Capítulo 41 - Bordéus

Uma semana passou desde que Louis e Chadd foram baleados pelo irmão, Louis estava a recuperar-se bastante bem aos olhos do médico e até já dava alguns passos, sempre apoiado numa bengala. Saía do quarto e dava pequenas caminhadas pelo corredor de modo a exercitar a perna ferida, e as mesmas recomendações foram feitas a Chadd.

Quanto a Fiona, esta já tinha as suas damas de companhia, são elas Janelle, Stephanie e Françoise. Desde o episódio das três cortesãs no corredor, encontro este relatado a Louis por insistência do mesmo, seguiram-se outros tantos, variando entre as cortesãs e as nobres. Na corte já tinha a má fama de a amante do rei, embora não aparentasse ser uma coisa muito má a realidade é que era bem pior, pois eram-lhe dirigidos todo o tipo de injúrias pela grande maioria das mulheres. Os homens limitavam-se a esboçar caretas reprovadoras sem proferirem uma só palavra.

Por estes motivos Fiona tornara-se reclusa no seu quarto, um quarto diferente do que tinha desde a sua chegada ao palácio, este ficava a uma distância de três portas do quarto de Louis e sempre que ele a queria ver ou vinha ele até lá, ou ia ela até ele.

No momento estava sentada no banquinho forrado a veludo vermelho junto à janela a observar o jardim, junto a sí estavam as suas damas de companhia que em pouco tempo se tornaram muito íntimas da sua senhora, sabiam de todas as suas angústias, ouviam os seus desabafos e aconselhavam-na como podiam. Françoise estava sentada de frente para a condessa no mesmo banquinho, já Stephanie e Janelle estavam sentadas aos seus pés, todas a olhar para uma Fiona alheia a tudo ao seu redor.

- Custa-me vê-la assim triste minha senhora. - disse Françoise segurando na sua mão gentilmente.

- Não posso nem consigo estar de outro modo Françoise. - respondeu Fiona abatida.

- Não devia dar-lhes importância vossa graça. - retrucou Stephanie. - Sua majestade ama-a acima de tudo e é só isso que importa.

- Sim, Vossa Graça é uma mulher lindíssima, muitas das cortesãs matavam-se para ter um quarto da sua beleza. Deve mostrar-lhes a mulher forte que é e mostrar que não se deixa abater por elas. - disse Janelle tentando soar convincente.

Fiona limitou-se a suspirar tristemente, não tinha forças para lutar contra nada nem ninguém. Sentia-se a pior das pessoas e já nem coragem de as encarar tinha.

- Não é fácil ser forte quando temos uma legião de cortesãs invejosas a chamarem-me de vadia oferecida. - retrucou Fiona com o olhar vidrado.

- As vadias oferecidas são elas não Vossa Graça! - bradou Stephanie. - Elas é que estão aqui a viver às custas do rei, elas é que não fazem mais nada a não ser receber homens entre as pernas! Elas sim é que deviam ter vergonha do comportamento imoral delas, pois tenho quase a certeza de que enquanto Vossa Graça esteve com o rei elas estiveram com uma dúzia!

- Stephanie! Tem tento na língua! - repreendeu Janelle.

- Porquê? Não disse mentira nenhuma nem nada que já não seja sabido. - defendeu-se Stephanie.

- Mas de qualquer das maneiras isso não é coisa que uma dama deva dizer. - returquiu Françoise.

Stephanie bufou nada elegantemente e cruzou os braços contra o peito.

- O que Stephanie queria dizer... - começou Françoise voltando-se para a condessa. - É que elas não têm o direito de dizer nada a seu respeito pois comportam-se de modo pior.

- E de que é que isso me vale! Já estou marcada, e o pior, é que já suspeitava que um dia isto fosse acontecer. Só não sabia que seria tão rápido. - desabafou Fiona entristecida.

Sinceramente, as três damas já não sabiam o que fazer ou dizer para animar a condessa. Agora cabia ao tempo curá-la e animá-la.


Desde que conseguira escapulir do casebre no bosque aquando ao resgate de Fiona que a localização da rainha permanecia um mistério. Louis havia convocado uma busca por Versalhes alastrando até Paris, deixando as buscas à responsabilidade do capitão da guarda, Jean-Claude Treville.

As buscas continuavam por Versalhes, mas o que ninguém sabia era que Kira estava agora sob a proteção do cardeal, hospedada secretamente na sua residência em Bordéus. Fora para lá pois a mesma previra que Louis logo daria a ordem para a sua busca, e também sabia que ao não encontrá-la em Versalhes ele a procuraria na capital, por isso quando o cardeal lhe ofereceu guarida ela prontamente aceitou, pois a casa o cardeal seria dos últimos sítios onde Louis a procuraria.

- E o que pensa fazer agora majestade? - pergunta o cardeal observando a rainha.

- Sinceramente não sei eminência. - confessou Kira. - Mas pretendo recuperar a minha reputação... E o meu marido.

- Não me admiraria nada que Louis tentasse anular o casamento. Ele pode fazê-lo visto não ter sido consumado. - disse o cardeal aproximando-se da janela com as mãos atrás das costas.

O pior é que o cardeal tinha razão, um casamento não era verídico senão fosse consumado.

- Posso mentir e dizer que houve consumação. - disse Kira relaxada.

- Não iria dar certo majestade. - advertiu o cardeal virando-se para a rainha. - Uma consumação entre membros da família real é assistido, é uma tradição na corte francesa onde há pessoas que observam a consumação de modo a confirmar que de facto se realizou. No seu caso não será assim pois não houve.

Kira ponderou sobre o argumento do cardeal e chegou à fatídica conclusão de que ele tinha razão, não poderia mentir pois teria testemunhas que a desmentiriam na hora.

- Estou numa situação de desespero cardeal. - desabafou a rainha sem perder a compustura. - E estou disposta a tudo para recuperar o meu lugar como rainha, e sem sofrer represálias.

- Não creio que seja fácil majestade. - advertiu o cardeal. - Louis é um rei poderoso, com recursos e aliados igualmente poderosos. Ele não tem medo de punir alguém à morte como creio que faça com os protestantes que atentaram contra a sua vida e a da condessa.

- Como disse? - perguntou Kira fitando o cardeal com curiosidade.

- Um grupo de protestantes reuniu uma legião de aldeões para invadir o palácio de modo a eliminar o rei e o duque de Lyon, liderados pelo príncipe Zac Lorran. - explicou o clérigo.

- E a que condessa se referia à pouco?

- À condessa de Montbéliard, Fiona Rodríguez. Vós deveis conhecê-la muito bem minha rainha. - disse o cardeal com um toque de ironia na voz.

- E houve mortes nesse atentado? - questionou a rainha.

- Não, tanto o rei como mademoiselle Fiona e os duques de Lyon foram salvos, mas por pouco que a condessa não era decapitada. Foi salva à última da hora.

- Uma pena ter sido salva. Era um peso que me saía de cima. - resmungou Kira. Maldita fosse Fiona, repetia em pensamento.

- Creio que tendes antipatia com Fiona.

- E credes muito bem eminência. Fiona é uma pedra no meu sapato que teima em não sair. Um obstáculo na minha vida.

- Uma antipatia por ela que não compreendo majestade. - disse o clérigo. - Fiona é uma mulher belíssima e encantadora.

- Uma mulher encantadora que me roubou o marido! - bradou Kira furiosa. - Uma mulher encantadora que se enfiou na cama de Louis tendo com ele o que ele devia ter comigo! E eu pretendo acabar com ela.

- Tente acalmar-se, lembre-se de que não pode optar por ações drásticas. - aconselhou o cardeal à rainha.

- Situações desesperadas pedem medidas desesperadas, e para garantir que Fiona desaparece do meu caminho de vez terei que tomar as tais medidas drásticas que sua eminência me impede de tomar. - disse Kira com um tom de mistério na voz.

O cardeal observou a rainha com atenção. Aquilo sim era uma mulher que não olhava a meios para atingir os fins, uma mulher que não tinha medo de ir até às últimas consequências para eliminar os obstáculos ao seu sucesso, algo que ele apoiaria. Mas desta vez não o fez.

- Sua majestade não está por acaso a sugerir que...

Kira virou-se para o cardeal e disse com uma expressão serena no rosto, completamente o oposto da conotação que as suas palavras levavam:

- Não é uma sugestão mas sim uma afirmação. Se quero de volta o meu lugar como rainha da França em pleno e o de esposa de Louis tenho que eliminar Fiona, e desta vez sem falhas.

- Mas ao fazê-lo estará a assinar a sua sentença de morte majestade! - retrucou o cardeal sob o olhar indiferente da rainha. - Lembre-se de que Fiona é a favorita do rei e ele fará de tudo para a proteger. E caso algo lhe aconteça é bom que tema pela sua vida!

- É precisamente essa situação de a Fiona ser a favorita de Louis que eu quero mudar. - explicou Kira ainda serena e indiferente.

- Ela é altamente protegida por ele.

- Mas não a ama. - afirmou Kira com toda a certeza do mundo.

- Eu não diria isso. - retrucou o clérigo.

Kira olhou para ele à espera que ele prosseguisse.

- Se ele não a amasse não se daria ao trabalho de a proteger das cortesãs que a injuriam uma vez que o caso de ambos foi descoberto.

De repente uma ideia surgiu a Kira que abriu sorriso alegre.

- Disse que o caso deles foi descoberto é isso? - perguntou e o cardeal assentiu. - Então acho que tenho uma forma de afastar Fiona do meu caminho sem ter que causar a sua morte.

- E que ideia é essa minha rainha?

- Primeiro temos que impedir que as atitudes hostis das cortesãs cessem, quero que as injúrias aumentem ainda mais até a estadia dela no palácio se tornar insuportável. Depois arranjamos alguém disposto a dar-lhe guarida fora do palácio e longe de Louis. - explicou Kira sabichonamente.

O cardeal afagou a barba rala enquanto ponderava sobre o plano da rainha.

- E quem seria a pessoa que lhe daria guarida longe do palácio? - perguntou fitando a rainha.

Teria que ser alguém que olhasse para Fiona com cobiça, que não se importasse de a tomar como mulher e acima de tudo, alguém que garantisse que ela não tentaria regressar ao palácio.

- Ainda não sei bem quem é, mas acho que conseguirei alguém para tentar encontrar a pessoa ideal de entre os nobres solteiros da corte de Louis. - disse Kira misteriosa. - Depois de a encontrar tenho a certeza que Louis não negará deixá-la ir visto ser para o seu bem não é?

Se o seu plano corresse com o idealizava então em breve regressaria a Versalhes e ao palácio sumptuoso tomando o seu lugar como rainha e amante de Louis. E mesmo que ele a rejeitasse como fez desde o início do casamento, ela insistiria até ele a aceitar e esquecer a nojenta espanhola de uma vez.

Bạn đang đọc truyện trên: AzTruyen.Top