Meu Novo Parceiro de Bebedeira
– Vocês sabiam que isso ia acontecer? – pergunto a Bruce, que me encara. Ele podia pensar que eu não sabia nada sobre ele e eu não sabia muita coisa mesmo, mas eu queria saber e não ia desistir disso.
– Vocês quem? – ele pergunta de volta, me testando.
Estávamos sentados no chão daquela casa, esperando a rua ficar totalmente tranquila e Amélia estava brincando com alguns ursinhos que tinha encontrado no quarto. Bruce me olhava nos olhos, sério.
– Militares. – respondo e ele dá um micro sorriso, desviando o olhar de mim e voltando a observar a rua.
– Vai começar com o papo que não dá pra confiar no governo como se eu estivesse perguntando alguma coisa? – ele pergunta ironicamente, me testando mais uma vez. Bruce claramente não se sentia confortável com esse assunto, mas eu sou um cara curioso e não vou desistir tão fácil de alcançar as respostas para cada curiosidade que eu tenho.
– Você confia no governo? – rebato e ele pensa um pouco, olhando nos meus olhos em seguida.
– Acha que se eu confiasse, teria me desligado dele para cuidar da minha família eu mesmo? – ele rebate e dessa vez quem pensa sou eu.
– Acho que não.
– Tá aí sua resposta sobre confiar neles. – ele volta a observar a rua, pensando um pouco. – Se eu não tivesse saído, minha irmã estaria morta. Ela é a minha prioridade. É tudo o que eu tenho agora.
– Por que não confia? – pergunto e ele solta um sorriso engraçado, claramente percebendo que eu não o deixaria em paz até saber tudo o que eu queria saber. Ele, então, coça a barba um pouco e me encara, sustentando seu corpo com o braço apoiado no chão.
– Você confiaria no seu emprego, se o seu emprego não te dissesse que a sua família seria atingida diretamente por algo que você foi pago e treinado pra desenvolver e controlar? – essa pergunta dele me faz gelar um pouco. Eu sou um pouco mais inteligente do que Bruce acha que sou, para perceber que aquilo não era um papo distante sobre a nossa realidade atual.
– Isso aí não é só uma pergunta hipotética, é?
– Há alguns anos, quando alguém me dizia que a China iria ser responsável por acabar com a humanidade, eu sorria. Sorria porque eu sabia que o responsável por acabar com a humanidade, na verdade, seria o poder. Estados unidos é o nome do sinônimo de poder. Espero que agora você me deixe em paz e pare de fazer tantas perguntas. Eu não aguento mais. – ele se levanta. – Vamos, Amélia...
Ela se levanta e eu vou atrás. Saímos da casa por trás dela, e continuamos andando mais abaixados que o comum, para garantir que ninguém nos visse. Os segui até certo ponto, quando tivemos que atravessar a rua. Bruce fez um estudo de panorama, se era bom atravessar ali e com o seu aval, Amélia foi na frente, comigo, enquanto ele dava cobertura e garantia a segurança dela.
Atravessamos a rua, depois de descobrirmos que não tinha nenhum zumbi passeando pela área – porque todos que estavam por ali foram seguir os ladrões – e depois Bruce voltou a ir na nossa frente, para fazer a nossa segurança. E eu queria deixar claro que eu falo "nossa", mas eu sei que é só de Amélia. Ela era importante demais pra ele, principalmente agora que o seu outro irmão estava morto.
No ritmo que estávamos indo, não demorou muito tempo até que chegássemos no cinema. Entramos andando devagar, Bruce fazia a limpa de um lado e eu de outro, até ouvir um som de gatilho no meu lado direito. Eu sabia que não podia me mexer ou essa pessoa atiraria, o que fez com que eu ficasse ainda mais chateado, por ser a segunda arma que colocam na minha cabeça em apenas um dia.
– Paradinho. – me viro bem devagar, vendo um cara com uma arma em minha direção.
– Harry, sou eu. – Bruce aparece, pouco atrás de mim.
– E ele? – o homem questiona de volta, ainda apontando a arma pra mim.
– Tá comigo. – Bruce responde e o cara abaixa a arma.
– As pessoas da sua família sempre usam armas de fogo por quê? – Bruce sorri, passando por mim. Eu odiava armas.
– Vocês chegaram... – uma moça vem até nós, abraçando Amélia, assim que chegamos no esconderijo deles. – Está bem? Foi mordida? – ela pergunta, passando a mão nos cabelos loiros da garota.
– É claro que não. Eu sou uma boa babá. – respondo e a moça me encara.
– Quem é esse? – um outro rapaz se aproxima. Passando os olhos rapidamente por aquele lugar, percebo que o grupo deles era realmente grande. Tinha cerca de 10 pessoas ali, observando nossa chegada.
– É o Dylan. Ele vai ajudar. Salvou a Amélia. – Bruce coloca sua arma sobre um dos bancos do cinema.
– Ele é médico? – o rapaz pergunta.
– Não.
– Então ele não vai ajudar. – o rapaz dá as costas, indo em direção a outro que estava sentado no chão.
– A única forma de ajudar seu irmão é enfiando uma bala na cabeça dele. – Bruce responde e o rapaz o encara.
– Eu sinto muito pelo seu irmão, Bruce, mas eu não vou matar o Spencer. – ele rebate.
– Ele foi mordido, seu animal. Não vai demorar muito até que vire um tuberculum. – Bruce explica, pegando mais uma barrinha de cereal e comendo-a, enquanto encara o rapaz que estava, claramente, irritado com ele.
– É, mas... – o rapaz tenta defender seu irmão, mas eu interrompo.
– Espera. Ele foi mordido quando? – pergunto e ele me encara.
– Se você não é médico, quer saber por quê? – ele rebate e eu sorrio.
– Porque eu... – tiro minha mochila das costas, colocando-a no chão, e Bruce fica me observando de longe, apoiado em um dos bancos do cinema abandonado. – Estudei essas coisas por muito tempo. – quando acho os papéis de anotações, me levanto e entrego os papéis para Bruce, que começa a ler com o outro rapaz.
– E daí? – Bruce me questiona, depois de ler.
– Sempre faço anotações.
– Ele foi mordido há 2 dias. – uma moça me responde e Bruce encara ela, que dá de ombros pra ele.
– Impossível. – rebato.
– É totalmente possível. – Bruce reafirma.
– Não, não é. A transformação mais demorada que eu já vi nesses 4 anos observando essas coisas durou 5 horas. E ela ficou no chão, paradinha, cheguei perto 2 minutos depois e já conseguia ver que os olhos dela estavam ficando brancos. Eu nunca vi alguém que fosse se transformar dessa forma... – explico e Bruce começa a raciocinar, enquanto me olha nos olhos.
– Dessa forma como? – o rapaz, aparentemente irmão do que foi mordido, me pergunta e eu desvio meu olhar de Bruce, olhando para ele.
– Totalmente saudável. – afirmo.
– E eu nunca vi ninguém imune a essa praga. – Bruce me entrega meus papéis, passando por mim.
– Mas ele pode ser o primeiro, Bruce. Sorte a sua de ser sangue imune nas suas veias. – com a minha afirmativa ele para de andar, se virando pra mim.
– É, mas meu pai não tinha, minha mãe não tinha, meu irmão não tinha. Acha mesmo que eu sou sortudo porque um primo é imune? Nem o pai dele era. – ele rebate, totalmente sério.
– Então você é uma anomalia genética. Tem que ser estudado, podemos tirar uma vacina dele. – digo e todo mundo começa a rir um pouco.
– Será que vão fazer o que com ele? Vai tentar matar ele, como fizeram com a Ellie de The Last Of Us? – Amélia questiona. Ela estava ali desde que toda a discussão começou, observando.
– É sério que você conhece The Last Of Us e não conhece o Arnold Schwarzenegger? – pergunto a ela, que dá de ombros.
– Você não conhece o Arnold Schwarzenegger? Como assim? – Bruce pergunta a ela.
– Não tive tempo pra gastar em filmes genéricos de ação. – Amélia rebate.
– Olha aqui... – Bruce vai falar algo, mas é interrompido.
– Gente, chega! – uma das mulheres fala, em médio tom. – Que papo é esse?
– A gente... – o irmão do rapaz mordido tenta falar, mas é interrompido.
– Eu vi o que estavam fazendo. Spencer foi mordido, o Den está morto e vocês estão mesmo debatendo sobre a Amélia, uma garota de 10 anos não saber quem é o Arnold Schwarzenegger? Chega! – ela fala com raiva, mas em baixo tom. Acho que a pior coisa pra quem é estressado é não poder gritar muito quando está com raiva.
– E a gente vai continuar a viagem? – um dos caras pergunta.
– É. Vamos. – Bruce aceita, e então a gente começa a andar até uma parte mais afastada do cinema, pouco antes da tela.
Lá estavam várias mochilas e coisas que eles estavam usando naquela parada e eu comecei a ajudar uma das moças. Ela estava grávida e claramente com dificuldade de se abaixar para pegar alguns objetos do chão, por isso eu fui pegando pra ela, enquanto ela organizava eles em sua bolsa.
– Ae, Bruce, acho que o seu amigo tá afim da Hany. – um dos cara brinca e os outros começam a rir.
Bruce não diz nada. Ele apenas me observa por alguns segundos e eu continuo ajudando a moça, cortando aquele olhar sério dele em minha direção. Quando o observo novamente, vejo que ele não está mais me observando.
– Bruce, vem aqui... tenho que trocar seus pontos. – uma outra moça se aproxima dele, com alguns suprimentos para curativos. – Trocou quando foi achar a Amélia, como eu mandei?
– Não. – ele responde e ela, de cara, fica inconformada.
– Limpou com o que eu te dei? – ela tenta novamente.
– Não. – ele responde e ela, mais uma vez, fica claramente irritada.
– E o que fez com isso? Bruce, era pra você se limpar. Se infeccionar você perde o seu braço! – ela responde e ele me observa brevemente. Ele tinha usado suas coisas em mim e eu nem podia agradecer naquele momento.
– Eu sei, tudo bem? Eu acho que perdi. – é o que ele diz, e eu volto a arrumar as coisas com a moça grávida.
– Tá, tanto faz, tira essa blusa. – ela manda e ele faz.
Quando ele tira, me revela um corpo mais definido do que eu tinha imaginado. Na parte de trás do braço, ele tinha um curativo médio e eu logo fiquei curioso para saber o que tinha acontecido.
– O que foi isso no Bruce? – pergunto para a moça grávida que eu ouvi se chamar Hany.
– Levou uma facada na última cidade pra me defender. Foi profundo, o cara quase tirou uma fatia do braço dele. – ela conta.
– Pra te defender?
– É. Eu não tinha noção que ele me protegeria. Eu sei lá, sempre achei que os irmãos dele fossem mais importantes, mas parece que depois que a gente se une, somos uma família. Ele já quase deu a vida por muita gente daqui.
– Conhece ele há muito tempo? – pergunto e ela dá de ombros.
– Não. Conheci ele depois do assassinato do meu esposo. A gente transou uma vez, foi ótimo, mas ele não gosta que ninguém chegue muito perto, então ele me afastou. – ela explica.
– O seu filho ele...
– Não, não... – ela sorri. – É do meu falecido marido.
– Entendi. – observo Bruce, que estava de costas pra mim, enquanto a moça trocava os curativos daquele machucado que ela tinha costurado.
– Mas é isso. Eu atravessei a cidade com ele pela primeira vez, quando tinha 6 meses de gravidez. Um cara interceptou a gente. Ele estava com uma faca e queria as minhas coisas. Bruce lutou com ele até estraçalhar o rapaz e eu nunca esqueci isso, até porque a forma como Bruce deixou ele me faz ter pesadelos até hoje. – ela explica, enquanto eu observo aquilo.
A menina jogava algo no machucado, para limpar, e Bruce tomava um pouco de bebida enquanto ela fazia isso, com o maxilar travado para não gritar. Eu nem conseguia imaginar a dor que ele estava sentindo.
– E o que pode me dizer dessa lição é?
– Não seja inimigo dele. É difícil, porque ele é grosseiro, impaciente e muito estressado, mas a melhor escolha não é ser inimigo dele.
– Grosseiro?
– É. – ela sorri. – Depois que transamos ele basicamente me deu "tchau e benção". Quando comecei a tratá-lo com mais carinho, ele me disse que não queria que mais gente amasse um cara que está ali para morrer por outra pessoa.
– Amélia?
– Provavelmente. Só ela toca nele para fazer carinho. É como se ela fosse o ponto fraco dele...
– Mas e o outro irmão dele? – sigo firme na minha investigação.
– Quando ele recebeu a notícia da morte do Den ele nem chorou. – ela conta, me olhando rapidamente e eu fico perplexo.
– É sério?
– É, ele voltou com o Mac lá, para olhar, e depois não disse mais nada. Apenas falou que ia buscar Amélia e pediu que esperássemos. – ela conta e eu fico me questionando o motivo disso. – Isso é uma loucura.
– Ae, Dylan... – Bruce se vira pra mim, quando a menina termina seu curativo e eu o encaro, intimidado.
– Oi. – respondo e ele sorri, provavelmente por causa da minha cara de medo.
– Vem aqui, ela vai fechar esse machucado da sua mão. – ele pede e eu me levanto, indo em passos tímidos até eles.
– Ele tá com a mão machucada? – a moça que limpou o curativo dele pergunta, e ele concorda com a cabeça.
– Tá. – verbaliza.
– Entendi. Vem... – a moça me chama e eu continuo indo até ela. – Meu nome é Kat, vou limpar você para que não corra risco de entrar nenhuma bactéria, e muito menos alguma infecção proveniente de tuberculum. – ela pega a minha mão e começa a examiná-la. – Tá até que bem limpo pra alguém que estava sobrevivendo sozinho. – ela me diz, olhando nos meus olhos e esperando que eu diga algo, mas eu não digo.
Bruce, depois de me deixar com ela, se afasta, indo até a grávida que eu estava conversando e ajudando a arrumar as coisas. Fico observando, para ver se ele gostava dela ou algo do tipo. Talvez ele fosse o tipo de cara que quando gosta de alguém tenta afastar a pessoa a todo custo e ela não percebeu.
– Precisa de alguma coisa? Como está?
– Bem.
– Certeza? – ele pergunta e ela sorri pra ele.
– Claro.
– Se sentir contrações, me avisa. – ele pede.
– Não temos um médico Bruce. Eu só espero que ela nasça e cresça bem, para conhecer você. – ela diz, segurando o braço dele, e passando os dedos por sua pele. Ele encara aquele toque e se afasta um pouco mais dela.
– Tá falando como se eu fosse o pai.
– Não é, você sabe. Mas é um bom exemplo de paternidade. – ela rebate e ele fica sério, concordando com a cabeça, como se quisesse demonstrar aquela afirmação não o incomodava.
– Ai... – reclamo a primeira espetada que ela dá na minha mão e fico com vontade de puxar. Na segunda, eu já sinto a vontade de gritar vindo, mas antes que eu chegasse no meu limite, Bruce surge com uma garrafa de vodka pra mim.
– Bebe isso. – ele me pede, entregando-me a garrafa.
– Odeio beber, principalmente sozinho. – sorrio, depois de dar um gole e ele bebe um pouco também. Eu, então, fico confuso, não conseguia entender o que Bruce queria fazer.
– Me fala da sua vida antes de tudo isso. – ele pede e me passa a garrafa. Eu, então, dou mais um gole na cachaça, assim que sinto a agulha passar pela minha carne.
– Tinha uma irmã mais velha, pais, morávamos juntos e eu tinha 14 anos. Nem tinha beijado ainda. – rimos. – E aí, do nada, me vi sozinho e tendo que fazer coisas que abomino. – entrego a garrafa para ele, que bebe mais.
– Tipo o que? Matar uma pessoa? – ele questiona, me passando a garrafa de volta. Eu, então, sorrio e bebo mais, passando a garrafa de volta para ele.
– Também, mas o que mais me incomodou foi ter que comer rato quando não tinha mais enlatado.
– Comeu cru? – ele pergunta, tentando ser simpático e eu rio, recebendo a garrafa de volta e dando mais um gole, enquanto a menina continua me costurando.
– Não, fritei. – respondo e ele sorri, negando com a cabeça.
– Parece frango se for frito, tá reclamando de barriga cheia. Carne é ruim e transmite doença quando está crua. – ele diz, enquanto continuamos o revezamento de garrafas depois de cada um dar seu gole. O efeito da cachaça queimando minha garganta desviava a dor da mão, o que era muito bom, porque ser costurado é uma das piores sensações que já senti na vida.
– Por que alguém comeria carne crua?
– Você tinha como fazer fogo?
– Tinha.
– Tem gente que não tem. – ele diz, com um sorriso discreto comprimido no rosto.
– Terminei. – a menina diz e ele se levanta, me deixando ali, com a garrafa, depois de olhar nos meus olhos com a cara meio positiva. Eu ainda ia agradecer ele, mas ele sequer esperou. Quando se afastou totalmente e eu me levantei, Kat voltou a chamar minha atenção. – Não faz isso.
– Isso o que? – pergunto a ela, não entendendo muito bem o que ela queria dizer com aquilo.
– Se apega a ele.
– Por quê?
– Ele sempre deixa claro que está de passagem, e acho que ele não está brincando. Vai ser doloroso deixá-lo ir caso tenha carinho por ele. – ela responde, fechando os kits pra tratamento das pessoas e saindo de perto de mim em seguida.
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