Capítulo Três

ALERTA: Bonitão na sala! – diz Edu, chegando à sua mesa cheio de urgência, todo esbaforido e com olhos sonhadores.

E me dando um baita susto bem no meio da manhã, diga-se de passagem. Finalmente o pessoal da Tecnologia conseguiu liberar meus acessos, e depois de alguns dias na cola do Edu, absorvendo informações como uma esponja, finalmente estou na minha própria máquina, fazendo meu próprio trabalho.

Ao escutar o alerta de Edu, como se tivessem sido treinadas, todas as designers do sexo feminino (e alguns do sexo masculino também) se viram de forma sincronizada, seus olhos de águia fixos na direção da Recepção, procurando enlouquecidas o tal "bonitão".

– Que bonitão, Edu? – pergunto baixinho, por que não estou entendendo nada.

– Ai, é um cara maravilhoso que ninguém sabe direito de onde veio. – responde meu colega, sem me dignar sequer um olhar, sua atenção está fixa na direção da Recepção, aguardando a entrada triunfal de sabe-se lá quem – De uns dias pra cá ele começou a dar as caras por aqui, mas ainda não conseguimos descobrir o CPF dessa divindade.

Sem entender nada, sigo o caminho de seus olhares, tentando observar seu objeto de desejo. Confesso que pela avidez coletiva não esperava menos que um Michael B. Jordan atravessando as portas de vidro, mas lá está um rapaz muito alto e bem esguio, todo engravatado, com cabelo dourado penteado pra trás e olhos grandes e claros. Todos ao meu redor suspiram em uníssono e eu franzo as sobrancelhas sem entender muito bem.

– Ô lá em casa! – Edu se abana encostando-se na baia, enquanto o sujeito conversa rapidamente a algumas mesas de distância.

Tento segurar a minha língua, já que sou nova aqui e seria uma péssima ideia contrariar todos os meus novos colegas, mas não consigo manter a boca fechada.

– Não entendi, gente. – digo, ainda com a testa franzida, observado o loiro alto gesticular durante sua conversa.

– Como é que é? – Edu desvia seu olhar de cobiça por um instante para fixar os olhos castanhos em mim.

– Não entendi por que tá todo mundo babando pelo cara. – falo sem desviar a atenção do objeto de afeição da equipe de arte, procurando o motivo de tanta comoção – Ele nem é tão bonito assim.

– Você tá de brincadeira! – agora é Cintia quem exclama do meu outro lado – Ele é praticamente um deus grego.

– Ah, gente. – digo, jogando as mãos pro céu – Pára! Ele só é loiro e tem olhos claros. As pessoas deveriam parar de exaltar esses estereótipos nórdicos e começar a dar valor pra sua própria beleza e cultura.

Quando termino meu discurso acalorado meus dois colegas me olham com as cabeças inclinadas, como se estivessem tentando compreender que loucura era essa que estava saindo pela minha boca. Depois, como se tivessem ensaiado, ambos desistem de me entender, sacudindo as cabeças ao mesmo tempo e voltando sua atenção para o suposto deus grego.

Sigo seus olhares, já que não tem nada melhor pra fazer mesmo. Durante esses dias de observação, pude perceber que o cara do Comercial, responsável pela venda dos Classificados, parece só enviar as artes dos anúncios no fim do dia, quase no horário limite do fechamento. E hoje não está sendo diferente. Preparei os layouts, posicionando os materiais fechados por pacote e agora estou no aguardo, dando uma força pra equipe.

Mas, como ninguém parece querer saber de trabalho no momento, me junto a esse estranho grupo de observadores atentos, que mais parecem um bando de pombas alinhadas nos fios de eletricidade, observando um pedaço de pão na rua. A cada gesto que o pedaço de pão faz, as pombas suspiram maravilhadas.

Porém, em dado momento, até mesmo eu sou obrigada a admitir que existe certa graciosidade e magnetismo nos movimentos daquele sujeito. Acho que finalmente percebo o que todo mundo vê no tal do bonitão quando ele começa a se afastar em direção aos elevadores. Não é que ele seja exatamente bonito, quer dizer, ele é, mas existe todo um conjunto que o faz parecer bem atraente. Talvez seja o jeito como seus lábios se movem ao formar palavras, ou então a forma cheia de confiança com que caminha, enquanto passa as mãos pelos cabelos com impaciência, jogando-os para trás. Não sei. Talvez seja o tal do sex appeal.

– E aí? – Edu pergunta, tirando-me do meu transe, quando o estranho finalmente embarca no elevador – Retira o que disse?

Existe um sorriso bem sacana em seus lábios e ele parece saber que me pegou no flagra.

– Nem a pau! – digo, sem querer dar o braço a torcer – Vamos trabalhar.

Ele gargalha com a minha mudança de assunto brusca e é acompanhado por Cintia e mais alguns colegas, todos voltando ao trabalho como se nada tivesse acontecido. Me concentro em tratar algumas imagens, que um de meus colegas pediu, mas não posso evitar vez ou outra erguer os olhos em direção aos elevadores da Recepção, esperando o retorno do deus grego. Apenas para uma espécie de pesquisa sócio-comportamental, claro.

▲▲▲

É oficial. Eu odeio o tal do William Machado!

Não que eu de fato conheça o sujeito. Nunca vi a cara dele. Aliás, nunca vi a cara de ninguém do Departamento Comercial. Edu me disse que eles são super esnobes e reclusos e nunca socializam com o pessoal do andar debaixo. Esses dias inclusive, ouvi Rebeca reclamando que eles mal apresentam os funcionários novos para as outras equipes.

Percebi uma rixa entre departamentos e acho que não posso culpar minha chefe, pois o pouco contato que estou tendo têm sido traumatizante. Já recebi um bocado de e-mails do tal William Machado, Gerente de Contas – ou como comecei a chamá-lo:  O Babaca do Comercial – de última hora, com anúncios de Classificados fechados quase fora do prazo. E essa é só a minha primeira semana no Jornal.

– Sabe, acho que talvez seja uma coisa boa que a gente não tenha muito contato com aquele pessoal do Comercial. – diz Edu, olhando pra tela do meu computador depois de escutar meu gemido de desespero.

– Acho que a Cami provavelmente jogaria uma cadeira na cabeça desse cara se soubesse quem ele é. – fala Cintia, enquanto contém uma risada em solidariedade à minha dor.

Dou um suspiro resignado. Estávamos nos preparando pra ir embora, tomar uma cerveja rápida no happy hour de sexta-feira, mas parece que vou ter que ficar até tarde de novo para reajustar o layout dos Classificados e encaixar o anúncio de última hora, antes de enviar o arquivo para impressão na gráfica.

– Você quer que a gente te espere? – pergunta Edu, também solidário.

– Ah, não precisa. – digo, resignada – Isso aqui vai demorar, fica pra próxima.

– Bom, então boa sorte aí, garota. – ele se despede – Até segunda.

– Até. – digo, enquanto abro o material para checar se está tudo em ordem.

Esse ritual se repetiu durante toda a semana, e agora entendo perfeitamente por que Edu literalmente ergueu as mãos aos céus quando eu cheguei aqui. Assisto a maior parte da minha equipe ir embora enquanto respondo cordialmente o e-mail do Sr. Sem Noção, confirmando o recebimento do material.

Minha vontade era fingir não ver nada e ir embora com meus colegas, porém  cada um desses pequenos anúncios custam mais do que 2 meses do meu aluguel, e na atual crise editorial, não é como se o Jornal pudesse se dar ao luxo de perder qualquer dinheiro. Além do mais, estou no meu período de experiência. Esse é o momento de mostrar serviço, mesmo que ficar até mais tarde impacte diretamente nas minhas contas do mês.

Morar na Capital não é exatamente barato, e mesmo economizando bastante, só um salário no fim do mês acaba não bastando. É por isso que passo a maior parte das minhas noites na frente do computador, fazendo alguns trabalhos por fora pra poder descolar uma renda extra. A questão em ficar até mais tarde no Jornal é que estou atrasando alguns freelas e não posso me dar a esse luxo.

Pelo menos finalizei todas as artes da campanha de adoção de pets da ONG de Isa na noite anterior e, no dia seguinte, vamos começar a divulgar tudo para a Feira, que deve acontecer no próximo mês. Penso em todas as coisas boas que o trabalho voluntário na ONG me trouxe: a amizade de Isa, indiretamente meu novo emprego, meus gatos e o prazer em me sentir útil, de fazer a diferença na vida desses seres tão inocentes e tão maltratados pela vida. Rapidamente minha indisposição por ter que ficar até mais tarde no trabalho se esvai.

Às vezes a gente perde tanto tempo pensando no lado negativo das coisas que acaba não valorizando os pontos positivos. A essa hora eu podia estar servindo mesas e torcendo para que os clientes pagassem os 10% do serviço na saída, mas estou aqui, fazendo o que amo e sendo paga pra isso. A vida é boa.

Suspiro, finalmente conseguindo encaixar o último anúncio na página de Classificados. Checo todo o meu trabalho pelo menos duas vezes antes de fechar o PDF e enviar para a impressão.

A sala está praticamente deserta a essa altura, salvo alguns revisores que ainda resmungam ao telefone, revisando os últimos textos. Me espreguiço na cadeira, checando o celular enquanto aguardo o e-mail de confirmação de recebimento da gráfica. É claro que tem uma mensagem de Isa me esperando:


Isa Bit:

Ganhei uma garrafa de vinho aqui na ONG
e preciso da sua expertise pra acabar com ela...

Cami S.:

HAHAHAHAHHA, só se for lá em casa.
Tenho alguns freelas pra terminar.

Isa Bit:

Você é uma amiga extremamente
ocupada agora.

Cami S.:

O Babaca do Comercial enviou os
anúncios em cima da hora de novo.
Ainda estou aqui no Jornal :(

Isa Bit:

Afff, que desagradável!
Te encontro na sua casa em 1 hora então.


Sorrio. Apesar de tudo, a vida é mesmo boa.

Alô, alô, pessoal!

Mais uma quarta, mais um capítulo fresquinho pra vocês :D

Espero que estejam gostando! Não se esqueçam de deixar muitos comentários e votos, isso impulsiona muito a minha escrita e influencia diretamente na frequência de postagem dos capítulos hehehe ;P

Bjsss e até a próxima!

Pam Oliveira

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