02 × Entre vidros e reflexos
Para uma escola que tinha mais vidro e aço do que qualquer prédio naquela cidade, o lugar era praticamente uma passarela de prestígio — e Blair sabia disso desde o primeiro dia. As paredes de vidro espelhado deixavam que a luz natural invadisse os corredores, refletindo o brilho de um ambiente quase teatral. Não era só um colégio; era um espetáculo arquitetónico que servia como palco para uma elite jovem e, claro, para os que aspiravam pertencer a ela.
Os corredores eram largos, com murais artísticos e instalações quase sempre mudando. Cada exposição era uma declaração do talento dos próprios alunos, afinal, a escola tinha um padrão a manter. E o que dizer dos laboratórios? Uma pequena utopia acadêmica: robótica, biotecnologia, o suficiente para fazer qualquer um se sentir num centro de inovação futurista. Os mais audaciosos se arriscavam nos projetos de química avançada; outros preferiam explorar o estúdio de música, onde o som de guitarras ecoava nos intervalos — uma trilha sonora improvisada que parecia dar ao lugar uma atmosfera de filme de meados dos anos 2000.
Mas a escola era mais do que apenas ciência e arte. A quadra de basquete ao ar livre era quase uma catedral ao esporte, onde aconteciam competições que pareciam finais de campeonatos, com uma plateia que mais lembrava uma torcida organizada de série de TV. E o ginásio? Perfeitamente iluminado e com arquibancadas que faziam qualquer aluno sentir-se em um verdadeiro estádio. Era ali que os holofotes se voltavam tanto para eventos esportivos quanto para as grandiosas apresentações e atividades interdisciplinares.
Blair caminhava pelos corredores com sua habitual bolsa atravessada no ombro, os passos rápidos tentando acompanhar o fluxo quase coreografado dos alunos. Naquele colégio, até os intervalos pareciam organizados por algum comitê invisível de estilo. Cada clique de sapato no piso polido era uma nota numa melodia que Blair, há tempos, parou de tentar seguir.
Avistou Kayla encostada em uma das colunas de vidro, mexendo no celular com a típica expressão de quem acabara de capturar um segredo. O coque bagunçado prendia seus cabelos de forma despretensiosa, mas nem isso conseguia desviar a atenção do corpo impecavelmente curvilíneo que atraía olhares onde quer que ela fosse. Com seios fartos e um rosto de revista, Kayla parecia personificar o ideal inalcançável do colégio. No entanto, Blair sabia que havia mais sob aquela superfície reluzente. Por trás do sorriso fácil e da postura confiante, escondia-se uma mente afiada e estratégica que poucos tinham a inteligência de reconhecer, preferindo subestimá-la como "apenas mais uma garota bonita".
Kayla ergueu os olhos do celular ao notar Blair se aproximando, um sorriso travesso se formando instantaneamente.
— Você não vai acreditar no que acabei de ouvir no corredor de literatura. — Sua voz baixa e cheia de malícia sugeria que o segredo era bom. Empurrando os óculos para o topo da cabeça, ela conseguiu, com um só gesto, intensificar o ar de despreocupação calculada que parecia ser sua marca registrada. — A festa do Dave vai ser temática. Algo como "Hollywood dos anos 90".
Blair ergueu uma sobrancelha, intrigada. Dave Stone. O nome por si só já carregava uma aura de controvérsia. Irmão de Lisa, ele era tudo o que sociedade amava odiar: egocêntrico, depravado, e o tipo de garoto que parecia viver sem consequências. Ele era também o atual passatempo de Kayla Telles.
— Porque soa como a desculpa perfeita para ele ostentar alguma coisa ridícula, tipo aquele blazer de veludo vermelho?
Kayla soltou uma gargalhada rápida, cristalina e envolvente, do tipo que fazia todos ao redor notarem sua presença.
— Não me surpreenderia nem um pouco! Ele tem esse talento para transformar extravagância em arte... ou em algo cômico. — Ela deu uma piscadela, apoiando o quadril contra a coluna enquanto voltava a digitar no celular.
Sim, Kayla era uma garota multifacetada. Mesmo com sua inteligência notável — uma habilidade rara e quase oculta de dominar linguagens de programação, algo que ela nunca anunciava publicamente —, ela também desejava intensamente os prazeres mundanos e o romance proibido que vinham com a adolescência. Era como se ela equilibrasse esses dois lados de sua personalidade com uma maestria que deixava Blair intrigada.
— Hollywood dos anos 90, sério? — Blair repetiu, com um toque de sarcasmo, enquanto sentava no banco próximo. — Nada diz "festa adolescente" como uma dose de nostalgia que ninguém aqui viveu.
— Exatamente. — Kayla sorriu, inclinando-se levemente. — Mas, se você for, juro que não deixo ninguém te empurrar na piscina.
Blair revirou os olhos, mas o canto de sua boca ameaçou formar um sorriso. Kayla era fútil quando queria, e intensa quando necessário. E talvez fosse isso que fazia dela tão fascinante: uma contradição em movimento, sempre pairando entre a profundidade e a superficialidade, sem nunca se comprometer completamente com nenhuma das duas.
— Pelo menos ele é divertido. Às vezes. — Kayla comentou, com um tom casual que escondia uma intenção a mais por trás. Ela sabia que Blair perceberia, o brilho provocativo nos olhos deixando claro que estava pronta para o jogo.
— Certo, e quando você cansar da diversão, o que vem depois? — Blair perguntou, inclinando a cabeça e cruzando os braços.
Kayla soltou uma risada, leve e cativante, enquanto ajustava a alça da mochila em seu ombro.
— Ah, Blair, querida, eu não sou do tipo que se cansa fácil. — Ela respondeu com um sorriso travesso, pegando Blair pelo braço e puxando-a suavemente para caminharem juntas na direção do refeitório.
O movimento foi tão natural quanto a conversa entre elas. Mesmo com a diferença de personalidades, havia uma harmonia peculiar em suas interações. Apesar do comportamento despretensioso de Kayla, Blair sabia que havia algo mais em sua relação com Dave. Não era apenas sobre atração ou popularidade, isso Blair tinha certeza. Talvez fosse a tentativa inconsciente de Kayla de se rebelar contra o rótulo que a perseguia, o estigma de ser apenas "a garota bonita". Ou talvez fosse a forma como Kayla parecia enxergar o mundo — como um grande jogo.
Enquanto Blair Antunes empurrava a bandeja pelo balcão do refeitório, sentia-se envolta em um deja vu tedioso. O arroz seco, o feijão sem tempero e a carne que parecia ter sido cozida mais por obrigação do que por vontade formavam o prato de sempre. O pedaço de bolo, que deveria ser um consolo, parecia mais borracha do que sobremesa. Ela pegou também um suco de caixinha, porque, afinal, era melhor não arriscar no refrigerante.
Kayla, ao seu lado, pegava sua comida com uma leveza irritante. Escolheu batatas assadas, carne e uma salada que, nas mãos dela, parecia sofisticada, apesar de claramente ser o mesmo repolho miserável que Blair ignorava. Kayla sempre tinha esse talento irritante de transformar o mundano em algo digno de atenção.
As duas se acomodaram em uma mesa próxima às janelas, onde a luz do sol aquecia a superfície desgastada de madeira. O sol atravessava as janelas do refeitório em feixes inclinados, iluminando as partículas de poeira que dançavam no ar. Blair fitava a luz dourada no tampo da mesa enquanto empurrava o arroz seco no prato. Ao seu redor, as vozes e risos dos colegas formavam um pano de fundo indistinto, como o zumbido de uma colmeia.
— Então... eu tenho uma ideia. — Kayla começou, o tom casual demais para ser inocente.
Blair ergueu os olhos, percebendo o sorriso malicioso da amiga. Largou o garfo com um leve tilintar no prato e suspirou, cansada antes mesmo de ouvir.
— Lá vem.
Kayla inclinou-se sobre a mesa, como se estivesse prestes a revelar um segredo que mudaria o rumo do dia.
— Quero que você conheça alguém. Ele é... incrível. — Sua voz tinha um entusiasmo ensaiado, mas havia algo além disso. — Acho que você realmente deveria conversar com ele.
Blair arqueou as sobrancelhas, cruzando os braços. A luz da janela caía sobre Kayla, destacando seu rosto perfeitamente simétrico, mas Blair não estava disposta a ser influenciada pela aura natural da amiga.
— Conversar? Sobre o quê exatamente?
Kayla fez uma pausa dramática, mastigando devagar antes de responder.
— Sobre você. Sobre tudo. — Ela sorriu, mas havia uma ponta de sinceridade em sua expressão que fez Blair recuar mentalmente. — Ele tem um jeito de fazer as pessoas falarem. É como mágica.
Blair riu baixinho, balançando a cabeça.
— E por que você acha que eu preciso disso? Eu já falo. Com você, com o Mathew...
— Por favor, Blair. — Kayla a interrompeu com uma risada curta, mas sem perder a firmeza. — Você não fala. Você finge que fala. Especialmente com o Mathew. E comigo... bom, você enrola.
O riso de Blair morreu rapidamente. Pegou o suco e deu um gole, tentando não reagir, mas sentindo a familiar defensiva subir.
— Não enrolo. — respondeu, soando mais rígida do que queria.
Kayla não se abalou. Pousou o garfo na bandeja e apoiou as mãos sobre a mesa, olhando diretamente nos olhos da amiga.
— Enrola, sim. — disse ela, séria. — Você acha que ninguém percebe o quanto evita certos assuntos?
Blair desviou o olhar para a janela, observando os feixes de luz que agora pareciam uma metáfora irritante para o que Kayla estava tentando fazer: iluminar partes dela que preferia deixar no escuro.
— Olha, eu só quero ajudar. — Kayla suavizou o tom, embora a determinação permanecesse.
Blair bufou, voltando a encarar o prato. Mexeu no arroz, agora mais como um gesto automático do que fome real.
— Kayla, eu não preciso de um terapeuta disfarçado de boa pessoa, ok?
— Não é isso. Ele não é terapeuta, nem nada do tipo. Só acho que vocês se dariam bem. Ele é diferente.
Houve um momento de silêncio entre as duas, enquanto Blair ponderava as palavras da amiga. Era raro Kayla mostrar preocupação real; geralmente, seu sarcasmo e charme mascaravam qualquer emoção mais profunda. E talvez fosse isso que a incomodava tanto. Blair se irritava com o fato de Kayla tentar penetrar as barreiras que ela havia construído cuidadosamente. Não era justo.
Quem ela pensa que é?, pensou Blair, enquanto apertava os lábios e empurrava o arroz seco no prato. Não era como se Kayla entendesse o que era perder algo e, depois, continuar vivendo como se o chão sob os pés não tivesse sido arrancado. Kayla, com seus olhos brilhantes e sorriso afiado, sempre parecia ter tudo sob controle, sempre tão segura, tão à vontade no mundo. Por que ela insistia em olhar para Blair como se fosse um quebra-cabeça incompleto?
Havia algo intrusivo na maneira como Kayla colocava suas preocupações à mesa, como se tivesse o direito de abrir as gavetas trancadas na mente de Blair e espalhar o conteúdo para examinar peça por peça. Conversar? Sobre tudo? A ideia fez Blair revirar os olhos por dentro. Não era que ela achasse que Kayla não tinha boas intenções, mas o tom de entusiasmo e a casualidade forçada faziam aquilo parecer uma invasão mascarada de ajuda.
Blair engoliu seco, sentindo uma tensão desconfortável crescer em sua garganta. Eu não preciso de ajuda, queria dizer, queria gritar. Mas dizer isso em voz alta parecia uma confissão. E ela sabia que, se protestasse demais, Kayla apenas insistiria ainda mais. Afinal, Kayla sempre soube encontrar brechas, sabia exatamente como expor aquilo que Blair mais queria esconder.
Respirou fundo, obrigando-se a manter a compostura. Podia sentir o olhar de Kayla sobre ela, avaliando-a, esperando por uma resposta que não viria. Blair queria afastar aquilo, sacudir os ombros e fazer a amiga entender que certas coisas eram intocáveis. Mas, no fundo, talvez o que a incomodava não fosse Kayla, mas o medo de que ela estivesse certa.
— Certo. — Blair cedeu finalmente, mas sua voz estava carregada de cansaço. — Mas só pra constar, eu não prometi nada.
Kayla sorriu, triunfante, mas de um jeito quase imperceptível.
— Ótimo. Não precisa prometer nada. Só... pense nisso.
Blair revirou os olhos, mas a insistência da amiga ecoava em sua mente. Não era o ato de conhecer alguém que a perturbava, mas a ideia de que Kayla achava que ela precisava disso. Como se algo estivesse quebrado. Como se ela estivesse quebrada.
Quando Kayla se levantou, ajustando o coque com um movimento fluido, ela hesitou por um segundo, parecendo menos confiante do que antes.
— E, antes que você diga qualquer coisa, estou fazendo isso porque me importo, tá? Só... pensa. — disse, a voz mais suave, antes de lançar um último sorriso e desaparecer no corredor.
Blair ficou para trás, os olhos fixos na bandeja quase vazia. A menção velada ao seu pai pairava sobre ela como uma sombra, mas Kayla não precisava dizer mais nada para que Blair soubesse exatamente o que estava por trás daquela insistência. Respirando fundo, levantou-se. Ainda havia o trabalho, e isso bastava como distração. O nome dele, fosse qual fosse, ecoava em sua mente, mas Blair empurrou o pensamento para longe. A ideia de se abrir para alguém ainda parecia uma rua sem saída. E, por enquanto, ela não tinha disposição para explorar.
Enquanto seguia para a loja de bicicletas, Blair tentava afastar os pensamentos persistentes sobre a conversa com Kayla. A Bike&Go sempre fora um refúgio, um lugar onde ela podia se perder em tarefas simples e tangíveis, longe das complexidades da vida. Assim que entrou, o som suave de uma música antiga tocando no rádio e o aroma característico de borracha e graxa deram-lhe a acolhida familiar de sempre.
As paredes da loja eram pintadas de um amarelo ensolarado, o que fazia o espaço parecer maior do que realmente era. Os quadros de bicicletas, dispostos com um cuidado quase obsessivo, criavam uma espécie de galeria improvisada. Capacetes brilhantes pendiam de ganchos como ornamentos coloridos, e a vitrine ao fundo exibia acessórios de última geração que contrastavam com a atmosfera retrô do restante do espaço.
— Blair, pode dar uma olhada nessa roda traseira? Está rangendo de novo — pediu o Sr. Milton, apontando para uma bicicleta encostada perto da porta.
— Claro — respondeu prontamente, amarrando o avental no lugar e apanhando as ferramentas que já conhecia de cor.
Sr. Milton, com seu boné desbotado e uma camisa xadrez que parecia fazer parte de seu uniforme pessoal, observava os clientes com paciência e entusiasmo, como se cada um deles fosse uma oportunidade de compartilhar sua paixão.
Enquanto Blair se agachava para examinar a bicicleta, ouviu o tilintar da campainha da porta e o som de passos apressados. Clientes vinham e iam, alguns discutindo sobre passeios ao ar livre, outros debatendo a necessidade de comprar equipamentos tão caros para simples pedaladas pela praia. O trabalho era mecânico e reconfortante. Ajustar a corrente, girar os pedais para verificar o movimento, apertar os parafusos na roda traseira. Esses pequenos detalhes, tão precisos e metódicos, davam-lhe a sensação de controle que faltava em outras áreas da sua vida.
Por um momento, enquanto o rangido finalmente cessava, ela se permitiu um pequeno sorriso. Ali, com as mãos sujas de graxa e cercada pelo murmúrio de conversas distantes, Blair sentia que tinha um propósito claro, mesmo que fosse apenas fazer uma bicicleta funcionar melhor.
Mathew respirava fundo enquanto corria pela quadra, o som das solas dos tênis rangendo contra o piso de madeira polida. O treino do time de basquete estava chegando ao fim, mas o ritmo continuava intenso. Dave, como sempre, parecia determinado a não deixar ninguém se acomodar, gritando instruções e provocando os colegas de equipe com a facilidade de quem sabia exatamente como motivá-los.
— Vamos, Grier, você está mais lento que o Bruce hoje! — Dave gritou, enquanto driblava um adversário e arremessava a bola com precisão.
Bruce, que vinha logo atrás, fez um gesto indignado, mas estava rindo.
— Ei, eu sou o cara que mantém esse time divertido, não rápido!
Mathew, apesar do cansaço, apenas balançou a cabeça com um sorriso enquanto corria para se posicionar. Ele adorava esses momentos, o suor escorrendo pela testa, os músculos queimando. Estava acostumado à rigidez. Era como uma trilha sonora constante em sua vida, tocando baixo, mas sempre presente. Os sermões do pai, as expectativas inabaláveis da mãe — tudo isso o acompanhava até mesmo na quadra.
— Então, sem você teríamos uma chance de ganhar qualquer time. — Mathew respondeu, um sorriso surgindo no canto da boca enquanto se movia com a bola.
Dave gargalhou, aproveitando a deixa para interceptar um passe e marcar mais dois pontos antes do apito final.
O treinador Martins se aproximou do centro da quadra, assobiando com os dedos para chamar atenção. Ele era um homem nos seus quarenta e poucos anos, de porte atlético e com uma voz que parecia carregar a autoridade de alguém acostumado a liderar. O boné preto já estava manchado de suor, e ele o ajustava constantemente, um gesto quase automático.
— Todos aqui, vamos lá! — disse ele, gesticulando para que os jogadores se reunissem.
Martins tinha um estilo direto, mas sabia como equilibrar firmeza com empatia, algo que conquistava respeito até dos mais teimosos, como Dave. Era conhecido por não poupar críticas, mas também por ser o primeiro a comemorar os avanços de seus jogadores, mesmo os pequenos. Ele não apenas treinava o time; parecia entender que, para muitos daqueles adolescentes, a quadra era mais do que apenas um espaço para jogos .
— Bom trabalho hoje — começou, caminhando lentamente enquanto falava, o som de seus tênis ecoando na quadra. — Mas não esqueçam: o jogo contra o Colégio Estrela não vai ser fácil. Eles são rápidos, precisos e sabem explorar falhas.
Mathew o observava com atenção. Sempre admirou a forma como Martins conseguia cativar todos, mesmo quando estava sendo mais crítico. Havia algo no jeito de falar dele — a maneira como seus olhos faiscavam ao mencionar táticas ou ao corrigir um erro — que fazia o time querer se esforçar mais.
— Quero mais intensidade na próxima semana, principalmente nos contra-ataques. — Martins olhou diretamente para Mathew e Dave, um sorriso de canto aparecendo. — E isso inclui você, Grier. Menos distrações, mais foco.
Dave levantou as mãos em um gesto defensivo.
— Foco é meu sobrenome, treinador.
Martins riu, balançando a cabeça.
— É mesmo? Então vamos ver isso em ação na próxima vez. E, Bruce, cuidado com aquelas faltas. Você está quase abraçando os caras na defesa.
Bruce soltou uma risada, acenando.
— Só sou amigável demais, treinador.
— Menos amizade e mais disciplina. — Martins respondeu, apontando para ele antes de olhar para o restante do time. — Ok, pessoal, descanso merecido. E lembrem-se: compromisso não termina aqui. Alimentação, sono e estudo das táticas. Vejo vocês amanhã.
Com isso, ele deu um último assobio, dispersando o grupo. Apesar do tom sério, havia algo encorajador em suas palavras, como se estivesse constantemente lembrando os jogadores de que eles eram capazes de alcançar mais do que imaginavam.
Mathew observou o treinador se afastar, conversando com um assistente ao lado da quadra. Sempre achou curioso como Martins conseguia equilibrar seriedade e acessibilidade. Era alguém que exigia o melhor deles, mas que também os fazia acreditar que eram capazes de entregar esse melhor.
Enquanto saíam da quadra, os passos ecoando no piso brilhante, o calor que impregnava suas roupas fora substituído pelo frescor do sabonete de lavanda, ainda perceptível na pele após os rápidos banhos no vestiário. Os cabelos de Mathew, ainda úmidos, caíam desordenados sobre a testa, enquanto Bruce ajeitava a gola da camisa com um gesto casual. O ambiente, antes preenchido pelo som das bolas quicando e os gritos do técnico, agora parecia mais leve, quase silencioso, exceto pelo farfalhar dos tênis contra o chão.
Na lateral da quadra, Lisa e Jade estavam encostadas na grade, um contraste gritante com o esforço evidente dos jogadores. Lisa parecia impecável, o rabo de cavalo alto sem um fio fora do lugar, o vestido casual que combinava perfeitamente com os tênis brancos novos. Ela sabia exatamente como estar em cena sem parecer que havia ensaiado.
Ao lado dela, Jade exibia uma postura igualmente confiante, mas com um ar mais relaxado. Seus cabelos escuros estavam soltos, caindo em ondas perfeitas, e o vestido azul que usava acentuava seu estilo refinado. Ambas pareciam intocadas pelo caos ao redor, como se tivessem surgido ali apenas para relembrar os outros de que estavam acima de qualquer desconforto.
— Finalmente decidiram aparecer. — Lisa comentou, um sorriso brincando nos lábios enquanto seus olhos analisavam os jogadores, parando por um momento em Dave antes de seguirem para Mathew.
— Achei que ia precisar entrar na quadra pra te tirar de lá. — Jade acrescentou, direcionando seu comentário para Bruce com um tom provocador.
Bruce, que ainda mexia na barra do uniforme, riu com a naturalidade de quem já estava acostumado às provocações de Jade.
— Se quisesse tanto assim me ver, era só falar, Jade. — Ele rebateu, piscando para ela.
Ela revirou os olhos, mas havia um brilho divertido em sua expressão.
Mathew, enquanto isso, aproximou-se de Lisa. O cheiro leve de lavanda misturava-se ao perfume floral dela, criando um contraste inesperado e uma consciência incômoda de sua proximidade. Apesar do cansaço, havia algo relaxante na forma como eles se reuniam, como se fossem peças de um quebra-cabeça montadas, mesmo que algumas bordas ainda não se encaixassem completamente.
— E você? Não tem nada pra reclamar de mim hoje? — Ele perguntou, com um sorriso despreocupado enquanto olhava para Lisa.
Lisa inclinou a cabeça, fingindo avaliar a pergunta.
— Ainda não decidi. Mas, se eu fosse apostar, diria que seu drible ainda precisa de trabalho.
Mathew deu uma risada curta, balançando a cabeça.
— Sempre crítica.
— Apenas sincera. — Lisa retrucou, e havia algo no jeito como seus olhos se mantinham firmes nos dele que o deixava desconfortavelmente ciente de sua presença.
— Então, vocês vão ficar parados aí ou vamos fazer algo divertido? — Jade cortou a tensão com um sorriso rápido, olhando para o grupo como quem já estava entediada de esperar.
Dave Stone, que estava mexendo no celular, ergueu a sobrancelha e guardou o aparelho no bolso, um sorriso confiante se formando em seus lábios.
— Tenho uma ideia. Mas vocês vão ter que confiar em mim.
— Confiança nunca foi seu ponto forte — Mathew riu, se direcionando a Dave.
— Relaxa, Grier. — Dave respondeu, batendo de leve no ombro de Mathew enquanto começava a caminhar. — Isso vai ser divertido.
— Isso nunca termina bem. — Mathew murmurou, mas seguiu os amigos mesmo assim. Ele sabia que, apesar de tudo, esses momentos descontraídos eram os que mais o faziam sentir que ainda fazia parte de algo, um elo que mantinha sua mente longe das pressões de casa e dos fantasmas que às vezes o perseguiam.
Ao lado, Lisa deu um passo ligeiro para acompanhá-lo.
— Está preparado para o desastre que o Dave está planejando?
Mathew riu de leve, lançando um olhar rápido para ela.
— Acho que nunca estarei.
Enquanto caminhavam juntos, ele sentiu a familiaridade daquela dinâmica. Por mais diferentes que fossem, algo na amizade deles tornava essas pequenas aventuras irresistíveis.
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