...Talento...

    Converso com minha mãe sobre tudo que aconteceu; sobre o que verdadeiramente aconteceu. Ela reclama comigo porque já havia falado que se eu não tivesse me aproximado deles nada disso teria acontecido. Não concordo, porque Jennifer poderia ter sido a próxima escolhida de Scott. Ela poderia ter sido a próxima a desaparecer, ter sido a próxima a ter seu pescoço sugado até a última gota de sangue. Minha mãe reclama porque já havia me explicado que se Scott de repente entrou no colégio é porque ele quer alguma coisa, que vampiros são astutos e que eu não deveria estar mais lá depois do que aconteceu.
Na verdade desde o primeiro momento em que eu falei com minha mãe sobre Scott ela me repreendeu por eu não obedecê-la e continuar indo pro colégio. Ela quer que agente se mude mais uma vez, mais eu não quero. Não posso me mudar. Não posso deixar que Scott cumpra seu objetivo, seja qual for. Não posso deixar meus amigos sozinhos com aquele professor.

—Mãe, o que será que ele quer? Não posso deixar meus amigos aqui sem descobrir o plano dele e pará-lo.

— Bryan, foi por causa dessa forma de pensar que aconteceu aquilo com Jennifer — diz franca como de costume.

—Eu sei, mas não faz sentido tudo isso, Scott e esse tal ruivo misterioso. Tem que ter uma explicação.

— Na verdade eu sei o que ele quer. Mas não posso te falar porque sei que se você souber colocará a gente em risco, que tomará atitudes. Tenho medo do que poderia acontecer.

   As palavras dela são como uma lâmina afiada no meu peito. Por que durante esse tempo todo ela vinha escondendo tudo de mim? O que mais vem me atormentando ultimamente é saber os planos de Scott e ela sabe.

—Sei qual é a motivação dele desde aquele dia em que vi você com seus amigos na sorveteria — ela diz com um certo arrependimento, pois coloca a mão na boca como se não devesse ter dito.

— Como assim quando nos viu na sorveteria? Você foi até lá?

Ela nunca sai de casa, penso. 

    Fico extremamente confuso em relação a tudo neste momento.

— Desde que você começou a se aproximar de pessoas, decidi tomar uma atitude.

—Que atitude? — questiono.

— Bryan, na verdade tudo que aconteceu hoje foi por minha culpa.

Não entendo como poderia ser culpa dela. Mas ela responde sem que eu pergunte:

— Eu tenho vigiado Scott há um tempo. Esse tal ruivo misterioso se chama Dave, é um vampiro que tem um talento parecido com hipnose, parece mais um convencimento passageiro. Scott só foi até vocês hoje porque eu o encarei há algum tempo atrás. Viu as marcas no rosto dele? Fui eu que fiz.

    Peço para ela parar. A confusão toma conta de mim. É muita informação pra ser processada agora. Como ela tem investigado Scott, sabe seus planos, o nome de seu parceiro ruivo e ainda bate de frente com ele? Como ela tem me vigiado sem que eu perceba? Que talento é esse que ela disse que esse tal ruivo tem?

— Eu preferi não falar nada com você até saber de tudo, na verdade, te contar tudo não era minha primeira opção. Scott usa Dave pra fazer tudo o que ele quer. Dave que caça pra ele e que raptou os alunos que sumiram — ela complementa.

    Fico extremamente impressionado com tudo que ela diz. Eu pensava que minha mãe não saía de casa pra nada, até ter essa conversa com ela. Depois do que aconteceu com meu pai ela se isolou do mundo, mas agora percebi que não está tão confinada como antes.

— Um dos motivos de Scott te encarar daquela maneira nas aulas é porque ele sabe que você é meu filho. Por isso eu tentei te impedir de ir pro colégio, pois tinha medo dele fazer alguma coisa com você.

— Eu sei me defender — retruco.

— Sei que você sabe se defender, mas é arriscado mesmo assim. Ainda mais depois que eu vi você com aquela garota na sorveteria... — Interrompo-a.

— Que garota? Lucy? O que tem de errado com ela? — questiono com certo desespero.

    Ela diz que tem tudo de errado. As palavras de minha mãe ecoam de maneira que me deixa louco. Fazendo com que eu perca toda minha capacidade de raciocinar.

— O que tem de errado com ela?— Repito a pergunta porque necessito de uma resposta.

— Lucy é o motivo disso tudo. É ela que Scott quer. — O pavor me domina.

Por que ele iria querer Lucy?

— Bryan, ele quer Lucy por que ela poderá desenvolver um talento.

— Espera! Talento. Você falou que Dave tem um talento, e agora que Lucy poderá desenvolver um. O que é isso?

— Ai, Bryan. Eu não ia contar nada e agora estou presa em uma teia de questões. Mas tudo bem, já que eu comecei, preciso terminar. Ela se senta no sofá. — Eu também não sabia até os meus dezenove anos, foi quando eu conheci Scott.

— Quando conheceu Scott? Você já o conhecia? Por isso que ele me encara daquela maneira porque eu sou seu filho? —Agora definitivamente não sei mais em que pensar.

— Bryan, essa é uma longa história sobre como tudo aconteceu comigo e com seu pai antes de mudarmos. É melhor conversar sobre isso outra hora — diz se levantando.

— Não. Agora quero saber de tudo — falo sem remediar, fazendo com que ela sente novamente.

— Tem razão, já passou da hora de você saber.

    Ela olha em meus olhos por um tempo e começa a falar.

— Bom! Seu pai e eu éramos jovens, loucos um pelo outro. Eu tinha  dezenove anos na época e ele vinte e estávamos comemorando quatro anos de namoro. Em meados do ano estávamos em uma praça à noite. Não tinha mais ninguém lá e foi quando Scott apareceu. Nunca tínhamos visto um vampiro antes e nem mesmo sabíamos que poderia existir. Ele se aproximou da gente e levamos um susto. Ele tinha uma face sombria e um olhar que nos apavorou profundamente. Tentamos correr, mas não conseguimos. Scott transformou seu pai, mas não conseguiu me transformar. Ele sugou tanto meu sangue que eu quase morri.

    Não consigo falar nada, nem mesmo pensar em nada. Apenas fico paralisado ouvindo as palavras saírem de sua boca.

— Acordei em um quarto, sem fazer ideia de onde estava e percebi que seu pai estava próximo, mas não era mais o mesmo. Estava diferente; tinha um tom de pele mais suave. Ele se aproximou e me explicou tudo que havia acontecido. Disse que tinha passado com Scott os três dias que eu estava desacordada. Me explicou que ele era um vampiro, mas que eu não era. Então perguntei porque só ele tinha sido transformado e foi quando ele me contou que era um talento auto defensivo que eu tinha. Foi a primeira vez que eu ouvi falar em talento relacionado a vampiros.

— Talento auto defensivo? — questiono.

— Exato! Seu pai sabia de tudo, então me explicou. Os vampiros com o passar do tempo começaram a se desenvolver de alguma forma. Se transformados em uma certa idade, de quinze a vinte anos, são mais fortes e de certa maneira "camuflados". Porque não têm a pele tão pálida, não têm os olhos avermelhados, não são tão gelados, controlam sua sede por sangue humano e podem se alimentar com comida humana também. Podem conviver com os humanos sem serem descobertos.

— Por isso eu sou diferente? — questiono e ela concorda.

—Scott desde aquela época busca humanos raros que, se transformados nessa faixa de idade, podem desenvolver algum talento. Vampiros podem sentir esses humanos. Você já sentiu isso Bryan, lembra?

    A pergunta dela desperta uma lembrança que vem em minha mente como uma onda e é então que eu encaixo todas as peças como um quebra cabeça. Eu senti algo muito forte em Lucy desde o momento em que a vi, mas conforme fui convivendo com ela isso se acentuou. Não entendia o que era, mas agora entendo. É o que vampiros sentem por esses humanos que podem desenvolver um talento. Por isso Scott a quer.

— Espera! Tem algo que não entendi. Eu já havia visto Lucy antes e não senti isso.

— Já tinha visto Lucy antes? Como assim?

— Sim. Quando Lucy percebeu o que Scott era de verdade me contou que já havia visto um vampiro na fazenda de seus avós. Ela havia me visto há cinco anos atrás quando eu fui me vingar dos humanos que mataram meu pai. Ela não sabe que sou eu por causa do tempo, mas lembra que ele se parecia comigo. Lembro de seu olhar quando eu estava me alimentando dos porcos. Estava assustada, tinha uns dez anos apenas. Não percebi que poderia ser ela até me contar que passou por isso, pois está muito diferente agora. Naquela época era só uma menininha.

— Pode ter sido porque naquela época você tinha se transformado há pouco tempo — responde.

    Estou realmente muito preocupado e amedrontado nesse momento. Preciso descansar. Como eu queria dormir agora, mas não consigo. Desde o dia da minha transformação eu tento dormir, porém em vão. Tenho que organizar meus pensamentos e estabelecer um plano. Preciso proteger Lucy, mas ainda há algo errado.

— Mãe, se Scott quisesse transformar Lucy ele já poderia ter feito isso antes.

Ela concorda.

— Já pensei nisso também. Acredito que ele quer estudá-la. Já têm anos que ele transformou eu e seu pai e ainda está a procura de talentos. Vejo que ele não conseguiu muitos porque só Dave está com ele. Acredito que quer saber o que torna Lucy diferente dos outros antes de transformá-la para facilitar a busca a outros.

Isso realmente faz sentido.

— Por isso tenho que protegê-la.

Minha mãe me olha em total desaprovação após minha confissão.

— Por isso de imediato não queria te contar. Sabia que você iria querer protegê-la e você não pode tentar isso porque sabe que pode acabar fazendo o contrário, assim como fez com Jennifer.

Me enfureço.

— Eu não matei Jennifer porque quis. Ela usou o celular para iluminar um pouco e viu quando eu ataquei Scott. Não tinha mais nada a fazer a não ser matá-la. Ela não poderia saber quem eu realmente sou. Ninguém pode saber.

Corro para o meu quarto sem saber se minha mãe falou algo após meu comentário enfurecido.

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