Kyra.

Não me lembro da última vez em que me senti tão impotente perto do Ethan, saber que ele está sofrendo tão profundamente novamente, não somente saber, mas venho vendo isso nos últimos dias. A culpa novamente recai sobre os meus ombros, se eu não tivesse assumido meu relacionamento com o Adam as coisas seriam diferentes? Eu conseguiria olhar para o meu melhor amigo e lhe dar um sorriso sincero? Fora tantos anos carregando esse relacionamento nas sombras, tudo porque eu não queria ver ele exatamente como está nesse momento, sua desconfiança com o irmão é tamanha que ele cogitou a ideia de ter sido Adam o causador do hematoma. Eu só queria conseguir conviver apaziguada com as pessoas mais importantes da minha vida, mas isso nunca foi e provavelmente nunca será. Como se fosse algo cronometrado, meu celular começa a tocar e o nome do Adam aparece na tela, atendo deixando no viva-voz sem tirar a atenção do trânsito a minha frente.

- Anjo? - a voz rouca do Adam ecoa pelo carro fechado - Você está bem?

- Sim - respondo mordendo os lábios instintivamente - Aconteceu algo?

- Na verdade, não só queria saber se você está bem - sorrio comigo mesma - E como eu já sei que você está bem, vou voltar ao meu trabalho.

- Tudo bem - sussurro e ele fica em silêncio por um tempo.

- Tchau! Anjo - sua voz é baixa, mas preenche os meus ouvidos.

- Tchau! Adam - ele desliga e eu paro com o carro em frente a grande e solitária mansão, Lewis. O portão se abre quando aperto o controle reserva e eu adentro a propriedade.

Assim que abro a porta de casa, o cheiro familiar me abraça, principalmente o do meu pai. E de torta de maçã?

- Pai? - chamo alto enquanto fecho a porta de entrada atrás de mim.

- Na cozinha, querida. - ouço sua voz e sigo até o nosso lugar favorito da casa.

Meu pai é um homem na casa dos 40 anos, pele bronzeada, cabelos escuros e olhos cor de mel. Sempre me vi muito nele, mas sei que também lembro muito a minha mãe. Com sua pele clara e cabelos loiros. Era realmente uma mulher muito bonita. Assim que passo pela porta da cozinha vejo meu pai com um de seus aventais, assim que me vê seu sorriso cresce, dou a volta na bancada e me jogo em seus braços protetores. Sei que enquanto estiver com ele me sentirei segura, o problema sempre é o depois de partir.

- Querida, por que está chorando? - eu nem notei que estava chorando - Quer me dizer o está acontecendo?

Nego com a cabeça e me afasto um pouco para poder olhar em seu rosto.

- Coisas de mulher - digo enxugando as lágrimas, mas ele não parece acreditar.

- Quando estiver pronta para me contar o que são essas coisas de mulheres. Estarei a disposição - sorrio agradecida e ele bagunça meus cabelos - Por agora, por que não coloca um avental e me ajude com essa torta?

- Claro - ajudo ele com o restante das coisas em meio a conversas e risadas como sempre foi. É bom estar em casa como antigamente, mesmo que (sendo) observada por olhos preocupados o tempo todo. Sei que meu pai não voltará ao assunto enquanto eu não dizer por vontade própria, mas isso não o impede de tentar me decifrar silenciosamente.

Depois de um tempo estamos na mesa do jardim comendo a nossa famosa torta de maçã, meu pai olha para o canteiro de rosas com admiração, eram as flores favoritas da minha mãe.

- Você deveria arrumar uma namorada - chamo sua atenção e ele me encara com os olhos estreitos - É sério, olha o tamanho dessa casa, e você fica aqui sozinho todos os dias.

- Eu não fico sozinho todos os dias - sorri - Você sempre está aqui.

- Não é disso que estou me referindo, você ainda é tão novo, pai - olho em volta, admirando o lugar em que minha mãe iria adorar - Ela ia querer que você fosse feliz.

- Mas eu sou feliz, Kyra - a seriedade na sua voz me pega de surpresa, olho para ele que está encarando o canteiro de rosas - Minha felicidade não é, e nunca será resumida a uma única pessoa.

Resolvo não questionar, pois, sei que ele está certo. Depois da nossa tarde juntos ele me acompanha até meu carro e antes de entrar eu olho para a casa do lado esquerdo. Por cima dos muros altos ainda consigo ver boa parte dela.

- Acho que o Adam ainda não está em casa - meu pai diz ao perceber para onde olhava.

- Não estou procurando por ele - sorrio de lado e ele balança a cabeça - Te contei que o Josh voltou?

Os olhos do meu pai se iluminam e ele sorri, Josh sempre se deu muito bem com o Sr. Juan.

- Diga ao garoto para vir aqui da próxima vez com você - concordo com a cabeça e destravo o carro - Querida?

- Sim? - me viro para ele.

- Eu sei que você já está saindo mas, quer me dizer o que está havendo com os filhos dos Evans?

Respiro fundo e me encosto no carro para ficar de frente ao meu pai. Não era o assunto em que eu gostaria de falar no momento. Mas sei que ele tem sido paciente e compreensível a muitos anos.

- Ethan ainda está passando por problemas - ele ouve atentamente - E penso que o meu relacionamento com o Adam não está ajudando muito.

Na verdade, não está ajudando em nada.

- Você gosta mesmo do Adam? - meu pai cruza os braços ao se encostar no carro do meu lado.

- Claro que sim - sussurro e ele balança a cabeça, o amo a tantos anos que chegava a ser doloroso ter de sempre esconde-lo do irmão mais novo - Mas se isso machuca o Ethan

- Abriria mão do seu relacionamento pelo Ethan? - balanço a cabeça confirmando e meu pai estreita os lábios em uma linha reta. A última coisa que eu quero, é machucar alguém que ainda sangra por feridas tão antigas.

- Sabe o quão importante ele é para mim - passo a mão no rosto e meu pai coloca os braços em volta do meu ombro - Faria qualquer coisa por ele, pai.

- Eu sempre julguei que você ficaria com ele - ouço sua voz, mas não digo nada - E sei do quanto ele é especial para você, querida. Mas você ainda sim merece ser feliz, certo?

- Certo - concordo e volto a olha para a casa do lado.

🖤