Capítulo 44 - Sem Revisão

Ethiena não entendia o que era a Flor Exótica, mas de alguma forma, ela se sentiu livre das amarras de suas descrenças. Lembrou-se de seus treinamentos com Qiteria, sempre a criticando por não ter imaginação, e também se recordou de Linden dizendo-lhe que aether fluía no cerne sentimental humano.

Ela tinha apenas um sentimento e uma imaginação: prender Linin para proteger sua família.

Todos ficaram um minuto inteiro em silêncio, no passo em que Linin ficou parada no espaço aberto, percebendo a súbita mudança do fluxo sentimental ao redor. Desviou o olhar na direção no profundo do jardim, dando um passo para trás, como alguém que escutou vozes chamando de um lugar distante.

Um cheiro forte e gostoso subiu até o nariz de Ethiena. Era terra, flores e plantas aromáticas. De repente, cada centímetro das árvores, plantas e todo o jardim parecia inclinar-se naquela direção para se aproximar do fluxo que Ethiena libertou de seu próprio corpo.

Os galhos mais altos pareceram se curvar para baixo, as folhas marrons no alto da copa das árvores se projetavam rigidamente, esfregando-se umas nas outras como muitas mãos frias e rachadas se confortando com o calor de uma fogueira.

Ela podia sentir tudo, e sabia que tudo ali podia senti-la.

— O que está a fazer, Bruxa!? — gritou Linin, dando um passo para trás. A sua voz estremeceu pela primeira vez.

Ethiena sentiu um fluxo flutuar de todos os lados como uma brisa fria de inverno. Ao mesmo tempo, algum tipo de sensação doentia subia de seus pés até o peito, aquele era o fluxo da terra doente que se tornara o jardim ao Linin plantar hera venenosa. Ethiena sentiu como se pudesse se comunicar com o jardim, e o ouviu gritar de dor pelo envenenamento.

Seu coração se apertou, e ela desejou saúde a cada planta e flor que existia naquele lugar. Por alguma razão, ela imaginou como se o jardim fosse uma criança.

Menos de dez segundos ante aqueles sentimentos, Ethiena ouviu passos à distância. Mas era tão longe, que não se deu conta o quão era. Eram pertos para ela, muito perto. Então, entendeu que começou a ter uma visão ampla de tudo o que estava acontecendo naquele jardim encantado.

Como se estivesse no alto de uma árvore, ela teve uma boa visão dos galhos mais altos que espalhavam-se à esquerda e à direita. Encontravam-se bem perto do final da mata, um pouco adiante havia uma clareira, com uma cerca ornamentada. Do outro lado, um campo aberto, grande, que de repente notou a presença dos passos que escutava de longe. Viu três pessoas caminhando entre o mato, acompanhados de animais curiosos que se escondiam de suas vozes alta e ecoante.

Eram de Kiwe, Lauro e Elmo. Os três procurando um caminho para fora do jardim, já muito perto de um dos portões que os levariam ao encontro da primeira rua de Lisbona. Lauro reclamava que as pernas estavam doendo, e Elmo falava sem parar a Kiwe sobre seu desejo em se tornar um soldado no futuro. Kiwe estava perto de estourar, mas permanecia em silêncio, vez ou outro falando um palavrão em sua língua materna.

— Eu quero a Thiena — disse Lauro, após parar para massagear as pernas curtinhas.

Kiwe não respondeu, pois ouviu o roçar dos matos, assustado quando um pônei com chifres que passou assustado para se esconder. Levou a mão até a coronha de sua pistola, e olhou em direção a origem do som. Uns quatrocentos metros de onde se encontrava, um soldado rebelde se escondia, rezando para eles passarem sem vê-lo.

— O que está a acontecer? — Elmo percebeu, olhando ao redor. — Oh, posso usar tua arma, senhor?

Kiwe o puxou para perto, caminhando devagar de costas, afastando-se do soldado desarmado e assustado.

— Shh! — pediu Kiwe.

Eles se afastam, Lauro agarrando-se a perna de Kiwe, que quase o chutou com impaciência, porém, logo, puxou o garoto para o colo.

— Apenas vamos sairr de cá em pleno silêncio... — aconselhou o nashanti.

Então, entraram em uma esquina distante, afastando-se mais e mais em direção a saída do jardim. Porém, se assustaram assim que o soldado escondido fora atacado repentinamente por uma erva-daninha, uma raiz bebê que o mordeu em todos os lugares até que seu grito se tornou apenas um fantasma escalofriante.

Kiwe e os garotos seguiram correndo para longe, apavorados, entretanto seguros.

Quando conseguiu manter uma pequena chama ardente de alívio em seu interior, a sensação fria de outras pessoas caminhando no solo do jardim a assustou. Em outro extremo, Ethiena viu através de olhos que não era o dela, muitos homens fortemente armados, e também, ela percebeu serem aliados.

O rosto firme e determinado de Comodoro Elias surgiu em sua mente como se ela estivesse assistindo a um filme. Ao lado do Comodoro, Ethiena vislumbrou a expressão mal-encarada de outros generais trajados nos uniformes preenchidos de dragonas e quepes altos e armas nas mãos. Também avistou um homem negro vestido nas vestimentas de guerreiros nashantis: roupas coladas e negras como vestes de super-heróis, ornamentadas de enfeites tribais dourados que se arrastavam nos braços e tecidos. Seguravam pesadas armas futuristas, que parecia incomodar Elias — embora o comum acordo era um entendimento mútuo.

Imediatamente à frente corriam soldados da Facção, que fugiram das barricadas ao redor das grades do jardim separando cidade de mato, e muitos deles se escondiam e começavam a atirar nos soldados de Portuália e aliados, gritando para manterem a formação. Nos passeis de pedras, um veículo grande e pesado, com rodas de tanque e eixo dianteiro giratório que o tornava manobrável num campo de mata fechada e repleto de cadáveres e destroços, avançava de volta para o palácio ao grito de uma língua estrangeira. Os inimigos estavam frustrados, mas suas forças ainda se encontravam na esperança de encontrar aliados no castelo.

Os sons da guerra eram assustadores.

Logo, algo ainda mais alarmante chamou a atenção de Ethiena, que virou para direita, encontrando perto de onde estava, centenas de soldados da Facção fugindo de um ataque repentino dos animais selvagens que se escondiam nas dimensões mágicas do jardim.

— Zapustit'! Oni zdes'... — gritavam os soldados, fugindo para o mato.

Ethiena sentia calafrios com os sons do tiroteio de metralhadoras e pistolas por todos os lados.

Outros e outros gritos saiam de todos os lugares. As dezenas de soldados da Facção Rebelde se enredavam nas plantas e tentáculos das árvores altas que se alimentavam do fluxo de Ethiena.

Seguros distante das dimensões sombrias do jardim, Ethiena se virou; segundos depois, como se seus olhos pertencessem às arvores, notando-se de longe acuar Linin para trás.

— Ethiena? — Linden chamou seu nome, erguendo a mão para tocar seu ombro.

A moça piscou, voltando a si. Ela pensou que tivesse passado horas, mas ao retornar para seu próprio olhar, apenas alguns segundos haviam passado. Toda a confusão a volta dela estava acontecendo ao mesmo tempo.

Quando suspirou, percebeu Linin erguendo a arma para atirar nas costas de Linden. Ela o empurrou, deixando um fluxo sentimental fluir para uma raiz perto dos pés de Linin. Ouviu-se um ruído que lembrava o estalido de um chicote, que acertou a mão de Linin cuja arma voou para longe de sua mão, embora atirou acertando no ar. A raiz de uma árvore espalhando-se profundamente no chão onde a rebelde pisava, moveu-se como uma onda exatamente como Ethiena imaginou.

Linin foi arremessada para trás, caindo de costas nos pisos cinzentos remexido pelas raízes. Do alto de uma árvore acima de sua cabeça, um galho desceu como um chicote em sua direção, batendo no chão quando ela desviou por reflexos ao abrir as pernas.

Assustada com a nova situação, Linin se ergueu do chão arrastando as pernas na terra. Correu para o meio da mata, ao se levantar. Ethiena não queria perdê-la de vista, por isso, impulsivamente foi até ela mancando e segurando onde havia levado um tiro com a outra mão.

— Espera, Thiena! — Linden tentou segurá-la, com os olhos arregalados para tudo que estava acontecendo.

Seguindo-a com toda a limitação física que possuía, Ethiena não imaginava que conseguiria se distanciar de Linden que caiu junto de Mariano, quando a terra tremeu debaixo dos pés deles.

Pelo menos, ela os sentia seguros enquanto queria vomitar seguindo o fluxo sentimental de Linin entrando em um corredor cheio de sebes e buchinhos altos. As paredes de plantas lançavam sombras escuras sobre os passeios cinzentos de jardim e, o barulho dos galhos retorcidos e das batalhas se tornavam mais altas quando Ethiena entrou no labirinto. Guiava-se pelos olhos das plantas, movendo-se com dificuldades. Quando cruzou uma esquina nos corredores de moitas ornamentadas, mancou até uma bifurcação, percebendo que estava distante e havia passado lá há mais tempo do que julgara.

Ela parou no meio do caminho, se perguntando o que poderia fazer seguindo-a. Deveria fazer tudo aquilo de longe.

Respirou fundo, tentando senti-la fugir em plena desvantagem. Ethiena, então, assustou-se ao ouvir uma risadinha assombrada surgir abruptamente do meio das paredes de plantas. Abriu seus olhos para seu espaço pessoal, desviando das mãos de Linin que quase agarrara seus cabelos. Ela havia se escondido no ao lado da parede de plantas, esperando como uma leoa para atacar sua presa.

— Achas que tu és melhor do que eu, preta? — Linin gargalhou após passar direto por Ethiena. Virando-se rápido até ela, tinha uma faca na mão. — Tive treinamento militar, e tu andaste com um livro na cabeça para etiquetas estapafúrdias da alta corte de Lisbona... Há de vencer-me com bordado e uma xícara de chá?

Ethiena recuou um passo para trás. Ela notou as sebes em formas de tentáculos mover-se atrás de Linin. Ergueu uma mão, lembrando-se que Linden tentou salvar a irmã. Ethiena não era uma assassina.

— Espera... — advertiu com a voz falha, porque o fluxo das sebes estava movendo-se por conta própria. Sentiam-se ameaçadas, como uma pessoa que tem uma arma apontada para seu coração. — Não se mexa, Linin... Largue a faca, e tudo vai ficar bem.

A rebelde curvou um sorriso no canto de sua boca, como se tivesse notado ter alguma vantagem. Mas ela estava em perigo, as sebes eram como uma rede de teias, prontas para devorá-la.

— Adoro desafios, mas cá, agora, há de ser apenas um aperitivo. Hei em torturá-la dia sim, dia não, apenas para que entendas que sou sua mestra.

— Linin...

Ethiena ergueu a mão, observando-a rir como se fosse a rainha do universo. Sua falácia e ódio eram tão gigantes, que mal conseguia perceber que não era nada além de uma garota perdida no ardor de sua arrogância.

— Eu não quero te machucar... — Ethiena sussurrou.

Linin soltou uma gargalhada, olhando para a moça de cima a baixo. Ferida, com sangue manchando seu vestido, e o suor porejando em sua pele pálida. Ethiena parecia completamente inofensiva, mas era a pior arma que poderia ter nascido no mundo.

O peito de Linin retumbou quando riu.

— Se tu estivesses em Revia, seria levada a fogueira e queimada viva! — bufou em seguida. — Mas cá estamos, e tu não almeja machucar-me?

Ethiena olhou para os galhos que se retorciam acima de sua cabeça, e sacudiu a cabeça em seguida.

— Linden queria salvá-la, então, eu... — murmurou, engolindo em seco.

— Ah, vamos, Vossa Majestade — Linin colocou desprezo ao proferir o título. — Sei que tu desejas usar tua bruxaria.

Sacudiu a cabeça novamente, sentindo o coração disparar no peito.

— Vamos! — Linin provocou. — Dê-me uma luta honrosa.

A mulher deu um passo à frente, e as plantas atrás dela se moveram para mais perto. O peito de Linin subia e descia rapidamente enquanto observava Ethiena se afastar devagar, as mãos erguidas para ela tomar cuidado.

— Largue a faca, Linin — implorou. — Linden quer salvar você, então, me deixa fazer isso. Eu te segui porquê queria te dizer, que se você se entregar, vamos pensar em uma pena branda.

Não era o que Ethiena queria. Seu desejo verdadeiro era insondável, e estava mantendo o que queria fazer com ela longe de sua cabeça. Imaginar, levaria a um ataque violento do jardim.

Não era uma assassina, e jamais seria.

— Dane-se, hei de degolar-te, e em seguida Linden também há de morrer. Mas para ele, guardarei uma execução pública, em frente a seus filhinhos e toda a nação. E todo hão de ver que eu sou a Pátria!

Os olhos de Linin ferveram de ódio. E em um segundo de sua cabeça quente fervendo, ergueu a mão para atacar Ethiena, que se encolheu em um reflexo autopreservativo.

Ouviu-se o estalido de galhos retorcendo-se, então, as plantas atrás de Linin moveram-se como uma cobra em ataque letal e agarrou em um nó no pulso de Linin. Ela se assustou no mesmo segundo, gritando um som agudo de uma princesa perdida e assustada.

— O quê diabos...? — tentou escapar, mas a mata enrolou-se ao redor dela, arrastando-a para trás.

Quanto mais lutava, pior ficava. Alguns galhos chicoteavam à sua volta, batendo no chão com força. Mas logo, estavam completamente tomando seu corpo.

— Não! — Ethiena esticou mão, na tentativa em puxá-la para fora do ataque. — Solte a faca!

Linin não soltou.

— Solte a faca e eles te soltarão! Solte...!

A rebelde continuou com a arma firme em sua mão. Gritava e atacava, tentando se livrar dos galhos que agiam apenas como anticorpos combatendo um vírus. Eles protegiam o coração do jardim, que agora era Ethiena. Qualquer fluxo sentimental de ameaça, atacariam qualquer um.

— Ah, socorro, socorro — gritava freneticamente Linin, dançando no meio das plantas —, por favor...!

As plantas enrolaram-se em seu corpo como cobras lutando contra uma presa, apertando-a por todos os lados. Ethiena escutou um som horrível de ossos partindo, em seguidas gritos e palavrões. Quanto mais lutava, mais os galhos e plantas se enrolavam ao seu redor.

Logo, os gritos de Linin se tornaram apenas uma assombração assim que antes de soltar a faca, seu pescoço foi quebrado.

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Nota

Eu não ia postar capítulo hoje, mas fiquei empolgada e escrevi um capítulo para encerrar a batalha. Agora, os capítulos que virão, são apenas perfumaria.

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