Tchau

[Fevereiro de 2013]

Como nos dezoito meses anteriores, Augustine acordou às 5:00 e pedalou até sua floricultura, a diferença é que dessa vez passou mais devagar pela Pont des Arts com a esperança de encontrar uma pessoa específica entre os muitos turistas e seus cadeados. Mas, como em todos os outros dias, seguiu seu caminho sem interrupções. De alguma maneira, aquilo a incomodou pela primeira vez, incômodo que insistiu em permanecer ali durante outras manhãs.

Os dias seguiram sem muitas surpresas. Estavam perto do dia dos namorados e, como sempre, as vendas subiram significativamente. O fato de a floricultura ficar a poucas quadras de distância da torre Eiffel também ajudava muito no número grande de clientes, a maioria deles era turista.

Otimista, Augustine analisava as contas. Apesar dos meses anteriores terem tirado algumas noites de sono dela, o último lhe deixara mais calma. Estava tudo dando tão certo que ela sentia vontade de dançar! Quis contar a Charlotte, que era sua ajudante e também única amiga. Levantou-se, afastando-se da mesa com alguns passinhos de dança e, antes mesmo que se aproximasse da porta, levou um susto.

Um cliente acabara de pedir uma flor-de-maio. Aliás, quem além dela conhecia a tal flor? Maior foi seu terror ao perceber que, além de pedir sua flor preferida, pediu também que ela fosse entregue no endereço de Augustine!

Terrificada, a menina tropeçou enquanto saia do escritório. E, por mais incrível que pareça, sua expressão de surpresa apenas se intensificou.

— Augustine! - um sotaque brasileiro gritou, abrindo seu sorriso branquinho.

Charlotte olhou assustada para a amiga, que, tentando recuperar a compostura, caminhou até o homem a sua frente.

— Jacques! Como você me descobriu aqui? - ela sorriu, outra vez sendo surpreendida, mas agora por descobrir que estava feliz por o ver outra vez.

— Bem, eu não descobri. É que você esqueceu isso e queria devolver. - ele estendeu o precioso livreto para Augustine. Ela nem tinha notado que estava sem ele! Pegou o livro com um sorriso grato e Jacques logo retomou sua fala — Lembrei que gostava da tal flor e, como tinha seu endereço aqui, pensei em devolvê-lo antes de voltar ao Brasil.

Charlotte os observava com curiosidade e, assim que Augustine lembrou que não estava a sós com ele, sentiu-se estranhamente incomodada.

— Char, eu vou sair para almoçar. Se quiser pode ir também - disse e então voltou para perto de Jacques. — Que tal um último passeio com a melhor guia turística de Paris?

— Só se aceitar almoçar comigo.

Decidiram ficar em um restaurante pequeno perto dali e jogaram conversa fora durante toda a refeição. O que foi curioso, já que os dois só falavam de outras comidas. Augustine, particularmente, estava encantada com as descrições da comida brasileira. Logo em seguida, ficaram alguns minutos no mesmo assunto, mas agora na torre Eiffel. Caminhando mais um pouco, foram até o Musée du Quai Branly.

— Meus pais se conheceram no Louvre, acredita? - disse ele, desviando a atenção de Augustine da obra à sua frente.

Depois de capturar atenção da menina, Jacques voltou a falar.

— Ele veio fazer um intercâmbio aqui. Três meses antes de voltar pro Brasil, eles se conheceram. Segundo ele, foi amor à primeira vista. Minha mãe discorda, mas assume que ele chamou a atenção dela de cara. E, bem, ele teve a sorte de gostar logo da garota apaixonada pelo Brasil. Em uma semana já estavam namorando. Antes de voltar pro Brasil, colocaram um cadeado com os nomes deles na Pont des Arts. Foi uma maneira do meu pai lhe pedir em casamento sem assustar minha mãe, já que ela achava que era muito nova pra isso. De certa maneira funcionou, já que dois meses depois ela aceitou um pedido de casamento via carta. E, bem, aqui estou eu.

— Nossa!

— Pois é. Lembro que, quando eu era criança, ouvia essa história e costumava planejar vir a Paris procurar o tal cadeado.

Do nada, Augustine soltou um gritinho e começou a arrastar Jacques museu à fora.

— O que você está fazendo?

— Tive uma ideia, vem!

E, pela segunda vez, Jacques seguia Augustine por um caminho desconhecido. Depois de alguns instantes, ele reconheceu os lugares capturados em sua câmera noites atrás.

— Pont des Arts? - perguntou, ficando à frente dela e a obrigando a parar.

Os olhos delas são verdes, percebeu. E, agora que estava mais perto, percebeu que seu cabelo tinha algumas mechas mais loiras, especialmente no lado esquerdo. Augustine deu um sorriso travesso - o mesmo que dava na infância, quando pretendia aprontar alguma coisa.

— Vamos realizar seu sonho de infância - anunciou enquanto quase corria até a ponte.

— Você tem noção de que é praticamente impossível encontrar esse cadeado, certo? Existem milhares deles aqui!

— Mas não no lugar onde eles colocaram! - disse como se sua ideia fosse óbvia e simples. — Fala com sua mãe, ela deve saber.

Jacques balançou a cabeça em desaprovação, mas obedeceu. Em poucos instantes, a mãe respondeu sua mensagem, ainda que estranhando a pergunta do filho.

— Lado esquerdo, fim da ponta, parte de baixo - deu as coordenadas e ela correu outra vez, em uma animação que poderia divertir qualquer um.

Sem muitas escolhas, Jacques a seguiu. E já não podia negar, a animação da jovem já era contagiante.

— Marcos e Chloé. Tem data também: 1985.

Augustine então começou a procurar pelo tal cadeado, Jacques a ajudando. Alguns minutos depois, ambos estavam cansados e decepcionados. Não encontraram o cadeado em lugar nenhum. Decidiram procurar no lado direito, mas nada também.

— Acho que não vamos encontrar - e lá estava outra vez o que Jacques descobriu odiar: a expressão de desapontamento no rosto de Augustine.

— Ei! E se ela considerar a outra extremidade da ponte como o fim? - sugeriu ele, buscando de alguma forma alegrar a menina.

E conseguiu. Outra vez, largando qualquer maturidade que havia adquirido em seus 21 anos, Augustine correu até o outro lado da ponte.

Jacques a seguiu seguiu em uma caminhada calma, sem tirar os olhos da mulher que logo agarrou um cadeado como se sua vida dependesse dele.

— Achei! Achei! - gritou e dessa vez Jacques também correu.

Mal podia acreditar! Pegou sua câmera e capturou a imagem de uma Augustine sorridente agarrada a um cadeado na Pont des Arts.

Logo em seguida tirou um foto do cadeado pelo celular e enviou para sua mãe que ficou tão animada quanto eles.

— Nossa! Eu passei muito do horário! - disse Augustine assim que olhou para seu relógio.

Resmungando, Jacques admitiu que também precisava ir. Seu vôo partia em duas horas.

— Acho que é isso. Foi um prazer conhecer você, Jacques - disse estendendo sua mão para um aperto.

Jacques concordou e dessa vez foi ele a ter uma ideia maluca.

— Ei! Parece que a ponte funcionou com meus pais... - começou, apoiando-se à Pont. — E se fizéssemos o mesmo?

Augustine o olhou surpresa.

— Como amigos, claro. Um trato de amizade! - corrigiu rapidamente, lembrando-se da natureza romântica da superstição.

— Mas não temos uma cadeado.

— É, tem razão. Mas poderíamos comprar um.

— Não precisa! Como é amizade, podemos usar isso - Augustine tirou um pedaço de barbante de um de seus bolsos.

— Ok, vou fingir que você não subestimou nossa amizade. - Jacques fez-se de ofendido, mas logo deixou uma de suas rizadas espalhafatosas preencher o espaço entre eles. Augustine sentiria falta daquilo.

Depois de amarrarem o barbante à Pont des Arts, Augustine e Jacques se abraçaram, outra vez seguindo caminhos opostos.

Bạn đang đọc truyện trên: AzTruyen.Top