XII. DEPOIMENTOS
O primeiro a chegar para dar seu depoimento foi Ernest Thurman. Era um homem com mais de setenta anos, no entanto, parecia dez anos mais jovem. Usava óculos discretos, típicos de avó, e os cabelos brancos como a neve fresquinha na primeira geada do inverno. Porém, qualquer sentimento de pureza parava aí.
Na sala de interrogações, os detetives compartilhavam o lado esquerdo da mesa. Embora fosse comum a prática de dividirem os papéis de bom x mau policial, os dois não estavam para brincadeira. O surto de Isabelle Stuart durante o velório lembrou mais uma vez que quem fez aquela barbaridade estava à solta.
Ernest tinha um álibi, estando ele em Kansas City à espera dos Stuarts para a reunião. Ainda assim, seria ingenuidade dos detetives acreditar que o assassinato não fora feito por profissionais, os quais sabiam o horário exato para interceptar a família. Quem, a não ser aqueles que os acompanhavam, saberiam daquela brecha na segurança?
— Então o senhor trabalha com os Stuarts desde a antiga presidência? — indagou Richard enquanto lia as anotações feitas mais cedo.
— Sim, desde que o pai de Chad assumiu a presidência e comprou a Cerquilha dos antigos donos — confirmou Ernest — é uma pena que tenham ido tão cedo. Que tragédia!
— O senhor Stuart tinha muito inimigos, senhor Thurman? — perguntou Peter, quem o olhar nunca se apartava de Ernest.
— Não que eu saiba, detetive — disse ele. — Digo, concorrentes não são inimigos, não é? Além do mais, eles compraram quase toda a concorrência.
Os detetives trocaram um rápido olhar em silêncio, confirmando que seus pensamentos vagavam para o mesmo caminho.
— Talvez… — iniciou Ernest, buscando a atenção dos policiais. — ...eles sejam amaldiçoados?
Peter piscou em silêncio tentando entender qual era o objetivo de Thruman.
— Por que diz isso? — inquiriu Richard.
Com um sorriso de quem estava feliz em ter a atenção voltada para si, Ernest disse em tom conspiratório:
— Os pais de Chad morreram em um acidente de carro quando ainda eram muito jovens. Uma tragédia! E mais essa? Acho que é maldição.
Richard bufou achando aquilo totalmente descabível, porém Peter manteve-se em sua análise da fala.
— Eles tinham inimigos? — perguntou Bane.
— Não sei dizer, mas com certeza não tinham boa fama de família perfeita como Chad e Gemma tinham — disse Ernest.
A próxima a entrar foi Lee Kyung-Soon. Descendente de imigrantes coreanos, a mulher era estonteante. Seu andar revelava que ela não seguia, e sim era seguida. Peter pode perceber até mesmo Richard afrouxar sua gravata azul diante dela.
Logo quando foi indagada sobre a morte dos patrões, Kyung-Soon mostrou-se tão fria e meticulosa quanto era de se esperar de uma grande executiva. Após desejar pêsames a ninguém em particular, a mulher teceu comentários sobre o impacto que a tragédia havia dado nos negócios.
Enquanto Lawrence anotava o quão calculista a senhorita Lee era, Bane observava as pequenas características de quem estava frustrada com o que havia acontecido. Tinha um leve pesar em suas palavras, embora fosse por motivos anormais.
— E o que você acha que acontecerá com as empresas após esse desastre? — indagou Peter sem muita pretensão se parecer interessado.
— Isabelle é uma mula, nunca teve metade do brilhantismo do irmão — respondeu a mulher olhando para suas unhas recém pintadas de vermelho. — Estarão no lucro se ela não enfiar todos a falência. Se for esperta, deixará para quem sabe comandar a empresa.
— Então, a empresa será vendida…
Lee deu um bufo de descaso.
— Duvido muito — disse ela. — É mais fácil casar-se com Russel e entregar tudo nas mãos dele. A estúpida tradição dos Stuarts nunca permitiria que ela desistisse das empresas que possui.
— Que tradição? Do que você está falando? — perguntou Richard confuso.
— Ah, vocês não sabem? — disse em tom zombeteiro. — Os Stuarts têm uma tradição onde o mais velho e o cônjuge serão presidente e vice da empresa, não importa quem sejam. Além do mais, todos os filhos devem estar envolvidos direta ou indiretamente. É um grande negócio de família.
Foi pensando naquela tradição que os detetives interrogaram Elliot Russel no final da tarde. Era visível a diferença do homem que estava no hospital acalentando a noiva com o homem que entrou na sala. Elliot poderia manter a postura de quem dominava o cômodo e a grife de quem comandava e não era comandado, no entanto seu olhos gélidos eram marcados por pequenas bolsas vermelhas de quem não dormiu muito bem e chorou mais do que o esperado. Ainda assim, seu tom de voz era indiferente diante das perguntas sobre como havia sido os dias em que estavam à procura dos Stuarts.
— No começo, achei que eles haviam tido problemas com o carro ou algo do tipo. Nunca entendi muito bem porque eles resolveram ir juntos e sem nenhum segurança, como se fosse uma viagem em família… — disse Russel com um olhar longínquo. — Não duvido que tenha sido essa a intenção de Chad. Há tempos que ele tentava reunir a família para isso, mas Isabelle sempre foi resoluta nesse quesito. Muita coisa mudou desde que ela começou a trabalhar de verdade na empresa.
— Há quanto tempo estão juntos? — perguntou Peter mais curioso do que pretendia.
— Três anos.
— Ela já trabalhava na empresa integralmente?
— Não, ela abandonou a carreira de artista plástico há dois anos. Nos conhecemos em um jantar da família por meio do pai dela.
— Ele era seu mentor?
Elliot balançou a cabeça concordando.
— Um pouco mais do que isso. Chad pagou minha faculdade mesmo sem me conhecer muito bem — acrescentou com um sorriso melancólico. — Eu era apenas um órfão na Fundação Halo e ele me aceitou quase como um filho.
— Você tinha problemas com Anthony, o filho mais velho? — indagou Lawrence entrando no diálogo.
— Não, éramos bastante próximos na verdade. Digo, apesar de me encaixar em sua família, ele ainda era o herdeiro e era tratado como tal — explicou Elliot despretensioso.
— Qual é a perspectiva que você tem em relação da empresa agora? — perguntou Bane.
Russel lambeu os lábios e olhou para o chão, pensando um pouco. Só depois levantou o olhar para afirmar:
— Não faço ideia. Belle poderia muito bem fazer um bom trabalho se ela não estivesse tão traumatizada — lamentou o homem.
Estava anoitecendo quando despediram Elliot. Richard e Peter decidiram fazer hora extra, embora a perspectiva de compartilhar mais tempo com Lawrence não fosse nem um pouco atraente para Bane.
Andando por entre os corredores da delegacia, Peter achou sua nova mesa que era um pouco menor que a antiga. Sentou-se na cadeira cansado e começou a organizar os papéis que estavam jogados aleatoriamente pelo birô.
— Peterzinho do meu coração, vai pedir o que para jantar? Estou ligando pro Taco Bell.
Cansado e impaciente, o detetive esfregou os olhos diante da animação de Daniel Stifler, quem nunca, em momento algum, perdia a animação. Ele era como uma criança que nunca cansava de brincar.
— Taco Bell é uma droga, prefiro Chipotle.
— É, mas prefiro ir lá escolher do que falar no telefone… — justificou Daniel — A não ser que queira fugir um pouco daqui.
Peter fitou Stifler e entendeu suas segundas intenções. Ponderando se valia à pena sair da delegacia, o detetive viu Sam piscando para ele de longe e chamando-o com a mão.
Por último, sua barriga roncou pedindo comida, e a resposta positiva escapou de sua boca.
— Aonde você está indo? — inquiriu Lawrence segurando Bane pelo ombro assim que o encontrou cruzando o corredor para a saída.
— Comer — respondeu continuando a andar para frente.
— Mas eu já pedi pizza.
— Já comi pizza essa tarde, Lawrence. Desculpe-me se meu estômago é um pouco mais exigente do que o seu — replicou Bane.
Percebendo que o parceiro não mudaria de ideia, Richard apelou:
— Irei relatar ao Capitão.
Peter levantou a sobrancelha zombeteiro:
— Então diga a ele que mandei uma abraço.
No jantar, sentados entre as mesas vazias, já que boa parte dos clientes chegariam em minutos depois, Peter manteve-se naturalmente quieto. Stifler, quem sempre fora falante, não parava de dissertar sobre um novo anime japonês que assistia. Chamava-se Bungo Stray Dogs e tinha personagens baseados em famosos autores japoneses. Samantha ria e fazia perguntas para que ele continuasse a falar, embora não estivesse realmente interessada naquele assunto. Ela era assim: gentil e compreensiva, mesmo quando a pessoa que estivesse falando fosse extremamente irritante.
— Está bastante silencioso hoje, Peter. Aconteceu alguma coisa? — perguntou Sam de repente.
— Só estou pensativo — explicou ele enquanto mexia seu copo com chá gelado. — Os depoimentos me levam a um caminho, mas algo me diz que não é exatamente isso.
— Ah, é o caso dos Stuarts? — o detetive assentiu. — Que caminho?
— Ei, Bane, tenho uma coisa para te contar — atrapalhou-a Daniel, incomodado por não ser mais o centro das atenções. — Eu falei com a médica legista hoje de tarde e…
— Finalmente pediu ela para sair? — completou Peter com as sobrancelhas arqueadas.
Ele fez uma careta em resposta.
— Eu não gosto dela desse jeito.
— Ótimo, porque namorar gente do trabalho é estranho depois que termina — argumentou Sam piscando logo em seguida para Peter que ria.
— Vocês estão mudando o assunto da conversa — reclamou Stifler irritado. — O que eu vou dizer é muito importante.
— Igual quando você palestro por uma hora sobre bungo-stray-alguma coisa? — indagou Peter adorando aquela brincadeira de deixar o amigo vermelho de ira.
— Você é terrível, Peter — advertiu Sam escondendo a risada com um guardanapo.
Daniel fechou a cara como uma criança.
— Vai, Stifler. Fale. — incentivou o detetive.
O perito soltou a respiração dos pulmões inconformado e, então, disse:
— Saiu os resultados do DNA de uma garrafa de água, salgadinho e outros lanches que estavam lá. Acho que quando você voltar estará tudo pronto — explicou ele, sendo prolixo, como de costume.— O que realmente me intrigou foi que todos eram da Isabelle Stuart.
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N/a: Eita! Será que temos agora um bom caminho para achar o culpado? O que acham? Quem deve ser o verdadeiro responsável pela morte dos Stuarts?
Comente! Sua opinião é super importante.
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