[03] Convites
#MomoBrilhaComoDiamante
No meu sonho reinava uma escuridão muito densa, e aquela luz fraca parecia vir de
da pele de Momo. Eu não conseguia ver seu rosto, apenas suas costas, enquanto ela se afastava de mim, deixando-me na escuridão. Eu não conseguia alcançá-la; por mais alto que gritasse, ela não se virava. Perturbada, acordei no meio da noite e não voltei a dormir por um tempo que parecia eterno. Depois disso, ela estava em meus sonhos quase todas as noites, mas sempre fora da cena, nunca ao meu alcance.
O mês seguinte ao acidente foi violento, tenso e, pelo menos no início, constrangedor.
Infelizmente para mim, tornei-me o centro das atenções durante o resto da semana.
Nishimura Riki tornou-se insuportável, me seguiu por toda parte, obcecado em me compensar de algum modo. Tentei convencê-lo de que tudo que eu queria era que ele esquecesse o que aconteceu, especialmente porque nada tinha acontecido comigo, mas ele continuou insistindo. Ele me seguiu entre aula e aula e na hora do almoço ele sentou na nossa mesa, agora bem lotada. Jake e Jeongin, eles se comportaram com ele de uma maneira muito mais hostil do que entre si, o que me levou a considerar a possibilidade de ele ter ganhado outro admirador indesejado.
Ninguém parecia se importar com Momo, embora eu explicasse repetidas vezes que a heroína era ela, que me tirou do caminho da van e que estava prestes a
ser esmagado. Tentei ser convincente. Yunjin, Jake, Jeongin e todos os outros que sempre comentavam que não a tinham visto ali até a van ser afastada.
Perguntei a mim mesma por que ninguém mais a vira parada tão longe, antes que ela salvasse a minha vida de repente e daquele jeito impossível. Com pesar, percebi a provável causa – ninguém mais tinha ciente da presença de Momo como eu ninguém a observava da forma como eu fazia. Que pena.
Momo nunca ficou cercada de uma multidão de curiosos ansiosos por seu relato em primeira mão. As pessoas o evitavam, como sempre. Os Cullen e os Hales sentaram-se à mesma mesa de sempre, sem comer, conversando apenas entre si. Nenhum deles, em especial Momo, voltou a olhar na minha direção.
Quando ela se sentou ao meu lado na aula, o mais distante de mim que a carteira permitia, parecia totalmente inconsciente da minha presença. Só ocasionalmente, quando seus punhos de repente se curvavam – a pele esticada ainda mais branca sobre os ossos – é que eu me perguntava se ela estava tão distraída como parecia.
Ela queria não ter me tirado do caminho da van de Niki – não havia outra conclusão que eu pudesse tirar.
Queria muito conversar com ela e, no dia seguinte ao acidente, tentei. Da última vez que a vira, do lado de fora da emergência do hospital, nós duas estávamos furiosas. Eu ainda tinha ficava por ela não ter me contado a verdade, embora cumprisse impecavelmente minha parte do trato. Mas ela salvara minha vida, independente de como tinha feito isso. E, da noite para o dia, a temperatura elevada de minha raiva desapareceu numa gratidão referente.
Quando cheguei à aula de biologia, Momo já estava sentada, olhando para a frente. Eu me sentei, esperando que se virasse para mim. Ela não deu sinais de ter percebido minha presença.
─── Oi, Momo. - eu disse de um jeito agradável, para lhe mostrar que ia me comprovar.
Ela se virou só um pouquinho para mim sem me olhar nos olhos, balançou a cabeça uma vez e depois desviou o rosto.
E esse foi o último contato que tivemos, mas ela ficava ali, a trinta centímetros de distância, todo dia. Eu a olhava às vezes, incapaz de me contar ─ mas de longe, no refeitório ou no estacionamento. Eu a observava à medida que seus olhos castanhos ficavam perceptivelmente mais escuros do que ele permitia. Eu estava infeliz.
E os sonhos continuaram.
Apesar das minhas mentiras descaradas, o tom dos meus e-mails alertou Jiwoo da minha depressão, e ela ligou algumas vezes, preocupada. Tentei convencê-la de que era apenas o clima que me deixava desanimada.
Jake, enfim, ficou satisfeito com a frieza evidente entre mim e minha parceira de laboratório. Eu podia ver que ele estava preocupada que o resgate ousado de Momo pudesse ter me impressionado, e foi um alívio para ele parecer ter tido o efeito contrário. Ele ficou mais confiante, sentando-se na beirada da minha mesa para conversar antes que começasse a aula de biologia, ignorando Momo completamente, como ela nos ignorava.
A neve desapareceu para sempre depois de um dia perigosamente gelado. Jake ficou decepcionado por não poder ter armado sua guerra de bolas de neve, mas satisfeito porque logo seria possível fazer a viagem à praia. Porém, a chuva continuava pesada, e as semanas se passaram.
Yunjin me informou de outro evento que assomava no horizonte – ela ligou na primeira terça-feira de março querendo minha permissão para convidar Jake para o baile de primavera das meninas dali duas semanas.
—Tem certeza que não se importa? Você não estava pensando em convidá-lo? — ela insistiu quando eu disse que não dava a mínima.
─── Não, Yun, eu não vou. - garanti ela. Dançar estava notoriamente fora de minha gama de habilidades.
─── Vai ser bem divertido. - Seu esforço para me convencer foi desanimado. Eu suspeitava que Yunjin gostasse mais com minha inexplicável popularidade do que com minha companhia.
─── Divirta-se com Jake. - eu a encorajei.
Fiquei surpreso que no dia seguinte ele não mostrou seu habitual ego efusivo na aula de trigonometria e espanhol. Ela permaneceu em silêncio enquanto caminhava ao meu lado entre uma aula e
outro, e tive medo de perguntar o motivo. Se Jake a tivesse rejeitado, eu era a última pessoa a quem ela gostaria de contar.
Meus temores aumentaram durante o almoço, quando Yunjin se sentou o mais distante possível de Jake, batendo um papo animado com Jeongin. Jake estava incomumente quieto.
Ele ainda estava em silêncio ao me acompanhar à aula, sua expressão de desconforto era mau sinal. Como sempre, eu estava eletricamente ciente de que Momo estava sentada perto o suficiente para que eu a tocasse, e ao mesmo tempo tão distante como se fosse uma mera invenção minha imaginação.
─── Mas aí - disse Jake, olhando para o chão. ─── A Yunjin me convidou para o baile de primavera.
─── Isso é ótimo. - acrescentei um tom de entusiasmo óbvio à minha voz. ─── Você vai se divertir muito com a Yunjin.
— Uh, bem... — ele ficou sem saber o que dizer enquanto estudava meu sorriso; Era óbvio
que minha resposta não o satisfez. ─── Eu disse a ela que precisava pensar sobre isso.
─── Porque você fez isso? - Deixei minha voz refletir alguma desaprovação, mas fiquei aliviada por ele não ter dado uma negativa absoluta a ela.
─── Eu queria saber se... Bem..., se talvez você estivesse planejando me convidar.
Parei por um momento, odiando a onda de culpa que varreu meu corpo.
Mas vi, pelo canto do olho, a cabeça de Momo se inclinar por reflexo na minha direção.
─── Jake, acho que você deveria aceitar a proposta dela. - eu disse.
—Você já convidou alguém? - será que Momo percebeu como os olhos de Jake disparavam para ele?
─── Não. - eu assegurei a ele. ─── Não tenho intenção de ir ao baile.
─── Porque? - jake quis saber.
Eu não queria informá-lo dos riscos que a dança representava para a minha integridade, então
que improvisei novos planos na hora.
─── Vou para Seattle naquele sábado. - expliquei. De qualquer forma, eu precisava sair do
cidade e foi o momento perfeito para fazê-lo.
─── Você não pode ir em outro fim de semana?
─── Não, desculpe - respondi. ─── Você não devia fazer Yunjin esperar mais tempo… é grosseira.
─── Sim, você está certa. - ele murmurou e, abatido, virou-se para voltar ao seu lugar. Fechei os olhos e esfreguei as têmporas com os dedos na tentativa de banir os sentimentos de culpa e pena da minha mente. O Sr. Banner começou a falar. Suspirei e abri o
olhos.
E Momo estava olhando para mim com curiosidade, aquele habitual ponto de frustração em seus olhos negros, que agora era ainda mais perceptível.
Olhei para ela, esperando que ela desviasse o olhar, mas em vez disso ela continuou, estudando meus olhos minuciosamente e com grande intensidade.
Minhas mãos começaram a tremer.
— Senhorita Cullen? — o professor ligou para ela, que estava esperando a resposta para uma pergunta
que eu não ouvira.
─── O ciclo de Krebs. - Momo respondeu, parecendo relutante quando se virou para encarar
olhe para o Sr. Banner.
Assim que os olhos dela me libertaram, eu abaixei os meus para o livro à minha frente, tentando me situar. Com a mesma covardia de sempre, deixei meu cabelo cair sobre o ombro direito para me esconder
o rosto. Eu não conseguia acreditar na torrente de emoções que batia dentro de mim, e simplesmente
porque ela achou por bem olhar para mim pela primeira vez em seis semanas. Eu não poderia permitir que ela tenha esse grau de influência sobre mim. Era ridículo. Mais do que ridículo, não era saudável.
Tentei ao máximo ignorá-la pelo resto da hora, e como já era impossível, que pelo menos ele não soubesse que eu a estava observando. Eu virei de costas para ela quando finalmente o sinal tocou, esperando que ela, como sempre, saísse imediatamente.
─── Dahyun? - Sua voz não deveria me parecer tão familiar, como se eu a conhecesse desde sempre.
─── Que? Você vai falar comigo de novo? —Eu finalmente perguntei a ele com um
nota involuntária de petulância na voz. Seus lábios se curvaram, escondendo um sorriso.
─── Não, na verdade não. - ela admitiu.
Fechei os olhos e respirei fundo pelo nariz, consciente de que meus dentes estavam rangendo.
Ela esperou.
─── Então o que você quer, Momo? - perguntei-lhe sem abrir os olhos; foi mais fácil falar com ela de forma coerente dessa maneira.
─── Sinto muito. - ela parecia sincera. ─── Estou sendo muito rude, eu sei, mas sério, é melhor assim. - Eu abri meus olhos. Seu rosto estava muito sério.
─── Eu não sei o que você quer dizer. - eu disse cautelosamente.
─── É melhor que não sejamos amigos. - ela me explicou ─── Confie em mim.
Eu estreitei meus olhos. Eu já tinha ouvido isso antes.
─── É uma pena que você não tenha descoberto antes. - murmurei baixinho. ─── Você poderia
tendo salvo todo aquele arrependimento.
─── Arrependimento? A palavra e o tom da minha voz o pegaram desprevenido, sem dúvida.
─── Arrependimento do quê?
─── Por não deixar aquela van estúpida me esmagar. - Fiquei atordoada. Ela olhou para mim sem acreditar no que estava ouvindo. Ela quase parecia bravo.
─── Você acha que me arrependo de ter salvado sua vida?
─── Eu sei que isso é verdade. - eu rebati.
─── Você não sabe nada.
Ela definitivamente ficou com raiva. Afastei meu rosto do dela, mordendo a língua para ficar quieta sobre todas as acusações fortes que eu queria dizer ao
caro. Peguei os livros e me levantei para ir em direção à porta. Eu pretendia fazer uma saída dramática da aula, mas, claro, minha bota ficou presa no batente do
porta e deixei cair os livros. Fiquei ali por um momento, considerando a possibilidade de deixá-los no chão. Então suspirei e me abaixei para pegá-los. Mas ela já estava lá, já empilhara meus livros. Ela os entregou para mim com uma expressão severa.
─── Obrigada. - eu disse friamente.
Os olhos dela se estreitaram.
─── Não há de quê. - retrucou ela.
Eu rapidamente me endireitei, me afastei dele novamente e fui para o ginásio sem olhar para trás.
A aula de educação física foi brutal. Agora jogávamos basquete. Meu time nunca me passava a bola, o que foi ótimo, mas cai bastante. Às vezes eu arrastava pessoas comigo. Hoje estava sendo pior do que o normal porque Momo ocupou toda a minha mente. Eu estava tentando me concentrar nos meus pés, mas ela continuou entrando em meus pensamentos justamente quando eu mais precisava manter o equilíbrio.
Como sempre, foi um alívio ir embora. Quase corri em direção à picape, pois havia muitas pessoas que eu queria evitar. O veículo sofreu danos mínimos como resultado do acidente. Eu tive que substituir as lanternas traseiras e teria feito alguns retoques
na folha de ter tido uma verdadeira equipe de pintura. Os pais de Niki tinham que vender a van para comprar peças.
Quase tive uma síncope quando virei a esquina e vi uma figura alta e escura encostada na lateral da minha picape. Depois percebi que era só Jeongin.
Comecei a andar novamente.
─── Oi, Jeongin. - eu o cumprimentei.
─── Oi, Dahyun.
─── E aí? - perguntei enquanto abria a porta. Eu não prestei atenção ao tom estranho de sua voz, então suas próximas palavras me pegaram desprevenida.
─── Eu estava pensando... se você gostaria de ir ao baile comigo. - Sua voz falhou quando ele falou a última palavra.
─── Pensei que as meninas é que deviam convidar. - respondi, surpresa demais para diplomática.
─── Bem, sim. - ele admitiu timidamente.
Recuperei a compostura e tentei oferecer-lhe meu sorriso mais caloroso.
─── Obrigada por me convidar, mas estarei em Seattle nesse dia.
─── Ah. - disse ele ─── Bom, quem sabe na próxima?
─── Claro. - concordei, e então mordi os lábios. Eu não queria que ele acreditasse isso tão literalmente.
Ele se curvou, voltando para a escola. Eu ouvi uma risada fraca.
Momo passava pela frente da picape, os lábios apertados. Abri o carro num rompante e pulei para dentro, batendo a porta ruidosamente. Acelerei o motor de um jeito ensurdecedor e dei ré para a rua. Momo já estava no carro dela, a duas vagas de distância, passando suavemente por mim, me dando uma fechada. Ela parou ali – para esperar pela família; pude ver os quatro andando para lá, mas ainda perto do refeitório. Pensei em bater na traseira de seu Volvo reluzente, mas havia testemunhas demais. Olhei pelo retrovisor e vi que começava a se formar uma fila. Bem atrás de mim, Nishimura Riki estava no Sentra usado recém-adquirido, acenando. Olhei; era Niki. Olhei novamente pelo retrovisor, confusa. O surto dela ainda estava ligado, a porta aberta. Inclinei-me na cabine para abrir a janela. Estava dura. Consegui abrir pela metade, depois desisti.
─── Desculpe, Niki, estou presa atrás da Cullen. - eu estava irritada; obviamente ele não estava preso ali pra culpa minha.
─── Ah, eu sei… só queria perguntar uma coisa enquanto estamos atolados aqui. - ele sorriu.
Isso não podia estar acontecendo.
─── Você vai me convidar para te acompanhar no baile da primavera? - continuou ele.
—Eu não estarei na cidade, Niki. - Minha voz soou um pouco áspera. Tentei lembrar que não era culpa dele que Jake E Jeongin já teria enchido o copo da minha paciência naquele dia.
─── É, o Jake me disse. - ele admitiu.
─── Então por quê…
Ele deu de ombros.
─── Eu esperava que você só estivesse se livrando deles do jeito mais fácil.
Tudo bem, a culpa era completamente dele.
─── Sinto muito, Niki. - respondi, tentando esconder minha irritação. ─── Eu estarei mesmo fora da cidade.
─── Está bem. Ainda temos o baile dos estudantes pela frente.
Ele voltou para o carro antes que eu pudesse responder. Eu sabia que meu rosto
surpresa refletida. Olhei para frente e vi Mina, Rose, Wonho e Changkyun indo para o Volvo. Pelo retrovisor, os olhos de Momo me acompanhavam. Ela sempre dúvida tremia de tanto rir, como se tivesse ouvido cada palavra de Niki. Meu pé apertou o acelerador… uma batidinha não os aranharia, só aquela pintura prateada cintilante. Acelerei o motor.
Mas todos estavam dentro do carro e Momo partia. Dirigi devagar para casa, resmungando para mim mesma o tempo todo.
Quando cheguei, decidi fazer enchiladas de frango para o jantar. Seria um longo processo e isso me manteria ocupada. Enquanto refogava a cebola e a pimenta, o telefone tocou. Quase tive medo de atender, mas podia ser Donghyun ou minha mãe.
Era Yunjin, e estava em júbilo; Jake falara com ela depois da aula e aceitara o convite. Ela precisava desligar, queria telefonar para Yuna e Yeji para contar. Sugeri de ─ com uma inocência despreocupada ─ que talvez Yuna, a menina tímida que tinha aula de biologia comigo, pudesse convidar Jeongin. E Yeji, podia convidar Niki; eu soube que ele ainda estava disponível. Yunjin achou uma ótima ideia. Agora que Jake estava garantido, ela pareceu sincera quando disse que queria que eu fosse ao baile. Dei-lhe minha desculpa de Seattle.
Depois que desliguei, tentei me concentrar na cozinha, principalmente em cortar o frango. Não queria fazer outra viagem ao pronto-socorro. Mas minha cabeça estava girando tentando analisar cada palavra que Momo havia falado hoje. O que ela quis dizer com que era melhor não sermos amigas?
Meu estômago se revirou quando percebi que ela devia estar falando sério. Ela devia ter visto como eu estava absorta nela; não devia querer me seduzir… então não podíamos mais ser amigas… porque ela não estava nada interessada em mim.
É claro que ela não estava interessada, pensei com raiva enquanto meus olhos lacrimejavam – uma reação causada por cebolas. Eu não era interessante. E ela era. Interessante... e misteriosa, perfeita... e bonita, e possivelmente capaz de levantar uma van com apenas uma mão.
Bem, estava tudo bem. Eu poderia deixá-la em paz. Eu a deixaria em paz. Eu suportaria a sentença que eu tinha me imposto aqui, no purgatório; então, se Deus quisesse, alguma universidade do sudeste, ou talvez o Havaí, me ofereceria uma bolsa de estudos. Concentrei minha mente nas praias ensolaradas e nas palmeiras enquanto eu terminava as enchiladas e colocava no forno.
Donghyun parecia cauteloso quando sentiu cheiro de pimentão verde ao chegar em casa. Eu não poderia culpá-lo, a comida mexicana comestível mais próxima provavelmente era para o sul da Califórnia. Mas ele era policial, mesmo que fosse naquela cidade pequena, então ele tinha coragem suficiente para dar a primeira mordida. Ele pareceu gostar disso. Foi divertido observar enquanto ele aos poucos começava confiar mais nas minhas habilidades culinárias.
─── Pai? - perguntei quando ele quase havia acabado.
─── Sim, Dahyun?
─── Hum... eu queria que você soubesse que estou indo para Seattle no sábado que vem… se não houver problema. - Eu não queria pedir permissão, isso estava abrindo um mau precedente, mas me senti grosseira, então dei uma valorizada no final.
─── Por quê? -Ele pareceu surpreso, como se não conseguisse imaginar nada que Forks não conseguisse oferecer.
─── Bem, eu quero comprar alguns livros porque a livraria local é bem limitada, e talvez olhe algumas roupas. - eu tinha mais dinheiro do que costumava ter, graças a Donghyun, não tive que pagar pelo carro. Não que a picape não me custasse muito no quesito gasolina.
─── Essa picape não deve ter um consumo de gasolina muito bom. - disse ele, ecoando meus pensamentos.
─── Eu sei. Pararei em Montessano e Olympia, e em Tacorna se necessário.
─── Vai lá sozinha? - perguntou ele, e não tive como saber se ele desconfiava de que eu tinha um “namorado” secreto ou só estava preocupado com problemas do carro.
─── Vou.
─── Seattle é uma cidade muito grande… você pode se perder. - ressaltou preocupado.
─── Pai, Phoenix é cinco vezes maior que Seattle e eu consigo ler um mapa, não se preocupe.
─── Você quer que eu vá com você?
Tentei ser astuciosa ao esconder meu pavor.
─── Está tudo bem, pai. Devo passar o dia todo em cabines de provas… tudo muito chato.
─── Ah, tudo bem. - a ideia de ficar sentado em lojas de roupas femininas por qualquer período de tempo o fez recuar de imediato.
─── Obrigada. - eu sorri para ele.
─── Vai voltar a tempo para o baile?
Só em uma cidade desse tamanho para um pai saberia quando acontecem os bailes da escola.
─── Não… eu não sei dançar, pai. - de todas as pessoas, ele devia entender isso; não herdei os problemas de equilíbrio da minha mãe.
Ele entendeu.
─── Ah, tudo bem. - percebeu ele.
Na manhã seguinte, quando entrei no estacionamento, deixei meu carro o mais longe possível do Volvo prateado. Queria fugir do caminho da tentação e terminar devendo um carro novo a ela. Ao sair da cabine, me atrapalhei com minha chave e ela caiu nu.a poça a meus pés. Enquanto me abaixava para pegar, uma mão branca apareceu de repente e pegou a chave antes de mim. Endireitei o corpo rapidamente. Momo Cullen estava bem ao meu lado, enconstando-se casualmente na picape.
─── Como você fez isso? - perguntei numa irritação surpresa.
─── Fiz o quê? - Ele me entregou as chaves enquanto falava e as deixou cair na palma da minha mão quando as abri.
─── Aparecer do nada desse jeito.
─── Dahyun, não é minha culpa se você é excepcionalmente distraída. - a voz dela era baixa, como sempre. Aveludada, abafada.
Eu fiz uma careta diante daquele rosto perfeito. Seus olhos brilharam novamente com um tom profundo e castanho como chocolate. Tive que olhar para baixo, para reagrupar meus pensamentos embaralhados.
─── Por que o engarrafamento de ontem? - perguntei, ainda sem olhar para ela. ─── Pensei que você déia fingir que eu não existo, e não me matar de irritação.
─── Aquilo foi pelo Niki, e não por mim. Tive que dar uma chance a ele. - ele riu, malicioso.
─── Você… - eu arfei. Não conseguia pensar que o calor de minha raiva pudesse queimá-la fisicamente, mas ela só parecia se divertir mais.
─── E não estou fingindo que você não existe. - continuou ela.
─── Então está tentando mesmo me matar de irritação? Já que a van do Niki não fez o serviço?
A raiva brilhou em seus olhos castanhos. Ela franziu os lábios e todos os sinais de alegria desapareceram.
─── Dahyun, você é totalmente absurda. - ela murmurou friamente.
Minhas palmas formigaram e senti vontade de bater em alguém.
Eu estava surpresa comigo mesma. Eu geralmente não era uma pessoa violenta. Virei as costas para ela e comecei a me afastar.
─── Espere. - ela gritou.
Continuei andando, chapinhando com raiva na chuva. Mas ela estava do meu lado, me acompanhado facilmente.
─── Desculpe, foi grosseria minha - disse ela enquanto andávamos. Eu a ignorei. ─── Não estou dizendo que não é verdade - continuou ela ───, mas de qualquer forma, foi uma grosseria dizer aquilo.
─── Por que você não me deixa em paz? - resmunguei.
─── Eu queria te perguntar uma coisa, mas você me desviou do assunto. - ela riu novamente. Parecia
tendo recuperado o bom humor.
─── Você tem transtorno de personalidade múltipla? - perguntei-lhe amargamente.
─── Lá vem você de novo.
Eu suspirei.
─── Tudo bem, então. O que quer perguntar?
─── Eu estava perguntando se, no sábado que vem… sabe como é, no baile do dia de primavera…
─── Está tentando ser engraçadinha? - eu a interrompi, girando para ele. Meu rosto ficou suado ao ver sua expressão.
Pelo olhar, ela parecia se divertir perversamente.
─── Quer por favor me deixar terminar?
Mordi o lábio e cruzei as mãos, entrelaçando os dedos, para não fazer nada precipitado.
─── Eu a ouvi dizer que vai a Seattle nesse dia e estava pensando se você queria uma carona.
Por essa eu não esperava.
─── Como é? - não tinha certeza do que ela pretendia.
─── Quer uma carona para Seattle?
─── Com quem? - perguntei, aturdida.
─── Comigo, é claro. - ela anunciou cada sílaba como se estivesse falando com alguém com problemas mentais.
Eu ainda estava pasma.
─── Por quê?
─── Bom, eu pretendia ir a Seattle nas próximas semanas e, para ser sincero, não tenho certeza se sua picape vai aguentar.
─── Minha picape funciona muito bem, obrigada por sua preocupação. - recomecei a andar, mas estava surpresa demais para manter o mesmo nível de raiva.
─── Mas sua picape pode chegar lá com um tanque de gasolina? - ela acompanhava meus passos novamente.
─── Não vejo como isso pode ser da sua conta. - dono daquele volvo idiota reluzente.
─── O desperdício de recursos não renováveis é da conta de todos.
─── Francamente, Momo. - Senti um arrepio me perpassar ao dizer o nome dela, e odiei isso. ─── Eu não consigo entender você. Pensei que não quisesse ser minha amiga.
─── Eu disse que seria melhor se não fôssemos amigas, não que eu não queria ser.
───Ah. Obrigada, agora está tudo muito claro. - ironia pesada. Percebi que tinha parado de andar de novo. Agora estávamos sob a cobertura do refeitório, então eu podia olhar mais facilmente o rosto dela. O que certamente não ajudou a clarear meu pensamentos.
─── Seria mais… prudente para você não ser minha amiga. - explicou ela ─── Mas estou cansada de tentar ficar longe de você, Dahyun.
Os olhos dela estavam gloriosamente intensos quando disse esta última frase, a voz ardente. Eu não consegui me lembrar de como se respirava.
─── Vai comigo a Seattle? - perguntou ela, ainda intensa.
Eu ainda não conseguia falar, então só balancei a cabeça. Ela sorriu brevemente e depois seu rosto ficou sério.
─── Você realmente deve ficar longe de mim - alertou ela ─── Vejo você na aula.
Ela se virou abruptamente e voltou pelo caminho de onde viemos.
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