Eu não sei o que quero ser, mas sei muito bem o que não quero me tornar

Friedrich Nietzche

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Pietro contou o que ocorreu e o motivo da demora para levar Millenna até si. Dante franziu o cenho de reprovação, não pela ação de seu consigliere, mas pela jovem ter problemas como esse além de tantos outros. A vista do quarto de hotel luxuoso que ocupava o deixou um pouco mais a vontade, durante a reunião que teve com a garota, pode notar o quanto a morena sentia medo, sentia vergonha e desconforto, era um tanto frustrante e por isso foi breve, disse apenas o necessário, caso a mesma aceite, o que Dante presumiu que sim, ele contaria mais sobre seus planos que seria benéfico para ambos.

Com o copo de bebida na destra, e os olhos fixos na cidade, não se virou quando ouviu passos ecoando para perto de si, pois sabia que era Pietro. O loiro se pôs ao lado de seu chefe e observou a vista em silêncio.

—Acha que foi uma péssima ideia propôr o acordo? —perguntou Dante sem olhar diretamente para o loiro.

—Não senhor. Se sentiu vontade de ajudá-la e tirar proveito, não vejo motivos para ter sido um acordo ruim. —respondeu vagamente.

—Ótimo. —concordou o chefe.

Dante caminhou até a pequena adega que havia no quarto, serviu mais uma dose de bebida para si, e outra para Pietro. Mesmo estando calmo, sentia ansiedade, nervosismo e preocupação, temia colocar aquela garota em risco. Bom. De qualquer modo, estava feito, agora tudo dependerá da bela morena de olhos castanhos.

—Teremos que ficar de olho no ex dela Dante.—falou Pietro ao desviar o olhar da cidade apenas para pegar o copo que lhe foi entregue, tomando um gole do líquido amargo, continuou. — Depois de deixá-la em seu apartamento, permaneci alguns minutos no carro, puxei toda a ficha dele.
Vincent é violento, não só com ela mas com outras companheiras anteriores.Encontrei denúncias feitas por Millenna, pedindo uma ordem de proteção contra ele por violência doméstica.

—Entendi. A protegeremos então. Enquanto meu pai viver, podemos manter essa fachada de noivado. Depois.—Dante não continuou, não precisava, Pietro sabia o que ele diria, o mesmo colocou os copos em cima da pequena mesa de vidro e ficou de frente para seu chefe. Seu companheiro.

—E se seu pai descobrir ? Nós conseguimos esconder por anos isso, porém não conseguiremos pra sempre. Fora que além de seu pai, tem toda a organização, os aliados e dentre muitos outros. —explicou com pesar, a voz calma e baixa, o loiro possuía uma leveza, uma frieza um tanto demoníaca. Era belo e perturbador ao mesmo tempo. Pietro era a personificação de um anjo caído, possuía a beleza e a maldade de um.

—Ele não irá. E quem ousar contar, irá morrer antes de chegar a Joseph. Eu prometo. —respondeu simplista.

—Tudo bem.Precisa de mais alguma coisa? —perguntou Pietro.

—Não. Pode ir descansar. Teremos assuntos para tratar pela manhã.

Pietro murmurou um ok, fez menção de sair porém Dante o puxou para um beijo rápido, o loiro envolveu o pescoço do chefe com as mãos, o gosto da bebida estava forte em ambos, o foi rápido entretanto cheio de significados, às vezes palavras não são o suficiente, e a mínima ação a respeito já diz muito mais. Pietro se afastou com um sorriso e desejou boa noite ao seu chefe. Ambos queriam passar a noite juntos, infelizmente não podiam, não quando homens a mando de seu pai estavam a postos para protegê-lo.

Dante tomou um banho frio e logo se vestiu deitando na imensa cama, deixando seus pensamentos fluírem. Seu plano estava de pé, e faria de tudo para colocá-lo em ação o quanto antes, esperou anos para exercê-lo e quando o fizer, será de uma só vez.

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Dante já estava vestido quando os primeiros sinais do dia começou a surgir no horizonte, havia recebido durante a madrugada a mensagem de Millenna aceitando o acordo, o que o deixou em partes aliviado, em outra parte nem tanto, pois não pensou no que esse seu acordo irá trazer, seriam consequências desastrosas caso algo saia terrivelmente errado. Ele é o chefe, afinal, o que ele propor não deve ter objeções, o tatuado sabia que quem iria se opor era seu pai, o mesmo não iria criar problemas sem antes ver a reação de seu pai. Joseph é um homem impiedoso, frio, sanguinário e genocida, o tatuado sentiu na pele o que seu pai adotivo era capaz, não bastou ter sofrido com a morte da família, precisou sofrer por anos a fio para ser alguém que Joseph se orgulharia. Dante provou sua lealdade à família greco, provou ser capaz de comandar a máfia ainda melhor do que seu pai havia sido.

O café da manhã foi-lhe entregue às seis e meia, o próprio serviu-se de um pouco de café fresco e amargo, deixou mensagem a Pietro para que venha até seu quarto acompanhá-lo. Os papéis que havia pego com o homem na boate, deixou a desejar, muita coisa que estava ali não era o que queria, e hoje, iria cumprir com o que havia prometido ao filho da puta.

Dante desde criança manteve suas emoções reprimidas, questionamentos eram feitos junto as maldições que proferia através da dor da perda daqueles que tanto amava, conhecer Pietro tornou tudo mais suportável, odiava ter passado por tudo sozinho sem um apoio emocional, apesar de que, tendo um pai como Joseph, Dante não teria apoio nem que implorasse de joelhos em meio às lágrimas; observando suas tatuagens na mão, pode ver uma no qual ele fez ali, a fim de jamais esquecê-la.

"I prefer to walk in gloomy valleys next to the wolves, than in flowering fields surrounded by false lambs."

Tal frase nunca lhe fora tão verdadeira, lembranças fatídicas, tão tempestuosa o mantinham sombrio, impenetrável como uma maldita muralha de adamantino negro. Dante caminhava entre falsos cordeiros, em uma vida que lhe fora entregue sem espaços para recusas. Se não fosse tão jovem na época, poderia ter se recusado a aceitar a adoção, infelizmente não pode, não por ser apenas uma criança, mas sim por ter sido um homem que jamais recebe um não, pois seu posto o precedia de tal maneira que o respeito que tinham não foi por mérito e sim através do medo. Ninguém tem coragem de lutar contra Joseph. Bom, ninguém além de seu filho.

—Buongiorno signore. — saudou Pietro ao sentar- se na cadeira estofada branca.

—Buongiorno. —respondeu o tatuado.

—Millenna ha accettato la proposta. —falou Dante olhando diretamente para seu subordinado.

—Perfetto. Cosa faremo adesso, signore?. —perguntou o loiro com um sorriso malicioso e nefasto.

Dante serviu mais uma dose de café para si e uma para Pietro, com a xícara em mãos, o próprio falou serenamente.

—Strapperemo la pelle a quel figlio di puttana che ci ha ingannati. —soou com uma promessa doentia e sádica.

A faca girava na destra tatuada do chefe, o andar despreocupado enquanto sua vítima permanecia sentado em uma cadeira envelhecida, Pietro estava no canto da sala com a arma em punho assim como os outros para proteger o chefe. O homem cujo nome era Anthony sentia o corpo tremer, o coração dar imensos sobressaltos, afinal, ser pego não estava em seus planos, outrora o próprio não fazia ideia de com quem lidava, para si, Dante era apenas uma criança brincando de gangster. Grande erro.

—É uma pena você não ter a sua língua para enfim me dizer o motivo de o que eu tinha solicitado, não ter me sido entregue. —voltou a dizer o chefe após vários minutos.

A lâmina brilhava em sua destra, o terno alinhado, a postura perfeita, seu ar era intimidador, era o ar de um maldito chefe.

Anthony resmungava e resmungava como se implorasse por clemência, visto que não tinha mais sua língua, ao menos não ela inteira tentava mesmo assim, ditar algo para se defender.

—Ho già perso molto tempo. Veniamo a ciò che conta davvero. —falou Dante avançando contra o homem para lhe arrancar a primeira tira de pele.

O sangue escorria através da face sem pele do homem, o corpo entrou em estado de choque devido a dor excruciante, Dante limpou a lâmina suja na camisa do homem, e por fim cravou no peito do mesmo e o torceu,sentindo a carne sendo rasgada em meio a ossos, o sangue fluiu até que Anthony estivesse morto.

—Brucia tutto. —ordenou o chefe antes de sair da sala.

O olhar frio e vazio o deixavam assustador, as tatuagens destacando na pele pálida das mãos e partes do pescoço, logo saiu do velho prédio onde residia Anthony, tirou um cigarro da carteira e pegou o isqueiro dourado do bolso. O primeiro trago trouxe calmaria ao interior caótico do chefe, o olhar focado em nada específico a sua frente, o tatuado soltou a fumaça branca e observou evaporar no ar em movimentos diversos. A porta velha foi aberta revelando a silhueta de Pietro indo de encontro a Dante, o mesmo escorou na parede ao lado do tatuado que logo entregou um cigarro e o isqueiro.

—Va tutto bene? —perguntou preocupado. O loiro acendeu o cigarro e devolveu o isqueiro a Dante.

O fogo começou a se alastrar no apartamento de Anthony e logo não demoraria para que consumisse todo o prédio.

—Sì. —ditou curto.

Dante terminou o cigarro e jogou a guimba em meio fio e apoiou as mãos nos bolsos da calça social.

—Voglio che tu vada a parlare con Millenna. Assicurati della risposta e facci sapere che partiremo domani al tramonto. —pediu Dante olhando para Pietro.

—Si signore.

Ambos caminharam lado a lado para sair do beco, Dante parou ao lado do carro luxuoso pelo qual viera, o loiro por sua vez iria seguir por outro mas parou, pois sabia que seu chefe diria algo, e ao ficar em silêncio, Pietro tomou a frente.

—Suppongo che dovrò proteggerla.

O tatuado soltou o ar exasperado.

—Sì. Meglio che la proteggiamo entrambi, Pietro. Ancora di più quando Joseph la incontra.

Pietro assentiu em concordância e entrou em outro carro indo a casa da mulher. Dante respirou profundamente e fez o mesmo.

O caminho silencioso trouxe memórias turvas, Dante não se lembrava com exatidão sobre sua infância, o trauma imenso apagou todos os momentos bons que tivera e manteve apenas as ruins, devido a isso, ficar sozinho era a melhor escolha que tinha, permanecer isolado sem lidar com as pessoas de forma constante o deixava em paz, ao menos a paz que ele criou para si. Os olhos azuis perdidos na cidade que passava como um borrão através da janela.

Você deve manter seu coração de aço. Uma frase que lhe veio à mente e que prontamente coube perfeitamente.

Joseph o ensinou a ser alguém destemido, alguém que todos temeriam só de ouvir o nome, todavia, Dante se tornou maior do que as previsões de seu pai, porém o seu coração ainda se mantinha humano, um traço de humanidade, e isso seria sua ruína caso não mude tal fato.