10 - this is me trying
E é difícil estar em uma festa quando me sinto como uma ferida aberta
É difícil estar em qualquer lugar hoje em dia quando tudo que eu quero é você
Você é um flashback em um rolo de filme em uma tela na minha cidade
E eu só queria que você soubesse que essa sou eu tentando
(E talvez eu não saiba o que dizer)
Eu só queria que você soubesse que essa sou eu tentando
Pelo menos estou tentando
Taylor Swift – this is me trying
– △ –
O quarto de Hanna se parecia com como seria exatamente o quarto da Barbie se esta fosse uma adolescente real e rica em 2017, e mesmo depois de anos de amizade Lis ainda sentia como se estivesse em outro mundo quando entrava no cômodo. Tudo era muito rosa e brilhante e frufru, combinando perfeitamente com a personalidade da própria Hanna.
– Onde estava? – Kate indagou enquanto mexia distraidamente em seu celular, a cabeça deitada sobre as coxas de Hanna que apenas encarava o teto e remexia os pés com agitação.
Lis apenas deu de ombros e tirou os tênis, deixando-os ao lado da porta junto de sua bolsa, para em seguida jogar-se na cama com as amigas.
O silêncio e a falta de resposta chamaram ainda mais a atenção da garota de cabelos azuis, que parou o que estava fazendo para fitá-la com uma curiosidade insistente.
– Lis, você disse que estava resolvendo umas coisas e sei lá, não faz o seu tipo resolver de fato alguma coisa – ela disse depois de um tempo e Lis bufou.
– É eu sei, eu sempre deixo tudo bagunçado na minha vida porque eu não tenho capacidade para resolver de fato alguma coisa, e daí?
– A questão não é essa e você fugir do assunto só prova ainda mais que não estava só resolvendo coisas – Kate rebateu e Hanna revirou os olhos.
– Meu Deus, até quando vão ficar nessa? A resposta é simples apesar de infeliz: ela foi ver o Matt – a morena comentou com impaciência antes de franzir as sobrancelhas. – Ou o Henri... Eu não sei, Lis tem tantos garotos na vida dela ultimamente.
– Ei! Isso é mentira! – Lis guinchou fazendo-a rir. – Suas duas afirmações são falsas, aliás.
– Ah é? Então por que tá com a cara toda borrada de batom? – Hanna provocou e Kate semicerrou os olhos, focando-os sobre os lábios e queixo de Lis que estavam completamente manchados por seu já característico batom coral.
– Sua filha da puta safada! – Kate disse passando o polegar no canto da boca borrada da amiga que a afastou com um tapa. – Quem foi?
Lis deu um longo suspiro cansado enquanto limpava o rosto com o dorso da mão, xingando Hanna mentalmente por ser tão atenta e esperta.
– Matt – respondeu por fim, arrancando expressões de indignação de ambas as amigas.
– O quê? Por quê?
– Eu sei lá, eu só senti falta dele e queria conversar e sim, por incrível que pareça eu queria, de fato, resolver as coisas, que saco – explicou reclamando e foi pega de surpresa quando Kate a abraçou.
– Eu não sou do tipo que passa a mão na cabeça de ninguém, você foi uma vaca com os dois Lis, mas não consigo imaginar o quanto isso deve estar sendo confuso e difícil pra você – ela disse e Lis precisou engolir o choro que ameaçava chegar, até porque já havia chorado demais naquele dia. – E ele também sente sua falta.
– Eu sei Kate, obrigada, eu só... Eu não quero mais tocar nesse assunto por hoje – admitiu e respirou fundo quando a amiga a soltou, forçando um sorriso para Hanna. – Mas então, eu vim aqui por um motivo, quais são as notícias?
– Ah, você sabe... – Hanna disse num murmúrio, encolhendo os ombros enquanto fazia mistério na intenção de deixá-la ainda mais curiosa. – Meu aniversário tá chegando e... meuspaismedeixaramdarumafestanacasadolago!
– É o quê? – Lis apenas indagou com o rosto estampando claramente que não havia entendido nada, provocando um revirar de olhos de Kate que tomou para si a responsabilidade de explicar a situação visto que Hanna estava eufórica e animada demais para isso.
– Os pais dela emprestaram a casa no lago por alguns dias para ela dar a festa de dezessete anos dela.
– Meu Deus! Aquela em Jackson? A que você sempre promete levar a gente mas nunca leva? – Lis zombou e Hanna fez uma careta insatisfeita.
– Não me culpe, sabe que as coisas tendem a sempre dar errado pra mim, mas tem mais – sua careta se transformou num sorriso brilhante e eufórico que rasgava seu rosto de uma orelha à outra. – Vão me emprestar o carro então não vamos precisar que nenhum adulto nos leve para ficar o caminho inteiro com um papo estranho sobre responsabilidade ou sei lá.
– Nossa isso é... Nunca entra na minha cabeça que você já tem carteira de habilitação e admito que isso me assusta um pouco, você não vai matar a gente em algum acidente doido ou jogar o carro num rio né? – Lis questionou parecendo mais desconfiada do que animada e Hanna lhe deu um soco no braço, resmungando.
– Pare de ser chata! Eu sei que esse é o tipo de rolê que a gente sempre quis mas nunca tivemos oportunidade então nos contentamos com essas festas xoxas e noites de bebedeira no barzinho da esquina.
– Se tem uma coisa que nossas festas com certeza não são essa coisa é xoxa, Hanna – Kate retrucou quando memórias rápidas de todas as situações absurdas que já haviam acontecido em suas festas anteriores passaram por sua cabeça. – De qualquer forma, tenho que falar com os meus pais primeiro.
– Ah, merda – Lis xingou baixinho por já saber que a relação de Kate com os pais não era das melhores. – Se a Karen for junto talvez...
– Você acha que ela vai querer perder o tempo dela passando o fim de semana inteiro com um bando de delinquentes juvenis? E não sei, não me parece uma ideia muito inteligente querer ir para uma festa com a minha irmã mais velha – ela respondeu tentando ao máximo ignorar o olhar agora esperançoso de Hanna.
Ela e Lis já estavam cansadas de saber sobre a paixão platônica que Hanna tinha por Karen e de ter que lidar com os diversos gay panics que a garota dava só de ver ou ouvir falar da irmã mais velha de Kate.
– Hanna, não. Já conversamos sobre isso – Kate disse com firmeza e a morena fez apenas um biquinho como resposta. – Puta merda, já faz sete anos que a gente se conhece e sete anos que você fica nessa, precisa superar. Minha irmã ao menos fica com mulheres.
– O Eliel pensa a mesma coisa de mim – Lis respondeu instantaneamente sem pensar e tomou um tapa da garota de cabelos coloridos que lhe lançou um olhar furioso. – Ai! O que foi?
– Não dá corda pra isso Lis, tá maluca?
– Não, eu sei lá, eu só... Acho que isso já deu Kate, você não pode impedir a Hanna de gostar de alguém só porque esse alguém é sua irmã – Lis disse e soltou um longo suspiro em seguida, Hanna sorrindo para ela como uma forma silenciosa de agradecimento.
– Você acharia normal eu gostar do Eliel?
– Meu Deus Kate, caralho, meu irmão é uma criança - respondeu e, diante do silêncio que veio em seguida, puxou o celular do bolso e checou a hora.
Eram sete e meia e sua mãe chegaria logo do trabalho, além de que estava começando a ficar com fome, afinal, sua última refeição fora a primeira: um café da manhã apressado e desanimado pois havia acordado sem a mínima vontade de viver.
– Bom, então acho que vou indo – avisou e se levantou, segurando a mão de Hanna por um momento e sorrindo fracamente para a mesma. – Eu sei que pareci meio chata em relação a festa, e me desculpa mesmo, eu só...
– Tá tudo bem, você não tem que pirar por isso nem nada, sei o quanto as coisas que andam acontecendo nos últimos dias devem estar te matando por dentro.
– É, talvez. Mas eu tô animada sim, e vamos organizar tudo juntas, nós três – disse enfatizando as últimas palavras e estreitando os olhos para Kate, que se limitou a mostrar o dedo do meio como sua maior forma de resposta. – Não fique tão estressada senhorita, fuma um antes de dormir que tá tudo certo.
– A vida seria tão mais fácil se pudéssemos resolver nossos problemas com drogas - Kate murmurou e as outras duas respiraram fundo e balançaram a cabeça em afirmação. – Desculpa pelo piti, acho que tô de TPM.
– Tá perdoada. Só come um chocolate então ao invés de fumar um, também é uma alternativa – Hanna propôs enquanto ela mesma começava a ser tomada pela vontade de atacar a geladeira em busca de qualquer coisa doce que pudesse encontrar. – Aliás, vão juntas?
– Não, vou dormir aqui hoje – Kate respondeu de imediato e deu de ombros diante do olhar de confusão com um toque de indignação que veio de Hanna logo em seguida. – O quê?
– Eu não te chamei pra dormir aqui – ela disse e Kate sorriu enquanto roía a unha pintada de preto de seu polegar.
– Sabe que não precisa disso, e também sabe que ama quando eu fico aqui porque você é super solitária e carente.
– Isso é verdade – Lis concordou e Hanna apenas bufou em resposta. – Bom, estou indo, se cuidem com drogas ou chocolate, não importa, só não matem uma à outra por favor. Amo vocês.
Ela abraçou as amigas e recolheu suas coisas, calçando os tênis laranja antes de se despedir uma última vez com um aceno de mão. Desceu os degraus de mármore branco com corrimão dourado até a sala vazia e silenciosa com sua decoração em tons neutros claros e brilhantes.
Os pais de Hanna raramente paravam em casa e a empregada da família ficava apenas durante a manhã e logo ia para a própria casa, era claro o porquê de Hanna se sentir tão sozinha e totalmente compreensível também, então ela e Kate tentavam passar o máximo de tempo com a amiga mesmo que esta tentasse se fazer de forte e independente algumas vezes – o que nunca era muito convincente.
Lis saiu da casa fechando a porta atrás de si e ouvindo o som da tranca automática logo em seguida. Abaixou para ajeitar suas meias e, xingando baixinho por ter tido uma ideia tão idiota como aquela, coçou a testa irritada por conta dos fios recém cortados de sua franja.
As ruas estavam vazias e o vento abafado do verão quase a fazia se sentir sufocada mas Lis ainda preferia isso aos chuviscos incessantes e o frio cortante do inverno que sempre lhe trazia memórias um tanto indesejadas – e, afastando tais memórias com os dedos agarrados firmemente à alça de sua bolsa, apertou o passo com pressa para chegar em casa logo mesmo que a casa de Hanna não ficasse a mais que dez minutos de distância da sua própria.
Seus batimentos aceleraram junto com seus passos em consequência de uma leve lembrança do que acontecera apenas algumas horas mais cedo.
Como Matt deveria estar depois daquilo? O que aquela situação tinha significado para ele de verdade?
Ela estava constantemente se torturando por causa de tudo o que vinha acontecendo, e só agora havia começado a pensar que talvez fosse a única. Lis tendia a se importar e se preocupar demais com coisas que mais ninguém dava a mínima, era sempre excessivamente sentimental e nunca chegara em sua cabeça que talvez Matt e Henri não sentissem o mesmo, que tudo aquilo não passava de um circo para eles, uma forma de ocupar e entreter suas mentes adolescentes que estavam sempre implorando por adrenalina e alguma emoção a mais em suas vidas que, em suas respectivas visões, era sempre muito sem graça.
Mas para ela não era assim. Ela estava verdadeiramente se quebrando com tudo aquilo, afundando cada vez mais nos sentimentos de culpa e, numa medida muito infeliz, de paixão e de amor também. Aquilo não era brincadeira nenhuma para Lis, muito longe disso na realidade, só a ideia de perder qualquer um dos dois fazia seu peito doer – algumas vezes no sentido literal, o que costumava deixá-la ligeiramente preocupada sobre acabar sofrendo um infarto do nada algum dia.
A ideia de sofrer um infarto por si só parecia coisa de gente velha, mas ela sabia que diversos outros fatores além da idade poderiam interferir neste caso, como altas doses de stress – o que ela com certeza estava tendo. Mas imagine só, chegar no pronto-socorro sofrendo uma parada cardíaca e ter que explicar ao médico que foi tudo puramente fruto de relações adolescentes mal resolvidas.
Isto a assombrava na mesma medida que a fazia querer rir – e Lis mal sabia se era de nervoso ou por achar a situação toda realmente engraçada.
Ela precisava resolver isso, e agora de verdade. Sentiu uma ponta de determinação e dor por já ter em mente qual seria sua metodologia para tal feito, e sendo assim a vontade de rir deu lugar à vontade de chorar e suas mãos tremularam quando ela subiu os degraus de sua varanda e pousou os dedos levemente suados sobre a maçaneta fria da porta, abrindo-a com seu já característico rangido.
Não queria que seu coração se partisse mais uma vez e isto já estava acontecendo, sentia as rachaduras forçando cada vez mais numa tentativa persistente de quebrá-lo e, ficar dividindo os pedaços entre Henri e Matt só aceleraria o processo, assim, a melhor solução, ela sabia, era manter os pedaços consigo, mesmo que isso significasse que ficaria sozinha.
A dor da solidão talvez fosse mais suportável do que a dor de amar e ter alguém, afinal de contas.
Respirou fundo para engolir o choro, ainda apoiada sobre a porta, e xingou baixinho quando entrou e sua mãe a chamou da cozinha.
– Lis? É você? – Violet perguntou e a garota imediatamente reconheceu o cheiro de pizza que vinha do cômodo, andando até lá em passos meio trôpegos.
– S-sim eu... Eu estava na casa da Hanna, estávamos planejando umas coisas para o aniversário dela – contou com a voz falha e sua mãe, a conhecendo melhor do que qualquer amiga ou namorado que Lis pudesse arrumar, parou de ajeitar os pratos na mesa para encará-la com certa preocupação em seus olhos violeta.
Lis nunca se acostumaria com a cor incomum daqueles olhos mesmo que já convivesse com eles há dezessete anos, mas ainda assim nunca confiaria em quaisquer outros mais do que naquelas íris cor de ametista.
– E eu fui ver o Matt também – confessou depois do breve silêncio, desviando o olhar e retorcendo a alça da bolsa por entre os dedos, denunciando sua ansiedade por tocar no assunto. – Eu queria resolver as coisas, ou pelo menos tentar.
– Ah, meu amor – Violet disse baixinho e correu para abraçar a filha. – Tá tudo bem, pode chorar se quiser.
Mas Lis não queria.
– Não mãe, eu... Obrigada mas tá tudo bem, de verdade – ela respondeu forçando um sorriso o máximo que conseguia e sua mãe deu um beijo em sua testa antes de encarar seus olhos por um momento para saber se sua filha falava a verdade.
E ela soube que não. Não estava nada bem na verdade, mas ficaria e ela acreditava em Lis.
– Bom, você não estava aqui então deixei o Eliel escolher o sabor das pizzas – Violet informou na tentativa de quebrar o assunto anterior visto que era esta a vontade da filha.
– Já sei, Marguerita e... – ela olhou nas caixas e franziu as sobrancelhas. – Pepperoni e Brocólis?
– É – Eliel disse assim que chegou na cozinha, os olhos ainda vidrados em seu celular e o fio dos fones de ouvido pendurados em volta de seu pescoço. – Sei que você gosta dessas, sua idiota.
Lis não conseguiu evitar um sorriso apesar de não querer se dar por vencida em seu longo e interminável joguinho de irmãos, então não agradeceu apesar de se sentir agradecida.
E enquanto comia e conversava com sua família, fazendo piada sobre todo o tipo de coisa e zoando os colegas de trabalho esquisitos de Violet junto da mesma, Lis quase se esqueceu do porquê se permitia ficar triste diante de coisas tão idiotas.
Afinal, ela tinha Hanna e Kate, tinha sua mãe e Eliel. Todas as pessoas que amava e que sempre a deixavam feliz independente de seus problemas secundários, e a última coisa que precisava era se permitir sofrer por garotos que na menor das oportunidades a trocariam por qualquer pessoa melhor ou até mesmo por um vídeo-game, quem sabe?
E foi diante desses pensamentos que ela caçou seu celular no bolso e, enquanto comia o último pedaço de sua pizza, bloqueou Henri e Matt de todas as formas e em todas as redes sociais possíveis.
Era uma atitude infantil e até mesmo burra se considerasse que moravam em uma cidade pequena onde todos se conheciam e podiam se esbarrar por aí a qualquer hora, mas ainda assim era sua melhor solução temporária por enquanto.
E somente esse gesto bobo já a fez se sentir um pouco mais livre e desconectada de toda aquela besteira.
Bạn đang đọc truyện trên: AzTruyen.Top