1. Início

- Não sei como isso pode acontecer. Me perdoe. Por favor. Eu... me perdoe.

- Onde?

- Onde? - devolvo a pergunta depois de um longo minuto.

- Onde?

No fundo, eu sabia que esse era o certo a fazer. E claro, nunca planejei isso. Por favor, entendam que as coisas simplesmente aconteceram. Às 20:32 eu estava bebendo água no bebedouro da estação São Bento e às 20:32'25 eu estava em seus braços, sentindo o gosto de hortelã de seu Trident, passando minhas mãos naquela nuca bronzeada que ela sempre passava e sentindo o perfume que eu lhe dera de amigo secreto. Não foi culpa minha. Quando ele pediu um beijo, eu apenas não pude mais resistir.

- Quem quer um beijo não pede, dá.

Eu nunca planejei resistir.

***

22 HORAS ATRÁS

- Vocês já estão indo? Hoje vou com vocês de metrô.

- Seu motoqueiro não vem hoje, 'fessora?

- Não, Renato. Meu motoqueiro não vem hoje. - responde nossa professora de Estudo Bíblico com sarcasmo.

Natália e Estela trocaramm olhares e fizeram aquela clássica cara de quem perdeu um belo colírio para ver no fim de tarde. Elas eram assim. Se pudesse descrevê-las (naquela época, por favor) com uma palavra, seria ninfomaníacas. Elas sós pensavam em garotos, astros de hollywood e rockeiros famosos. Falavam disso o tempo todo. Viviam isso. Respiravam isso. Onde eu estava no meio disso tudo? Sentindo-me excluída, como sempre.

- Meu pai já 'tá chegando, professora. Se quiser ir, eu fico com a Naty e o Charles.

- Não, Estela. A gente espera. Quem vai pra estação agora?

Levantei minha mão e olhei para os presentes. Dentre os meus colegas, eu era a mais pobretona, com toda certeza. Meu pai nunca me buscou na igreja e nem tinha um carro para isso. Renato e Thales quase sempre iam de metrô, mas algumas vezes o Oliveira, seu pai, os buscava. Os também irmãos Bruno e Lucas iam de metrô, mas moravam na frente na estação da árvore. (Não conta) O pai da Mari buscava ela de moto quase todos os dias. O da Estela, Charles e Naty, quase sempre de carro.

- A gente vai hoje também. - disse Renato, olhando pra mim.

Senti aquele baque no coração. Eu começava a imaginar coisas, ou ele estava praticamente se oferecendo pra mim? Ok. Eu era apaixonada por ele. Completamente. Mas todo o lance do beijo, pegação, sexo, ficava lá na minha cabeça, na caixinha mais distante e bem lacrada, escrita com caneta vermelha em letras garrafais: IMPOSSÍVEL. Seu olhar me fez lembrar o dia que ele pegou na minha mão distraidamente. Quando viu que não era a Naty, se separou de mim com tanta rapidez que fez todos rirem por horas. Naty fingiu ciúme e ele ficou realmente sem graça. Ou não? Ou ele queria desesperadamente me encostar e como sempre, foi idiota o suficiente para não escolher o melhor momento e o melhor lugar? Nesse dia não consegui dormir a noite. Beijei a palma da mão, lambi e imaginei que era sua boca fina e sensual. Me toquei e imaginei que ele estava me dando prazer. Eu mal consegui olhá-los no dia seguinte.

- Bora, então? - disse Bruno.

- Não esqueçam de fazerem as leituras. Amanhã tem provinha.

- Ah... vamos fazer alguma coisa! Vamos... sei lá... comer um pastel, então. - sugeriu Natália.

- Vamos deixar pra amanhã. Amanhã é sexta mesmo aí a gente já sai todo mundo. Não tenho grana pra saidinha todo dia não, fia.

Todos concordaram com um: "Pode ser", "É verdade" ou "Por mim tanto faz" e Natália, que estava sempre acostumada a dar a última palavra, sugestão ou mandamento, rebateu.

- Não tem, porquê não trabalha e é um folgado.

Charles olhou para a irmã e em milésimos de segundo já estava com a resposta na ponta de sua língua afiada.

- Trabalho mesmo não. Estudo o dia todo! Quero ver você no meu lugar em vez de assistir a tarde toda Maria do Bairro. 'Cê num dá conta do batidão não! Tá "pensano" o quê?

Uma buzina despertou a atenção de todos, espalhando cada qual aos seus destinos.

- Vâmo embora, intôjo! Eu assisto minha novela enquanto passo sua roupa, viu, ingrato!

- Eita...E recebe bem pra isso! Falando nisso, aquela blusa azul...

Terminaram a discussão no carro do Milton (o pai). Renato deu um biquinho na namorada e fechou a porta do carro. Naty estava muito ocupada brigando com Charles para ver o olhar sugestivo que Renato me lançou assim que se afastou do veículo.

Nesse momento, pensei: "Se ele me beijasse, eu jamais recusaria. Entregaria minha inocência se ele me pedisse."

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