Capítulo V
Aos gritos e completamente apavorada, foi assim que acordou desse sonho pesadelo. Tenso e angustiante, paralisada em sua própria mente. O ambiente estava frio, mesmo com as janelas fechadas, tudo estranhamente parado. Suava muito e seu coração parecia ter ganhado um ritmo próprio, — Tum-Tum! Tum-Tum! Tum-Tum! — Podia ouvi-lo. Tudo parecia estar em seu lugar, as pequeninas luminárias brilhavam lançando um mesclado de azul e roxo pelas paredes, teto e o chão. Seus olhos vagavam pelo cômodo baço... Com aquela sensação inquietante de não está só.
Menos de dez minutos depois de despertar aos berros, seu pai entrou porta adentro olhando cada canto do quarto, procurando o motivo dos gritos da filha.
— O que foi?! O que aconteceu?! — Perguntou ele atônito, invadindo o cômodo, com punhos cerrados, pronto para qualquer briga.
— Eu tive um pesadelo. — Respondeu ela assustada com a forma que seu pai entrou.
— Ah! Tem certeza de que é só isso? — Perguntava ele enquanto revistava o quarto e olhava pela janela.
Quando se virou encontrou sua filha o olhando estranho.
— Tudo bem mesmo?
— Uhum! — Ela acenou, em seguida seus lábios se retorceram. — Pai, cadê suas calças?
Edward, olhou para baixo, se viu só de cueca e meias, completamente envergonhado, saio correndo pelo corredor a fora em direção ao seu quarto.
— O que aconteceu? — Perguntou o Jack se aproximando da porta, com um bocejo, passou a mão pelos cabelos.
— Sonhos ruins. — Respondeu ela se levantando.
— Ah!... Estranha. — Sussurrou ele enquanto saia para encontrar-se novamente com sua cama.
Grace o ignorou, apanhou seu celular e desceu para a cozinha. Pegou um copo com água e se sentou à mesa se perguntando como tinha ido parar no quarto, sendo que, se lembrava claramente de ter cochilado no quintal, sob o véu escuro da noite. Depois de um tempo seu pai reapareceu.
O Edward se aproximou em silêncio, pegou um pote de sorvete de chocolate e duas colheres, em seguida se sentou de frente para a filha, tinha um olhar envergonhado. Grace brincava com os dedos, por algum motivo estava desconcertada, não lembrava de alguma vez já tê-lo visto sem as calças. Também, não queria discutir de novo com ele, a noite já estava por si só complicada.
Ele destampou o pote e pegando um pouco de seu conteúdo com um longo suspiro. Grace olhou para o creme marrom a sua frente e sentiu o gelo em seus lábios, o gosto meio amargo e ao leite da sobremesa, depois desviou novamente, virou a tela do celular para baixo, como se estivesse evitando algo. Seus dedos finos começaram a tamborilar na mesa, olhou através do vidro da janela e viu a noite escura que estava lá fora, a sensação foi de que havia algo ali a olhando de volta, isso fez seus pelos eriçarem. Seu pai lhe estendeu uma colher, que relutou por um momento em pegar. Ele passou uma das mãos pelos cabelos bagunçados, jogando-os para trás, ela fez o mesmo, no automático, ele sorriu de lado, pegou outra colherada e pigarreou, para limpar a garganta do gelo.
— Me desculpe por agora a pouco — disse ele ficando com as orelhas vermelhas.
Grace fez um aceno de 'tudo bem', enquanto saboreava o doce gelado, estava tão bom, o conteúdo frio descia pela garganta amortecendo, congelando o peito, arrepiando-a, tão cremoso ao toque da língua, e a sensação de derretimento era como deleite supremo para as papilas gustativas. Ele a observou por uns momentos antes de prosseguir.
— Me desculpe também por eu ter gritado. — Ele falava com um certo pesar, exibindo suas rugas de expressões. Ela o observava em silêncio, tinha conseguido toda a sua atenção. — Esses dias têm sido bem estressantes, e... e... eu amo vocês, me enlouquece vê-los nesse conflito quando...
— Tá tranquilo — Grace o interrompeu, em seguida forçou um esboço de um sorriso, falhando miseravelmente. — Tudo bem.
Ele repousou a colher sobre a mesa e cruzou os dedos uns nos outros, se encostando no espaldar da cadeira. Estava vestindo uma calça moletom quadriculada cinza e uma camisa branca que ressaltava seu peitoral forte e definido. Parecia mais velho naquela postura. Ela sentiu algo remexer em seu íntimo, uma tristeza sem nome, se imaginou sem ele e isso foi muito doloroso. Estava ficando velho, logo o tempo o reclamaria, tiraria dela, se não algum tipo de imprevisto horrível. Muitas imagens dele vieram em sua mente, das viagens a Flórida, das viagens de acampamento para o Alaska (com sua mãe, os três juntos), da casa de campo em New Hampshire, onde abrigava muitas memórias felizes de quando pequenina e acreditava que havia fadas escondidas vivendo nos campos, dos sussurros da floresta, do hall da porta pintada com suas minúsculas mãos... do seu aniversário de seis anos que jamais se esqueceria.
As imagens eram tão nítidas, que por um momento um sorriso cruzou seu rosto, porém lembrar do passado pode ser tão doloroso como uma estocada no peito. "Talvez fosse mais fácil andar sobre vidros". Não poder voltar ao que era, aos dias felizes, era sufocante, como ter uma pedra atravessada na garganta, quer respirar! Quer engolir! Mas não pode. Saber que um dia vai perder quem se ama... dá um sentimento de impotência, olhar para o vazio e não poder fazer nada: "Por que amar é tão doloroso?" É tão ruim se sentir esmagada por seus próprios sentimentos: "Queria eu ser apenas uma máquina, sem sentimentos, sem emoções, assim não sofreria, eu não sentiria nada, talvez assim... eu teria paz". Quase que segurando algumas lágrimas desviou o olhar, para além da escuridão lá fora.
— Como eu fui parar no quarto? — Perguntou ela também deixando a colher de lado. — Me lembro de estar no sofá lá fora... — Sua voz estava embargada pelas lágrimas ocultas que fizeram um nó em sua garganta, sentiu uma dor tão aguda no peito que perdeu as palavras.
— Quando eu cheguei, vim para a cozinha e te vi dormindo lá fora, um sono muito pesado por sinal. — Explicou ele percebendo a mudança no tom de voz dela. — Te peguei e levei até a cama. — Sua face se fechou preocupado.
— Ah, obrigada.
— De nada princesa. — Disse ele se levantando, não queria deixá-la, mas já estava muito tarde e precisava acordar cedo mesmo num domingo. — Vou voltar para a cama. Tem certeza de que está tudo bem...? — Ele hesitou.
— Sim — ela respondeu com um sorriso triste. — Eu guardo o pote. Boa noite, pai.
— Boa noite, princesa. — Disse ele beijando o topo da cabeça dela com ternura.
Grace ficou mais uns quinze minutos ali, entre o pote de sorvete e um temor, seus pensamentos não a deixava em paz, torturavam-na, mais do que o carrasco andando lentamente para a execução, causando desconforto e mais angústia ao condenado. Olhou para seus braços lembrando do sonho que tivera, a dor daqueles cortes amenizaram a que sentia por dentro, amortecendo como uma leve anestesia, o sangue quente que pingava de seus dedos frios. Amaldiçoou a si mesma por ser tão estranha, fechou os olhos tentando ignorar aquilo que temia. O silêncio estridente envolveu como um manto noturno, aquele pensamento, aquela voz, reverberava, como um tambor pulsante: "Quem te fez mente louca?".
Depois do sonho horrível que teve, não conseguiu mais dormir, passou o restante da madrugada lendo, só faltava algumas páginas para terminar a história. Quando o cômodo já estava completamente claro pela luz do dia, se forçou a sair da cama e ir até o banheiro.
Ligou a torneira, no automático, bocejava muito, seu corpo parecia mais pesado, pequenas olheiras adornavam seus olhos, contudo, ainda estava agradável, como seu colega uma vez a chamou, 'a ninfa das águas'. Se sentou na tampa do vaso sanitário enquanto a banheira enchia. Ao passo que o recipiente era preenchido pela água quente, uma neblina húmida se tornando densa tomava conta do espaço, inebriante parecia mais leve e rodar, rodar ao mesmo tempo.
Grace observou seus braços, parecia mais pálida que o habitual, talvez pela atmosfera esbranquiçada do cômodo. Suas veias eram claramente visíveis, esfregou com os dedos o pulso esquerdo, lembrando do sonho, as sensações que havia sentido e os cortes seguidos do vazio, a anestesia que adormecia seu peito, um último suspiro morto. Os paradoxos do desconhecido fervilhavam na mente, possíveis questionamentos — o que é realmente a liberdade? Está livre?
Seus pés pareciam húmidos, um líquido transparente molhava suas pantufas marrons. Ficou alguns minutos encarando a água morna que banhava seus pés, emanando vapor, era como se estivesse em um outro mundo místico, onde as criaturas fantásticas a espreitavam de seus esconderijos, estava tão absorta naquele universo que se fez um pequeno questionamento antes de perceber que a banheira havia transbordado, voltando assim para o mundo real. Sem pensar muito, correu para fechar a torneira. Ao olhar ao redor, notou que o banheiro estava alagado.
— Merda! — Exclamou chateada com sua própria bagunça.
Foi até o armário, pegou uma toalha para tentar ela mesma secar o lugar, não queria deixar para a Maria ou para a Emily. Levou um tanto de tempo para terminar, e ao fazer se sentiu travada, sua coluna parecia uma engrenagem que não recebia lubrificante a séculos. Seu pé não estava mais inchado, porém, a dor ainda não havia abandonado.
Após o banho relaxante, foi até o armário para a caça as roupas, queria ficar bem largadona sem parecer mendiga. Vasculhando até o fundo do armário, encontrou um antigo short de um pijama, era rosa bebê com as bordas brancas. Ao vestir percebeu que era curto demais, sua madrasta surtaria, ou a Maria, riu no íntimo com esse pensamento. Vestiu uma camisa duas vezes o seu tamanho, verde musgo, com o número dez nas costas em branco, e calçou um par de meias pretas com duas listas brancas nas coxas. Ao se olhar no espelho, achou um visual legal, mas acima de tudo, confortável. Desfez o coque e desceu sem pentear os cabelos.
O tempo não estava frio nem quente, estava tão balanceado que chegava a ser agradável. Tinha expectativas de que aquele domingo seria bom, ou pelo menos esperava isso.
O café da manhã era servido na cozinha, numa mesa redonda perto das janelas e da porta de vidro. Seus irmãos já estavam à mesa. A Evelyn se encontrava atrás do balcão, ao lado das duas empregadas, fazendo sabe lá Deus o que, conversavam sobre a noite anterior. Grace se aproximou da bancada com uma expressão tão leve, um brilho bonito nos olhos, ignorando a fofoca das duas. Educadamente saudou todos, contudo, não se sentou de início na banqueta, observou de pé o que tinha para o café.
— Pelo amor de Deus! — Exclamou a Evelyn, olhando a menina de cima a baixo com espanto. — Que roupa é essa?!
Com um semblante de confusa, Grace olhou para se mesma, como quem procurava um problema, uma mancha de mostarda invisível. A Maria se esticou sobre o balcão para espiar já com uma cara de crítica. A Emily olhou com um olhar do tipo, lavem B.O. Jack observou sua irmã, olhando-a de baixo acima, se encolhendo na cadeira, suas bochechas coraram.
— Qual o problema? — Perguntou Grace inclinando um pouco a cabeça para o lado, como se não estivesse entendendo.
— Qual o problema? — Repetiu ela a pergunta com escárnio. — O problema é essa vestimenta vulgar...
— E satânica — se pronunciou a Maria, interrompendo sua patroa.
Grace a olhou com uma cara mais confusa ainda: "O que isso vem ao caso?". Evelyn respirou fundo e continuou.
— Aqui é uma casa de respeito, decência. Os membros desta família se vestem, se comportam como tal...
— Bom, parece que nem todos. — Disse a jovem olhando de esguelha e com um sorriso de lado para o Jack, que engoliu a seco.
Ele ficou vermelho e se afundou ainda mais na cadeira. O Noah olhou entre os dois percebendo o clima tenso entre ambos, apesar de ainda ser bem jovem, não era tão inocente assim.
— Se você quiser andar só de calcinha e blusa, o faça em sua casa. — Ela ainda falava, parecia ultrajada, e de vez em quando batia com uma das mãos no mármore. — Não aqui.
— Bem, segundo meu pai, essa é minha casa. — Falou pôr fim a menina enquanto passava geleia na torrada, que a Emily tinha passado junto com um copo de café, seu tom era debochado e desafiador.
A Evelyn emudeceu de raiva, seus olhos saiam faíscas. Grace deu uma mordida generosa no pão olhando a cara de sua madrasta fumegar. Ela pegou seu desjejum e foi se juntar aos filhos na mesa.
— Falando no meu pai, cadê ele? — Perguntou a menina olhando para a Emily.
— O Sr. Peterson saio cedo. — Respondeu a jovem.
— Seu pai foi para o escritório. — Comentou a Evelyn sentada de gostas para a garota, não suportava mais olhar a cara da jovem, que segundo ela se parecia muito com a mãe.
— No domingo. — Pensou Grace em voz alta.
— Para você vê. — Falava a Evelyn de forma mais calma, serena e presunçosa.
Ela levou a xícara aos lábios, bebericou um pouco de seu conteúdo de forma contida que Grace tentou imaginar o quão quente estava aquele chá de maçã com mel.
— Ele é uma pessoa muito ocupada para estar se preocupando com comportamentos libertinos. — Disse ela enquanto repousava a xícara lentamente na mesa.
Grace se remexeu em seu acento, prendeu as madeixas num coque frouxo no topo da cabeça. A comida descia de forma pesada agora, seca, como se estivesse perdido a saliva ou com a garganta inchada, apertada. A jovem passou a mão pelos cabelos, soltando-os novamente, tamborilava com os dedos sobre a bancada. A voz de sua madrasta a estava deixando enjoada, tentou abafá-la mentalmente até parecer um pequeno ruído irritante.
— ... Por isso ele vai abdicar daquele caso com os Miller. — A Evelyn falava como quem tinha uma faca pronta para usar.
Aquela frase trouxe a garota de volta do seu mundo.
— Vai desistir do processo!? — Grace se virou abruptamente para encarar sua madrasta que estava sentada de costas para ela.
— Lógico — disse ela repousando a xícara no pires e pegando um biscoito. — O Sr. Miller é alguém muito importante, não faz sentido criar uma briga 'por nada'. — Evelyn deu uma enfatizada a mais nas duas últimas palavras, o que fez a menina lacrimejar. — A carreira do Ed é muito importante para ser sujada com coisas banais.
"Por nada. Coisas banais", pensou Grace se voltando para afrente, se sentia tão triste. Tocou devagar uma cicatriz em sua testa (um pouco para a esquerda), uma consequência das agressões da Alice. Emily passou por ela tocando em seu ombro direito, o que a fez tremer no íntimo. Os três na mesa voltaram para seus aparelhos telefones, a Maria começou a falar, comentava sobre sua igreja e de como a presença de um certo homem negro estava causando um certo desconforto entre os fiéis, falava de como o rapaz era desagradável e intrometido, quando se voltou para a menina, dizendo que a levaria assim que o rapaz saísse, a jovem se levantou em silêncio e saio dando as costas para a mulher que logo em seguida a chamou de mal-educada.
A menina subiu as escadas ainda com um pouco de dificuldade. Estava tão magoada, olhos rasos d’agua, soluçava baixinho. Não teria justiça pelo que sofrera, foi espancada por nada, tudo por causa de umas roupas queimadas. Poderia ter morrido se não recebesse socorro. Sua vida valia menos que aquelas roupas? Um ato comparado a 'nada', tinha cicatrizes que demorariam para desaparecer e era tido como 'nada'?! "Por que esse mundo é tão injusto?" Se debulhava em lágrimas, seu peito doía esmagadoramente, soluçava descontroladamente, como uma alma desesperada por ajuda clamava aos céus por misericórdia, aquela dor era insuportável, queria rasgar o peito e jogá-la para fora.
Apoiada na porta, levou uma mão a cabeça e a outra ao peito apertando, cravando as unhas na tentativa de sufocar essa dor interna. "Por que dói tanto? Alguém, alguém faz parar". Suas mãos tremiam, estavam frias e suadas, perdeu a força nas pernas, sua respiração estava descompassada, a cabeça pesada e leve ao mesmo tempo, sentiu que poderia desmaiar, desabar... finalmente. Se sentou no espesso tapete cinza, afundando as suas mãos, se recostou na lateral da cama observando a porta do armário a sua frente...
A crise já estava passando, isso levou incontáveis minutos. Enxugou as lágrimas que agora estavam se contendo.
Uma brisa fria tomou o cômodo, as cortinas farfalhavam ao seu toque bruscamente macio, um ritmo hipnótico. A jovem fitou o objetivo preso a primeira janela, dançado misticamente diante de seus olhos, uma figura irreal, quando se viu já estava de pé indo de encontro ao fantasma dançante, e naquele instante, toda sua dor desaparecera, amortecida outra vez, o vazio a apreendeu como no sonho, anestesiando-a. O tecido mexia e se remexia agora do lado de fora, tão suave, elegantemente metódico, conduzindo-a com o seu farfalhar ensurdecedoramente... mudo, pulsando, um eco no fundo da mente. Já podia sentir o vento em seus cabelos, acariciando-a tão gentilmente, e o céu... cada vez mais perto, — 'liberte-se'.
A porta bateu voraz despertando-a do transe. Grace estava com o tronco para fora da janela, suas mãos pálidas agarravam o batente com força. Algumas pessoas que passavam a olhavam com curiosidade. Ao olhar para baixo sentiu medo, lentamente foi se afastando do precipício. Fechou a janela e a encarou por alguns segundos. "Céus, estou enlouquecendo. O que vai ser de mim? Sou muito jovem para ser internada como louca", pensou enquanto fitava seu próprio reflexo no vidro. Depois foi até o armário, pegou a mochila para arrumar as suas coisas. A manhã estava se desenrolando de uma forma tão agitada que se arrependeu de ter saído da cama.
A Emily bateu na porta, pedindo permissão para entrar, já tinha se passado algumas horas. Grace abriu e se dirigiu para a estante de livros, escolheu alguns e os colocou na mochila vermelha, ainda não tinha terminado de arrumá-la.
— Já está arrumando as coisas? — Falou a jovem mais para se mesma.
— É... — Disse Grace parando melancolicamente. — Vou levar algumas coisas e trazer outras.
— Entendi. Grace... — Começou a Emily timidamente, rolando uma agenda nas mãos. — Eu não sei exatamente, o que você está passando, apesar de ver o quanto...
Grace olhava para ela atentamente, tentava deduzir o que a outra queria, aonde queria chegar com aquela conversa. Emily levantou os olhos percebendo o olhar semicerrado da menina.
— Eu só quero dizer que, eu não sei o que... exatamente está sentindo, talvez eu não entenda ao ponto de poder... — Falava a jovem se atrapalhando nas próprias palavras, parecia nervosa e bem desconexa. — Na verdade as vezes não entendemos a nós mesmos. As vezes chega a ser desgastante. Mas conversar ajuda, porém sentir falso interesse ou certos tipos de julgamentos é... horrível. — Ela terminou a frase estendendo um objeto para a outra.
Grace não se manifestou em pegar, apenas observou em silêncio a caderneta na mão da moça, era azul marinho com uma aparência aveludada, contudo, não era de tecido, na capa em letras douradas a seguinte inscrição: "Little box of thoughts". Parecia ter sido feito à mão, na lateral, tinha um feixe que o trancava.
— É um diário. — Disse a jovem gesticulando para que Grace pegasse. — Teve um tempo, uma fase da minha vida que isto foi meu melhor amigo, meu fiel confidente, me ajudou a falar quando... — A Emily parou no meio da frase, como quem estava contendo alguma coisa, algumas lágrimas, lembranças tristes.
A menina pegou o objeto da outra, agradecendo o gentil presente.
— Vou escrevê-lo.
Ambas se despediram com um sorriso e nada mais foi dito. Ela encarou uma última vez o objeto antes de colocá-lo na bolsa, respirou fundo e se jogou na cama, se sentia tão cansada, todo que queria era só um boa noite de sono e um dia inteiro de paz. De pensar que amanhã já era segunda-feira, a fez estremecer no íntimo: "Por que os finais de semana são tão curtos?" pensou ela jogando o travesseiro no rosto.
Depois do almoço, decidiu dá uma olhada, apesar de ausente tentava ser o máximo de atenciosa, contudo, não era perfeita.
Edward descia a meia com cuidado, como se estivesse lidando com algo extremamente delicado. Sua filha esboçava suas típicas caretas enquanto ele examinava o tornozelo. A coloração estava normal, mas ainda estava um pouco inchado, o esforço que havia feito mais cedo contribuiu para isso.
— Hm! Está parecendo bem melhor. — Comentou ele enquanto olhava bem de perto. — Como foi que isso aconteceu mesmo?
— Eu não sei. — Disse Grace arrumando a almofada atrás das costas. — Acho que eu caí da cama.
— Era só o que me faltava — Se pronunciou a Evelyn de braços cruzados entre o portal da sala de estar e a de jantar.
O Edward e a Maria olharam para ela como se estivessem acabando de notar sua presença ali.
— Isso deve ter acontecido enquanto sonambulava pela casa. — Continuou.
— Sonambulava?! — Edward e Grace Falaram ao mesmo tempo encarando a mulher de semblante fechado.
— Princesa, amanhã vou te levar ao médico. — Disse ele colocando a bolsa térmica no local lesionado. — Ligue para a sua mãe e avise, eu vou avisar a escola.
A menina concordou com um aceno. Ela se sentiu preocupada com o que poderia acontecer no consultório, seu medo era ser enfaixada.
— Você não tem uma conferência com os sócios? — Disse a Evelyn se aproximando do marido e tirando a jovem de suas preocupações.
— Eu tenho. — Ele colocava a meia da filha no lugar.
— Isso vai te atrapalhar. — Ela falava com a voz mansa e suas feições meigas, juntando as palmas das mãos e se aproximando do sofá. — Deixe que a mãe dela a leve...
— Bom... — Iniciou ele se levantando. — Eu penso que os meus filhos são mais importantes.
— Mas Ed...
— Obrigado, por se preocupar.
Ele a tocou no ombro e saiu. Evelyn encarou a menina dando a volta no sofá, em seguida parando a sua frente.
— Fardo desnecessário. — Disse ela antes de sair.
A Evelyn saiu carrancuda, mas com o rosto sempre meigo ao falar, dizendo que iria ver o jantar. Se passado algum tempo, ao voltar para a sala, Edward encontrou a filha ainda no sofá, parecia entediada, perguntou se ela queria subir, como concordou, ele então a pegou no colo e a levou para o quarto, disse que ela não precisava descer para o jantar, mandaria alguém levar. Grace ligou para a Irina, e como toda mãe, mostrou estrema preocupação, algo que ela odiava fazer com a mãe, tirar-lhe o sono com preocupações.
Às 20h30, recebeu seu jantar. Uma massa ao dente envolta em molho branco, um frango grelhado com um molho agridoce e ervilhas refogadas e suco de laranjas. O frango e as ervilhas estavam deliciosos, comeu tudo, excerto, a massa. Depois que se aprontou para ir dormir, isto é, arrumou a cama, recebeu a visita da Emily, que recolheu os pratos e levou uma xícara de café.
A jovem parecia um pouco estranha. Grace se aproximou dela e perguntou como estava, a pergunta saiu de forma tão sincera que a moça inclinou a cabeça para o lado intrigada, os papéis pareciam invertidos, levou um tempo até sorrir e responder que estava tudo bem, não queria contar para a menina o que a perturbava, ainda não era o momento, e talvez o futuro pudesse mudar, e o que a afligia não acontecer. Ela desceu dizendo que faria mais biscoitinhos de canela e mel. Grace a observou em silêncio enquanto a outra saia, não tinha comprado aquela resposta. Em seguida foi até a porta e a deixou entre aberta, depois de alguns minutos, foi até o banheiro para se preparar finalmente para dormir.
Penteou os cabelos, prendendo-os num rabo de cavalo baixo, escovou os dentes, limpou o rosto, vestiu uma camisa larga azul com detalhes brancos nas mangas, a calça tinha ficado em cima da cama. Ao sair do banheiro deu de cara com uma figura bisbilhotando suas pelúcias...
— O que está fazendo aqui?
Bạn đang đọc truyện trên: AzTruyen.Top