18
Cathe
Aldeia dos Goblins - Mundo sombrio
- Que bom que acordou, querida - uma voz feminina, tranquila que aparentava sabedoria disse em sua mente, e abrindo os olhos, ela viu que estava com roupas diferentes e não viu suas vestes de batalha -, não se assuste, eu mesma troquei as suas roupas, e venho cuidando de você desde que te trouxeram para cá junto com o rapaz. Nós não vamos lhe fazer nenhum mal, e assim que se recuperarem, os deixaremos ir.
Sentindo-se revigorada e recarregada após descansar, ela se levantou e viu que em um canto do quarto onde estava, havia uma banheira cheia, com uma água que, pela fumaça que dispensava, parecia estar quente e convidativa para um banho. Em cima de uma bancada, toalhas limpas reforçaram o convite e ela não resistiu.
- Se eu for virar refeição das criaturas dessa aldeia, pelo menos vou tomar meu último banho quente! - Ela pensou, enquanto caminhava até a banheira.
- Goblins não se alimentam de magos - a mesma voz que tinha falado em sua mente disse, agora de dentro do quarto, a fazendo se assustar e olhar ao redor. Uma Goblin, que aparentava ter muitos anos, por suas rugas, estava sentada em uma poltrona perto da porta, como se estivesse ali o tempo todo -, e eu sou velha sim, mas não sou uma Goblin, pelo menos, não totalmente. Acredito que o termo correto para a minha espécie, seria Hobgoblin.
- Você, digo, a senhora pode ouvir o que eu estou pensando? - Cathe perguntou, envergonhada por ter pensado que ela era velha - Me desculpe, eu não quis ofender.
- Não se preocupe, querida - disse a senhora de pele vermelha que, ao levantar-se, parecia ter mais de um metro de altura, e pelo seu andar, parecia realmente ser bem avançada em idade -, demore o tempo que quiser no banho, e depois, venha até a minha cabana para tomarmos café e conversarmos um pouco.
A imagem da senhora se desfez, mostrando ser apenas uma projeção, e Cathe ficou admirada com aquela magia, que mesmo ela, tendo olhos e sentidos bem treinados, não conseguiu diferenciar da realidade.
Caminhando até a banheira, ela se despiu e entrou, sentindo a água quente ativar suas terminações nervosas e se deixou relaxar, afundando todo corpo. Por um instante, apenas ficou ali, de olhos fechados e sem pensar em nada, mas sabia que devia estar pensando em algo, aliás devia estar pensando em muitas coisas.
Ela foi treinada para ficar alerta o tempo todo, mas ali naquela aldeia, estava estranhamente relaxada, como se estivesse em casa. Ela havia ido ver como o jovem vampiro estava, mas acabou se envolvendo em uma batalha contra Ogros e as flechas que disparou para salvar o Goblin e o Bugbear, tinham custado toda a sua energia, por isso ela deve ter apagado e as criaturas a levaram para a aldeia deles, provavelmente para retribuir o favor.
Mesmo estando no Mundo sombrio, em uma aldeia cheia de criaturas que os Magos consideravam inimigas, ela não conseguia se sentir ameaçada, e isso a incomodava, porém, nem esse incômodo a tirava desse estado de relaxamento e tranquilidade. Terminando de tomar o banho, ela se secou e se vestiu, e decidiu aceitar o convite da anciã, indo até a casa dele para um café da manhã.
O tempo no Mundo Sombrio passava de modo diferente de como passava no Mundo humano, e mesmo ali sendo de manhã, não sabia que horas seriam no Mundo humano. Ela tinha saído de casa por volta das dez da manhã, e quando chegou no Mundo Sombrio, parecia fim de tarde, então devia ser início de noite lá, e Cody deve tê-la procurado para acompanhar seu treinamento, e agora estaria furioso e preocupado, mas nem a imagem de seu irmão possesso com seu sumiço conseguiu tirá-la de seu estado de torpor.
Do lado de fora da cabana, ela viu uma aldeia bem organizada, com cabanas bem feitas e passagens bem definidas, como ruas entre as casas. Parecia uma pequena cidade e os jovens Goblins e Bugbears brincavam alegremente, correndo por todos os lados e pulando no belo lago que ficava no centro e era alimentado por um pequeno rio que cortava a planície.
- Como podem dizer que essas criaturas são perigosas? - ela perguntou a si mesma, em pensamento, imaginando que os magos invadiram aldeias como esta e aniquilaram todas as criaturas.
- nós somos os verdadeiros monstros afinal! - ela concluiu, em voz alta dessa vez.
- Salvadora de Borgg e Grigg não é monstro - ela ouviu uma voz grave, e ao se virar, viu o Bugbear e o Goblin que tinha salvado antes de desmaiar - ela combate os monstros, e salva as criaturas boas.
- Meu amigo grandão está certo - o Goblin no ombro de Borgg disse, fazendo uma pausa ao lembrar que não sabiam o nome dela -, aliás, não sabemos o seu nome.
- Eu sou a Cathe - ela disse sorrindo -, e vocês são Borgg e Grigg, né? Obrigada por me trazerem pra cá!
- Borgg não podia deixar salvadora lá na floresta - o grandão simpático disse.
- A anciã acabou de buzinar aqui na minha mente para a levarmos até a casa dela - Grigg disse -, então é melhor irmos. É aquela casa grande lá no alto.
Cathe seguiu com eles, pensando que precisava contar para Cody que aldeias assim existiam, e que precisavam rever os conceitos dos magos. Muitas criaturas só queriam viver e a conduta antiquada e métodos de caçada adotados por eles eram injustos e cruéis.
Ela entrou na cabana, mas Borgg e Grigg ficaram do lado de fora. Ao que parecia, a conversa entre elas tinha de ser particular. Uma mesa redonda com duas cadeiras estava disposta no meio da grande sala, com bolos e pães, mas a anciã não estava.
- Sente-se e coma, por favor, querida - a senhora disse em sua mente -, estou terminando de passar o café, e já me junto à você.
Ela se sentou e se serviu de uma fatia de um bolo, que gostou, mesmo não identificando de que era feito, e que na verdade preferia não saber, já que estavam no mundo sombrio e não sabia dos hábitos alimentares dali.
- Eu imaginei que gostaria do bolo de nozes silvestres - a senhora disse, aproximando-se da mesa com duas xícaras de café, colocando uma na mesa à frente de Cathe e se sentando na cadeira vazia -, foi o preferido dela também.
- É incrível esse poder de manipular as emoções de outrem. Eu refleti um pouco e deduzi que só pode ser a senhora que está fazendo com que eu me sinta tão tranquila assim - a jovem disse, após dar um gole na bebida quente.
- Você é realmente formidável, Cathelyn Storm - a mais velha disse sorrindo -, não é fácil raciocinar estando em estado de êxtase e torpor. Você está certa: eu usei essa magia em você, porque acordar em um lugar estranho não é nada legal, e queria que ficasse confortável para conversarmos sobre o jovem que veio pra cá junto contigo, e sobre a importância de vocês nessa guerra. Ela disse que você viria, e demorou um pouco, mas veio. Ela também acertou sobre a grande responsabilidade que carregaria consigo.
- A senhora poderia ir direto ao ponto, por favor - Cathe disse, agora sentindo que a magia que a tranquilizava havia sido retirada - eu agradeço pela hospitalidade e por terem cuidado de mim, mas eu preciso ir.
- Claro, mas vou deixar você fazer as perguntas - a anciã disse calmamente -, tenho certeza de que fará as perguntas certas.
- Quem é essa pessoa que previu a minha vinda? - a jovem perguntou - O que aquele vampiro recém criado tem a ver comigo? De que guerra está falando? E como podemos ter qualquer importância nela?
- Você é rápida para elaborar perguntas - a anciã disse sorrindo, como se estivesse se divertindo com a demonstração de ansiedade da jovem -, Vou começar das últimas, se me permite.
- A guerra em questão, é a que teve início, mas nunca acabou - ela continuou, após tomar um gole de café -, e agora toma novas proporções. Os demônios não são vistos mais no Mundo Sombrio, e os Vampiros buscaram novas e improváveis alianças. Nós que nos escondemos, precisaremos nos mostrar em breve e não haverá criatura nos dois mundos que poderá ficar alheia ao conflito. O jovem Matt, que agora tem o destino ligado ao seu, é uma peça importante para o destino de todos, mas não sabe disso. Caberá a você guiá-lo, mas o seu caminho também será repleto de obstáculos.
- Lendo a mente dele, eu vi algumas coisas que estão bloqueadas mesmo para ele - a anciã disse, e levantando-se, seguiu até a lareira, sendo seguida instintivamente pela jovem e ambas se assentaram em poltronas voltadas para o fogo, que se acendeu sozinho na madeira, espalhando um aroma suave, como um incenso -, umas por terem acontecido quando ainda era um bebê, outras por estarem em sua herança genética. Algumas recentes, porém trágicas demais.
- Ele foi deixado pela mãe humana, na porta da casa do um casal que o criou - ela continuou o relato, agora acompanhado de imagens que surgiam no fogo da lareira -, e teve uma infância difícil, por conta da herança genética de seu pai, que é um híbrido de demônio e Lobisomem. O que os médicos colocaram na cabeça dele, como sendo surtos emocionais, eram a criatura sombria dentro dele, querendo se libertar. De alguma forma, os Vampiros ficaram sabendo da existência dele depois de vinte anos, e foram até a sua casa, onde mataram os seu pais adotivos e os clientes da lanchonete, além de levar a irmã dele como refém.
- Isso que colocaram no pescoço dele - Cathe disse, levantando-se e se aproximando das imagens no fogo, que a anciã havia paralisado -, é uma coleira de contenção de poderes. É uma arma mágica exclusiva dos caçadores. Pode voltar as imagens no momento em que os vampiros chegam na lanchonete?
A anciã apenas voltou a imagem, e focando na entrada da loja, a jovem viu um homem careca que também manipulou os portais para que os vampiros deixassem o local. Era, com toda certeza, um mago, mas ela não reconheceu. Pelo que parecia, estava usando magia de transfiguração para mudar o seu rosto, mas usava portais sem nenhuma arma mágica ou runa, então tinha magia natural.
Agora, mais do que nunca, precisava voltar para casa, e alertar o seu irmão sobre essa aliança de magos com vampiros pelas costas dele, porém, também precisava saber mais sobre porquê os vampiros queriam o Matt, além de não deixá-lo sozinho.
- Então, agora o Matt é lobisomem, demônio e vampiro? - a jovem perguntou, sentando-se novamente - se ele se aliar aos vampiros ou aos demônios, eles ficariam imbatíveis. O Mago que está ajudando os vampiros, deve estar planejando algum golpe, mas qual será?
- A mulher que disse que eu viria era uma grande vidente, ou tinha acesso a um - Cathe continuou, após pensar um pouco - ela não disse mais nada? Talvez sobre essa conspiração no meio dos magos.
- Infelizmente não - a anciã respondeu -, mas ela acredita que você seja a única que pode lidar com essa situação. A vidente que previu essas coisas, morreu um tempo depois em uma emboscada, e isso foi tudo o que Margareth me disse.
- Margareth? - Cathe perguntou, assustada ao ouvir aquele nome - Margareth Storm?
- Sim, querida - a velha disse, segurando as mãos trêmulas da jovem, entre as suas, carinhosamente -, você se parece muito com ela, e se tornou tão forte quanto. Ela com certeza ficará orgulhosa.
- Eu não entendo porque a senhora insiste em usar verbos no presente e no futuro para falar dela - Cathe disse com os olhos marejados -, se ela também morreu naquela emboscada.
- Não, pequena - a anciã disse calmamente, se preparando para usar a sua magia de controle emocional na jovem, tendo em vista que, o que estava prestes a dizer, tiraria qualquer pessoa dos eixos -, a sua mãe está viva!
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Anjos da Resistência
Clareira na floresta - Mundo humano
Lucy e Liam ajudaram a retirar o corpo de Barth de cima de Aynne, e aos poucos o jovem desacordado foi voltando à forma hominídea.
Assim que Barth foi atingido pelas setas, as Licantras se foram, deixando claro que a missão delas era matá-lo, mas se elas foram embora após o acertarem, era porque estavam confiantes de que só aquelas setas seriam letais. Eram assassinas treinadas, mas para matar um lobisomem, mesmo na forma Glábrica, simples armas como aquelas não seriam suficientes.
- Ele não está respirando! - Lucy disse, se aproximando do rapaz inerte - Ainda tem pulso, mas tá muito fraco.
- As setas não são de prata negra - Liam disse, enquanto retirava as lâminas do corpo de Barth. As feridas eram profundas e não esboçavam nenhum sinal de regeneração -, isso é ferro normal, mas esse ferimento não quer se fechar!
Um portal se abriu no meio da clareira e dele, a Mãe saiu elegantemente, pisando na folhagem como se não tivesse peso algum. Aynne se apressou para tentar dizer algo, mas ela pediu que se calasse com um aceno.
- Eu sei a verdade agora, pequena - a maga disse, olhando para a Sìthiche que estava com um olhar preocupado -, depois conversaremos sobre isso, precisamos voltar rápido, o acampamento está sob ataque.
- A senhora precisa ajudá-lo, Mãe - Aynne disse, sentando-se perto de Barth e colocando a cabeça dele sobre suas coxas -, ele me salvou duas vezes hoje. Não posso deixar que ele morra!
- Já faz muito tempo que eu não vejo isso! - a Mãe disse apontando para as setas de ferro, que derretiam como manteiga em uma chapa aquecida - É ferro amaldiçoado por magia negra. Algum necromante enfeitiçou essas armas, então não posso salvá-lo só com minhas habilidades rúnicas de cura.
- Tem algo que possamos fazer? - Lucy perguntou, parecendo preocupada com o jovem.
- Talvez tenha - a Maga respondeu - imagino que tenham água benta e sal na bolsa. Tragam pra mim!
- Aynne, eu liberto sua natureza - ela continuou, liberando um encantamento e, imediatamente, as asas da jovem apareceram -, e preciso que use sua empatia com a floresta para encontrar Alecrim e Arruda Selvagem. Essas plantas sagradas com a runa certa, podem ajudar o espírito do jovem a combater a magia.
Aynne levantou-se e foi até o centro da clareira onde, concentrando-se, fez a vegetação crescer ao seu redor e abaixando-se, começou a sussurrar para as plantas, que entendiam o que ela dizia e respondiam, gerando nela expressões de decepção, que mostravam que as plantas não sabiam onde encontrar o que ela precisava. Até que, entendendo a mão, uma mariposa pousou em sua palma e lhe disse algo que a fez sorrir.
- Vá amiguinha - a Sìthiche disse ao inseto antes de vê-lo voar para longe -, outros amigos irão te ajudar a trazer essas plantas para mim.
A mãe iniciou o tratamento das feridas do jovem lobisomem, despejando água benta e sal nas feridas, que ferviam e espumavam com o contato dos elementos sagrados com a magia profana. A seguir, usando uma adaga, ela desenhou na pele dele, quatro runas cercando as feridas, e após recitar um encantamento, Barth voltou a respirar.
Essa melhora gerou certo alívio, mas a cura não estava completa. Os ferimentos pareciam se abrir lentamente, e se não conseguissem reverter a magia negra, ela iria consumir todo o corpo dele. Após alguns minutos, ouviram o grasnar de uma águia se aproximando e levantando-se, Aynne recebeu o animal, que pairou à sua frente com as asas abertas, e a entregou alguns ramos de Alecrim e Arruda Selvagem, conforme ela havia pedido.
Rapidamente, a Mãe fez um emplastro usando as plantas presas por um curativo em cada ferida e enfaixou todo o local. Aos poucos a respiração e pulso de Barth foram se estabilizando, mas ele permaneceu inconsciente.
- Consegue carregá-lo, Liam? - a Líder perguntou enquanto, com a adaga, fazia cortes em formas de runas, no ar à sua frente, para conjurar um portal - Precisamos ir, Vyk não irá segurá-los por muito tempo!
- Consigo, sim! - o lobisomem disse, colocando Barth nos ombros.
Imediatamente, eles entraram no portal, que se fechou em seguida.
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