Capítulo 10
Pothos, o erotes da paixão, não aguentou esconder de Eros o que Afrodite estava fazendo. Por isso, ele resolveu conversar com Anteros e Himeros sobre contar para Eros o que Harry estava passando. Como Anteros era um deus vingativo, ele foi contra essa decisão já que acreditava veemente que Afrodite estava certa em infligir sofrimento a Harry para vingar o sofrimento de Eros. Contudo, Himeros apoiou Pothos e, por questões democráticas, eles contaram sobre tudo o que estava acontecendo.
Louis quase enlouqueceu ao descobrir que Harry estava abandonado em uma estrada da Toscana novamente e que dessa vez era pior porque ele estava ferido. Ele não estava curado ainda, porém estava muito melhor do que quando chegara ao palácio de Afrodite. Os remédios de Apolo ajudaram a amenizar as dores que ele sentia e isso foi o suficiente para que ele deixasse o Olimpo afim de buscar Harry. Os outros erotes estavam preocupados com o bem-estar de Eros, por isso, resolveram acompanhá-lo.
O Amor não era orgulhoso nem vingativo, logo fazia da sua natureza perdoar. Portanto, Louis não se importava mais se Harry havia tirado a máscara, tampouco com a mágoa que sentia. Se fosse sincero consigo mesmo, Louis admitiria que nem se importava se sua ligação de alma com Harry falhasse pelo encanto de sua beleza, contanto que Harry ficasse bem.
"Ele está muito machucado, deve ter perdido muito sangue." Pothos falou, assim que viu o corpo de Harry estendido no chão.
Ele estava caído de bruços, desacordado. Sua pele pálida e lugar machucado em sua perna deixava óbvio a perda de sangue.
Louis nunca sentiu tanto medo como sentiu nesse momento, ante a possibilidade de Harry não sobreviver. Isso fez seu coração se estilhaçar pela segunda vez e a fraqueza, que há muitos dias ele não sentia, voltou com força total.
Ele se sentiu um pouco tonto, atordoado pela dor de ver o sofrimento de Harry e pela possibilidade de perdê-lo para sempre. Entretanto, nenhum dos erotes percebeu porque eles estavam concentrados demais em Harry machucado.
"Foi a perna." Anteros falou de braços cruzados, indicando o óbvio enquanto revirava os olhos porque ele não entendia o tamanho da comoção.
"O que devemos fazer? Levá-lo até Apolo ou a outro deus da medicina ou deixá-lo em um hospital?" Himeros perguntou para Eros, esperando que ele tomasse alguma decisão ou já soubesse o que fazer.
O estado de Harry parecia tão delicado que ninguém queria ser responsável pela decisão do que fazer com ele. Por isso, todos olhavam para Louis e aguardavam suas ordens.
"Levem-no até minha casa, eu vou voltar para o Olimpo."
Os erotes franziram o cenho simultaneamente, achando que aquela era a pior decisão a ser tomada. Mas nenhum deles estava disposto a se opor a ele. No entanto, Anteros era curioso demais e pela primeira vez no dia não se mostrou entediado ao perguntar.
"Por que você vai voltar?"
"Eu vou pedir ajuda de Apolo e de Zeus." Eros disse abrindo suas asas e se preparando para voar. "Tomem cuidado com ele. Ele é frágil e precioso." Falou e depois levantou voo.
Talvez essa tenha sido a vez que Louis chegou mais rápido no Olimpo, dado o seu desespero e o medo de ser tarde demais. Ele voou tão rápido que só levou segundos até estar na entrada do palácio de Zeus. Louis não se importou com as boas maneiras e saiu invadindo tudo até chegar na sala em que o conselho dos doze olimpianos se reunia. Ele encontrou Zeus sentado no trono central, o maior de todos. Ele segurava seu raio-mestre e parecia estar um pouco entediado, se seus bocejos fossem indicativos de algo.
Sua aparência variava com frequência, mas o que ele mais usava eram os cabelos e a barba grandes e brancos. Ele vestia uma túnica de linho que deixava boa parte do seu abdômen definido a mostra e tanto eu quanto Louis nos perguntávamos se ele não poderia usar um manto para se cobrir. Ele se parecia muito com o Platão da pintura Escola de Atenas de Rafael Sanzio.
Louis não entrava naquela sala com frequência porque ele era um deus menor e estes ocupavam lugares menos sofisticados no monte Olimpo. Por isso, sempre se surpreendia com a aparência imponente daquela sala. Isso porque haviam doze tronos espalhados pelo lugar todos contendo características de seus donos e também porque Louis sabia que era dali que saíam as decisões mais importantes do Olimpo, ainda que nem sempre elas fossem as mais inteligentes.
"Senhor, eu quero te pedir uma coisa." Louis falou e ouviu sua voz ecoar pelo salão quase vazio. Ele foi se aproximando de Zeus, torcendo para que ele não estivesse de mau-humor e quisesse lhe ajudar.
"O que aconteceu?" Ele perguntou com as sobrancelhas arqueadas, finalmente percebendo a presença de Eros na sala. Era uma raridade encontrá-lo porque ele passava a maior parte do tempo com os mortais. Sendo assim, foi surpreendente para Zeus que ele aparecesse por ali.
Louis não sabia exatamente o que dizer, porque ele poderia contar nos dedos de uma mão as vezes que ele falou com Zeus. Logo, seria estranho chegar pedindo ajuda e expondo sua vida amorosa. Contudo, ele sabia que Zeus, ao contrário de Afrodite, não iria julgá-lo porque nenhum outro deus tinha um histórico tão grande de relações amorosas com mortais.
"Eu encontrei minha alma gêmea e ele está morrendo." Ele disse por fim, com vergonha de olhar Zeus nos olhos. Para ele era um tanto vergonhoso ser o deus do amor, mas não conseguir dar conta do próprio relacionamento.
Louis direcionou seus olhos ao teto, querendo resolver esse problema o mais rápido possível. Mas se desconcentrava sempre que fazia isso, porque aquele era o lugar mais bonito de todo o Olimpo sem dúvidas. Ele se impressionava cada vez que ele olhava para cima porque o teto da sala era um céu de verão, cheio de nuvens brancas. E era sustentado por colunas enfeitadas com as arquiteturas gregas: coríntia, jônica e dórica.
"E o que você quer que eu faça?" Assim que Zeus indagou, Louis voltou sua atenção para ele. A pergunta ríspida fez um calafrio subir pelo corpo de Louis, ainda que a sala estivesse aquecida pelas labaredas esverdeadas do fogo grego.
A imponência do ambiente fazia com que Louis quisesse sair voando dali. Mesmo com o som das liras que ecoava por todo o local, este não era muito acolhedor e deveria ser ainda pior quando estava com doze deuses discutindo. No entanto, todos os deuses e monstros gregos poderiam estar ali e Louis ainda enfrentaria todos para conseguir fazer Harry ficar melhor.
A mera lembrança dele machucado, fez Louis criar coragem, jogar o bom senso para o ar e dizer o que queria. Ele estufou o peito, olhou bem no fundo dos perturbadores olhos cinzentos de Zeus e disse: "Eu quero sua permissão para curá-lo e torná-lo imortal."
Zeus estava apoiando o rosto nas mãos e batendo os pés no chão de forma ritmada. No entanto, bastou Louis terminar de falar, que ele se levantou em um sobressalto. Seus olhos se arregalaram e as veias do seu pescoço ficaram visíveis.
"Você só pode estar ensandecido, mas é claro que- Aí. " Zeus estava gritando com tanta força que parecia que a qualquer momento o mundo desabaria em uma tempestade.
Trovões foram escutados ao longe e diversos raios caíram na Terra. Contudo, antes que um desastre maior acontecesse, Hera surgiu sentada no trono ao lado de Zeus e pisou no pé dele, interrompendo seu discurso esbravejado.
Hera vestia uma túnica azul claro e seus grandes cabelos loiros estavam adornados por uma coroa de brilhantes. Sua imagem não parecia mais bela devido à sua expressão irritadiça. Os olhos espremidos e direcionados ao marido e os braços cruzados, evidenciavam uma atitude pouco cooperativa e anunciavam uma bronca iminente.
"Como pode ser tão insensível, Zeus? É um rapaz apaixonado, está sofrendo por amor. Como pode não se compadecer disso?" Ela ralhou, erguendo uma das sobrancelhas.
Eu não visitava muito essa galera do Olimpo. Mas me recordo bem de que, sempre que eu ia, me sentia mil vezes mais intimidado por Hera do que por Zeus. A mulher era terrível e olhava para todo mundo como se ela fosse uma mãe brava e nós fossemos o filho que acabou de quebrar o jarro caro.
Ouso dizer que até o próprio Zeus se sentia intimidado por ela e o cara era o senhor do Olimpo, isso é muita coisa. Ainda assim, ele encolheu os ombros e voltou a ficar sentado no trono. Sacudiu a cabeça por estar contrariado, mas disse complacente.
"Hera, eu já falei para você não se meter em meus assuntos. E por que eu faria com isso?"
"Porque esse garoto é o deus de amor. E é por causa das flechas dele que os humano se apaixonam. Se ele ficar sem sua alma gêmea, vai sucumbir de tristeza e amargura. E quem vai flechar os humanos e fazer eles se apaixonarem?" Hera falou exaltada, colocando as mãos na cintura. Ela encarou Zeus, desafiando-o a contestá-la.
Louis estava quieto, não ousando se meter no embate que assistia. No entanto, ele não deixou de ficar feliz por ter mais alguém para interceder por ele. Até então, Hera estava sendo uma boa advogada de defesa. Apesar disso, ele suava, esfregava as palmas e se movimentava frequentemente por estar angustiado e com pressa. Ele só queria ter a permissão de Zeus logo para tirar a vida de Harry de risco.
"Dar a imortalidade a alguém é algo muito sério e você sabe disso." Zeus retrucou, tentando parecer zangado, mas falhando miseravelmente. Ele fechou os punhos e cerrou os dentes, porém não conseguiu sustentar a expressão porque se deu conta de que Hera tinha razão.
Naquele momento, se eu fosse Louis eu já estaria pensando se casamento e romance era o que eu realmente queria. Fala sério! Zeus, marido da deusa do casamento, não conseguia ter paz em seu matrimônio e ainda saía por aí pulando a cerca. Se o casamento dele era assim, imagina como não seria o de qualquer outra pessoa. Contudo, Louis só pensava em curar Harry, em tê-lo de volta em sua vida. Além disso, eu aposto que ele aguentaria milhões de intrigas como aquela no próprio casamento, se fosse para estar com Harry no fim do dia.
"Pior ainda é um mundo em que as pessoas não possam amar. Você sabe que Eros é indispensável para manter os humanos apaixonados. Quando nenhum humano for capaz de amar não me venha pedindo para ajudar você com as consequências." ela respondeu, cruzando os braços. Hera sabia que estava completamente certa.
Zeus ficou quieto, tentando achar uma saída para o impasse que Hera o havia colocado. Isso não era porque ele não queria ajudar Eros, mas sim porque ele não queria admitir que a esposa tinha razão. No entanto, seu silêncio prolongado foi resposta suficiente.
"Tudo bem, garoto. Você pode torná-lo imortal. Mas não me apareça mais com pedidos difíceis. Me dê uma de suas flechas." Ele disse por fim, estendendo os braços para pegar uma das flechas que Louis lhe entregava.
Quando Zeus segurou-a, um raio saiu da ponta de seus dedos e percorreu todo o objeto. A contra gosto, ele devolveu a flecha. Contudo, Louis não a guardou na aljava para não a misturar com as outras.
Hera observou a cena contente. Não porque ela gostava de ajudar as pessoas, mas porque sabia que Zeus precisava refletir mais sobre suas decisões. Não deixasse Louis tornar Harry imortal só para manter a pose de durão, colocaria em risco a paz de toda humanidade. No fundo, ela achava que faria um trabalho muito melhor sendo senhora do universo. Eu não duvidava disso.
"Esse não é meu único pedido." Louis começou a falar. Mas foi interrompido pelo suspiro exacerbado de Zeus que causou um pequeno tremor no ambiente, denotando a irritação dele. Ainda assim, isso não foi suficiente para fazer Louis desistir e ele continuou falando. "Eu quero saber onde Apolo está. Eu preciso dele para curar Harry."
"Procure por ele na ágora. Ele deve estar tocando lira com as musas. Vá, Louis. Aproveite enquanto é tempo ou Thanatos buscará a alma de Harry e será tarde demais." Hera disse, antes que Zeus pudesse falar alguma coisa ou ficar mais irritado com os pedidos de Louis.
"Muito obrigado." Louis, apesar de muito apaixonado, ainda era muito esperto. Por isso, não esperou que Zeus retrucasse ou que Hera se arrependesse. Agradeceu aos deuses e saiu voando o mais rápido possível.
Ele procurou por Apolo na ágora e ele estava lá da mesma forma que Hera lhe informara. Apolo era o único homem que estava no centro da praça acompanhado por nove mulheres. Elas, as nove filhas de Mnemósine e Zeus, eram entidades a quem eram atribuídas a capacidade de inspirar a criação artística ou científica.
"Apolo." Louis chamou ao se aproximar. Imediatamente, Apolo parou de tocar a lira e prestou atenção em Louis.
Apolo era um dos deuses preferidos de Louis porque ele exalava simpatia e juventude. Além disso, não tinha o ego tão inflado como os outros deuses e se interessava pela humanidade como Eros.
"Oi, Eros, como você está?"
"Muito bem. Obrigado pelos medicamentos que me mandou." Louis falou se sentando em um dos bancos vagos, com vergonha de pedir o favor, uma vez que, Apolo já o havia ajudado a se recuperar.
Ele tentava demonstrar que estava calmo, porque odiava estar tão vulnerável como estava em frente a tantos desconhecidos em um mesmo dia. Contudo, mexia as mãos constantemente, de tal forma que Apolo não demorou a notar que tinha algo errado.
"Por nada. Mas o que te traz aqui? Duvido que veio apenas me agradecer." Ele falou, entregando a lira para Euterpe, a musa da música, e se levantando para ter mais privacidade na conversa.
"Você está certo. Eu preciso da sua ajuda." Eles seguiram andando pela ágora. Louis olhava para os pés e mantinha a fecha encantada por Zeus firmemente em sua mão, enquanto caminhava. Ele não sabia para onde estavam indo, nem se havia um destino real para seguir.
"Será um prazer. Os erotes de Afrodite terão minha ajuda sempre que precisarem." Apolo falou, colocando suas mãos nos bolsos da calça jeans.
Ele era um dos poucos deuses que se vestia constantemente acompanhando a moda dos humanos. Talvez por isso, ele fosse o olimpiano mais estiloso.
"Eu preciso de algo para curar minha alma gêmea. Ele machucou a perna e perdeu muito sangue. Estava desidratado e pouco nutrido também." Louis explicou, sentindo suas bochechas se aquecerem e corarem.
Ele se sentia um pouco envergonhado sempre que falava de Harry. Isso não ocorria por Harry ser um mortal, mas sim porque era a típica vergonha dos apaixonados. O constrangimento de se colocar em um local de vulnerabilidade, ainda que ele soubesse que Harry lhe correspondia.
"Certo... Ele está correndo risco e o tempo é crucial. É melhor que a cura seja imediata." Apolo ponderou, pondo uma das mãos no queixo. Logo depois, seus olhos se direcionaram para a flecha na mão de Louis, então, uma ideia surgiu em sua cabeça.
"Entregue-me uma das suas flechas, eu vou colocar a cura nela. Assim vai ser mais rápido." Louis pegou outra flecha em sua aljava e entrou a Apolo. Ele sussurrou algumas palavras e uma cobra de fumaça se enroscou pela flecha.
Quando Louis pegou a flecha de volta, ela emanava um brilho esverdeado e estava aquecida. Ao contrário da outra, que poderia ser facilmente confundida com uma flecha comum.
"Obrigado, Apolo." Ele agradeceu, se preparando para alçar voo.
"Isso não foi nada." Apolo respondeu, sorrindo e caminhando de volta para perto das musas.
Com as duas flechas em mãos, Louis voou o mais rápido que pode até sua casa.
💘
Quando Louis voltou para casa, encontrou Harry deitado na cama e tão inerte como estava na estrada. Seu corpo ainda se mantinha sujo, mas ao menos havia um curativo improvisado em sua perna para conter o sangramento.
Todos os erotes estavam a sua volta observando-o como se estivessem encarando o caixão em um velório e o silêncio sepulcral do quarto aumentava ainda mais o clima fúnebre. Nenhum deles dizia nada, como se eles acreditassem que o mínimo ruído faria Harry acordar de uma hora para outra e de uma forma explosiva. Louis sabia que isso não iria acontecer e que Harry não se curaria sem a flecha de Apolo. Por isso ele pegou seu arco e a flecha com brilho esverdeado que estava em sua aljava.
Louis mirou no braço de Harry e atirou com rapidez, mais preocupado com a demora de Harry receber a cura do que com a possibilidade de errar a mira. A flecha cortou o ar e acertou em cheio o membro. Aos poucos, o brilho esverdeado foi se dissipando e a flecha voltou a coloração normal.
"O que vai acontecer agora?" Anteros perguntou, com os olhos vidrados na figura deitada na cama.
Uma coisa engraçada de Anteros era que ele tinha a aparência de criança e sua mentalidade era de adulto. No entanto, em alguns momentos, ele tinha atitudes tipicamente infantis como essa curiosidade exacerbada e a falta de senso para tratar de assuntos delicados.
"Temos que esperar a cura se espalhar pelo corpo dele." Louis respondeu, sem tirar os olhos do corpo de Harry sobre a cama. Ele temia que Harry parasse de respirar caso ele desviasse o olhar, o que fazia com ele soubesse que não teria descanso até ver Harry bem e saudável.
Por sorte, Louis não precisou passar mais muito tempo aflito porque, lentamente, todas as feridas abertas foram se fechando e o sangramento acabou. A pele de Harry começou a se corar, deixando para trás a palidez mórbida que dominava seu corpo. Até mesmo seu aspecto mais magro deu lugar a uma aparência sadia. Alguns minutos depois, ele começou a se mexer na cama, dando indícios de que iria acordar. Como consequência, Louis escondeu suas asas e pegou a máscara para colocar no rosto, mas antes de completar a tarefa se lembrou de que não havia necessidade para isso mais.
"Deveríamos sair daqui." Himeros falou e Pothos concordou, acenando em afirmativo. Eles caminharam em direção à porta e estranharam ao ver que não estavam sendo seguidos por Anteros. Por isso, se viraram, com suas sobrancelhas franzidas, encararam o irmão.
" Eu vou ficar." Ele esclareceu, voltando a olhar para Harry se mexendo em cima da cama.
"Não vai não."Pothos respondeu, enquanto voltava para puxar Anteros pela mão.
" Mas eu quero ver ele acordando..."
"Não é hora para satisfazer sua curiosidade, Anteros. É melhor vocês ficarem na sala, enquanto ele acorda." Louis disse em tom ríspido e alto, sem tirar os olhos de cima da cama. Os erotes saíram do quarto sem dizer mais nada, até mesmo Anteros não emitiu nenhum barulho indicando descontentamento.
Os olhos de Harry se abriram devagarzinho e ele piscou um pouco para se acostumar com a claridade do quarto. Suas sobrancelhas e seus lábios estavam franzidos, o que fazia parecer que ele estava um pouco perdido.
"Harry, você está bem?" Louis perguntou sem conter o sorriso, se aproximando da cama e se sentando na beirada. Ele segurou uma das mãos de Harry entre as suas, sentindo o peso da preocupação ser tirado de suas costas.
"Louis?! LOUIS. Eu não acredito que estou te vendo novamente."
Harry se levantou com rapidez, se jogando nos braços de Louis e se aconchegando em seu abraço. Louis segurou-o com firmeza, enterrando o nariz em seus cabelos e só então notando a saudade que sentia de fazer aquilo. O tempo que eles ficaram separados foi doloroso para ambos e parecia que havia uma eternidade desde a última vez que eles estiveram juntos.
"Fique calmo. Você deve estar muito cansado. " Louis pediu em sussurro, enquanto passava a mão para cima e para baixo nas costas de Harry.
Eles ficaram em silêncio, aproveitando a companhia um do outro. Ainda que Louis quisesse que Harry não fizesse esforço e que a posição que eles estavam fosse um pouco desconfortável. Entretanto, eles se viram obrigados a se separar quando a barriga de Harry roncou.
"Estou faminto." Ele disse o óbvio com as bochechas coradas e o olhar distante, pela vergonha que estava sentindo. Seu estômago tinha que fazê-lo passar essa vergonha como se já não bastasse estar sujo, enquanto Louis estava tão cheiroso.
"Eu vou buscar algo para você comer, espere um pouco."
Louis vai à cozinha, abre os armários e nota que não havia muitas opções do que comer por ali. Ele espia pela porta e percebe que não tinha como Harry vê-lo do quarto, por isso transforma a caixa de suco industrializado em sopa e o pacote de biscoitos velho em pão. Ele esperava que o gosto estivesse agradável, já que transformar comida não era uma de suas especialidades.
Lembrou-se da primeira noite que Harry passara ali, quando ele inventou de fazer uma sopa para impressionar Harry com os dotes culinários que ele nem tinha. Naquela noite, Louis poderia ter transformado qualquer coisa em comida também, mas desde aquele dia que sua vontade de ofertar o melhor que podia para Harry, do mesmo modo que os semideuses costumavam deixar a melhor parte de sua comida para os deuses.
Era Eros quem tinha os poderes divinos, mas ele sabia que se dependesse dele era Harry que seria servido como um deus. Porém não havia tempo hábil para tentar fazer alguma comida boa e, por enquanto, Harry teria que se contentar com aquilo. Ainda assim, antes de voltar para o quarto, Louis pediu para os erotes fossem em busca de comida de qualidade para Harry.
"Não se compara ao que você cozinha, mas serve para matar a fome." Ele falou, assim que voltou para o quarto e entregou a comida a Harry.
A comida estava com um gosto esquisito, Harry tinha certeza. Mas ele estava muito faminto e aquele era o melhor jantar que tivera em dias. Por isso, comeu tudo o que tinha prato, tentando não parecer deveras desesperado.
"Precisamos conversar." Louis disse tão logo Harry deixou a colher em cima do prato.
"Banho primeiro, por favor." Harry pediu, sentindo-se incomodado com a poeira em seu corpo.
"Claro. Você sabe onde fica o banheiro, eu vou pegar roupas para você."
Harry não teve pressa na hora de tomar banho e passou longos minutos passando xampu e hidratação em seu cabelo e garantindo que todo o seu corpo ficasse limpo e com cheiro agradável. No entanto, o tempo que ele gastou com esse ofício serviu para que ele pensasse em tudo o que tinha acontecido nos últimos dias. Sua mente estava confusa e ele mal podia acreditar que tudo aquilo foi real.
Ele não passou muito tempo refletindo sobre o que realmente aconteceu ou que era produto da sua mente cansada porque se lembrou de que Afrodite disse que Louis estava machucado. Ao se recordar disso, Harry se esforçou para sair do banho o mais rápido possível devido a sua preocupação com o bem-estar de Louis.
Quando ele voltou para o quarto, encontrou lençóis limpos sobre a cama e não havia indícios do prato sujo e nem dos bagaços de pão que ele derrubou em cima do colchão. A janela estava aberta, permitindo que um vento fresco passasse por ela e Louis estava sentado na cama.
"Lou, como você está?" Harry perguntou, antes que Louis tivesse a chance de iniciar a conversa que ele tanto queria ter. Ele se sentou na cama com pernas dobradas e coluna ereta e ficou esperando a resposta.
"Eu estou bem, não se preocupe. Eu quem deveria estar perguntando isso, já que era você quem estava machucado." Louis respondeu de sobrancelhas franzidas.
"Eu me sinto perfeitamente bem. O que importa aqui é você, porque uma mulher me disse que era a sua mãe e que você estava muito doente." Harry contou e achou que essa história parecia ainda menos lógica quando verbalizada.
"Eu já me curei. E, por favor, não considere nada do que minha mãe te disser." Louis pediu, segurando a mão de Harry entre as suas para enfatizar o que dizia.
"Acho que ela não gosta muito de mim."
Harry soltou um sorriso forçado, lembrando-se da forma que a mãe de Louis o tratava. Porém, não se importou com isso, uma vez que, ela parecia um problema pequeno nesse momento que ele estava perto de Louis e que sabia que ele já estava curado de seja lá o que ele tivesse. Além disso, ele pensava que era reconfortante saber que ele não estava imaginando coisas, embora também fosse muito bom se aquela mulher não fosse real. Eu concordo com ele.
"Isso não importa. O que importa é que eu gosto de você." Louis disse baixinho, afagando as bochechas de Harry ao mesmo tempo que olhava dentro dos olhos dele para deixar óbvio seus sentimentos.
Eles eram almas gêmeas, afinal, por isso Harry pode sentir o tamanho do sentimento de Louis como se fosse ele mesmo que se sentisse daquela forma. Seus olhos se enchem de lágrimas, ao que ele notou ambos corações batendo na mesma velocidade e Harry mal podia acreditar no sentimento que via nos olhos de Louis, o mesmo sentimento que ele sabia que carregava em seu olhar. Entretanto, o fascínio do momento foi quebrado pela culpa quando Harry se deu conta de que Louis nutria o mais belo sentimento por si, ainda que ele tivesse quebrado a única promessa que Louis pediu que ele fizesse.
"Lou, me desculpa, por favor. Eu não deveria ter quebrado minha promessa." Harry disse com a voz falhando.
"Eu quem peço desculpas, Harry. Eu não deveria esconder nada de você."
Aquelas desculpas eram sinceras, porque Louis estava se sentindo um pouco culpado sobre o que acontecera com Harry, embora tentasse evitar ter esses pensamentos porque não ajudariam em nada. Um dia antes desse momento, talvez Louis ainda se importasse com aquilo. No entanto, a máscara parecia ser algo totalmente fútil depois de ficar tão perto de perder Harry para sempre.
"Tudo bem, o importante é que estamos juntos agora." Harry disse de forma abafada, com o rosto enterrado no pescoço de Louis e sem nenhuma pretensão de se mover.
Louis, entretanto, desfez o abraço e segurou Harry pelos ombros de maneira delicada, fitando os olhos verdes e criando coragem para entrar no assunto mais delicado que eles já tiveram até então.
"Na verdade, eu ainda tenho uma coisa para mostrar." Ele disse de forma lenta e cadenciada, torcendo para que Harry entendesse e acreditasse no que ele tinha a dizer.
"O que é?" Harry perguntou, com um sorriso gigante e os olhos brilhando em curiosidade.
"Eu quero que você prometa que vai me deixar explicar antes de qualquer coisa."
"Louis..."
Harry não queria fazer mais nenhuma promessa, devido as consequências da última vez que ele prometeu algo sem ter certeza se seria capaz de cumprir.
"Promete, Harry." Louis insistiu.
Harry passou alguns segundos em silêncio, pesando se deveria prometer ou não. Mas ele era muito curioso e não sabia se aguentaria passar mais alguns minutos sem saber do que se tratava.
"Ok, eu prometo." Ele disse por fim, acreditando que estava muito preparado para ver o que Louis tinha para mostrar, mas ele achou que iria desmaiar quando Louis levantou da cama e mostrou as suas asas.
Harry se sentiu um pouco zonzo, colocou as mãos em sua cabeça e fechou os olhos. Abriu e fechou de novo. Passou um tempo piscando, tentando convencer a si mesmo que a imagem que ele via era real. Depois de um tempo, ele só se manteve boquiaberto e ficou mexendo a cabeça, enquanto encarava Louis com as sobrancelhas franzidas. Ele achava que em algum momento entenderia o dispositivo que Louis utilizara para fazer aquelas asas obviamente falsas aparecerem.
Louis deixou que Harry tivesse seu tempo e só ficou parado, observando todas as suas reações que estavam sendo melhores do que o esperado. Levando em conta o quanto Harry era cético, eu achei que ele realmente iria desmaiar quando Louis contasse a verdade. Mas parece que a mente dele tinha travado e que ele não tinha entendido totalmente o que estava acontecendo.
"O que é isso?"
"Minhas asas." Louis respondeu, dando de ombros e pegando seu arco e sua aljava. Em um estalar de dedos, suas roupas de ser humano comum foram trocadas por uma túnica de tecido cru.
"O que é você?"
"Eu sou Eros."
"Isso só pode ser uma brincadeira, onde está a câmera escondida?"
Harry soltou um riso frouxo e se levantou da cama, acenando em negativo. Ele começou a se afastar de Louis e a observar todos os cantos do quarto, como se realmente procurasse por uma câmera escondida.
"Não estou brincando Harry.
"Não, Louis. Isso não pode ser verdade..."
Harry encarou Louis e expirou, como se admitisse sua derrota na busca pela câmera. Ele voltou a se sentar na cama, mas ainda manteve uma distância que considerou segura entre ele e Louis.
"Você me prometeu que me deixaria explicar." Louis disse, massageando as têmporas. Estava frustrado porque queria que Harry o escutasse, mas sabia que não poderia exigir nada. Ele pensou que sua aparência poderia influenciar nos sentimentos de Harry por ele, mas nunca tinha pensado que sua verdadeira identidade pudesse causar repulsa de alguma forma.
"Mas eu não imaginava que o que você tinha para me mostrar era ISSO." Harry gritou, sacudindo o braço para dar ênfase ao que ele falava.
"Harry... Me deixa explicar." Louis sussurra com os ombros caídos. Ele escondeu as asas e guardou o arco e a aljava porque achou que deixá-los amostra estava piorando a situação.
"Tudo bem. Fale." Harry diz, com os cotovelos apoiados sobre seus joelhos e a cabeça entre as mãos. Tentava entender o que tinha acontecido com sua vida nos últimos dias e não se achava capaz de lidar com tudo aquilo.
Louis queria ficar mais próximo de Harry, porém estava respeitando o espaço que ele impôs. Não sabia o que fazer com suas mãos e não tinha coragem de encará-lo com receio de qual seria sua reação. Ainda assim, ele explicou tudo desde o momento que Afrodite chegou em sua casa pedindo para que ele se vingasse de Harry até o momento que Harry acordara depois da flecha encantada por Apolo.
"Eu não consigo acreditar." Harry disse, acenando em negativo quando Louis acabou de falar tudo.
Louis suspirou ainda frustrado com a situação difícil que se encontrava, mas ele não estava surpreso. Por isso, resolveu deixar Harry um pouco sozinho para que ele tivesse tempo para pensar. Levantou-se da cama, caminhou até a porta do quarto e disse:
"Você deve estar cansado, tire um tempo para descansar e para pensar um pouco. Depois conversamos."
Na manhã seguinte, Harry estava sem coragem de sair do quarto e torcia para que Louis não estivesse em casa. No entanto, ele não teve tanta sorte porque o encontrou na cozinha, tentando fazer café da manhã. Ele até queria sentir um ódio muito grande de Louis, pela bagunça que sua vida tinha se tornado. Mas sabia que não poderia culpá-lo e era muito difícil sentir raiva quando Louis estava se esforçando tanto para fazer panquecas ao ponto de estar com o cabelo todo cheio de farinha.
Uma noite era pouco tempo para Harry repensar sobre tudo o que ele acreditou, ou melhor, não acreditou por toda a sua vida. Mas ele achou que era melhor enfrentar tudo aquilo logo e decidir o que faria a partir dali. Dessa vez, Harry teria certeza de ir em busca do que ele desejava e não se acomodar com qualquer coisa que a vida lhe ofertasse como fizera outrora.
"Então, acho que agora podemos conversar direito." Ele disse constrangido com a situação, encarando seus pés descalços em contato com o chão.
"Você pensou?"
"Sim e eu tenho algumas perguntas para te fazer." Harry disse, cruzando os braços e caminhando até a mesa da cozinha. Ele arrastou uma das cadeiras e se sentou, ainda olhando para o chão.
Louis acena em afirmativo, indicando que Harry poderia perguntar o que quisesse. Ele desistiu de continuar com as panquecas quando notou que elas estavam saindo tostadas demais.
"Você é o deus do amor que atira flecha e deixa as pessoas apaixonadas?"
"Mais ou menos isso. Eu ajudo as almas gêmeas a se encontrarem." Louis explicou, apesar de ele já ter dito tudo isso no dia anterior. Ele enxugou as mãos em um pano de prato e sentou em uma cadeira do lado oposto ao que Harry estava sentado.
"E você é minha alma gêmea?"
"Sou. Por que está me perguntando isso se eu já te falei antes?"
Harry fez sinal para Louis se calar porque ele queria mostrar seu raciocínio e precisava que Louis confirmasse tudo o que tinha dito antes. Isso porque Harry torcia que tudo não passasse de um delírio, mesmo que naquele momento ele já tivesse certeza que estava tudo bem com a sua sanidade.
"E você é imortal como essas histórias de mitologia?"
"Sou." Louis respondeu, revirando os olhos e se arrependendo logo depois. Ele deveria era agradecer que Harry não tinha fugido no meio da noite como ele pensava que faria. Inclusive, esse pensamento fez com que Louis perdesse o sono.
"Mas eu não sou. O que acontece então?"
Só então Harry levantou os olhos e fitou Louis, por querer estar olhando nos olhos dele quando tivesse a resposta. Aquela questão era algo que estava dominando seu pensamento, desde que a ideia de que Louis era um deus tinha se assentado em sua mente. No entanto, Louis não sustentava uma expressão de quem estava pronto para sanar essa dúvida, se suas sobrancelhas franzidas eram indicativas de algo.
"Eu envelheço e morro e você continua sendo jovem?" Harry melhorou a pergunta e Louis finalmente entendeu aonde ele queria chegar com todas aquelas indagações.
"Eu posso assumir a forma que eu quiser, então posso ficar com a aparência de velho com você. Mas essa decisão é sua. Eu posso ter uma vida normal com você até você morrer, ou você pode optar por ser imortal ao meu lado." Louis esclareceu, suas palavras saíram de forma calma. Mas a forma que sacudia suas pernas debaixo da mesa deixava óbvio o seu nervosismo.
"Isso só é muito para minha cabeça..."
"Eu sei e é por isso que você pode me dar a resposta quando quiser. Eu literalmente tenho todo tempo do mundo. Só não duvide porque eu não estou brincando."
Eles tomaram café da manhã em silêncio, depois que Harry deu um jeito em fazer novas panquecas, já que as de Louis não prestaram.
Os dias passaram sem que eles conversassem muito e Louis temeu que com esse afastamento Harry não fosse mais capaz de amá-lo. Por isso, ele mal conseguia se concentrar em suas tarefas, preocupado demais com o futuro dos dois. No entanto, no domingo pela manhã, Louis acordou com batidas na porta de seu quarto e com Harry anunciando que queria a imortalidade. E, quando Louis acertou uma flecha em Harry pela segunda vez, ele soube que dali em diante eles não seriam mais separados.
Harry gostava de dizer que aquele foi o dia que eles selaram a união, como uma espécie de casamento. Eu não sei se eu concordava muito com isso, porque eu não conhecia ninguém que tenha casado de pijama. Mas Louis concorda com Harry porque foi naquele momento que ele Louis percebeu que passou grande parte do tempo subestimando o amor do dois.
Louis amava Harry ao ponto de ter ido contra a própria mãe para ficar com ele e Harry o amava tanto que foi capaz de passar por grandes adversidades só para vê-lo. Isso sempre foi claro como água limpa para mim, mas eu não podia esperar que todo mundo fosse tão esperto quanto eu. O tempo todo eu sabia a verdade: amor deles era como fogo grego, inflamável até mesmo na água. E, ao invés de se apagar com as adversidades, continuava flutuando e queimando.
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