Capítulo Dezesseis
Inspirada pelos conselhos de Isabela, logo cedo na segunda-feira seguinte, enviei um e-mail para a caixa de entrada corporativa de Will, convidando-o para almoçar e torcendo para que a mensagem não fosse interceptada pelo pessoal do TI.
Demorei cerca de uma hora para apertar o botão de Enviar e passei os minutos seguintes tendo crise de ansiedade e respirando dentro de um saco (imaginário, claro).
Quando minha caixa de entrada apitou quase que imediatamente, com uma resposta que só poderia ser dele, demorei mais uma hora pra tomar coragem, abrir a mensagem e ler.
Foi assim que começou a nossa troca de e-mails diária.
Nas semanas que se seguiram, Will e eu passamos a trocar diversas mensagens pelo sistema de e-mails do Jornal. Sempre começava com um "bom dia" e terminava com um "almoço hoje, meio-dia?".
Não vou mentir e dizer que foi fácil no começo. Ah não, até hoje sinto um certo frio na barriga quando vejo o nome dele na minha Caixa de Entrada, mas esse contato virtual me ajudou a desenvolver conversas racionais, sem ter a presença opressora dele mexendo com meus hormônios.
E, no final das contas, Isabela tinha razão. Com o tempo, todos esses e-mails e almoços foram ficando mais fáceis, o encontro nos elevadores no final do expediente foi sendo aguardado com ansiedade e eu até mesmo passei a conseguir aceitar caronas sem surtar.
Porém, uma coisa não mudou, e agora consigo admiti-la para mim mesma, continuo terrivelmente atraída por este homem!
Principalmente depois de começar a conhecê-lo melhor. A primeira vista, sempre achei que Will fosse do tipo filhinho de papai pomposo e privilegiado e que nós dois vínhamos de mundos completamente diferentes.
Ainda é verdade que estamos à uma galáxia de distância um do outro, mas da pra perceber que, do alto de seus privilégios, ele possui uma grande consciência de classe, notada em pequenas atitudes do dia a dia, que só consegui perceber convivendo mais com ele no último mês.
Hoje sei que Will é dono de um humor singular, que possui uma desenvoltura natural e o mesmo magnetismo que às vezes vejo na própria Isa, mas, ao contrário da minha melhor amiga, Will é mais comedido. Como se guardasse certas partes de si mesmo apenas para algumas pessoas.
Sinto meu coração palpitar descontrolado cada vez que ele revela uma nova camada de si: quando fala com carinho da irmã mais nova, que está fazendo um intercâmbio em outro país, ou quando cita as peripécias do cachorro que ela lhe deixou de presente, "para que não se esquecesse dela".
O nome do bicho é Monstro e eu confesso que esperava no mínimo um Pit Bull, mas então, qual não foi a minha surpresa, quando Will sacou o celular para mostrar uma foto de seu mascote e eu dei de cara com uma cópia do cachorrinho da Paris Hilton? Um bolinha de pelos cor de caramelo, menor que um gato, e que mais tarde descobri tratar-se de um Lulu da Pomerânia.
Ao mesmo tempo em que descubro mais sobre ele, percebo que revelo mais de mim também. Coisas que somente Isabela sabia, e que tirou de mim com muito custo, vou desnudando para Will com facilidade, como meu amor por gatos e a razão de eles terem nomes mexicanos: era apaixonada por novelas mexicanas na infância; minha fascinação por tudo o que é arte, desde música R&B e Jazz à museus cheios de histórias e segredos; minhas causas sociais: da ONG de Isa até os inúmeros trabalhos voluntários que realizamos.
Não é fácil destrinchar essa parte de mim. Esse assunto está ligado diretamente ao meu passado e à minha vontade de não permitir que ninguém passe pelo que passei. De ajudar pessoas do mesmo jeito que fui ajudada a chegar onde cheguei... num lugar tão distante de onde comecei.
Não me envergonho das minhas origens. Pelo contrário, sou uma mulher preta e forte, que lutou contra todas as estatísticas e probabilidades de um país racista e preconceituoso, e considero que venci, mesmo com todas as adversidades enfrentadas no dia a dia. Tenho muito orgulho disso. Por este motivo, gosto de retribuir e ajudar quem precisa.
Mas não me sinto à vontade expondo minha história. Detesto o olhar de pena que surge no rosto das pessoas cada vez que escutam onde cresci, o que aconteceu com meus pais, onde estão meus irmãos. Não é um segredo. Mas não é algo que vou dividir facilmente, até por que não cabe numa conversa despretensiosa durante um almoço. É um assunto que evito, por que não me pertence mais. Foi superado e resolvido e procuro não mexer no que já passou.
Porém, com Will, é fácil esquecer que sou essa pessoa emocionalmente travada. Quando estamos almoçando naquele mesmo vegetariano de sempre e estou contando sobre qualquer coisa e vejo seus olhos brilharem, cheios de interesse, como se aquilo que digo fosse algo precioso, mesmo que seja algo ridículo, sinto meu coração bater mais forte e uma vontade louca de lhe contar tudo.
Amo como ele me encara com olhos brilhantes e interessados e como sorri com frequência quando está comigo. Amo como ele me faz sentir a pessoa mais inteligente do mundo e como faz questão de saber minha opinião sobre as coisas, me fazendo sentir relevante, valorizada e apreciada. E amo que agora temos piadas internas e trocamos mensagens cúmplices durante o dia inteiro.
A única coisa que não amo é a implicância sem controle e sem medida de meus colegas de trabalho. A Equipe de Arte do Jornal da Hora definitivamente não conhece limites pessoais. Eles passam metade dos dias, desde o momento em que Will pisou naquela Redação com um convite para almoçar, fazendo piadinhas e a outra metade me implorando por mais informações.
Mesmo depois de dois meses trabalhando no Jornal, meus colegas ainda não perceberam, ou fingem que não, que gosto de guardar as coisas para mim.
Claro que, depois do dia em que inventei de levar Isabela para um de nossos happy hours, algumas barreiras caíram. Todos pareceram amá-la e juntaram-se contra mim, ávidos sobre a minha vida e sobre Will.
Isa não pôde ajudar muito sobre o último, mas bastou algumas cervejinhas para que botasse a boca no trombone e me traduzisse completamente para meus companheiros. Ela falou sobre os gatos, sobre a ONG e sobre nossos trabalhos voluntários como se falasse do clima. No final estavam todos encantados, como se fossemos santas e não como se não estivéssemos fazendo mais do que a nossa obrigação, ajudando quem precisava.
Quando aquela noite terminou, recebi muitos abraços bêbados e cheios de carinho, e ainda um muito esquisito de Cíntia, que me olhava com olhos encantados e um sorriso mole no rosto, dizendo me amar mais a cada dia.
No final daquele mês eu carregava comigo mesma uma sensação de plenitude muito maior do que qualquer sentimento que já tive na vida.
Ver meus colegas de trabalho, que sinto a obrigação de chamar de amigos daqui pra frente, se dando tão bem com Isabela, foi uma espécie de validação. Mesmo que agora eles se juntem para me atormentar diariamente.
Mas a melhor sensação de todas ainda é sair da minha mesa no trabalho e encontrar um certo par de olhos azuis como estrelas me esperando em frente ao elevador, e me olhando como se eu fosse a melhor coisa do mundo inteiro.
Alô, minha gente amada!
Sei que não estamos no dia prometido (por favor, não desistam de mim ainda!) e principalmente, não estamos num horário usual, mas... EU FINALMENTE SUPEREI O MEU BLOQUEIO! Por isso senti a necessidade de vir aqui dividir com vocês esse capítulo fresquinho, que apesar de curto, é uma grande virada na nossa história... acho que já posso prometer emoções mais fortes daqui em diante!
No mais, quero agradecer todo o apoio de vocês nesse período de crise, pandemia e bloqueio criativo. Obrigada pelas mensagens privadas e por todos os comentários que deixaram aqui! Obrigada pelos puxões de orelha e por todos os choramingos no Whatsapp... é só por isso que estou aqui de novo! Vocês me forçam a escrever e a não desistir do meu sonho!
Continuem votando, comentando e compartilhando a história com seus amigos!
Bjss e até a semana que vem!
Pam Oliveira
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