Capítulo 58
Alguns anos depois.
— Papai! Vamos no parque, você prometeu... — Minha filha pediu, fazendo biquinho e ameaçando encher os olhos de lágrimas — Leia seu caderninho, tem ai, começo do outono, levar a Sarinha para passeios.
— Não preciso ler, para lembrar que preciso aproveitar cada segundo com minha princesinha — Respondi pegando Sara no colo e lhe dando um abraço apertado — Chame sua mãe, vamos agora! Se arrume e pegue suas coisas de banho, depois do parque, vamos a praia.
— Sério?! — Sara gritou empolgada e saiu pulando pela casa — Eba! Vamos a praia!
O tempo, pela primeira vez, havia sido bondoso comigo. Mesmo não levando, junto com meus anos de vida, minhas preciosas memorias, consegui ter uma vida feliz. Fiz bons amigos, terminei os estudos, me tornei palestrante, dando aulas sobre minha doença e contando minhas experiencias, motivando jovens, adultos e demais interessados, a não desistir e prosseguir com a vida, não importa a dificuldade.
— Querido, vamos mesmo a praia? — Minha esposa perguntou confusa — Você passou a semana palestrando e 3 delas foram em outros estados, não é melhor descansar?
— Amor, qual é meu lema? — Questionei ela e minha esposa revirou os olhos chateada, sabendo que não iria me convencer — Vamos, responda. Aquela frase bonita, escrita em cada quadro, parede da nossa casa, livro, site e qualquer lugar que minha história já passou.
— Viver como se não houvesse amanhã... — Ela suspirou derrotada — Na minha inaceitável opinião, isso ainda não é motivação. É só um lembrete que logo, logo você deixará sozinha.
— Ah, não seja assim, meu bem — Puxei ela para meus braços e beijei sua testa — Já conversamos sobre isso Senhora Sammy Blazer. Deixe de drama e vá vestir aquele biquíni maravilhoso que eu adoro!
— Mamãe! Não consigo fechar o Zíper do vestido — Sara gritou do quarto — Não achei minha roupa de banho também...
— Vou preparar a comida, até logo querida — Falei dando um selinho na minha esposa, que sorriu e me deu uma lista com os nomes e detalhes sobre as comidas, já que com o tempo, eu não lembrava mais a diferença entre maças, goiabas, laranjas ou qualquer fruta redonda — Obrigado minha gatinha.
— Gatinha com 50 anos? — Ela riu subindo as escadas — Não me iluda!
— Eu tenho 52 e sou o maior gatão, as novinhas ficam loucas — Brinquei e fui para a cozinha, não demorou muito para Sara descer as escadas e vir me ajudar — Princesa, o papai ainda arrasa corações por ai não é?
— Eu diria que elas estão interessadas mais em seu salário, do que em seu coração papai — Minha filha respondeu toda inocente — Mas pra mim, você é o papai mais lindo do universo.
— Cada dia mais parecida com sua mãe — Fiz cara de chateado e depois rir — Pode fazer os sanduíches querida?
— Não é mais fácil e eficaz comprar comida? — Ela questionou espertinha e lancei um olhar cortante pra ela — Já sei, já sei, comida feito em casa é mais saudável.
Embora ela estivesse certa e eu apoiasse a ideia de comprar, eu não queria fazer minha família passar vergonha toda vez que saíssemos de casa, então criei essa ideia de que é melhor comida de casa. Infelizmente, eu sempre esquecia de pegar meu cartão depois de pagar as compras, ás vezes eu não sabia a diferença de valores e muito menos o que era batata frita ou um milk shake. Sammy precisava fazer tudo, além de tomar conta da Sara e ficar atenta para eu não me perder, nas minhas idas necessárias e frequentes ao banheiro. Era sempre exaustivo para minha esposa, ficando quase sem tempo para se divertir. Mesmo não querendo estragar nossos planejamentos de viagens, eu sabia que na idade dela, Sammy preferia e achava mais tranquilo ficar em casa.
— Papai, tia Marry não pode ir dessa vez? — Sara perguntou curiosa — Faz tempo que ela não nos visita...
— Meu anjo, você sabe que a titia está trabalhando. Talvez nas férias... — Falei desanimado, sabendo que aquilo era pouco provável — Se ela escolher ter esse ano. Depois ligue pra ela e cobre isso, quem sabe você amoleça aquele coração duro dela.
Quando Marry, Sammy e eu terminamos os estudos, cada um seguiu seu caminhos. Eu quis ser professor e cursei letras, mas logo decidir apenas palestrar e logo ganhei fama, muitas universidades e vários lugares me requisitavam para saber mais sobre minha doença. Sammy resolveu ser advogada, porém, nossos caminhos se cruzaram após uns 7 anos de profissão dela. Começamos a namorar, 1 ano depois casamos e 5 anos a frente, ela engravidou e deixou a carreira de lado. Já Marry, optou por ser Investigadora da Policia. Passou em 1º lugar com a nota mais, estudou na melhor universidade e atualmente é a melhor investigadora da cidade, até agora não perdeu um caso.
Não lembro ao certo, o por que dessa escolha dela, mas acredito fortemente que tem algo a ver com nossa mãe verdadeira. Descobri certa vez, mexendo nas coisas dela, que ela descobriu o paradeiro da minha adotiva, que infelizmente, morreu, vitima de um acidente culposo. Não se sabe ainda sobre os envolvidos, contudo, acho que tem a ver com nossa mãe biológica e o ex namorado dela, que por sinal, é pai da Marry. É um passado muito triste o nosso, ás vezes penso em queimar os cadernos com essas recordações e deixar o tempo e minha doença, levar de vez todas essas lembranças dolorosas. Talvez um dia, eu faça isso de vez, como uma despedida de mim mesmo, ou quem sabe eu transforme em um livro. Daria um ótimo drama!
— Amor, vamos? — Sammy chamou, me acordando dos meus pensamentos — Se demorarmos mais, não acharemos vagas para estacionar.
— Verdade. Vou indo para o carro, tirar ele da garagem — Falei saindo — Sara, ajude sua mãe a trazer as coisas.
Fui em direção ao carro e logo minha esposa e minha filha chegarão. Seguimos viagem ao parque de diversões, ao chegar lá, fiz questão de ir em todos os brinquedos que Sara mais gostava e fui em alguns outros que eu ansiava lembrar a sensação. Depois, saímos de la e fomos em direção ao parque, sempre guiados pelo GPS do carro. Não ter memoria me impossibilitava de muitas coisas, mas percebi que passados os anos, tomando os medicamentos que meu medico estava testando em mim, para achar uma possível cura, tenho a impressão que já não sou esquecido. Ao menos lembro do nome da minha amada esposa e da minha querida filha.
— Pai esquecemos a água, pode ir comprar? — Sara pediu e minha esposa fez uma careta chateada, quando descemos do carro — Ah, perdão...
— Eu vou querida, vi uma moça vendendo numa barriquinha, não muito longe daqui — Respondi animado, pois dessa vez, eu sabia que não traria problemas — Confie em mim, vou e volto em segundos. Pagarei em dinheiro e deixarei o troco lá, para ajudar a senhora. Nada dará errado!
— Tudo bem, eu acho... — Sammy falou preocupada — Então vamos esperar aqui no carro e depois iremos juntos até a praia. Quando eu lhe ver, vou te acenar... Tente lembrar, certo?
— Como eu esqueceria o rosto, da mulher mais linda desse planeta, que ainda por cima é minha esposa? — Falei lhe dando um beijo e saindo para comprar a água — Eu te ligo, se algo acontecer.
Não tinha erro, eu vi a barraca perto da palmeira mais alta. Percebi que só havia ela, as outras eram de altura média ou menor. Segui até o local e ao chegar, notei uma fila enorme. Resolvi enviar logo uma mensagem para Sammy, assim diminuiria um pouco da preocupação. Demorou cerca de meia hora para eu ser atendido, faltando apenas uma menina que não se decidia era água de coco, água natural, refrigerante ou suco. Se fosse eu, o mais saudável é obvio, mas jovens não ligam para diabetes aos 20 anos, para eles, isso é algo só para idosos. Aproveitei a indecisão dela, para enviar outra mensagem para minha esposa, avisando que era minha vez e eu retornaria em alguns minutos.
— Bom dia, eu gostaria de 3 águas naturais, bem geladas, se possível! — Pedi ainda cabisbaixo, encarando o celular e notando a demora da senhora para me responder, a encarei — Algum problema?
— Ah... N-não... — A senhora gaguejou e continuou me encarando — Você... Qual o seu nome?
— Richard e o seu? — Sorri e paguei a água, para fazê-la entender que eu estava com pressa — Me conhece?
— Sou eu, Richard... Marília — Aquele nome era familiar, mas o rosto dela era muito estranho, talvez pela idade — Não lembra mais de mim? Sei que faz tempo... Tem seu problema de memoria também...
— Espera! Como sabe disso? — Perguntei surpreso — É alguma fã minha? Bom saber que sou famoso até entre os idosos. Me viu em alguma palestra?
— Querido, sou eu... — Ela repetiu com lágrimas nos olhos dessa vez — Marília, sua mãe... Eu que te levei ao hospital, fiz doação de sangue, me entreguei a policia para sua outra mãe adotiva sair da cadeia e...
Eu já não a escutava mais. Há muito tempo atrás, em várias páginas e em dezenas de cadernos, estava escrito, que havia apenas uma coisa que eu não poderia fazer, que eu deveria evitar a todo custo. Ver minha mãe biológica... Aquela pessoa, seria a mesma que destruiu minha vida e a da minha irmã? Que estava por trás da morte da minha mãe adotiva? Tantas perguntas e uma dor horrível no peito. Senti um frio preencher meu corpo, mãos suadas e formigando, minha visão estava ficando embaçada. Naquele momento, eu não via mais nada, apenas uma escuridão preencher todo o lugar que eu estava.
Estamos na reta final hein? Só mais 2 capítulos! Será que o Richard vai sobreviver ou será hora do adeus? Se for, pensem pelo lado bom, ele viveu mais do que imaginavamos. Até o próximo cap.
Bạn đang đọc truyện trên: AzTruyen.Top