Meus pais gentilmente decidiram se acomodar em um hotel, já que em meu apartamento eles ficariam extremamente desconfortáveis no sofá-cama que serviu, muitas das vezes, para oferecer abrigo a modelos de outras cidades que não estavam completamente instaladas em NY ainda. Só que eles não perderam tempo, quando o relógio marcou dez horas da manhã, minha mãe já estava na cozinha e o cheiro de bolo de milho invadiu os cômodos, cortesia brasileira que fez meu estômago roncar.

— Meu Deus, que cheiro maravilhoso. — Com tanto tempo longe e sozinha, eu havia me esquecido de como é bom acordar com um ato carinhoso de sua mãe. — Bom dia...

— Feliz aniversário e páscoa, filha! Como se sente com 28 anos de idade? — Tatiana se aproximou de mim, exibindo um sorriso largo antes de me envolver um abraço apertado e vários beijos nas bochechas. Sua pele bronzeada, olhos verdes e cabelo com cachos bem definidos, tornavam difícil acreditar na veracidade do nosso parentesco. — Você está cada dia mais bonita!! Seu pai foi comprar pão, então vamos esperar ele chegar para te dar o presente. Eu acho que você vai amar!

— A propósito, eu sei que você só queria ''cortar um bolinho'' — Liz tentou falar em português, minha mãe sem dúvidas tentou ensinar, mas sem sucesso, já que soou como qualquer outro idioma, menos o pretendido. — Mas eu chamei mais gente. Relaxa, só pessoas que você gosta e se dá bem, nada demais. Inclusive o Jonny Hanton.

— Mas eu já havia chamado o Jonny. — Comentei, um pouco confusa sobre aquilo ser considerado uma novidade ou talvez algo para me surpreender. Minha mãe aproveitou nossa conversa para cortar um pedaço enorme de bolo e encher uma xícara de café, colocando a minha frente.

— Quem é Jonny? — A mais velha perguntou, encarando Liz como se ela fosse a mais suscetível a deixar escapar.

— É meu chefe. — Cortei Elizabeth, já que esta não tem filtro algum e as palavras saem da sua boca como uma metralhadora. Minha mãe pareceu não acreditar, mas mudamos de assunto assim que papai chegou com um sorriso enorme e uma sacola de pão nos braços.

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Depois do almoço de páscoa, todos subimos para decorar minimamente o terraço para que ficasse apresentável. Algumas plantas, almofadas, lâmpadas e velas fazem um verdadeiro milagre em conjunto com toalhas bordadas com paetês e uma mesa de bolo.

Meu celular não parou de vibrar desde cedo, recebendo inúmeras mensagens de parabéns, inclusive um e-mail genérico da minha antiga agência que deve ter esquecido de me retirar do cadastro pois dizia ''Ficamos felizes em ter uma estrela como você em nossa equipe''. Porém, nenhuma mensagem de Jonny, o que fez com que um gosto amargo invadisse minha boca.

A ausência de Jonny na primeira hora de festa me afetou mais do que eu gostaria de admitir, mas depois, quando a música alta tomou conta da atmosfera e as pessoas se dividiam entre beber e dançar, as únicas presenças que me importavam eram daqueles que estavam ao meu redor. Minha mãe dançando até o chão com um funk brasileiro enquanto meu pai quase escondia o rosto de vergonha, meus amigos que tiravam selfies e gargalhavam, abraçados uns aos outros como se suas vidas dependessem de socialização e contato. Liz tomando conta de cada detalhe e reclamando no celular que o buffet ainda não havia chegado, mesmo que não passasse de as pizzas estarem atrasadas.

— Isla?

Quando me virei, uma silhueta um pouco mais alta do que eu me encarava. Seus olhos azuis contrastavam com o cabelo acobreado e barba da mesma tonalidade, as rugas não tão marcadas ao redor dos olhos não o tornavam feio, mas deixavam a mostra que os quarenta anos se aproximavam em toda a sua glória.

— Laurent. — Eu disse seu nome, como se estivesse tentando me acostumar com a ideia de sua presença ali. Laurent é 11 anos mais velho do que eu e ficamos pela primeira vez ano passado, quando eu tinha apenas 26 anos e ele 37.

— Não vai me dar um abraço? Feliz aniversário! — Sem pensar duas vezes, enrolei meus braços em seu pescoço no mesmo momento em que ele abraçou minha cintura, escondendo o rosto em meu cabelo e rindo baixo. Laurent e eu somos apenas mais uma daquelas histórias que não deu certo antes mesmo de ter a chance de começar, já que ele teve que se mudar para o Japão quando estávamos engatando nosso relacionamento.

— Você voltou???!! Quero dizer, você está aqui! — Não pude evitar minha felicidade. Apenas Liz soube do nosso relacionamento prematuro que terminou na mesma velocidade que começou depois de uma balada no centro de NY. Uma história não tão bem resolvida que deixou muitas pontas soltas no passado.

— Eu estou aqui! Voltei de vez para NY, te procurei na agência a recebi a notícia que você não trabalhava mais lá, que saiu do nada para trabalhar exclusivamente para um ''estilista que está tendo seus 5 minutos de fama''. É isso mesmo? A propósito, essas foram as exatas palavras da sua antiga chefe.

— Sim, estou trabalhando com Jonny pelos próximos seis meses. Eu não aguentava mais aquela agência, Laurent. Sério. E o Jonny está me dando uma chance boa de ter sucesso, você sabe o quanto eu quero isso.

— Então é só trabalho? Sabe, vocês dois... — Homens e suas maneiras estranhas de perguntarem se estamos solteiras. Não é mais fácil perguntar diretamente do que dar várias voltas?

— Sim, claro. Sabe que sou estritamente profissional.

Laurent conseguiu identificar a brincadeira em minha voz em relação a última frase, já que estava bem na frente e me conhecia há um ano, mas Jonny não. O estilista, parado bem atrás de mim, apenas limpou a garganta para chamar minha atenção, anunciando sua presença ali.

— Oi, eu pensei que você não viria. — Comentei, sendo completamente ignorada por Jonny que estendeu a mão para Laurent, se apresentando puramente profissional, mas não deixando de ser irônico. Instantaneamente meu humor se fechou com Jonny, ele está realmente me ignorando no meu aniversário?

— Eu sou o ''estilista que está tendo seus 5 minutos de fama'', e você...? — Cerrei os olhos, impressionada que Jonny não conhecesse Laurent, editor chefe da Vogue Japão. Engoli em seco, olhando para os lados como se pedisse ajuda, já que a tensão entre os dois chegava a sufocar qualquer um que passasse por ali.

— Laurent Bellini. — Os dois, que apertavam as mãos até então, foram interrompidos por Liz, que chegou como um furacão para me tirar daquela situação e puxou Laurent para o bar enquanto dizia que ''depois ele conversava melhor com a aniversariante''.

— Você me ignorou completamente quando chegou, Jonny. — Comentei, irritada por sua audacidade em fazer aquilo.

— Você estava um pouco ocupada, não é? — Jonny disse, completamente seco antes de guardar no bolso do paletó uma caixinha que segurava em sua mão até então.

O encarei incrédula, aquele não é o Jonny com quem convivi nas últimas duas semanas sem pausa alguma. Puxei Jonny para um canto onde podíamos ver o movimento dos carros nas ruas e a brisa gélida congelava nossos rostos, afim que ninguém pudesse ouvir o que conversaríamos a seguir já que ele estava agindo como uma verdadeira incógnita.

— Se isso tem alguma coisa haver com o nosso beijo de ontem... — Comecei sendo brutalmente interrompida por Jonny.

— Foi só um beijo, Isla. Não fique tão emocionada. — A dureza em seu olhar e fala altamente incisiva me magoaram extremamente, quase como se alguém tivesse atirado uma faca em meu peito e risse da situação.

— Eu acho que é melhor você ir embora... Ah, já sei para onde ir, vai para a puta que pariu, Jonathan. — Coloquei a mão em seu ombro, encarando-o com um misto de decepção e ironia enquanto dizia tais palavras. No momento em que virei de costas, ele disse a pior das coisas até então, que fez com que sua primeira fala fosse quase que um elogio.

— Isso é uma tática sua, Isla? Eu não devo ser o primeiro idiota com quem você tenta, não é? — Ao perceber que fiquei quieta, Jonny se aproximou e cuspiu o restante de seu pensamento odioso enquanto o hálito de bebida se fez presente entre nós dois. — Se envolve com um estilista por fama, uma alpinista social.

Engoli em seco novamente, sentindo as lágrimas envolverem meus olhos, mas não choraria no meu aniversário e muito menos na frente de Jonny. Não depois da acusação dele.

— Você está bêbado. Vai embora agora antes que eu peça para alguém te tirar aqui a força. E a propósito, foi só um beijo, lembra? Não fica tão emocionado.

Virei as costas, andando a passos rápidos para que Jonny não conseguisse me alcançar. Liz se aproximou novamente, quase que como um anjo da guarda, e jogou braço no meu ombro enquanto andávamos em direção ao banheiro. Quando chegamos no cômodo, deixei o choro sair, não de tristeza, mas de raiva por ter meu trabalho reduzido a alguns relacionamentos ou beijos que dei durante a noite. Raiva por Jonny ter ao menos cogitado aquilo.

— Okay, Jonny foi um babaca com você. Agora olha para mim. — Liz disse, secando minhas lágrimas e sorrindo para tentar me acalmar e levantar o ânimo— Você é uma modelo maravilhosa, solteira e pode fazer o que quiser, não deixe homem algum tirar isso de você, Isla. Se você quiser sair daqui e dar para todos os homens da festa é um direito seu, do mesmo jeito que pode ser celibatária para o resto da sua vida. Sua profissão não depende da sua vida sexual, é muito mais do que isso.

Abracei minha amiga, agradecendo a Deus por tê-la ao meu lado. Elizabeth sabia como me acalmar e trazer o melhor de mim à tona, não sei o que faria sem ela. Funguei, limpando o nariz logo em seguida ao mesmo tempo que ouvi uma ''eca'' de Liz que me arrancou uma risada e revirada de olhos, quem não fica com o nariz entupido depois de chorar?

— O Laurent tá de volta. — Disse para Liz assim que voltamos para a festa, que rolava solta, já que ninguém notou nossa ausência. Ela obviamente sabia daquilo, mas eu não sabia o que significava para mim. Para nós dois.

— Talvez é o destino dando uma chance para vocês de novo.

Quando ela disse aquilo, meu olhar se cruzou com o de Laurent. Mesmo a distância, algo dentro de mim queimava, ansiando por mais. A passos lentos e desviando de algumas pessoas que estavam na pista de dança improvisada, Laurent se aproximou de mim novamente, com um sorriso que derretia meu coração todas às vezes.

— Espero não ter causado problema entre você e seu chefe.

Balancei a cabeça em negativo para que ele esquecesse aquilo.

Jonny está fora de jogo.

Laurent voltou.

NOTAS DA AUTORA:

Seguraaa coração. Para os amantes de Jonisla, esse capítulo não foi muito bom, não é mesmo? Mas reservem um espacinho  co coração de vocês para o Laurent, ele não é o vilão da história <3 e a autora aqui gosta bastante dele. 

Não esqueçam de votar e comentar. <3 Semana que vem estamos de volta com mais um capítulo.