Capítulo 11
Será se era a polícia? Eu não sabia dizer, só sabia que ainda estavam trocando tiros do lado de fora.
Como estava bem escuro, eu permaneci abaixada para não correr o risco de ser acertada por uma bala perdida. Na verdade, de bala perdida não tem nada porque sempre acha alguém né?
Fui agachada até o extremo do matadouro para ver se tinha alguma saída. Sim, havia uma, mas estava trancada. O jeito era sair por onde eu havia entrado.
Assim que passei pelo corpo do Cebola, eu parei. Tinha uma sombra um pouco mais a frente, em pé.
— Você não vai fugir, Nikki. – Zeca falou nas sombras. Poxa, hoje não era mesmo o meu dia de sorte.
— Você de novo? Achei que só voltaria amanhã.
— Para a sua sorte eu voltei antes. Um passarinho me contou que você estava com visita aqui. Eu não autorizei nenhuma visita. – Zeca veio andando e se virou para as sombras. — Fica aí. — Acho que ele já estava pirando, eu não sei com quem ele estava falando e não vi ninguém ali.
Zeca veio na minha direção.
— Ela acertou em cheio. – Ele disse. Ela? Fiquei pensando. — Ela tem boa pontaria. É claro, fui eu quem a treinou.
— Ela? – perguntei.
— É. – Zeca fez um suspense enquanto examinava o corpo do Cebola no chão. — Ela não queria fazer isso com você, ela gosta de você.
— Como assim, não queria fazer isso comigo? Fazer o quê? – Eu não estava entendendo nada e nem sabia de quem o Zeca estava falando.
— Ela teve a chance de te avisar, mas escolheu sabiamente não fazer. – Zeca continuava olhando para o Cebola. — Agora o quarteirão dele é todo meu. – Ele falou para si mesmo e olhou para as sombras. — Você já conseguiu a sua vingança.
— Quem é que está ali? – Perguntei. Por algum motivo, eu não queria saber quem era essa pessoa. Algo me dizia que eu iria ter uma bela surpresa, talvez uma surpresa desagradável.
— Paciência Nikki. Você vai saber quem é. Como eu disse antes, ela tinha duas saídas, contar para você ou continuar com a vingança dela.
— Ok, continua. – Pedi.
— Bom, ela veio a mim pedindo que eu a ajudasse, em troca, o quarteirão dele... – Zeca empurrou o Cebola com o pé. — seria meu. Era uma troca justa, sem contar que esse puto merecia isso. Na verdade ele merecia uma morte igual a todas as vítimas dele que morreram injustamente.
— E você diz isso assim? Quem foi que matou aquele cara ali sem saber se a história era verdadeira ou não? – Falei, apontando para o corpo do homem mais adiante que o Zeca deu um tiro, o tal de Juca, que tinha sido acusado de transar com a mulher dele.
— Acredite, eu já desconfiava dele há muito tempo Nikki. Esse cara aqui... – Zeca apontou o homem pendurado no gancho. — Falou a verdade.
— E mesmo falando a verdade você o matou. – Declarei.
— Claro. Você acha que eles vão fazer besteiras e eu só vou cortar um dedinho e depois tudo volta ao normal? Que perdoarei eles? – Ele negou com a cabeça. — Mas voltando o assunto, o Cebola matou os pais dela e depois a colocou para trabalhar a força. Depois que ela me procurou, eu comecei a treiná-la, escondido de todos.
— E porque o Cebola matou os pais... Dela? – Perguntei.
— Havia alguém antes do Cebola. Alguém que tomava conta daquele quarteirão. Alguém de bem. – Zeca andava na minha frente, ia e voltava, olhando para mim vez ou outra. — O pai dela era policial, ele dava segurança àquele quarteirão. Mas um certo dia... O Jean apareceu. – Zeca apontou para o Cebola. — Ele era muito mais novo na época, mas muito ambicioso. Eu o conheci poucos dias depois dele chegar, ficamos amigos logo de cara, tínhamos muito em comum.
— Você e o Cebola? Amigos? É difícil de acreditar. – Tentei imaginar aqueles dois, sem todo aquele ódio mortal.
— É verdade. Como eu disse, o Jean era bacana, mas ambicioso. Isso acabou o levando a caminhos sem volta. Jean queria o poder, queria controlar as pessoas, ser temido. – Zeca olhava para um canto com uma expressão pensativa. Seus pensamentos estavam muito longe.
Eu nem tinha percebido que os tiroteios haviam parado do lado de fora. Eu estava tão vidrada nessa história do Zeca quem nem tinha mais vontade de fugir.
— Ele conseguiu. Mas para isso, ele teria que acabar com a única pessoa que estava entre ele e o poder. O pai dela. E não só o pai como a mãe dela também. – Zeca olhou para mim. — O Jean tinha conseguido, matou os dois e se tornou o líder. As pessoas o temiam, e foi assim que ele passou a se chamar Cebola. Daí veio a gangue e eles passaram a ser os novos policiais daquela área. Nada passava aos olhos dele. Se vacilassem, com toda certeza você seria achado sem a cabeça no dia seguinte. O Jean era um carrasco. Eles conseguiram armas pesadas, de grosso calibre. Toda vez que a polícia ia até aquele quarteirão, era recebida por tiros... Até que um dia pararam de ir.
— E como você virou um líder de gangue também? – Perguntei.
— Por causa do Jean. Eu soube que ele tinha matado os pais dela. Não acreditei naquela barbaridade, matar um casal inocente só porque o marido trazia segurança para os moradores. Então eu decidi que alguém precisava parar o Jean, parar aquela máquina de matar. Montei minha própria gangue, e coincidentemente, ela veio querendo vingança.
— E agora? Você me mata? – Deduzi.
— Não sei o que vou fazer com você. Ela não quer que eu faça isso. Mas também não vou te deixar livre. – Zeca sorriu diabolicamente.
— Porque não acaba logo com isso? Poupa tempo.
— Não me irrite garota, eu não sou muito violento, mas quando perco a paciência...
— E isso aqui foi o quê? – Me referi aos cortes que ele me fez mais cedo em mim.
— Isso? Isso não é nada. Tá reclamando do quê, queria ficar igual a ele? – Zeca apontou para o cara pendurado.
— Não. – Respondi imediatamente.
— Então fica de boa aí.
— E essa mulher, quem é? – Perguntei e Zeca sorriu.
— Aparece princesa. – Olhei para as sombras e vi uma forma, veio andando lentamente até finalmente eu conseguir ver o seu rosto.
— Você? Mas...
— Oi Nikki.
— Por quê? Eu achei que... – Eu não tinha o que falar.
— Eu sei. – Ela me deu um sorriso triste. — Espero que você me entenda algum dia. Fiz tudo isso pelos meus pais.
— Era você que estava matando o pessoal do Cebola? – Perguntei.
— Sim.
— Você... Você sabe o que eu estou passando por sua causa? Sabe? – Ela me olhava com tristeza. — Você se passou por mim, eu nunca cheguei a matar ninguém, mas a culpa veio pra mim.
— Eu precisava agir e o único jeito que encontrei foi esse. Eu te segui uma noite, você era tão misteriosa que eu desconfiei. Vi você assaltando e logo tive essa ideia. Você assaltava e por muitas vezes alguém da gangue do Cebola estava por perto, então eu o matava e modificava a cena para parecer ter sido um assalto. A verdade é que eu não queria que eles chegassem a você, mas eu também queria chegar no Cebola. – Ela disse.
— E olha só o que isso me causou? Se não fosse por sua causa, eu ainda estaria assaltando e ninguém saberia. Achei que você se importasse comigo. – Falei.
— É claro que eu me importo com você Nikki. E me preocupo também.
— Não é o que está parecendo. – Falei irritada.
— Olha Nikki, ela tinha o direito de se vingar. Quem somos nós para impedir isso? – Zeca falou. — Ela devia isso aos seus pais, mortos por esse cara caído no chão aqui.
— E agora ela estraga a vida dela, sujando as mãos de sangue e ainda colocando outras pessoas no jogo, é isso? – Falei e olhei para ela.
— Se eu entrei nisso, foi por que eu quis e sabia o risco que estava correndo. – Ela se aproximou de mim. — Meus pais foram vingados, você não sabe o alívio que isso me causa.
— É, não sei mesmo.
— Infelizmente, Nikki, você foi só parte do jogo. Isso acaba aqui. – Zeca falou.
— O que quer dizer com isso? – Ela perguntou, estranhando. — Esse não foi o combinado Zeca, você prometeu que deixaria a Nikki ir embora.
— É uma pena, minha querida. Ela sabe demais. – Zeca me puxou e segurou firme em minha mandíbula.
— Zeca... – Tentei falar, mas Zeca balançou a cabeça me fazendo calar.
Pela visão periférica, vi quando a executora do Cebola apontou a arma para a cabeça do Zeca e bem na hora escutei o barulho de um tiro. Na verdade tinham sido dois tiros, um veio do lado de fora. Zeca me soltou e eu corri junto com ela, fomos para trás de um bloco de pedra.
Escutei Zeca nos xingando.
— Onde você o acertou? – Sussurrei.
— Eu não sei, mirei na cabeça, mas me assustei com o outro tiro. Deve ter acertado no ombro, não sei.
Estava mais escuro ainda. Zeca não sabia onde estávamos, mas se continuássemos ali, logo ele saberia.
Do lado de fora começou outra chuva de balas. Dessa vez eu nem imaginava o motivo. Eu ainda tinha esperança de que poderia ser a polícia.
— Temos que sair daqui. – Falei.
— Não, você tem que sair daqui, Nikki. Eu me viro com o Zeca.
— Nem pensar. – Onde eu estava com a cabeça? Por causa dela eu estava nessa enrascada toda e ainda me preocupava com ela. — Você atirou nele, ele vai te matar.
— Eu sei me cuidar Nikki.
— Eu vou pegar vocês duas. Vou deixá-las pior do que esse cara pendurado aqui. – Zeca gritou. Me arrepiei só de imaginar. — Eu devia ter imaginado, que você escolheria ela. Mas isso não vai ficar assim. Vem para o papai vem? – Zeca estava andando, em qual direção eu não sei, mas sua voz estava ficando mais alta.
— Consegue acertá-lo? – Sussurrei.
— Não, está escuro, não sei onde ele está.
— Eu sei que vocês estão aí. – Zeca parecia um maníaco falando.
— Olha Nikki... – ela sussurrou em meu ouvido. — O que eu fiz foi pelos meus pais. Sei que você mais do que ninguém está decepcionada comigo... Mas o Zeca está certo, isso acaba esta noite. Não vou deixar você pagar por uma coisa que eu causei. Quando eu disser já, você corre para a saída. Se tiver sorte, quem estará lá fora será a polícia.
— Você vai sair comigo. – Sussurrei de volta.
— Não. Eu vou tentar despistar o Zeca.
— Cacau... – Tentei chamá-la, mas logo ela se levantou e começou a atirar em direções aleatórias.
—VAI NIKKI. CORRE.
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