Capítulo 4 Nico
Eu sou assim
Até que os primeiros dias de aula não estão tão ruins, pensei que meus colegas fosse lidar de uma maneira preconceituosa com o fato de terem um menino transsexual na turma, mas até que estão lidando bem.
Tivemos uma aula de religião que falou sobre diversidade. Aceitar as pessoas diferentes. Talvez isso tenha influenciado.
A única pessoa que eu sinto que não está entendendo muito bem é o Dani. O Dani é meu amigo há dois anos. Ele foi a primeira pessoa em quem eu contei o meu primeiro beijo com um menino. A pessoa que sempre sabe os meus crushs. E agora eu contei para ele que sou um menino. Faz sentido ele não entender de primeira.
Eu amo muito o Dani. Quero muito contar para ele sobre todas e todos os meus crushs. Sejam eles meninas, meninos, não binários, enfim a pessoa que eu estiver apaixonado, afinal sou um menino trans pansexual.
Quero muito o ombro amigo do Dani que eu sempre tive. Eu acredito que um dos problemas para ele me entender e até mesmo se encontrar e se aceitar (eu acredito que ele seja gay), seja por causa da sua religião.
Dani segue uma religião muito rígida, eles dizem que o normal é ser cis hetero, caso contrário você tem uma doença e está desagradando muito à Deus.
Eu acredito em Deus, mas o Deus que eu acredito é amor, ele ama todas as pessoas.
***
No primeiro dia de aula o Dani me perguntou o que era ser transsexual. Hoje durante a aula de educação física eu resolvi explicar para ele.
- Então Dani, você ainda quer saber o que é ser trans? - puxo o assunto com ele.
- Quero sim, estou curioso.
- Então. Lembra que antes eu estava em um corpo biológico feminino? Na verdade eu nunca me identifiquei com aquele corpo. Não me identificava com as roupas, com os pronomes e muito menos com as designações para o gênero feminino. - Respondi de uma maneira calma.
- Você sempre foi assim?
- Sim. Sinceramente eu sempre neguei de mim mesmo. Queria acreditar que estava errado. Comecei entender que pessoas assim existem há dois anos. - Faço uma breve pausa e percebo a boca de Dani abrir, provavelmente de espanto. - Durante as férias eu pesquisei bastante sobre a vivência das pessoas trans, e me identifiquei.
Percebo que Dani ficou quieto. Será que ele queria me dizer alguma coisa? Será que ele irá parar de falar comigo? Provavelmente ele me ache um completo louco, ou completa, pois na cabeça dele eu sou uma mulher, tenho certeza.
***
Estava quase na hora do recreio e o Dani continuava quieto, só falava o necessário, como "me empresta o apontador?" ou "o que está escrito ali?" imagino que isso seja difícil dele entender, espero não perder meu amigo.
- Dani, você sabe que pode confiar em mim para tudo, né?
Ele mexe a cabeça em sinal de sim.
Descemos para o recreio e ele inventa uma história que precisa ir ao banheiro. Na verdade eu sinto que também estou com vontade de ir no banheiro.
Chego lá e vejo três meninas. Elas estavam rindo alto. Não vou negar, elas são lindas. Uma delas é magra e alta, chamou a minha atenção de uma maneira diferente, mas eu não disse nada.
Acho que isso é normal para pessoas trans, não saber como chegar em alguém que gosta. Eu sou um homem transexual e tenho como orientação sexual pansexual, sinto atração por pessoas em geral, e naquele trio de meninas uma delas fez meu coração bater.
Depois que faço minhas necessidades no banheiro vou lavar as mãos. Quando abro a torneira uma das meninas veio conversar comigo, infelizmente não era a minha crush.
- Ter amiga louca e foda, viu? - Disse a menina.
Dou um leve sorriso de canto.
- Desculpa a falta de educação, sou a Louise, mas pode me chamar de Lou.
- Eu sou Nic.
- Olha que legal, fiz uma amizade de banheiro. - disse a menina Lou e começam a rir.
- Preciso ir, até mais Lou.
- Tchau Nic.
Saio do banheiro sem saber o nome da crush, mas a vida é assim.
Quando chego na fila da merenda encontro um menino que nunca tinha visto antes. E ele é muito lindo. Talvez o mais lindo dessa escola.
Ele estava na minha frente da fila. Como não sou bobo, puxei logo um assunto.
- Oi, tá calor, né?
O menino me olhou, deu um sorriso de canto e disse que sim.
Pegamos o nosso lanche e como o Dani não estava aqui eu fiquei sem ninguém para lanchar comigo.
Provavelmente o menino percebeu que eu estava sozinho e me convidou para sentar com ele, fofo. Lógico que aceitei na hora.
- Então.. qual o seu nome?
- Nicolas, mas pode me chamar de Nic. - Ele foi a segunda pessoa da escola em que eu falei o meu nome, Nicolas.
- Posso fazer uma pergunta?
- Claro.
- Você é trans?
- Sim, sou um homem transexual. Mas ainda estou bem no comecinho da transição.
- E como é para você se assumir?
Essa pergunta sempre me pega de surpresa, não tenho boas histórias em relação a sair do armário. Não sou a pessoa mais indicada para dar conselhos sobre esse assunto.
- Minha família aceitou de boas. - Minto.
- Eu sou bissexual, mas tenho muito medo do meu pai descobrir.
- Algumas famílias realmente não aceitam muito bem.
- Eu sei, esse é o meu medo.
Enquanto ainda conversávamos tocou o sinal anunciando o término do recreio.
- Quem sabe um dia?
- Realmente. - Responde ele um pouco apreensivo, acredito que não dei nenhum conselho bom.
- Qual seu nome?
- André.
- Muito prazer. Você é do ensino médio?
- Sou.
Bonito desse jeito, só podia ser.
Logo subimos, cada um para o seu corredor.
***
As últimas aulas passam voando e de repente é hora de ir embora.
Como eu e o Dani moramos perto, voltamos para casa juntos. Aproveito para puxar um assunto sobre sexualidade com ele.
- Dani.. imagino que aquele assunto sobre transexualidade te deixou um pouco confuso.. - Faço uma pausa e volto a falar. - Saiba que existem pessoas diferentes do padrão, e isso é belíssimo.
Percebo que os seus olhos estão com lágrimas, então eu o abraço.
- Te amo Nic.
Nós abraçamos um pouco e então vou embora.
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