Capítulo 1

Harry estava deveras cansado, mas isso deveria ser comum para qualquer padrinho de casamento. Ele passara as últimas semanas organizando a festa matrimonial de seu irmão do meio e da sua melhor amiga e se encontrava muito satisfeito com os resultados. Tudo estava tão lindo e luxuoso que os convidados ficaram boquiabertos. Até mesmo o próprio Harry que sabia de todos os detalhes da festa se surpreendera com o resultado final. Entretanto, o mais importante de tudo era que Zayn e Georgia, seu irmão e sua melhor amiga, estavam muito felizes e apaixonados.

O balanço do carro e a música clássica que tocava baixinho aliados a exaustão faziam os olhos de Harry se fecharem hora ou outra. Mas o entusiasmo o impedia de tirar uma soneca na volta para casa. O rapaz ainda flutuava com as lembranças do casamento que fora igualzinho ao que ele sonhara para o seu próprio. Mesmo assim, não era a inveja que tomava seu coração, mas o sentimento de plenitude que geralmente vem após a conclusão de um trabalho bem feito.

Zayn e Georgia tiveram tudo que mereciam. Um casamento ao ar livre com a paisagem verdejante da Toscana como plano e fundo e toda a decoração branca e amarela se sobressaindo no verde como um oásis no deserto. Bastante simbólico e bem pensado dado a importância que o matrimônio tem para o rapaz. O casamento era para ele tão importante quanto um oásis poderia ser para um beduíno.

O jardim da vinícola Barone Ricasoli tinha ficado repleto de cadeiras brancas separadas por duas fileiras de girassóis e um caminho de pétalas amarelas para que os noivos pudessem passar. E, para tornar o ambiente mais aprazível, havia o pôr do sol ao fundo e música clássica tocada pela pequena orquestra.

"Queremos conversar com você, Harry." As palavras de Anne fizeram com que o rapaz saísse dos seus devaneios e ficasse em alerta. Todas as vezes que a conversa se iniciava desse modo não terminava bem. Harry sabia o que se sucederia porque ele já vivera momentos similares mais vezes do que queria.

Era esquisito que seus pais parecessem tão ansiosos de uma hora para outra. Isso porque o casal tinha passado o dia com uma expressão comedidamente exultante devido ao casamento do filho do meio com uma das solteiras mais ricas da Toscana. O mínimo esperado era que eles voltassem ao seu estado comum pelo menos no dia seguinte. Entretanto, Harry não era tão sortudo e seus momentos de paz haviam acabado.

"O que houve, mamãe?" Perguntou como se não soubesse o que estava por vir. Àquela altura, ele saberia de cor as palavras que sua mãe diria. Pressionou as têmporas querendo que a conversa, que mal tinha começado, tivesse fim. O cansaço e a felicidade que sentia fazia com que ele quisesse que seus pais poupasse-o ao menos por algumas horas, nas quais ele poderia dormir. Mas como sabia que isso não seria possível, tirou o rosto da janela, sentou de forma ereta e esperou pelo discurso tão conhecido.

"Você sabe que o casamento é a maior benção que pode acontecer na vida de alguém, não sabe? " O tom de voz de Anne era calmo e suave como se ela fosse cantar a música mais tranquilizante que existia. Não era atoa que a capacidade argumentativa dela fosse perfeita, uma vez que a mulher era a reencarnação dos sofistas.

Harry pensava que qualquer vilão deveria ter uma voz como aquela porque aquele tom era perfeito para convencer e manipular alguém. No entanto, não era nada bom quando ele estava sendo dirigido a si acompanhado por um sorriso amarelo. Nesses momentos, seus pais sorriam como o gato de Cheshire e olhavam para ele como se fossem charlatões prestes a aplicar um golpe.

"Hum... Sim, eu sei. Você me disse isso semana passada. " Harry disse baixinho, os dentes serrados em exasperação. A paciência escorria de seu corpo como o suor em um dia quente. Entretanto, ele não tinha coragem suficiente de ser sarcástico em voz alta.

"E você também sabe que por isso é muito importante que você arranje um casamento? " Continuou Des como se não tivesse escutado a interrupção do filho. Harry revirou os olhos e franziu os cantos dos lábios para cima. Se pudesse, teria levantado do carro naquele mesmo momento e ido embora para não voltar nunca mais. Mas isso não era possível, portanto, só fechou os olhos, respirou fundo e tentou não levar a sério as palavras que ouviria.

"Sim, pai. Vocês já me disseram." Falou, fechando os olhos e movimentando os cantos dos lábios para cima em sinal de indiferença. Ele cruzou os braços porque o ar condicionado do carro começara a incomodar. Já não estava mais feliz como antes, não importava mais que tudo tinha dado certo no casamento de Zayn.

"Então... Nós estamos tentando conseguir um casamento para você, filho. Mas está sendo muito difícil." Anne disse por fim e Harry abriu os olhos imediatamente porque essa informação era nova. Ele sempre soubera que seu casamento seria arranjado assim como o dos seus irmãos fora. Além disso, a frequência com que o tema casamento era falado nos jantares levava-o a crer que já havia um pretendente em vista. Porém, nunca imaginara que estava sendo difícil encontrar alguém que quisesse casar consigo.

Os Styles possuíam uma vinícola recém-aberta e eram tão ambiciosos quanto qualquer capitalista costumava ser. Contudo, as grandes vinícolas faziam um enorme sucesso enquanto a deles mal fechava a conta no fim do mês para desgosto e inconformação de Anne e Des. Eles consideravam um absurdo que a sua vinícola não aparecesse em guias turísticos e que as vendas e as visitas estavam escassas.

Qualquer pessoa inteligente perceberia que essa situação não era mais do que o esperado. Até porque era realmente difícil competir com vinícolas que já tinham séculos de existência. Entretanto, o casal não entendia e não tinha paciência para esperar o negócio ficar rentável. Além disso, eles queriam mais sucesso, ainda que ganhassem o suficiente para manter a família e ter uma boa qualidade de vida.

Invés de contratarem alguém formado em publicidade ou tentar melhorar a qualidade do vinho, o casal Styles teve outra ideia. Eles acharam que seria muito mais fácil e lucrativo se os seus três filhos se casassem com os donos das vinícolas famosas. Com o tempo, o nome Styles estaria relacionado aos maiores produtores de vinho da Itália e se não fosse para o casal gozar de tal privilégio, ao menos, seus netos gozariam. Era uma ideia fantástica e foi por causa dela que eles ficaram conhecidos por se aproveitar da beleza dos três filhos e vendê-los em casamentos arranjados pela Toscana.

O casal Styles era super protetor com seus filhos. E não só a ambição justificava essa atitude vil, mas também a certeza de estar fazendo o melhor para os três. Anne e Des padeciam do mesmo problema que muitos pais, achavam que sabiam o que era melhor para os filhos sem se preocupar com as vontades deles.

"Todos os seus pretendentes desistem de casar com você antes mesmo de te conhecer." Des soltou sem se preocupar com a maneira que o filho receberia a informação. Provavelmente foi até intencional, já que palavras como estas minariam a autoestima de qualquer pessoa.

"Qual o problema comigo?" Harry perguntou porque realmente não conseguia entender o que tinha de errado consigo. Sua voz saiu frágil e gaguejada como as flores da coroa que estava em seu cabelo, tão frágil como seu brio que já não costumava ser muito forte.

Não foram poucos donos e herdeiros de vinícolas que queriam se casar com os filhos dos Styles, já que os três garotos eram conhecidos por sua beleza inigualável. Por isso, fora extremamente fácil casar os mais velhos. Até porque além da aparência, Liam era um exímio dançarino e Zayn tinha um talento nato para negócios.

A beleza de Harry era esplendorosa de tal forma que causaria inveja até na própria Afrodite, de uma maneira que causava intimidação em todos os seus pretendentes. Todas as vezes que viam as fotos de Harry, os aspirantes a marido desistiam da ideia do matrimônio intimidados demais para seguir em frente com a proposta.

Contudo, essa informação foi deliberadamente omitida. Isso porque, era de seu interesse que Harry estivesse com a autoestima fragilizada. Seria muito mais fácil fazer com que Harry aceitasse a proposta que viria a seguir caso ele acreditasse que tinha algo de errado consigo. Ainda assim, essa era a única verdade em meio às mentiras absurdas que o casal contava para o seu caçula. De qualquer forma, não é fácil ouvir que ninguém lhe quer, principalmente quando ser solteiro é tão malvisto.

"Nós não sabemos, filho. Por isso que é muito importante que você preste bastante atenção no que vamos te propor. Essa pode ser sua única chance de casar." Anne explicou mantendo seu tom maternal, o mesmo tom que Harry sabia que não indicava boa coisa. Mas ele estava atordoado demais para prestar mais atenção.

As palavras machucaram o coração de Harry como se elas fossem uma flecha embebida em veneno. A dor psicológica era tão intensa que sua mente se confundia ao ponto de parecer que ele fora ferido fisicamente. O rapaz passara boa parte da adolescência sonhando em casar, ele era tão apaixonado pela cerimônia que almejava trabalhar com a organização desses eventos. Não era só a dor das rejeições até então desconhecidas, era a impossibilidade latente de nunca realizar o seu maior sonho: o de organizar seu próprio casamento.

Engolindo um choro escandaloso, Harry acenou em afirmativo. Os seus olhos se arregalaram como se isso fosse fazer com que ele absorvesse melhor a informação e uma lágrima solitária escapou por sua glândula lacrimal como um protesto mudo e infrutífero. Toda a sua atenção fora dirigida para as palavras de seu pai, afinal de contas, desde pequeno que Harry sabia que alguém só poderia ser feliz se tivesse um bom casamento. Ademais, essa poderia ser sua única chance de realizar seu sonho.

"Você se lembra de Giovanni Gherardini?" Anne perguntou, pois sabia que ela teria mais prudência para transmitir a notícia sem causar revolta no filho. Não é como se Harry tivesse tido alguma atitude rebelde na vida, ao menos, não que eles soubessem. Mesmo assim, era melhor prevenir. A mulher se remexeu no banco, lambeu os lábios e esperou pacientemente que o filho respondesse. Em contrapartida, Des revirou os olhos e começou a bater os pés em claro sinal para a esposa que ele não achava necessário tanta enrolação.

"Lembro..." Harry respondeu cauteloso, temendo as ideias que começavam a se formar em sua cabeça. Sentiu o suor escorrendo de sua testa e desejou que seus pais acabassem logo com isso para que seu coração voltasse a bater na velocidade normal ou parar de uma vez por todas. "Não é ele que é o dono da vinícola mais famosa da Itália?"

"Exatamente!" Anne exclamou exultante, ela esbanjava a mesma alegria de horas atrás na hora que Zayn e Georgia Barone Ricasoli assinarem os papeis que selavam a sua união matrimonial. "Ele é da mesma família que a Monalisa. Isso não é fantástico?"

"Eu não sei." Harry respondeu tamborilando os dedos na perna e logo depois interrompendo os movimentos para passar as mãos no cabelo. Ele não sabia o que fazer ali, tinha uma vontade imensa de sair correndo para longe daquele carro que em poucos minutos se tornara um ambiente hostil.

"Mas o que eu tenho a ver com isso?" Perguntou com rispidez por estar muito mais preocupado com o caminho que a conversa estava indo do que com que era ou deixava de ser parente da Monalisa.

"Oh! Querido, eu e seu pai temos uma notícia fantástica para você." Ela continuou com uma animação que ninguém mais no automóvel partilhava. "Você vai ficar tão feliz." Prosseguiu batendo palminhas de tamanha excitação.

Àquela altura Harry estava ao ponto de gritar, pois parecia que ninguém tinha nem um pouco de piedade para tirá-lo daquele tormento. Ele só queria que alguém falasse rápido, era só arrancar o curativo e deixar que ele sentisse a dor de uma vez. Ele aquiesceria e aceitaria tudo que lhe impusessem como sempre aconteceria ou finalmente teria coragem de se rebelar, mandaria todo mundo para o inferno e iria embora de casa. Faria exatamente o que sempre devaneou, quando seus pais lhe davam uma ordem que ele não queria seguir.

"Certo." Harry respondeu nervoso pegando um elástico de prender cabelo e amarrando seus cachos no topo da cabeça em uma tentativa falha de conter o nervosismo. "Explica. "

Harry não era bobo e já tinha a mínima noção do fim dessa conversa. Embora eles não tivessem o costume de se estender tanto no assunto casamento, era um pouco óbvio onde tudo isso iria dar. Entretanto, parte de si torcia para que suas suspeitas estivessem erradas.

"Giovanni Gherardini aceitou casar com você." Des disse por fim, revirando os olhos. Sem paciência para o tanto de enrolação que Anne estava fazendo.

De uma hora para outra o carro ficou em um silêncio sepulcral, a mente de Harry ignorava a música que tocava e o som da respiração das outras pessoas presentes ali. Parecia que o mundo tinha congelado, que o tempo não passava. Harry esperou que, em alguns minutos, os pais explodissem em uma gargalhada e dissessem que ele tinha caído em uma pegadinha. Mas os minutos foram passando e ninguém ousou dizer nada. Se houvesse uma mosca ali, ela não se atreveria a zumbir.

Se Harry soubesse dirigir e estivesse na direção do carro certamente ele chocaria o veículo com a primeira árvore que aparecesse. Contudo, ele estava em um dos bancos de carona e não poderia fazer nada além de empalidecer e sentir seu corpo se petrificar. Seus olhos se arregalaram e suas cordas vocais não funcionavam de maneira nenhuma.

"Mas ele tem idade para ser meu pai!" Ele esbravejou. Finalmente, ele recobrou a capacidade de fala, depois de abrir e fechar a boca umas três vezes.

O motorista contratado pela família do marido de Zayn se sobressaltou com o grito de Harry o que fez com que ele sussurrasse um pedido de desculpas. Já Anne e Des ficaram de mandíbula caída e olhos arregalados, pois nunca esperavam tal atitude do filho. Essa era a primeira vez que Harry levantava a voz para eles e não condescendesse com suas vontades. Entretanto, isso não era suficiente para fazer o casal desanimar.

A verdade é que todas as recusas que Harry recebera foram as melhores coisas que poderiam ter acontecido. Pois, se não fosse por elas, Harry não estaria prestes a se casar com um dos homens mais ricos de toda a Toscana. Esse casamento seria um ótimo negócio para a família Styles, muito melhor do que qualquer outro que eles quisessem pedir.

"Ele é o único que quer casar com você." Anne disse ríspida como se isso encerrasse a questão. A sua mudança de abordagem mudando em um estalar de dedos era perfeito para ilustrar o que acontecia: ou Harry se deixava manipular ou casaria forçado. "Ou vai ser ele ou vai ser a solidão, você está ficando velho. "

O argumento de não querer ficar para titio era ridículo. Porém pareceu surtir algum efeito já que toda a atitude cheia de rompante que parecia vir a seguir murchou como uma bexiga de ar não amarrada. Ele recuou, engolindo todas as palavras desobedientes e se encolhendo no banco do carro. "Eu posso pensar, pelo menos?" Perguntou em voz baixa e encarando o chão sem coragem de fazer contato visual com nenhum dos dois.

Ele voltou ao seu comportamento dócil como um cachorro que acaba de ser repreendido pelo dono. Todavia lágrimas grossas e quentes começaram a descer pelo seu rosto, mas ele não ousou soltar nenhum murmúrio. Chorou silenciosamente, enquanto tentava se convencer de que não seria tão ruim assim.

Seu rosto se avermelhou pela vergonha e ele desviou seus olhos para a paisagem que passava rapidamente devido a velocidade. Mal podia acreditar que gritou com seus pais, que iria querer contrariar alguma ordem deles. Tentou esquecer sua atitude lamentável e forçou a sua mente a pensar no lado positivo de tudo isso.

Ele sabia que o matrimônio transmitia amadurecimento e responsabilidade, gerando respeito como consequência. Era melhor um casamento ruim do que casamento nenhum, não é mesmo? Além disso, ele ainda poderia montar a cerimônia perfeita, talvez nem precisasse conviver muito com o marido e ainda traria orgulho para a família. Se Gherardini era o único que queria casar consigo, então era melhor casar com ele do que ficar solteiro para sempre.

"Na verdade, você não pode. Nós já aceitamos por você." Anne respondeu à pergunta do filho enquanto pegava o celular da bolsa e desbloqueava. "Temos que fazer alguns sacrifícios pela nossa família, Harry." Deu o assunto por encerrado, acreditando que um dia Harry a agradeceria por isso. Pensar no futuro era importante e Harry perceberia a relevância disso quando estivesse vivendo cercado por luxo e tendo todas as suas vontades atendidas.

Não é preciso dizer que Harry tinha naturalmente uma personalidade submissa. Porém, a quantidade de regras e de mandos que os seus pais o impuseram acentuou ainda mais esse traço. O costume de obedecer sempre fazia com que ele fosse incapaz de negar qualquer coisa que lhe pedissem, mesmo que já tivesse alcançado a maioridade e fosse legalmente responsável por si mesmo.

Ele queria ter coragem de fugir de casa como achava que seu irmão Zayn faria. Queria sair escondido à noite ou fazer um escândalo e ir embora pela porta da frente. Mas a junção da sua subalternidade com toda a ideologia de relevância do matrimônio que foi incutido no decorrer de sua vida tornava inviável que ele tomasse alguma atitude.

Anne e Des fingiram não ver as lágrimas do filho, enquanto Harry fingia que estava tudo bem e que ele não estava derramando-as. O rapaz começou a imaginar um mundo fictício em que ele se rebelaria contra as atitudes do pai ou que o homem perfeito que sempre sonhara interromperia seu casamento com Gherardini e o levaria para longe de casamentos por conveniência. Era mais fácil se iludir com situações improváveis do que encarar o pesadelo que sua vida se tornaria.

💘

" Tenho um trabalho para você. " As palavras saíram da boca da deusa assim que ouviu os passos de seu filho.

Louis se sobressaltou, pois não esperava encontrar ninguém em sua casa. Ele mal havia tirado as sandálias nem guardado o arco e as flechas quando ouviu a voz da mãe. Inspirou e pediu por paciência enquanto colocava seus instrumentos de trabalho no sofá e se preparava para mais um estresse trazido pela sua genitora.

A mulher estava sentada na poltrona da sala com as pernas cruzadas e olhar altivo como se fosse a dona do lugar. Só a beleza dela era intimidadora o bastante e fazia com que Louis achasse sua própria casa fosse um ambiente hostil, ainda que a lareira acesa aquecesse a pele e provocasse a sensação de plenitude e seguridade.

Os traços delicados, o brilho do cabelo, a elegância da roupa e a postura ereta deixavam qualquer outra pessoa com vontade de se esconder em um buraco somente pela insegurança ao estar perto de tamanha beleza. Mas nunca foi novidade que Afrodite faria qualquer um se jogar de um penhasco apenas para não ficar na presença dela.

"O que você quer? " Louis inquiriu, praguejando em pensamento ao se dar conta que seus dias de paz tinham acabado.

"Não se preocupe. É algo bem simples." Respondeu ao passo que se encarava no espelho da sala conferindo se todos os detalhes que compunham sua aparência estavam em seu devido lugar.

Era bem comum que deuses abordassem seus filhos dessa forma, porque era um pouco difícil para nós percebermos que o mundo não gira em torno da gente. Contudo, a deusa do amor conseguia se superar nesse quesito. Independente de se tratar de um deus menor ou de um meio-sangue, ela olhava para todos como se fosse a abelha rainha e o resto suas operárias. Aliás, Afrodite aparentava acreditar que todo mundo era seu escravo e estava pronto para realizar suas vontades.

Afrodite era igual àquela mãe chata que ficava rodando pela casa e procurando algum motivo para reclamar o filho. Ela não ficava bem se não estivesse enchendo o saco. Era chata de tal forma que Louis não aguentava mais suas exigências até porque eram séculos de exploração do pobre coitado.

Eu acho que o pior era que ela não morreria nunca nem seria esquecida, já que o amor sempre foi fundamental para a existência da humanidade. Isso era desesperador na minha opinião, inclusive eu pensava que poderiam ter dado o cargo de deusa do amor para alguém mais simpático. Sinceramente, um sentimento como esse não combinava com alguém como ela.

Era realmente difícil ter uma deusa como mãe porque ela poderia lhe encontrar em qualquer lugar, ficava meio impossível até mesmo fugir principalmente quando essa tal deusa era uma bisbilhoteira de plantão. E tudo bem, era muito hipocrisia da minha parte falar algo assim, uma vez que, eu também era um abelhudo. Entretanto, eu não ficava observando a vida dos outros para importuná-los depois.

"Basta falar e você terá o que precisa." Louis respondeu em tom monótono fazendo com que suas asas desaparecessem e se sentando no sofá de frente para a mãe. Ele só queria que ela desse logo sua ordem e partisse o mais rápido possível e levasse com ela aquele perfume de rosas insuportavelmente doce.

Batucou os dedos em sua perna, enquanto revirava os olhos discretamente ao ver a mulher se levantar e começar a mexer na estante de livros no canto da sala. Louis pensava que alguém precisava urgentemente ensinar o significado de propriedade privada para ela. Já era extremamente invasivo entrar na casa dos outros sem permissão, revirar os pertences alheios então, era o cúmulo da falta de senso.

"Eu quero que você use uma de suas flechas com um mortal em específico." Falou depois de passar alguns minutos segurando o suspense.

Louis franziu as sobrancelhas diante das palavras, não estava entendendo a motivação da mãe. Isso já não era o que ele fazia? Usar suas flechas em um mortal era algo que acontecia frequentemente, afinal, ele era o próprio Eros. Esfregou as palmas e lambeu os lábios por já estar antecipando que o trabalho não poderia ser tão fácil.

A hesitação evidenciada pela falta de informação no pedido deixava claro que ele não iria gostar nem um pouco das ordens que viriam. Isso porque todas as vezes que tinha um pedido egoísta, mesquinho ou maldoso, Afrodite fazia suspense para falar como se estivesse em uma novela ou em um filme de Hollywood. Assim como estava fazendo nesse momento.

Por vezes, tanto eu quanto Louis achávamos que Afrodite sonhava em ser alguém como Nazaré Tedesco ou Carminha das novelas brasileiras. Só algo assim para explicar as atitudes teatrais.

" Você quer que ele se apaixone?" indagou temeroso já sabendo que Afrodite não iria continuar falando sem que ele perguntasse. Fazia parte do show dela assim como o tom cadenciado de sua fala, seus movimentos calculados e sua expressão facial.

"Isso. Mas não quero que ele seja correspondido, quero que ele sofra por amor." Respondeu com os dentes cerrados ao se lembrar do motivo da raiva que sentia.

As palavras da mulher exalavam tanto ódio que chegava a causar repulsa. De uma hora para outra, suas feições se transformaram, seu rosto ficou extremamente vermelho e as veias do seu pescoço ficaram visíveis. Era como se a qualquer momento ela fosse bater a mão e derrubar a estante de livros. O ar ficou pesado e todas as moléculas de gás pareciam estar se chocando com mais velocidade por absorver a irritação da deusa.

Uma pessoa sensata teria tentado se esconder debaixo do tapete. Mas Louis, por estar muito acostumado com os chiliques da mãe, resolveu que era melhor fazer perguntas para entender a situação. Isso era a prova de que existia gente realmente corajosa no mundo.

"Posso saber o que ele fez para te deixar tão irritada?" perguntou se levantando, andando até a mãe e colocando a edição mais nova de Romeu e Julieta que a deusa segurava de volta na prateleira. " Deixa meus livros quietos, é melhor voltar para o sofá antes que você destrua qualquer um com a força do seu ódio".

Ela o encarou e o seu rosto ainda parecia que ia explodir a qualquer momento por causa da petulância de Louis. Porém, piscou os olhos devagar e respirou fundo ao invés de estrangulá-lo como parecia ter vontade de fazer. Afrodite anuiu e respirou fundo mais uma vez ao notar seus dentes cerrados e seu rosto quente.

Estresse não fazia bem para pele e perder a compostura não era atitude de uma dama, em virtude disso a deusa se acalmou. O ambiente voltou ao nível de hostilidade anterior e ao silêncio ensurdecedor que antecede uma tempestade.

A deusa do amor sentir ódio era algo extremamente irônico, para não dizer desesperador. Mas se bem me lembro algum filósofo grego disse por aí que só era possível saber o que era amor se soubesse o que era o ódio. Era provável que ele estivesse certo e existisse uma linha tênue entre os dois sentimentos. Inclusive, talvez fosse por isso que não existia um deus do ódio e que Afrodite sozinha tivesse personalidade o suficiente para sustentar tão bem os dois sentimentos.

"Não, você não pode. Isso não é dá sua conta." Falou com o tom neutro e quase conciliador em contraste a dureza semântica.

Massageou as têmporas e suspirou cansada de carregar o peso de ser bonita. Por certo, manter o posto de ser mais bonito que existe não era fácil, parecia que sempre existiria alguém pronto para tomar o primeiro lugar do pódio. O sangue olimpiano da deusa fervia só de imaginar que alguém superaria a perfeição de seu exterior.

Louis não sabia, mas eu sim. Eu tinha plena noção de que os motivos de tanta exasperação era a inveja que Afrodite sentia. De fato, a inveja era como uma unha encravada que latejava o tempo inteiro tornando impossível o seu esquecimento.

Os comentários e a adoração dos mortais pela beleza angelical de Harry Styles era a nova dor de cabeça de Afrodite, de tal forma que ela mal podia esperar para castigar o rapaz. Era totalmente inaceitável para a deusa que alguém tivesse a beleza mais adorada que a dela. Nada mais justo que Harry sofresse as consequências de tamanho desaforo.

"Tudo bem. Quem é?" Louis perguntou resignado, não se daria o trabalho de negar a tarefa sabendo que era caso perdido tentar discutir com a mãe.

Ele faria como de costume, obedeceria ao pedido da mãe sem se importar com causas e consequências. Tudo isso em nome de sua paz, pois quando alguém dizia que Afrodite era uma chata, essa pessoa não estava mentindo.

"Harry Edward Styles. Não vai ser difícil para você achar, ele mora na Toscana. A família tem uma vinícola." Informou, conferindo se nenhuma unha postiça tinha caído, o que era uma preocupação genuína obviamente, haja vista era realmente difícil mantê-las no lugar.

"Alguém em específico para ser alvo da paixão dele?"

"Qualquer um, exceto o seu futuro marido." Respondeu encarando Louis com seriedade, suas palavras deixavam claro que ela não aceitaria falhas. Afrodite não descansaria até ver Harry Styles definhando de amor.

"É bem provável que aquele velho se apaixone por ele e acabe com meus planos. Então é bom que você trate de fazer o Giovanni Gherardini se apaixonar por alguém que não seja Harry".

Louis assentiu concordando novamente em fazer o que lhe foi pedido. Embora tivesse a noção de que o mortal não deveria ter feito nada de ruim para a sua mãe. Ele sabia que Afrodite tinha a tendência de se irritar com pouco, mas já fazia tempo que ele deixara de se importar se estava sendo injusto. Por isso, faria o que lhe havia sido ordenado e depois seguiria pelo mundo atirando suas flechas por aí em paz conforme deveria acontecer.

Algumas vezes, como aquela, ele sentia um pouco de falta de como sua mãe era quando ele era criança. Ela parecia tão mais amável e simpática que Louis não sabia se era a forma como ela lhe tratava exclusivamente ou se algo tinha mudado no tempo que ele ficou longe. De qualquer forma, sempre era um pouco difícil digerir a deusa pedante que Afrodite se mostrava.

"É isso. Espero que você não demore e não falhe na sua tarefa." A deusa falou no momento em que se levantou do sofá. Já havia feito suas exigências, por conseguinte estava pronta para partir.

Afrodite desapareceu em um passe de mágica sem esperar respostas ou dizer adeus. Tudo o que restara foi o cheiro enjoativo de seu perfume evidenciando que ela estivera no ambiente.

Louis se jogou no sofá suspirando calmamente, o ar parecia estar até mais limpo depois da partida da mãe. Ele fechou os olhos aproveitando os poucos momentos de paz que teria até entrar em uma nova confusão de Afrodite.

Foi neste momento que eu tive uma epifania. Era estranho demais a justificativa de que ninguém queria casar com Harry porque ele era bonito demais, isso não faz sentido em uma sociedade baseada em aparência na qual a beleza era valorizada.

Foi aí que eu percebi que tudo isso tinha dedo de Afrodite: ninguém aceitar casar com Harry, a frieza de Anne e Des perante o sofrimento do filho, o velho Gherardini ter aceitado se casar de novo depois de jurar no leito de morte do seu marido morto que não colocaria ninguém no lugar dele, especialmente quando eles eram almas gêmeas. Tudo isso cheirava ao Charme da deusa.

Afrodite tem um poder de convencimento perfeito, ela usa um tipo de hipnotismo que persuade os mortais a fazerem o que ela quiser. Se ela já estava há muito tempo incomodada com a aparência de Harry, eu não ficaria admirado se todas essas desgraças na vida dele fossem obra dela.

Era uma opinião totalmente pessoal, mas eu achava que Afrodite deveria ser a deusa da inveja também porque não pode ser normal o tanto de confusão que ela cria só por causa da aparência. Sinceramente, eu já teria dado uns sermões nela se eu fosse Zeus.

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