2
Rioston está fixamente olhando para o teto. Acordou a pouco, mas não saiu da cama. O sentimento de nulidade toma conta do seu ser, e senti-se um nada.
Mesmo tendo pago à justiça pelo acidente que matou Veruska, Rioston sofre por saber que mesmo se ficasse preso a vida toda, nunca traria a moça de volta à vida.
A dor da sua alma está a cada dia mais latente.
Ele sabe que o pouco mais de cento e vinte segundos que esteve morto, mostrou-lhe o outro lado da morte... Rioston ainda lembra-se do aviso:
"Você precisava voltar para ajudar as pessoas a se encontrarem."
Pensando alto ele fala:
— Como vou ajudar as pessoas a se encontrarem, se nem eu estou me achando? Estou literalmente perdido... Não sei o que fazer da minha vida. — Rioston chora deitado olhando para o teto e cada uma das suas juntas doem.
Ele limpa as lágrimas e passa a observar as cicatrizes que decoram seu corpo. São muitas e estão por todos os lados.
O acidente fez três ano no mês passado. Rioston está cumprindo um ano de pena alternativa, depois de passar quase um ano internado no hospital. Porém, as lembranças de Veruska morta sempre vêm tirar-lhe o sono, num sofrimento ímpar e diário.
Todas os dias, um fisioterapeuta vem ajudá-lo com sua perna esquerda.
Ele sente as dores aumentando.
Rioston senta na cama. Suspira. Foi difícil, mas levantou-se.
Ele consegue sentar... Prefere muito mais a dor física do que a dor na alma. A dor de ter assassinado uma pessoa.
Seus amigos o visitaram no hospital, e disseram que não foi culpa dele... mas se ele não tivesse bebido ou se não tivesse olhado para o celular... Veruska estaria viva.
A bengala está a um passo de distância dele. Mas, parece que tem um quilômetro entre eles. Os separando.
— Vamos Rio, força. — Ele fala, puxando de si para levantar-se. — Você é mais que tudo isso! Opa. Consegui. — Rioston com paciência espera sua cabeça parar de girar e poder entender qual caminho seguir.
A sua higiene pessoal demora sempre umas duas horas.
Ele não tem pressa e ver essa situação, como um momento para investir seu tempo com pensamentos positivos.
"O médico sempre o diz, que somos o que pensamos, logo não serei eu quem falará o contrário."
Olhando para o espelho, o rapaz de vinte e seis anos começa a repetir:
— Base para Hostoun! Câmbio! Alguém na escuta? Câmbio.— Ele agora muda a voz, tampando a boca com a mão dizendo:
— Adiante para Hostoun, Base.
Sem conter mais o sorriso, Rioston gargalha sozinho no banheiro... Depois seu semblante fica sério. As memórias do dia trágico chicoteiam-lhe novamente a alma.
Por mais que tente continuar a viver, qualquer coisa o leva de volta ao dia do acidente.
Em segundos ele vai da mais alta gargalhada, para o mais profundo choro.
Rioston chora muito!
Chora alto.
Os fluidos nasais saem em abundância pelo sofrimento gerado em seu coração.
As articulações do punho doem de tanto fazer força com suas mãos fechadas, prendendo-as na pia.
As águas salgadas das lágrimas o sufoca. Entala. Martiriza.
Rioston grita!
Ele grita mais alto!
O acidente parece nunca ter fim na sua mente. Uma repetição atrás da outra. A culpa toca-lhe fogo no seu interior.
A campainha toca.
Ele pede um momento.
A campainha tocas mais duas vezes. Rioston resmunga um palavrão.
A sua alternância de humor, vai da gargalhada matinal, passando pelo choro ao levantar-se e à completa vontade de se afogar durante o banho.
— Um momento! Rioston grita de dentro da casa. — Já estou saindo! — No seu tempo, ele troca de roupa.
Rioston mora numa confortável casa com dois quartos, varanda e próxima da praia de Porto de Galinhas. Na rua da delegacia.
— Bom dia Frederico. Desculpas a demora. Estava me trocando.
— Bom dia! Como passamos a noite?
— Fui dormir tarde, depois do vôlei de praia... Ou será que foi depois do forró? — Rioston usa um tom sarcástico, mas amigável. Sorrindo mais da situação do que criticando o estado no qual se encontra.
Frederico sorri com a gracinha soltada por Rioston, e lhe dar um tapa nas suas costas.
— Eu estava com saudade desse seu humor ácido... Você sempre na gozação, e isso é bom.
— É o que tenho pra hoje, meu amigo... Apenas risos ou lágrimas. — Frederico pede licença com um gesto na cabeça e entra na casa.
— Mas, a vida não é só isso! — O fisioterapeuta completa ao passar pelo amigo e paciente.
— Frederico... Hoje você está mais clichê que os outros dias! — Rioston mete a bengala nas costas dele sem força.
— Ser clichê, não quer dizer que esteja errado ou seja ruim. Há varias coisas que você pode fazer e dar um novo sentido na sua vida.
— Como o que por exemplo? — Rioston dirigi-se para maca hospitalar e começa a subir, quando Frederico o ajuda apoiando pelo braço.
— Ajudar as pessoas. Você poderia começar a ajudar as pessoas que estão enfrentando problemas parecidos com o seu.
— Fred... Eu não consigo me ajudar. Todos os dias minha cabeça ferve pensando naquela noite maldita. Como vou ajudar as pessoas?
— Bom, não sei! Vamos começar a fisioterapia e sei que você vai achar um norte para sua vida.
— Você esquece que estive do outro lado?
— Lógico que não! Eu lembro do Rioston de seis meses atrás, e o que estou vendo agora, na minha frente. Seu crescimento emocional e físico é excelente, mas sinto que você pode mais!
Rioston abaixa sua cabeça.
— Nada é por acaso meu amigo. — Fred, fala a frase já pedindo para Rioston forçar a perna esquerda para frente. — Vamos pedalando para começar o exercício.
— Eu as vezes acho que tudo que vi, não passou de uma pegadinha da minha cabeça... Aquele homem me falando para voltar e ajudar as pessoas que iriam precisar de mim. Loucura total.
— Você viu o que precisava ver! Agora deixa de moleza e força nessa perna direita.
Perto de meio dia, o rapaz loiro com sua bengala chega ao restaurante com comida self service, na rua principal de Porto de Galinhas.
Antes dele entrar no restaurante, vê uma criança perdida, procurando pela mãe. O menino corre até ele e pergunta:
— Você viu minha mãe? Poderia achá-la para mim?
Rioston se aborrece por está sendo incomodado por um fedelho perdido. E de forma áspera responde:
— Eu não sei quem é sua mãe. Aonde vocês estavam antes de perder-se dela? — Rioston ao começar a buscar respostas e saber mais informações sobre os pais dele, um senhor parecendo seu avô, chama o menino pelo nome.
A criança vai correndo até a loja de conveniência que fica no posto de gasolina, e adentra no estabelecimento para encontrar-se com o idoso.
Rioston suspira aliviado por não ter que sair à procura dos pais da criança, não estava nos seus planos... e fica aliviado também por saber que o menino achou um familiar.
Ele como faz todos os dias, entra no restaurante e vai até o final dele onde se senta. O local, ainda está com alguns lugares vazios.
A garçonete vem atende-lo.
Depois de tirar o pedido, Rioston olha para a rua. O movimento das pessoas, é diário e constante, fazendo-o esquecer do tempo.
Porto de Galinhas, foi escolhida onze vezes seguidas, como a "Praia mais bonita do Brasil". Logo, com essas premiações, o que já é cheio, está lotado.
Uma jovem magra com cabelos pretos, usando uma camisa preta da banda de Rock "Queen of Stone Age" entra no recinto e procura um lugar para sentar.
Rioston, passa a mão no olho esquerdo, porque vê uma Borboleta Preta, parar no ombro da moça, depois que ela se senta.
A borboleta embora seja toda preta, há em cada uma das suas asas um desenho que lembra um olho na cor azul anil.
Suas antenas também tem a cor preta, intercalada com azul.
Ele, percebe que a garçonete está o olhando para ele e também para a moça sentada com a Borboleta Preta.
Rioston, fica sem jeito. Ele abaixa a cabeça.
Ele não quer ser mal interpretado, haja vista não está flertando a moça, além do que linda como ela o é, não deve está sozinha e muito menos o notaria.
O acidente ainda maltrata seu corpo.
Passados uns trinta minutos, o seu pedido chega. Ele sorve a canja. Prefere comer algo líquido, do que sofrer no banheiro com cólicas intermináveis.
Terminado o almoço, Rioston levanta-se e sai.
Mas, antes de deixar o local, olha por baixo, procurando a moça de cabelos pretos, que continua sentada e devindo a mesa com um casal, que conversam animadamente.
Ela apenas os escuta atentamente, com as suas mãos sobre a mesa.
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