Capítulo 2 - Fúnebre

O céu estava cinza, o vento uivava enquanto retirava delicadamente as folhas das arvores calvas, fazia frio e eu me cobri com cobertor com meus olhos presos a janela. Tudo estava em um tom sutil fúnebre, o grande dia havia chegado.

O despertador marcou 06h15min da manhã, olhei o criado mudo, abri a primeira gaveta e peguei um frasco de tarja preta. O abri, e ao virá-lo na minha mão segurei um comprimido branco, o joguei na boca e o mastiguei. Fechei o frasco e coloquei de volta na gaveta do criado mudo.

Troquei-me rapidamente, vesti uma camisa preta, calça jeans e o All Star. A casa estava em silencio, Jhon ainda dormia. Direcionei-me até a porta principal. Abri e a fechei rapidamente, sem fazer qualquer ruído.

Caminhei pelas ruas da cidade ainda deserta, levei 15 minutos até chegar à saída norte da cidade, caminhei sem pressa alguma.

O Sol banhava a água cristalina do lago, o céu estava em seu azul marinho pilhado pelo tom fúnebre. A brisa era gelada, os pássaros cantavam uma doce melodia. O lago era cercado por árvores de uma densa floresta e havia uma rocha na borda do lago. Sentei-me e olhei meu reflexo na água.

No final das contas eu estava triste. Meu plano era simples e a prova de falhas, observando as flores brancas no dia anterior, havia me ocorrido à idéia. As majestosas flores brancas eram regadas silenciosamente. Sem o sistema elas morreriam, mas se o sistema as regasse de mais elas também morreriam.

Não havia nada que me prendesse por mais tempo a esse mundo.

Tirei o All Star e o coloquei de lado, me levantei, suspirei e olhei novamente meu reflexo na água. Meus olhos começaram a lacrimejar e de um deles escorreu uma lagrima. Enxuguei-a e olhei para o céu com seu tom fúnebre e puro.

Meu plano era a prova de falhas porque eu não sabia nadar e morreria afogada em um lugar belo e distante onde não havia chance de salvação.

Levantei-me e olhei para a água cristalina e pulei.

O desespero tomou conta do meu corpo.

Automaticamente me debati na água procurando algo em que me segurar, mas não havia nada. Minha boca se abria para gritar, mas não houve nenhum som. Meu corpo estava afundando e pela minha boca entrava água até que desisti fechei os meus olhos e a última coisa que vi foi o céu azul e depois do azul pude ver os olhos castanhos, o cabelo negro e desalinhado e no final tudo escureceu.

Meu peito era massageado rapidamente enquanto eu colocava água para fora, foi então que percebi que era Lucas que me ressuscitava, seus olhos estavam desesperados e a boca estava fechada num sinal de impaciência seu cabelo estava molhado.

– Lucy– ele me olhou com um leve sorriso e suas feições se tornaram serias em seguida. – No que você estava pensando?

– Eu...– eu não tinha força nem pra falar.

–Você precisa de um médico. – ele me colocou no seu colo, e pude sentir seu peito nu e dentro dele o coração querendo sair.

Ele caminhou comigo nos braços até um gol prata, ele me colocou no banco do passageiro, fechou a porta e entrou rapidamente. Ele ligou o carro acelerou, a paisagem passava rápido, e cansada fechei os meus olhos, enquanto pensamentos dominavam a minha mente.

Porque a última lembrança que me veio à mente foi a de Lucas? Porque Lucas? Eu poderia procurar por respostas depois, eu estava exausta então dormi.

Quando abri os meus olhos lá estava ele, dormindo numa poltrona. Eu estava deitada em uma cama de hospital, havia vários aparelhos conectados ao meu corpo. A enfermeira entrou no quarto e abriu as cortinas, ela se aproximou de mim e verificou o soro.

– Há quanto tempo ele está aqui? – olhei para a enfermeira que estava ao meu lado examinando talvez meu estado atual.

– Ele? – ela riu – Não saiu daqui nem por um minuto, ele está aqui desde ontem. – ela fez uma pausa e riu docemente – Ele deve gostar muito de você.

O olhei novamente, mas ele continuava ali inerente preso em seus sonhos. A enfermeira o olhou brevemente e se virou para mim com um sorriso, ela não pronunciava nenhuma palavra, logo depois saiu. Eu não imaginava ninguém deitado em uma poltrona de hospital além do meu pai.

A porta se abriu. Jhon estava com seus olhos verdes cansados e com vestígios de olheiras, o cabelo estava desalinhado e o rosto perdido em pensamentos. Ele trazia um copo de café expresso, provavelmente para Lucas.

– Pai... – o chamei, seu rosto saia da perdição enquanto os seus olhos brilhavam ao ouvir a minha voz.

– Lucy – ele me abraçou – Me prometa que terá mais cuidado, eu não quero te perder – ele me olhava.

– Eu prometo – eu o olhei e automaticamente meus olhos se fixaram em Lucas, pude ouvir um leve sorriso vindo de Jhon.

– Ele é um bom garoto – o olhei e Jhon o olhava – Ele está aqui desde ontem e já até tentei dizer para ele ir para casa, até os pais dele, mas ele se recusou a ir.

– Eu não o entendo...

– Tenho certeza de que o entende – ele me olhou e me deu um meio sorriso – Você o entende mais do que você imagina.

Ele se levantou e colocou o copo de café expresso em cima de uma mesinha que estava perto da porta.

– Volto mais tarde, você está em boas mãos – Jhon se virou e saiu do quarto, fechando a porta atrás de si.

Aos poucos ele abriu os olhos que estavam cansados e as olheiras em seu rosto me diziam que ele não dormira direito. Ele me olhou e vi nascer em seu rosto o mais belo sorriso e foi nele que eu me perdi. A preocupação que o habitava havia sumido.

Eu sorria.

– Você está bem? – ele se aproximou da cama puxando a poltrona consigo.

– Graças a você...

– No que você estava pensando? - seu rosto se enrijeceu, mas a alegria de me ver ainda estava em seus olhos.

– Era a única solução – me desviei do seu olhar. – Eu vou morrer de um jeito ou de outro.

– E porque acelerar? – o olhei seu rosto estava calmo com o mesmo brilho no olhar.

– Eu já sofri demais e... Eu só queria dar um fim a tudo isso. Meu coração não aguenta mais nem viver e nem se decepcionar – ele assentiu com o olhar.

– Sei que não sou importante para você, mas será que você pode parar de pensar em se matar pelo seu pai?

O olhei em silencio e consenti com um breve movimento de cabeça. Ele estava errado ao dizer que não era importante, eu queria dizer que ele era importante, mas eu não conseguia dizer isso a ele.

– Eu preciso que confirme que caiu por acidente no lago.

– Que eu o que? – o olhei confusa.

– É... Achei melhor dizer que você caiu por acidente do que o verdadeiro motivo, só alguém que quer se matar vai ao lago sozinha sem saber nadar.

– Como sabe que?.

– Estudei com você desde a 1° série – ele deu um leve sorriso. – Só não fomos apresentados devidamente e o mais perto que tive de uma conversa com você foi quando a ajudei – Ele me olhava enquanto o sorriso se desfazia aos poucos.

Ele se levantou, empurrou a poltrona de volta ao lugar e se direcionou a porta.

– Aonde você vai? – Eu não queria que ele fosse.

– Você já está bem não precisa mais de mim.

E antes que eu pudesse protestar ele já havia ido. E eu fiquei sozinha no quarto, eu estava tão confusa e tão certa. Eu só queria que ele ficasse mais um pouco, eu queria que o garoto que eu conhecia de longe, ficasse ali. Enquanto eu estava perdida aos meus pensamentos, alguém abriu a porta do quarto, foquei meus olhos no desconhecido.

Era Math.

Com um doce sorriso no rosto e sem nenhum rastro de noite mal dormida ou qualquer preocupação o que me desapontava um pouco.

– Tudo bem com você Lucy?

– Sim. Se não fosse o Lucas... – dei um breve sorriso.

– Lucas? – Math me olhou desconfiado.

– É ele estuda lá no colégio na sala quatro, no térreo.

– E o que vocês faziam tão longe da cidade, no lago?

– Conversando.

– Só isso? – disse ele com um olhar desconfiado.

Ele estava com ciúmes?

– Sim. Só isso Math.

Em outra época eu teria ficado feliz em ver Math com ciúmes de mim, mas para mim isso não fazia diferença alguma agora, o resto da nossa conversa foi vaga e eu não prestava atenção nele, meus pensamentos estavam em meu amigo que havia até o momento tirado Math do seu pedestal.

Meus pensamentos estavam incondicionalmente, irrevogavelmente em Lucas.

No final da tarde pude voltar para casa, Jhon me dava muita atenção e Math ia me ver a cada meia hora, mas só havia uma pessoa que eu ansiava em ver, somente uma...

Eu estava no meu quarto revendo algumas fotos do fundamental e lá estava ele, em todas as fotos.

– Lucy – Lucas bateu na porta de madeira duas vezes.

Ao reconhecer sua voz, me levantei e corri até ele o abraçando como se ele fosse à única coisa importante.

– Seu pai ligou pra minha mãe. – Ele falava em meio a um sorriso – vejo que você está muito bem.

– Graças a você – o olhei comum sorriso. – Eu preciso te perguntar uma coisa.

– Pergunte.

– Como você foi para o lago?

– Bem – ele deu um breve sorriso – Bem eu não sei como explicar ao certo, parece ate doideira, mas eu só estava em casa pensando em... E me veio à mente o lago e logo em seguida senti meu coração se apertar... Fiquei desesperado quando vi você boiando na água – seus olhos ficaram tristes.

– Me perdoa? – abaixei a cabeça.

– Não tenho o que perdoar – ele riu – O que importa é que você está bem, infelizmente eu não posso ficar.

– Mas já? – falei em protesto – Te vejo amanhã no colégio?

– Não. Eu vou viajar e não sei ao certo quando vou voltar.

Fiquei perdida e desolada quando ele disse que viajaria, ele me olhou e deu um breve sorriso.

– Eu vou voltar logo.

– Promete.

– Prometo. – ele beijou minha testa e me abraçou forte.

Eu desejava que fosse eterno e que ele não deixasse os meus braços e sem dizer mais nada ele saiu dos meus braços e se foi. Por mais que eu achasse tudo um grande absurdo eu não poderia negar duas coisas: Lucas gostava de mim e eu o retribuía, por enquanto não precisávamos de palavras somente existir um para o outro.

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