhado do Odin.

      — Ótimo ensaio — finalmente Amaral nos elogiou com entusiasmo. — Está quase perfeito. Falta limpar algumas coisas, mas vai ficar excelente. Eu sabia que não errei em escolhê-los como Siegfried e Odette.

      Danielle e eu trocamos um abraço, felizes e agradecidos pela entrega mútua.

      Estendi a palma da mão para fazermos um highfive. Ao invés de tocá-la com a mão, ela se apoiou na minha cintura e, inclinando o corpo todo para frente, tocou minha mão com o pé, mostrando atrevidamente o quanto era flexível.

      — Depois dizem que eu é que me acho — murmurei.

      — Desculpe — ela deu de ombros.

      Tomei banho e vesti o uniforme de aquecimento do curso de verão. Sai do teatro, me sentei na escadaria abraçando meus joelhos.

      O celular vibrou no bolso da minha calça.

      Venha logo. Quero você aqui.

      Levei a mão à testa desanimado, um suspiro fugindo por entre meus lábios em forma de lamento.

      O que eu fiz da minha vida?

      Uma mão feminina pousou com suavidade no meu ombro, e eu a reconheci mesmo antes de olhar para cima. Danielle sentou-se ao meu lado. Olhei para ela com intensidade, para seus olhos azuis, seu sorriso com aparelho de dente.

      — Por mais que a tristeza seja grande, ela fica pequena quando dividimos com alguém — ela disse, olhando para o infinito à nossa frente.

      Me mantive quieto.

      — Não quer me contar o que está acontecendo? 

      Abaixei a cabeça, escondendo-a entre os cotovelos. Um silêncio mortal se fez ouvir.

      Se fosse possível, ficaria quieto, porém não dava mais. Guardei durante muito tempo um segredo que estava me destruindo, eu achei que dava para esconder.

      — Eu gosto muito de você, Vítor Hugo. Principalmente quando está alegre. Mas você fica triste do nada. Não gosto. Só eu posso ser melancólica.

      Prendi e soltei o ar, e antes que minha coragem fugisse, comecei:

      — Danny, tem muita coisa sobre mim que você não sabe.

      Danielle deu de ombros, sorrindo.

      — Bom... Comece — me desafiou.

      — A primeira coisa: eu sou bissexual.

      A informação causou um pouco de estranheza nela.

      — Bissexual é quem gosta tanto de homem quanto de mulher, né?

      — Sim.

      — Isso, pra mim, não tem importância. Eu não tenho preconceito. Meu pai é homossexual, tem namorado, e é o melhor pai do mundo. A orientação sexual das pessoas é irrelevante pra mim.

      — Danielle Raluca — não a deixei continuar —, só me escute. Eu não sou esse cara que tu pensa que sou.

      A garota arqueou uma das sobrancelhas. Semiabriu a boca, e antes que eu fôsse interrompido, continuei:

      — Eu tô longe de ser um cara legal. Eu não presto. Sou a pior espécie de ser humano que existe. Fiz muitas coisas erradas nessa vida, e só agora estou vendo que não valeu a pena. Mas é tarde.

      — Vítor Hugo, o que você quer dizer?

      — Antes de conhecer você, Danny, eu fiquei com um sem número de meninos e meninas. Marquei encontros casuais. Usei essas pessoas do jeito que quis, sem me importar com elas, sem olhar para elas de verdade. Só queria sexo. A vida era assim pra mim, simples, e achava que era assim que tinha de ser.

      Eu queria ter a atenção da Danielle e consegui. O choro se acumulava no meu peito. Tive receio de não conseguir terminar.

      — O amor, pra mim, era um sentimento idiota. O único amor que eu tinha era pelos meus pais e pelo balé. Principalmente pelo balé. Ele sempre me deu tudo. Fez eu me sentir aceito como sou, fez eu me sentir especial, confiante, e acreditar que podia ir além.

      — Por que está me dizendo isso? Eu... preciso entender.

      Inclinei a cabeça, quase tocando-a no peito. Me faltava ar. Um nó havia se formado na minha garganta. Respirei fundo, e ao olhar de novo para a Danny, lágrimas corriam pelo meu rosto.

      — Eu só queria poder dançar junto com meus colegas que tinham dinheiro… Ir para outros países, dançar em festivais importantes. Mas você sabe, Danny, que balé é caro, passagens de avião são caras, tudo é caro… E minha família é pobre.

      — A Duda também é pobre e mora de aluguel com os pais, e no entanto, ela dançou em festivais importantes. Ela correu atrás de patrocínios, por isso é a melhor bailarina júnior deste país. Quando se tem talento, a pobreza não impede a gente de realizar um sonho. Mas o que isso tem a ver…

      — Eu sou um garoto de programa, Danielle! — explodi.

      Danny arregalou os olhos, e fez uma cara de quem toma um choque.

      — Como assim, garoto de programa?

      — Sabe aquele homem, o Beto? Faz um ano que ele e eu temos um caso. Ele é quem patrocina minha carreira. Ele é quem arca com todas as despesas minhas nos festivais de dança. Em troca de sexo.

      Mordendo o lábio inferior, Danielle fechou os olhos e virou-se para frente, escondendo a cabeça entre os joelhos. Levantou a cabeça novamente e sustentou seu olhar em direção ao meu. Não era um olhar duro, de quem julga e condena, porém era indecifrável. À qualquer momento, ela se levantaria, com nojo e vergonha de mim.

      Se eu tinha esperança de namorar com a Danny, tudo tinha acabado antes mesmo de começar. O amor, um sentimento que sempre desprezei, e que sem que eu percebesse aflorou violentamente, e despertou em mim o desejo de me tornar uma pessoa melhor, escapou por entre meus dedos.

      Foda-se se alguém podia chegar e me ver naquele estado lamentável. Eu era humano. Tudo o que eu queria era chorar.

      Solucei em voz alta, pondo para fora toda a minha vergonha, me limpando por dentro, e acredite, foi libertador.

      Danny suspirou, pondo uma mecha do cabelo louro atrás da orelha, dando um sorriso triste. 

      — O que as pessoas fizeram e por onde andaram nunca teve importância pra mim — disse pondo o dorso do indicador na maçã do meu rosto.

      — Por favor, me perdoe.

      Danny meneou a cabeça para os lados.

      — Eu não sou Deus pra perdoar ninguém.

      Minha respiração parou com a secura destas palavras.

      Danielle balançou a cabeça para os lados, em silêncio, sorrindo tristemente, mas sem raiva. Segurou meu queixo, sustento meu olhar no dela.

      — Não fique assim. Você não teve culpa. Você foi uma vítima daquele homem. Não tem que pedir perdão.

      — Danny... — suspirei baixinho.

      — Não diz nada — ela sorriu. — Eu tô do seu lado. Vai ficar tudo bem.

      E inclinando-se para mim, Danielle me apertou num abraço. Sentindo o calor de seu corpo, me sentindo amparado, meus braços passaram em volta de sua cintura.

      — Mas você sabe que não pode ficar quieto, não é? — o tom doce das palavras da loura também tinha reprovação, me lembrando que eu tinha um dever. — Você tem que pôr um fim nessa situação. Você tem que denunciar o Beto.

      — Eu não sei se posso — fechei os olhos. Soltei um suspiro angustiado, busquei mais contato com ela.

      — Você pode, sim. Sempre dá pra ir além das nossas forças. Mas se você não puder, eu vou te ajudar. Prometo.

      Danielle afagou minha cabeça, me dando uma sensação de amparo e proteção. Tomado pela emoção, vulnerável e sensível, deixei minhas lágrimas caírem livremente.














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