Capítulo 11 - Isla

— Posso perguntar uma coisa e você jura que não vai ficar chateada comigo? Eu sei que você e o Laurent tem um passado pessimamente resolvido e que o Jonny não foi nem um pouco legal na última noite, mas eu achei que vocês estavam se envolvendo... Sabe, além do trabalho.

Meus cabelos sempre tão lisos estavam ganhando alguns cachos nas pontas, tudo por conta de Elizabeth, que me causou um pouco de irritação com aquele comentário infeliz sobre minhas relações.

— Você é minha amiga ou do Jonny? — Questionei, mais irritada do que deveria. Sei que é um problema que devo lidar, ás vezes sou grossa com os outros sem qualquer necessidade, por isso inspiro ar umas boas vezes antes de continuar. — Liz, eu não sei... É tudo muito complicado.

— Não acha que esteja saindo com o Laurent só por causa do passado? Vocês se separaram muito cedo e não tiveram a chance de viver o que queriam, mas isso não significa que são destinados a fazer isso agora só porque ele voltou. — Eu posso sentir os dedos de Elizabeth deslizarem delicadamente por minhas mechas loiras, resultado de horas de prática nos camarins, já que algumas vezes nós mesmas nos arrumávamos pela falta de profissionais adequados. — Eu estava conversando com o Matthew...

— Matthew? O da festa do Jonny? Achei que fosse ser diversão de uma noite, até porquê você nem sabia o nome dele... ''Brian''. — A feição irritada de Liz apenas fez com que eu gargalhasse, lembrando da cena. Jamais esqueceria aquela vergonha alheia, mas ela parecia disposta a fazê-lo, já que continuou a conversa como se eu não tivesse a interrompido.

— Ele disse que ontem o Jonny chegou chorando em casa, e ele não mentira sobre isso. Sério.

Engoli em seco, sentindo a saliva descer por minha garganta como navalha. Óbvio que algo estava errado com Jonny, mas talvez nossa discussão só tenha piorado tudo, o que quer que tenha acontecido antes da festa, realmente conseguiu magoá-lo mais do que qualquer outra coisa.

— Não é querendo justificar as atitudes dele ou estragar seu encontro, mas tem algo de errado com ele.

Meu celular tocou com uma mensagem de Laurent avisando que já está me esperando na porta, o que fez com que eu afastasse as mãos de Liz de meu cabelo e colocasse a bolsa no ombro. Em minha cabeça tantos pensamentos me afogavam que estava difícil focar em qualquer coisa, há pouquíssimas horas eu havia dado um veredito a Jonny: seríamos apenas colegas de trabalho, mas agora, com a notícia de que ele realmente estava mal, como seguir nossos dias de trabalho?

Estava tão desligada que só percebi chegar na portaria do prédio quando quase bati de cara no vidro, completamente envergonhada, limpei a garganta e sorri para Laurent que tentava não rir dentro do carro, uma Audi S8 Plus 2020. Laurent sempre gostou de se arrumar e ostentar a parte boa de dinheiro, por isso não me surpreendi com seu carro de luxo e perfume forte, assim como a blusa da Armani. Todos nossos encontros sempre foram regados a garrafas de champanhe, comidas caríssimas e locais reservados.

— Você está lindo. — Mesmo que os quarenta anos estivessem chegando, Laurent exibia aquela aparência de tirar o fôlego de qualquer mulher, e eu não estava imune aos seus efeitos. Com seu rolet dourado no pulso direito e iphone novo no bolso, ele não economiza em prazeres.

— E você só não está mais bonita do que no dia em que te conheci. — Seus olhos azuis encararam os meus e eu sei que quero beijá-lo e sentir cada centímetro seu novamente, por isso aproximo meu rosto até alcançar seus lábios em um beijo intenso e íntimo, aproveitando cada segundo em nossas bocas estão grudadas. Nosso beijo ainda encaixa e é indescritível, de modo que não quero me separar dele, ainda que ao mesmo tempo algo esteja faltando, talvez a excitação de quando fazíamos escondidos ou o fato de que não nos beijávamos há muito tempo.

— Eu realmente não esperava por isso. — Sua voz grave soa feliz e eu rio quando percebo que seus lábios estão vermelhos, da cor de meu batom, já que a maquiagem transferiu. Com carinho, levo minha mão até sua boca e esfrego levemente o local, antes de limpar os cantos de minha boca.

— Fiquei te devendo um beijo hoje de manhã, lembra?

— Se eu te disser que está me devendo algo mais, você me dá de madrugada?

Encarei Laurent com os olhos arregalados mas caindo na gargalhada depois por causa do duplo sentido, havia me esquecido do seu senso de humor sem qualquer filtro. Afasto a mão dele que está apertando minhas coxas e faço um sinal com a cabeça para a rua.

— Vamos nos atrasar para a reserva, vai logo, Bellini.

Laurent não perdeu mais tempo, ligando o automóvel e partindo para o restaurante, que como qualquer outra coisa a partir do Bronx, fica há mais de 30 minutos de distância. No caminho, trocamos conversas triviais sobre nosso tempo separados, desde de experiências profissionais até pessoais. Contudo, minha consciência não deixa eu prestar atenção em todas as suas palavras, por isso, resolvo tomar coragem e envio uma única mensagem para Jonny.

Eu: Você está bem?

Jonny: Sim, me desculpa por hoje cedo. To meio bolado com umas coisas que aconteceram, mas deixa para lá. Quer sair um dia desses para compensar seu aniversário? Prometo explicar tudo e ser a melhor companhia possível.

— E aí eu derrubei toda a comida em mim... Isla? Você tá prestando atenção?? — Por mais que tenha tentado disfarçar, pude perceber que Laurent ficou um pouco chateado por eu não estar tão envolvida na história quanto ele e sim no celular. Seu olhar desviou até a minha tela, a qual desliguei na mesma hora. — Quem era?

— Elizabeth. — ''Primeiro encontro, primeira mentira.... Não começamos muito bem, né Isla?'' penso sozinha. — Ela queria saber se eu já estava no carro com você, fica preocupada quando desço na portaria de noite.

— Entendi... Diz para ela que você está em boas mãos... — Agora sua piada com duplo sentido não foi tão engraçada para mim, isso porquê Jonny estava esperando minha resposta.

Realmente é uma boa ideia eu me envolver além do trabalho? Jonny, meu atual chefe, tem problemas para lidar... mas quem não tem? Sem qualquer síndrome de Anastásia de 50 Tons de Cinza, não acho que posso ou devo mudá-lo para um homem melhor, mas algo havia acontecido.

Eu: Que tal uma pizza amanhã depois do trabalho? Mas você paga.

Espero sua resposta com o celular na mão, e quando vibra, não consigo evitar um sorriso mínimo e disfarçado.

Jonny: Eu pago, mas quando você for uma modelo super famosa, o jantar de comemoração vai ser por sua conta. Você não sabe o quão caros são esses restaurantes chiques.

No mesmo momento, Laurent para na frente do restaurante e minha porta é aberta pelo manobrista, que nos deseja um ótima noite. Antes que o Bellini venha a meu encontro, digito rapidamente.

Eu: Tenha certeza que sei.

O restaurante é simplesmente lindo.

Candelabros extremamente ornamentados, toda a madeira escura e ambiente vintage nos transportam para um lugar além de NY, parece até mesmo uma outra época. Laurent conseguiu reservar uma mesa bem na frente do jardim de inverno, que nos presenteia com flores coloridas como vista, fruto da primavera que está em seu ápice.

— Você não me disse porquê voltou. — Ele havia evitado aquele assunto na última noite e claramente ficava desconfortável quando eu insistia, mas se algo estava errado, eu tinha que saber antes me envolver de fato. Mas para deixá-lo mais tranquilo, comecei falando de mim. — Eu sai Boss Agency porquê eu desfilei para o Jonny Hanton e ele me ofereceu uma proposta irrecusável. Acho que se eu ficasse na agência, nunca teria essa chance de novo.

— Que proposta? Eu te ofereci ir para o Japão comigo, Isla.

— Sim, como sua secretária, se me lembro bem. — Aquela lembrança amargou minha boca. Laurent me oferecendo um cargo na empresa e quando li a proposta, seria sua...

— Assistente pessoal. É diferente. — Todas ás vezes que tocávamos naquele assunto, Laurent fazia questão de frisar a diferença, mesmo que para mim fossem completamente nulas.

— Jonny me ofereceu um percentual de ganhos da nova coleção, que está sendo desenhada por nós dois, e eu também desfilo e poso exclusivamente para a Skin 4 You nos próximos meses, pelo menos até depois da Fashion Week.

A cada palavra minha eu ficava mais ansiosa enquanto Laurent encarava seu relógio, analisando o quão demorado estava o atendimento, que até então não havia trazido nossa entrada. Depois disso seu celular tocou, o que retirou completamente sua atenção de mim.

— Tenho que atender. Me desculpe. — Sequer deu tempo de eu responder qualquer coisa, já que ele levantou da mesa e foi em direção a uma área distante. Peguei o celular para ver se conseguia conversar com alguém, mas Liz estava offline e nenhum dos meus outros contatos eram amigos de verdade, ou ao menos suficiente para eu me sentir confortável de conversar que estava levando um bolo no meio de um encontro.

Desviei meu olhar para aos arredores, pelo menos uma dezena de mesas estava no mesmo salão do que nós. Um casal comemorando bodas de casamento, um grupo de amigos e muitas outras pessoas que pareciam estar ali corriqueiramente, como se jantar em um local tão caro fizesse parte de suas rotinas. Tomei mais alguns goles do champanhe, até que a taça restasse absolutamente vazia.

Quando o álcool entra em sua corrente sanguínea, você começa a pensar coisas que estava evitando por muito tempo, como por exemplo: qual o real motivo de eu estar nesse encontro? Será que se apegar tanto as memórias é algo bom? Já que claramente a ligação de Laurent é mais importante do que eu. Novamente, foco minha atenção nos casais ao redor, desde os mais jovens até os senhores que estão sentados de mãos dadas a minha direita, um rindo para o outro como se estivessem encarando o paraíso.

É quando eu percebo: não quero estar ali.

Não estou animada como deveria.

30 minutos e Laurent ainda não voltou para a mesa, de modo que assim que o garçom serve nosso prato principal, chamo sua atenção para que me responda:

— Por acaso o senhor sabe onde está o homem que me acompanha? Ruivo, alto, quarenta anos mais ou menos...

— Ele está na recepção. Bom apetite, senhora. — Antes que o garçom se vire para ir embora, corrijo para ''senhorita'', recebendo apenas um aceno de cabeça em confirmação, na verdade, ele sequer se importa com aquela informação.

Certa de meus próximos atos, jogo o guardanapo na mesa, visto meu casaco e chamo um UBER ali dentro mesmo, para evitar ter que ficar esperando na calçada, o que daria mais tempo para Laurent querer argumentar. No momento em que alcanço a recepção e ele me encara, coloca a ligação em espera mas não consigo ver o nome em seu visor.

— Meu amor, onde está indo? Eu juro que já estou terminando e volto para a mesa. — Depois disso, ele apenas vira as costas, prestes a voltar a ligação quando digo.

— Não me chama assim, não sou seu amor, Laurent. — Simultaneamente fecho meu semblante, principalmente porque Laurent tenta segurar meu braço em um ato falho de controlar minhas atitudes. — Da próxima vez que me chamar ou qualquer outra mulher para um encontro, que tal ficar na mesa?

— Essa ligação é importante, Isla. — Por mais que sua voz esteja baixa e controlada, posso ver um indício de irritabilidade surgir em seu olhar. — É do Japão, por isso estão me ligando essa hora, tenho alguns assuntos pendentes.

De repente a gerente se aproxima, uma mulher que aparenta ter 50 anos com cabelos castanhos tingidos para escolher os fios brancos que insistem em decorar sua franja. Seu olhar imediatamente pousa em mim, quase como se estivesse ignorando a presença de Laurent bem ao seu lado.

— Está tudo bem aqui? Posso ajudar em algo? — Laurent tentou falar, mas a senhora apenas levantou a mão pedindo silêncio, o que foi suficiente para ele se calar. — Estou falando com a senhorita e não com o senhor.

No bolso de meu vestido o celular vibra, avisando da chegada do carro.

— Estou bem, desculpa pela inconveniência.

Não perco tempo em apressar meus passos na recepção até o lado de fora, o ar frio é um refresco no meu rosto, que parece estar ardendo em febre, mesmo que seja apenas um impressão. Só percebo que minhas mãos estão tremendo quando alcanço a maçaneta do carro e quase me jogo no banco, a tempo de ver Laurent me encarando com os braços abertos na na entrada do restaurante, o que eu estou sentindo? Raiva? Decepção? Um misto de todos?

— Bronx, por favor.

Confirmo o endereço, mesmo que esteja escrito no aplicativo. Limpo a garganta antes de ligar para Liz, rezando para que ela atenda, o que acontece pouco antes de cair na caixa postal.

— Amiga? Tá tudo bem? — Sua voz é preocupada mas não muito embriagada de sono, claramente estava acordada. — Aconteceu alguma coisa?

— Estou indo para a casa, ok? Te explico tudo quando chegar. — Encosto minha cabeça no vidro do carro em movimento, respirando fundo como se estivesse tentando me situar dos últimos acontecimentos.

— Não estou em casa, pode vir me buscar? A gente divide a corrida. — Além de arruinar minha noite, fiz o mesmo com minha amiga? Que burra, Isla. Levo minha mão livre até os olhos, coçando-os e pensando se deveria tirar minha amiga de sua diversão, ao mesmo tempo, sei que ela vai dar um jeito de me encontrar, então é melhor estarmos juntas e seguras, não é? — West Village, 1107.

Cerro os olhos, eu já estive nesse lugar há pouquíssimos dias, não esqueceria tão rápido.

— Você está na casa do Jonny? — Indago, sem saber se torço para a resposta ser positiva ou negativa, o que causa um sentimento estranho, como se algo estivesse preso em minha garganta.

— Só vêm, amiga. Não precisa subir.

Então Liz desliga o telefone, me deixando no silêncio da linha vazia que está completamente muda. Peço para o motorista mudar a rota, então em cerca de dez minutos estou parada na frente do apartamento mas quem abre a porta do carro não é minha amiga e sim Jonny, usando uma bermuda e regata, provavelmente seu pijama, mesmo que do lado de fora esteja frio.

— Boa noite, Isla.

Sua mão está estendida em minha direção e por mais que tente disfarçar, há certa expectativa em seu rosto, esperando que eu aceite seu gesto.

E eu aceito.

NOTAS DA AUTORA:

Ai, ai... E esse capítulo, gente? Além de bem maior do que o costume, foi de mexer com nossos corações. O que será que o Laurent esconde nessa ligação?

Fiquem ligadas e até semana que vem (E adivinhem?? ponto de vista do Jonny!!)

Não esqueçam de votar e comentar bastante <3 

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