• CAPÍTULO 4 •

SÁBADO, 9 de maio de 2020.

CHARLIEE, O RECEPCIONISTA, ERA UM AMOR. Havia descoberto isso quando o senhor de meia idade me viu e correu para perguntar se eu estava bem. O que aparentemente eu não estava.

Olhei para a frente, ainda atônita. O que tinha acabado de acontecer? A resposta ainda era a mesma. Alguém havia armado para mim, e eu havia encontrado uma segunda carta dentro da minha bolsa naquela manhã.

Não sabia como ela havia parado alí, uma vez que antes do interrogatório da polícia, não havia nenhum rastro dela.

A única diferença entre a segunda carta e a primeira, era que agora, a remetente se auto-intitulava Cinderela, e disse que em breve, a gata borralheira teria um final feliz; que infelizmente seria muito doloroso para mim se eu não me afastasse da empresa onde eu estava nesse exato momento.

Antes de deixar a sala, Charliee dissera que meu irmão estava em reunião, mas que pediria ao patrão, vulgo Victor, para avisá-lo de que eu estava aqui.

Trinta minutos depois, um Ian desesperado e um Victor preocupado chegaram na sala, perguntando o que havia acontecido.

Mas a adrenalina parecia ainda estar acumulada, mas não espalhada pelo meu corpo, me deixando em um estado facilmente descrito como...

Ouvi um grito, e um soco na parede, o som emitido fora um audível estalo, e eu sabia que possivelmente, algumas articulações do meu irmão sofreram um considerável dano com o golpe.

- O que você tem na cabeça, Amélia? - Meu irmão gritara. - Você chega aqui acabada, parecendo um zumbi, daí eu olho pra você e claramente você saiu escondida! E pra piorar, você não diz porcaria nenhuma sobre o que aconteceu e fica olhando pro nada.

Me encolhi na cadeira, meu irmão nunca havia explodido daquela maneira em frente à mim. Sabia que os funcionários possivelmente já deveriam ter lidado com diversos surtos como aquele, mas ainda assim, senti que a preocupação em sua voz era genuína, e que possivelmente, sua raiva era proveniente apenas da frustação. Eu nunca o havia decepcionado por algo assim, e isso também me afetara.

- Chega Ian. - Victor o cortou. - Sua irmã errou se saiu sem lhe avisar, mas ela tem idade o suficiente para ir a uma festa sem precisar da sua autorização. - O mesmo respirou fundo, conforme seu peito subia e descia lentamente, indicando que o mesmo também se controlava para não elevar sua voz. - Você não acha que está sendo duro demais com ela, quando nem sabemos o que de fato aconteceu?

A cadeira parecia ainda menor conforme eu me encolhia em posição fetal, avistando Ian puxando o sócio para fora do escritório, o que não adiantara muito, uma vez que a voz de Victor era mais do que sonora, e acreditava eu que todo o saguão daquele andar podia escutá-lo.

- Olha o estado da garota! Ela já tá assustada o suficiente e você ainda fica gritando com ela. - Pronunciou o sócio de meu irmão.

Apesar de estar dando-lhe um sermão, a súbita elevação do mesmo me impulsionou a continuar calada ainda mais, e sem que eu percebesse, as lágrimas corriam soltas pelo meu rosto, denunciando meu arrependimento e nervosismo.

Eu me sentia como um gatinho.

Um filhote gatinho que quase havia sido atropelado por um carro e havia sobrevivido por milímetros de ser pego. Tudo o que aquele gatinho queria naquele momento era que a mamãe gato estivesse ali e miasse que tudo ficaria bem.

Mas infelizmente a mamãe gato não se importava com seus filhotinhos, e só queria saber de pular de telhado em telhado, procurando novos parceiros.

- Você tem razão. Me desculpe, eu não sei mais o que fazer. É a primeira vez que algo assim ocorre, a garota voltou em um estado que eu nunca vi antes! No máximo, eu só a vi acabada das noites em que ela virava, estudando para as provas. - Meu irmão sentou ao meu lado, secou minhas lágrimas e me abraçou. - Aquela menininha é a minha maior responsabilidade, Victor, e vê-la daquele jeito, é como se eu decepcionasse toda a expectativa que eu mesmo coloquei sobre mim, para cuidar dela. - Ian falava, conforme ambos se aproximavam novamente da sala onde eu me encontrava.

Respirei fundo, conforme começava a me preparar psicologicamente para levar outro sermão sobre responsabilidades, e senti que novamente as lágrimas ameaçavam brotar dos meus olgos. Pra mim, a pior parte de tudo aquilo nem havia sido a conversa com o promotor, mas sim decepcionar meu irmão. Em algum lugar de mim, uma vozinha gritava para nunca mais ouvir as loucuras de Miriam.

Conforme ambos voltaram para a sala, e uma moça muito amigável me trouxe uma água com açúcar, comecei a narrar os acontecimentos daquela noite, de maneira a detalhar até mesmo a conversa que eu havia tido com o oficial de justiça. Protamente, logo que terminei a sequência de fatos, Ian e Victor conversavam entre si, ameaçando falar com o promotor, enquanto eu dizia que só não queria mais nenhum problema.

- Victor, eu ainda tenho mais uma reunião com os investidores, não vou conseguir cuidar dela agora. Você pode levar ela pra casa? Assim que eu terminar com eles, eu vou direto pra lá.

- Ok. - O impotente CEO estendeu a mão para mim. - Vamos florzinha, eu te deixo em casa.

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Victor me perguntara se eu queria que o mesmo ficasse por ali, mas eu negara, e lhe disse que não gostaria que o mesmo cancelasse alguns de seus compromissos para cuidar da irmã de seu sócio, e praticamente tive que enxotá-lo de minha casa, algo que fora extremamente difícil.

Meu quarto parecia frio, quando adentrei o mesmo. Não sabia se era eu, ou se as paredes pareciam sem vida demais. Já planejava redecorar algumas coisas eu meu quarto, e decidi que queria algo que remetesse à paz.

Setei um lembrete para comprar tintas para pintar as paredes do mesmo, esse era um projeto que poderia me ajudar a espairecer; e fui para o chuveiro. Tirei todo o resquício da noite anterior de mim, e conforme secava meu cabelo, olhei no espelho vendo uma versão apática de mim.

Esperava ao menos que fosse forte o suficiente para me manter firme, e não me deixar traumatizar quanto àquela experiência. Ao menos era uma história que no futuro seria engraçada, e que poderia render uma boa prosa com meus amigos.

Apenas esperava que eu visse aquilo como engraçado mais rápido do que imaginava que levaria, o que certamente não era pouco tempo.

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