Coisas que não foram ditas
- Senhorita On-Yue?
Repetiu-se, com a voz ecoando dentro da sua cabeça.
A garota de cabelos escuros não pôde esconder a vergonha que subiu pelo seu rosto e se manifestou nas bochechas avermelhadas, em forma de rubor.
Nessas circunstâncias parecia uma pervertida.
- Pelo menos não esfreguei os dedos de ninguém nos meus seios -- seu resmungo escapou, discutindo consigo mesma.
- O que? -- a entonação subiu duas escaladas, tornando-se ridiculamente infantil -- O que a madame acabou de dizer?
Prestes a erguer os braços na altura da cabeça em rendição, cessou o movimento assim que as palavras vieram a tona.
Madame. Senhorita.
Espera aí.
Só tem uma pessoa em toda vizinhança - e, depois da dinastia Fujiwara, - que ainda usa esses termos coloquiais não ironicamente.
- É você! -- disse com o tom suspeitosamente elevado, virando-se com um amplo sorriso exagerado. Era pior em disfarçar do que o garoto que furava a fila e repetia o lanche, apenas botando o boné e fingindo ser outro estudante -- Kimmie! Como vai?
- Sou eu...-- enrugou levemente a testa, deixando que alguns de seus fios castanho claro fugissem da divisão semi-perfeita.
Ela era uma típica estudante na média. Muitas vezes na aula Yue a flagrava rabiscando na própria borracha e até perdida em devaneios, enquanto observava as borboletas lá fora.
Seu cabelo, normalmente preso, estava completamente livre daquele pompom rosa que sufocava seus fios em um rabo de cavalo.
Kimmie era mais uma das vítimas de Kochi, apesar de não fazer absolutamente nada para merecer isso - Novidade!
Não que Yue merecesse ser tratada pior do que salmão velho, mas Samantha, querendo ou não, havia motivos para me atazanar desde que Shin se aproximara dela.
Caso não estivesse morrendo de vergonha pela situação que a desestabilizava, estaria vermelha pela forma que o rosto de Kimmie tornou-se mais brilhante, estando exposto desde os ossos de seu maxilar, até a ponta das orelhas rosadas.
Caia bem nela.
- Eu que te pergunto. Está bem? -- inclinou a cabeça levemente para o lado, acompanhando meu olhar que, automaticamente, fugiu para os dois. Sozinhos. Naquela. Sala -- Talvez não seja você que esteja precisando de ajuda.
- O que? -- piscou, tornando-se rapidamente para o corpo pequeno -- N-Não! Está tudo sob controle! Ninguém precisa de socorro por aqui-puft!
Emitiu um sonido estranho com a boca, revirando os olhos como se esse pensamento fosse um tremendo absurdo - Como se escutara algo surreal de Kimmie.
Mas não era nada além da verdade e a verdade não costumava ser surreal.
- Algo me diz que tem muito mais acontecendo do que deixa transparecer -- disse, semicerrando os olhos analítica.
Yue engoliu seco.
Como ela poderia ter o dom de saber das coisas, mesmo sem saber de nada? Só podia significar uma coisa...
Os olhos azuis percorreram a menina diante de si descaradamente, parando em seu rosto enquanto processava sua conclusão:
Definitivamente ela era uma empata.
Não.
Não uma empata-foda. Uma empata. Que sente o que os outros estão sentindo e tudo mais -- Nível X-men.
- Ah! -- teve um relapso, mudando a expressão para um sorriso -- Antes que eu me esqueça, vim aqui para te agradecer.
- Não foi por nada! -- mexeu a mão, dispensando o agradecimento, como se estivesse dizendo que não foi nada demais -- Pera-por que isso de repente?
Os lábios em um laranja fraco - quase que um mate - abriram-se, expulsando uma risada gostosa.
Kimmie levou as unhas pintadas de rose para o canto dos olhos, limpando as lágrimas fujonas que ameaçavam surgir.
- Você é realmente um tesouro no meio de tanta poluição! -- referiu-se a escola, recompondo-se e deixando Yue com uma sensação engraçada no peito enquanto via a cena -- Soube que confrontou os aspirantes a Hollywood...
*:・゚✧Aspirantes a Hollywood*:・゚✧
=
Samantha e sua gangue
- Não imagina o tamanho da minha surpresa quando falaram que você confrontou o foguete dourado, em pleno corredor! -- o ar de fascínio se fez presente, juntamente de um brilho dentro de suas orbes.
*:・゚✧Foguete Dourado*:・゚✧
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Kin Shin
Por que o apelido?
Digamos que Shin, durante suas rotineiras e intensas disputas no basquete, voasse quando arremessasse a bola. Em um jogo, um louco - fanático - gritou da arquibancada. Acabou pegando.
Ela costumava usar apelidos como maneira de disfarçar sobre quem falava. É uma tática inteligente adotar códigos, por mais bobo que pudesse soar.
E, se você quer sobreviver, torna-se essencial.
Yue coçou atrás da nuca, mostrando o seu melhor sorriso - Mesmo que, no fundo, tenha dúvidas se é verdadeiro.
- Não fiz isso pensando no que era certo. Eu fiz porque eu achei certo na hora -- buscou adotar um tom brando, sendo sincera -- Não mereço agradecimento, porque, parando para pensar, foi até um pouco egoísta e inconsequente. Poderia ter botado eles na sua cola.
A boca dela se abriu.
Por longos minutos Yue cogitou ter dado um pane na mente da garota. Provavelmente demoraria um pouco para processar...
- Como pode dizer uma coisa dessas?! -- exclamou subitamente, fazendo com que Yue desse um pulo, saindo do chão -- Se isso foi um ato egoísta, por favor, o colégio adoraria que você fosse mais egoísta!
- Olha, não precisa mesmo disso...-- olhou para os lados, preocupada se havia alguma entidade a espreita, as observando: -- Não sou uma super heroína com capa, nem nada do gênero. Apenas fiz uma coisa pelo momento. Sem medir as consequências.
Isso também era conhecido como "ser adolescente" ou "vivenciar plenamente a sua juventude"
Porém essa não é a questão agora. Não, o foco era aqueles dois, sozinhos, em uma sala e esse foco - e a imagem enjoada - perseguiria Yue pelo resto do semestre letivo.
Um calor reconfortante envolveu as mãos da garota de cabelos escuros.
Surpresa, abaixou seu olhar na direção daqueles dedos enfeitados e delicados. Kimmie envolvera sua mão.
- Pare de ser teimosa. Apenas aceite quando agradecem e escute quando pedirem desculpa! Não tem mistério -- disse simplista, deixando uma pontada de inveja dentro de Yue, surgir -- Você achou ser o certo, porque você, On-Yue, é a única pessoa boa que conheço. Sabe como tenho tanta certeza disso? Porque uma pessoa boa não tira medidas antes de fazer o que o coração manda, mesmo que isso signifique arrumar problemas para si mesmo no futuro.
Kimmie soava tão firme e convicta que seu semblante foi tomado pela confiança. Yue sentiu suas bochechas arderem subitamente.
A boca entreabriu, permitindo um pouco do ar que respirava, escapar.
- Já disse que você é de outro mundo? -- um sorriso terno pairou nos lábios finos de Yue, direcionando um olhar carinhoso.
Kimmie jogou o cabelo para trás em um gesto metido, prestes a falar algo quando não foi sua voz que saiu:
- O que as arruaceiras estão fazendo? -- o agudo doloroso de Kochi estalou dentro dos ouvidos de Yue -- Não podem se controlar e badernar em outro lugar?
O contato apertado se dissolveu no ar, assim que ambas escutaram a porta se abrindo com um barulho alto e fugaz.
Se voltaram para a sala, ficando de frente para Kochi e - ali, bem ao lado - estavam cercados pelo salpicar de canela e madeira.
A silhueta masculina se aproximou a passos constantes e, quando reparou, estavam um de frente para o outro, deixando as duas garotas trocando faíscas silenciosas entre si.
O par de olhos intensos subiu pelo seu corpo e desceu com uma pontada de desprezo orbitando as íris cor avelã.
- O que fazem aqui? -- indagou, sem desgrudar os olhos de Yue -- Não acham que estão atrasadas para ir? O sinal já bateu.
Yue falaria, mas foram interrompidas, novamente, pela voz irritante de Samantha. Ela aprendera a falar ontem, não é possível!
- Bisbilhotando por trás da porta, não é óbvio? -- disparou um sorriso ácido, deixando amostra suas presas afiadas -- Ninguém respeita mais a privacidade dos outros nos dias de hoje.
Yue sequer cogitou lançar sua atenção para Samantha. Não daria o que ela queria, biscoito - Caso quisesse, procurasse seus súditos leais para fornecerem uma fornada inteira para ela.
Contentou-se em fechar os olhos por segundos, respirando fundo.
- Sabe muito bem que não foi o que aconteceu -- os abriu, sustentando o sondar firme de Shin. Ela também podia jogar esse jogo de encaradas.
- Eu sei? -- rebateu, cruzando os braços sob o peito -- Porque não é o que está parecendo.
- Não preciso justificar minhas ações para vocês -- lançou uma disparada grosseira para Kochi, voltando ao rapaz com as sobrancelhas quase se encostando: -- Sei o que eu fiz e, espionar o casalzinho do ano, não está entre essas coisas.
Yue sentiu uma mão envolver seu pulso.
Kimmie estará apertando a região, com a cabeça levemente inclinada para baixo enquanto evitava encarar eles nos olhos.
- Vamos logo para casa, Onnie -- o apelido deixou Yue tentada a obedecê-la, percebendo o desconforto da garota por estar ali.
Entretanto, não aceitava a forma que se sentia impotente e inferior a eles.
Ela precisava erguer a cabeça.
Levou a mão de encontro a da colega, pondo gentilmente por cima e a libertando do toque. Antes que desse continuidade, balbuciou um desculpe para Kimmie.
Talvez ela a perdoasse.
- Seus seios sempre foram tão grandes? -- tornou-se para Kochi, lançando um olhar indecifrável enquanto mantinha uma sobrancelha erguida provocativamente -- Desculpe é que, como você disse, eu estava bisbilhotando e não pude evitar de reparar.
Aquela risada familiar se fez presente, deixando uma pontada de satisfação preencher a lacuna odiosa dentro de Yue.
Kimmie se engasgou, pondo a mão na boca enquanto buscava disfarçar ou sufocar o som alto que emanava de si.
- Do que você está rindo pirralha?! -- gritou em descontentamento, deixando visível rugas brotarem da testa perfeitamente lisa -- Saiba que esses bebês aqui são fruto de benção divina!
Então a garota de cabelos negros trocou um olhar cúmplice com Kimmie.
E, antes que Yue virasse totalmente para a colega, sentiu a sombra de um sorriso pairar nos lábios de Shin.
- Isso não vai ficar assim -- rosnou, prestes a espumar pela boca. O que seria uma pena, borraria seus lábios cheios e cor-de-rosa.
Antes que desse a oportunidade de Kochi tentar algo sem pé nem cabeça, Shin pegou Yue pelo pulso e seguiu corredor a dentro.
- O que pensa que está fazendo levando o meu Kingzinho? -- arregaçou as mangas, se aproximando a passos fundos -- Mais uma...!
Sentiu seu corpo ser empurrado para trás e jogado contra a parede mais próxima. Kimmie tomou o as rédeas da situação.
Se prontificou de manter a rainha abelha com seu ferrão guardado.
- Fico te devendo uma, Kimmie! -- Shin jogou por cima do ombro, tendo um consentimento silencioso de cabeça e sorriso conformado.
- Só não magoar a minha amiga! -- retrucou, mantendo os braços contra a pele azeda de Samantha.
Quando finalmente encontraram um corredor - mais vazio do que o outro - Para se esconderem, o abrigo tornou-se a perdição de Yue.
Durante a corrida, apenas manteve a atenção nos dedos dele envolvendo seu pulso. Eram firmes e, assim como daquela vez no intervalo, davam ar de segurança.
Ele não a soltou até que estivesse da na sua frente.
Prensada contra a parede de tijolos.
- Eu não acredito que fizemos isso -- os fios rebeldes voaram pela risada descontraída. Ele os jogou para trás, reflexamente -- Kochi vai botar o diretor para mandar todos os alunos limparem os banheiros depois da equipe de futebol usar.
- Eles fedem tanto assim? -- Yue não impediu uma careta. Sua risada a deixou tão a vontade que esqueceu completamente que estavam a centímetros de distância -- Só não devem feder tanto quanto eu.
Yue deu uma leve risada, percebendo os ombros de Shin pararam de se mexer. A risada cessou de súbito.
Um ponto de interrogação se formou em cima da garota de cabelos escuros.
- Jamais diga isso novamente -- seu olhar escureceu, fazendo com que arrepios percorressem por toda extensão do corpo de Yue.
- Só estou replicando o que falam -- pigarreou, utilizando o tratamento dos outros como defesa pessoal -- Não é como se mentissem. Sou neta de pesqueiro, faz parte de mim.
A frase final foi dita com orgulho.
E, a seguir, a garota acompanhou o canto dos lábios tentadores de Shin subirem em um sorriso. Era difícil de decifrar, mas ele pensara numa forma para que ela entenda com mais clareza.
As mãos se apoiaram acima da cabeça de Yue, deixando o corpo pequeno ainda menor. Estava contra a parede e o corpo atlético de Shin.
A cabeça inclinou-se vagorosamente para frente, ficando com uma distância mínima e ameaçadora.
- Você é única -- ponderou, desestabilizando todo sistema da garota que, agora, se mantinha em estado de alerta vermelho.
Ela buscou fugir dando um passo para trás, mas seus pés subiram na parede, deslizando em seguida e quase se chocando contra o torso do rapaz.
Voltou-se para o rapaz que, com a cabeça inclinada, aproximou-se perigosamente do seu pescoço.
- Seu cheiro, seu cabelo...A forma que pulava nas poças de chuva, só para lavar as galochas e não dar trabalho para os seus avós -- sussurrou ao pé do ouvido, deixando o corpo dela quente e a pele mais sensível -- Quero que se orgulhe de quem você se tornou porque eu...
Shin foi interrompido pelas próprias mãos da menina em seu colarinho, rompendo a distância quase inexistente e selando o maldito beijo que perseguia seus sonhos.
As bocas se encontraram e traçaram um único caminho.
Surpreso, demorou a se render e a fechar os olhos, mas logo acompanhou os lábios e entrou no ritmo de Yue.
A garota poderia nunca ter beijado, mas a forma determinante que o agarrou e capturou a boca do rapaz, pôde impressioná-lo.
Além de mostrar o quão certa ela estava daquilo.
Sequer se lembrava de respirar, ocupados demais com o que faziam. A mão da menina segurou as laterais de seu rosto, aprofundando mais o beijo.
No meio daquele mar de sensações, um frio ameaçara surgir da sua barriga, mas, no instante em que ele se formara, os braços fortes de Shin trataram de subir seu corpo.
Um gritinho surpreso escapou dentre os lábios de Yue, fazendo com que o rapaz desse uma risada, abafada pelos selares.
- Espera, espera...-- Shin afastara um pouco, apenas o suficiente para ver claramente a feição da garota -- Puxa.
O suspiro que escapou de sua boca permitiu que a garota se perguntasse em qual estado se encontrava.
- Um tornado passou por aqui, não é? -- mordiscou o lábio inferior, constrangida. Levou os dedos para os fios rebeldes.
Prestes a ajeitá-los, teve as mãos presas pelo próprio Shin.
Os olhos avelã escureceram, mergulhados pelo fascínio e desejo. As maçãs do rosto estavam coradas, os lábios acompanhavam em uma tonalidade avermelhada semelhante.
- Deixe-me vê-la melhor -- pediu em um tom profundo, marcado pela rouquidão. Yue apenas manteve-se parada, o peito subindo e descendo, ora encostando no torso dele -- O único tornado que vejo, é você. O tornado que bagunçou minha vida.
- Que honra! -- debochou, arquejando uma sobrancelha, provocando -- Imagino que nem todas as garotas são chamadas de um fenômeno meteorológico pelo Kin Shin.
- Nem todas elas são um tornado -- rebateu, dando um sorriso felino -- E, nem todas, têm uma constelação inteira no olhar.
Os dedos masculinos afastaram algumas mechas de seu campo de visão.
- Nesse caso, eu vou bagunçar a sua vida -- desceu as mãos até o pescoço dele, fechando as pernas ao seu redor -- Vou virá-la de cabeça para baixo. Você não viu nada ainda.
A atenção de Shin estava depositada naqueles lábios tão doces e convidativos. Sentia que precisava provar mais deles para conhecê-los melhor.
Aquele foi o gatilho final para pôr as mãos no rosto da garota e beijá-la fervorosamente. Diferente do primeiro, esse beijo exalava certa urgência da parte dele.
Como se, no fundo, necessitasse mais disso do que de respirar.
O que, por mais que evitasse admitir, talvez se tratasse disso. Yue podia mesmo tornar-se seu ar?
Ela sentiu a língua movimentar-se vagorosamente por todo interior da sua boca, explorando como se tentasse se recordar de cada canto. Quando as duas línguas se tocavam, uma eletricidade era compartilhada.
De repente o cheiro de coentro também manchava o seu uniforme. De repente a canela impregnava suas narinas e, de repente, vozes foram ouvidas...
- Um segundo -- Yue disse, buscando interromper o beijo que, Shin, por muito pouco não deixaria. Com um ar desconfiado, tornou a cabeça para o lado -- Escutou alguma coisa?
- Olha, eu...
- Não acredito! São os dois mesmo!
Meio atrapalhada Yue desfez o laço com as pernas, empurrando levemente o corpo do rapaz para trás.
Assim que sua atenção repousou nas roupas, pôde reparar o estado que se encontrava. Realmente, um tornado era pouco.
Ela ainda sentia o olhar de Shin sob si, queimando toda região do corpo. Estava tentando se concentrar em, pelo menos, conseguir dar um laço.
Porém, não conseguiria tão cedo com aquele par de olhos perfurando sua carne. O peso era tão grande que parecia encolher.
- Acho que você não vai mesmo acreditar, a não ser que veja com os próprios olhos.
- Merda -- praguejou em voz alta, os olhos ardendo pelas lágrimas frustrantes que surgiam. Os dedos embolaram no laço, enquanto cedia outra vez.
Assim que Yue levantou a cabeça, esperando se deparar com inúmeros olhares, uma grande muralha cobria sua visão.
Tratava-se da silhueta de Shin. Ele dispôs o corpo para escondê-la, dando mais tempo para que conseguisse se recompor.
- Leve o tempo que precisar, Onnie -- disse por cima do ombro, lançando um sorriso provocativo com o olhar brilhando em divertimento.
Engoliu, repassando as mãos velozmente pelo tecido, o esticando e desamarrotando. Levou uma mecha atrás da orelha, respirando fundo.
Se preparou psicologicamente, mas esse preparo não bastou. Seria necessário, no mínimo, uma semana para lidar com aquela quantidade exorbitante de alunos no mesmo ambiente.
Não pôde comparar a multidão com o vazio do corredor anterior.
Esse fenômeno só pôde ser acompanhado durante o intervalo, geralmente na fila - Mas, mesmo assim, não era capaz de reunir toda escola.
Os olhares eram todos depositados neles. As vozes transbordavam dos estudantes curiosos e fofoqueiros.
Obviamente não se contentariam em assistirem calados, sentiam a necessidade de comentar e compartilhar em voz alta suas teorias.
"Como ele consegue ficar perto sem tampar o nariz?" - uma voz atingiu com tudo.
"Com o inverno talvez Samantha tenha razão..."-- ponderou -- "Talvez o nariz dele esteja entupido"
Amargas teorias que levaram Yue a abaixar o olhar em direção aos meus pés. A coisa mais parecia me interessar - Além do próprio Shin.
Que, por sinal, ainda estava com o corpo a um suspiro de distância. O peito dela subia e descia com essa ideia.
"Seja o que for, ela não parece muito satisfeita" -- se aprofundou na testa franzida e os lábios cheios tomados para dentro da boca, fortemente.
"Alguma garota ficaria?" -- contrapôs como se fosse óbvio -- "Foi trocada por um pescado."
O rapaz metralhara todos com o olhar. Entretanto, algo mudou em sua expressão quando acompanhou Yue descer a cabeça.
Teria arrumado briga com todos ali, os punhos estavam cerrados e as veias do pescoço saltadas. Teria, se um aperto no peito o obrigasse a liberar os dedos das palmas e afrouxar as mãos.
- Onnie, vamos sair daqui -- mostrou-lhe a mão, parada no ar. O semblante não era aflito, pois escondia o sentimento o quanto podia dentro de si.
Vamos.
O apelido Onnie ainda fazia voltas na sua mente, deixando que Kimmie escondesse o rubor das bochechas com os próprios fios de mel.
Shin insistiu por mais alguns segundos, contados propositalmente de forma lenta.
A garota tinha um temperamento forte demais para que cedesse tão facilmente. A única vez que a encontrou assim foi...
Yue encarou os dedos longos do rapaz, a mão estendida com um suplico silencioso por trás para que cedesse e agarrasse.
Ela levou a mão até o encontro. O coração ecoava feito dois tambores no ouvido, deixando ela com uma prévia sensação de vertigem.
Com a ponta dos dedos se roçando, Shin engoliu. Engoliu de tal forma que sentiu que tinha algum líquido na boca, por mais que estivesse seca como o deserto.
"Não percebe?" -- retrucou com um ar sabido -- "Claramente não passa de atuação! Sempre temos pegadinhas ao final do ano."
Foi quando a frase cortou o fio vermelho que se ligava entre os dois, com uma tesoura cega, deixando alguns fiapos soltos por lá.
A mão de Yue congelou no ar.
Shin trincou o maxilar, as sobrancelhas quase se encostando enquanto praguejava e desejava que aquela pessoa infeliz perdesse a língua grudada em qualquer poste congelado.
Acompanhou o fantasma de sorriso evaporar de sua face, observando a tonalidade voltar para a forma tão leitosa.
Antes que pudesse impedir que qualquer pensamento contrário e precipitado floresça na mente fértil da garota, abriu a boca.
- Que idiota -- uma risada fraca, sem alma, escapou de si.
Entretanto..
As engrenagens já haviam rodado e, Shin, remoeu-se internamente por não ter explicado a tempo.
Sempre era rápido no basquete, pegava qualquer lance só com a agilidade e velocidade dos pés - Porém, reconhecia que, - Quanto se trava de relacionamentos, não tinha a mesma habilidade.
- Você não é a idiota aqui
Principalmente quando envolvia sua relação com Yue.
- Nenhum deles é tão idiota quanto eu. Por ter acreditado...Nisso -- jogou as mãos no ar, exasperada.
Ela deu um passo para trás, pondo as mãos na frente e impedindo qualquer tentativa de proximidade por parte dele.
- Ainda tem audácia de me pedir para acreditar em você -- apontou o dedo trêmulo em sua direção, fechando as mãos contra o peito.
Tentava conter o bombeamento agressivo do coração.
Aquela era a sensação de veias se rompendo? Ou só os caquinhos espetando o resto dos órgãos?
- Aqui não é o seu lugar! -- a voz tornou-se alta inconscientemente, enquanto as costas largas subiam e desciam pela respiração desregulada -- Você não entende?
O olhar anil ergueu-se apressadamente, prendendo as íris avelã com respingos amarelados. O amarelo dilatou, misturando-se com o outro tom.
Aqueles olhos tinham um brilho, surreal. Um brilho vívido que fez reconhecer Yue no mesmo dia em que se sentaram lado a lado.
- Eu sei...-- soltou chorosa, puxando o nariz para dentro em um fungar -- Sou a neta de pesqueiros, os melhores da região e, para completar a tragédia humana que sou, ainda não passo de uma bolsista!
E, agora, aqueles brilhos que envolviam seus pensamentos obscuros, não eram os mesmos. Tomavam forma de lágrimas.
Lágrimas que, por sua culpa, estavam lá.
Gradualmente, duas conseguiram escapar, enquanto ela continuava a fungar.
Shin não controlou seu gesto, passando os dedos pela bochecha cálida e tirando o resquício da gota.
- Mas eu me conformei com isso -- afastou o toque do rapaz, depositando um tapa estalado que rompeu as barreiras do som. Os olhos azuis se transformaram em um cinza pela intensidade acumulada -- Pensava o mesmo de você, mas, pelo visto, não tenho um bom tato para essas coisas.
- Eu me conformei com quem você era antes de você -- respondeu, com uma pontada de vacilo ameaçando invadir a fala -- Mas não vou mudar a visão que tem de mim só dizendo isso, né? Que seja.
Finalizou com um tom frio.
As mãos dele desceram para os bolsos. E, com esse simples gesto de indiferença, Yue viu a oportunidade para partir.
Ela girou os calcanhares e rumou para qualquer lugar longe das pessoas, da escola, da vida que ela gostava - Mas todos a faziam questionar se realmente era boa o suficiente para permanecer na instituição escolar.
- Ótimo. Desejo muitas bolas, campeonatos vitoriosos e garotas de biquíni -- deu um ponto na discussão, encerrando por cima do ombro -- Só, saiba, que o garotinho que eu conhecia merecia mais.
As sobrancelhas de Shin se levantaram, enquanto, com uma última troca de olhares, ela balbuciou. Muito mais.
De qualquer forma, nada importava, já que não pertencia a aquele lugar.
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