Capítulo 42

Ethiena sentiu algo contra sua boca. Uma força grosseira abrindo caminho para algo quente e delicioso deslizar por sua garganta até o fundo de seu estômago. Lembrou-se de ter escutado de muito longe alguém falar sobre "morte" e Flor Exótica.

A moça tentou mexer seu corpo fraco e paralisado, tendo a sensação de que um balde de gelo estava virando dentro de si. Ela abriu os olhos, mexendo a mão, sentindo-se no fundo de milhares e milhares de metrôs cúbico d'água.

Gritou, mas ao invés do som de sua voz, bolhas flutuaram ao redor de seus olhos.

Ethiena sacudiu as pernas com força, e parecia que seus músculos estavam preste a explodir, seu próprio cérebro era como um pote de água. Não conseguia respirar, precisava de oxigênio...

Ela sentiu água entrar em seus pulmões, quando tentou engolir um pedaço de ar que fosse. Bateu a mão à frente, sentindo a dureza do que lhe pareceu vidro. Tentou ver alguma coisa, mas não conseguia ver nada. Sua cabeça girava. A sensação era como se estivesse se afogando, presa dentro daquele carro. Sem ar, apenas com a sensação de terror e desespero lutando para manter a própria sobrevivência.

— Ethiena! Ethiena! — escutou de repente. — Por favor, não morra... Thiena, por favor...

Então sentiu como se sua cabeça pulasse para a superfície de um oceano de água, oxigênio frio e repentino fez seu peito arder. Ela o engoliu, tendo a sensação de que jamais respirara antes na vida. Ofegante, teve dificuldade para se acostumar com a certeza de que estava tendo uma alucinação.

Tossindo o ar estranho, Ethiena dobrou-se sentada, experimentando uma pontada ao lado de seu abdômen, e lembrou-se do medo de estar cercada por monstros.

Se encolheu para trás, afastando mãos que a seguravam, batendo a nuca em uma parede de concreto. Ela gritou um palavrão feio.

— Hey! — escutou a voz de Linden a atraindo como um farol.

Ethiena não tinha ideia do que havia acontecido. Não sabia se morrera e voltou para seu corpo original, ou se era uma lembrança reprimida do momento em que morrera. Sentiu apenas um terrível medo, que a vez chorar feito uma criança assustada.

— Lin... — ela murmurou. — Ah!

Levando um susto, deixou um som agudo escapar. As criaturas ainda estavam lá fora, batendo na grade e chorando feito bebês assustadores.

— Shh! Agora tudo está bem — Linden garantiu. — Logo estará melhor. A dor há de passar logo.

Ethiena olhou para ele, piscando. Mariano estava ao lado dele, apoiado em suas mãos de criança enquanto fitava para ela com o rosto machado por rastros de lágrimas.

— O que... O que aconteceu? — Ethiena estava confusa.

Ela fez menção de se levantar, mas parou bruscamente, com uma careta de dor. Ainda doía muito em seu abdômen, mas não tanto em sua perna. Se sentia até mesmo um pouco mais desperta.

— A Flor Exótica há de curá-la, Thiena — Linden garantiu, se aproximando com uma expressão muito esperançosa.

— Eu? — Ethiena, se sentindo mais viva, perguntou.

Linden e Mariano se entreolharam, riram em seguida.

— Não, bobinha — o Imperador sorriu, puxando-a para ele, em um abraço de pleno alívio. — Não havia percebido, mas entramos no coração do jardim...

Ethiena franziu a testa, achando aquilo um absurdo. Mais história sobre mágica que fazia parecer sua vida-pesadelo um conto de fadas.

— O quê? — ela sussurrou, sentindo a voz rouca.

— Sabes porque pessoas raras possuem o título de Flor Exótica? — Linden perguntou.

Ethiena sacudiu a cabeça, confusa.

— Não é uma zombaria? — questionou, tentando encontrar a relevância daquilo em meio ao cenário em volta deles.

— Bem, não Thiena. É uma honra, na verdade. Quero dizer, é comum que nenhum membro da família real revele a ninguém, por mais que confie na pessoa — Linden explicou, apressado, abraçando-a com a certeza de que ela ainda tinha o calor do corpo. — Há muitos anos, Pedro I escondeu sobre a Flor Exótica, tornando apenas um conto de fadas. Apenas mais tarde, tornou-se um título para referir-se a pessoas raras ou criaturas místicas, como vosmecê.

Com o corpo recuperando-se cada vez mais, Ethiena sentou-se, afastando-o por um momento. Sua cabeça ainda estava doendo.

— E daí? — ela bufou, levando a mão ao ferimento em seu abdômen. Não havia percebido que o tecido de seu vestido estava empapado de sangue.

— Bem, o segredo da família real sobre a magia e esse jardim, é também o mistério sobre a Flor Exótica. Mantemos em segredo, pois, sempre foi a fonte de renda da família.

Linden ergueu uma estranha flor, cujo caule segurava entre os dedos. Ela era a coisa mais estranha que Ethiena havia visto, ainda mais quando faltavam uma ou duas pétalas. Ethiena não tinha certeza, não entendia muito de flores, pareceu a ela um lírio que não era muito bonito. Possui folhas enormes em forma de cunha, de cor verde-esmeralda em meio a tanta flor escura que tomava o jardim. Do centro dela, havia duas antenas como de abelhas, que brilhavam douradas, assim como suas pétalas enrugadas de cores amareladas e roxas.

— Eu ouvi isso de meu pai, quando ele ainda era lúcido — o Imperador explicou. — Diz a lenda que uma gota de luz solar caiu dos céus, e a partir desta única gota cresceu a Flor Exótica. Uma flor com a capacidade de curar qualquer doença ou ferimento, mesmo feridas mortais. Mas seu poder ia além, essa flor pôde dar a magia ao solo e, por isso, a família real se tornou rica através das pedras ametistas mágicas que mineravam a partir desde lugar. Mas tarde, a partir de estudos sobre os poderes da Flor Exótica, descobriu-se que o fluxo sentimental da flor podia ser usado em pergaminhos, e a família real começou a vender como magia de papel, aumentando a fortuna da família até tomar o comando do país através de golpes e conquista.

Linden olhou para cima da cabeça dela, para onde Ethiena notou um pedestal com uma tampa de vidro em cima.

— Acredito que a família começou seu império a partir de cá — ele ergueu-se, colocando a flor de volta dentro do vidro. — Usaram suas propriedades sobrenaturais para dominar, conquistar e enriquecer. Bem, talvez, qualquer pessoa muito gananciosa faria o mesmo. Minha família sempre foi muito gananciosa.

Ele se abaixou até a esposa, segurando sua mão.

— Nunca encontrei esse lugar antes. Linin e eu entrávamos aqui, com a intenção de encontrar a Flor Exótica e fazer um pedido para sua propriedade de cura libertar nosso pai das bruxarias de Helena Teodoro — disse ele, suspirando.

Nunca havia dito aquilo a Ethiena, e provavelmente porque a Flor Exótica era um segredo de família. Não se sentiu traída, mas a perturbou um pouco nunca ter perguntado ao marido como Linin era quando criança.

— Isso porque há uma lenda na família — Linden falou, observando a expressão da esposa —, que diz que a Flor Exótica tomou vida própria e se esconde no interior do jardim, mudando de lugar ou confundindo aqueles que a procuram, para não ser encontrada. Apenas um líder de bom coração poderia voltar a vê-la e tocá-la. Pelo Leão, estamos cá.

Mariano segurou a outra mão de Ethiena, afastando-a de suas perguntas dos verdadeiros motivos de Linin, se um dia quis salvar Rui e não causar toda aquela confusão.

— O papai usou a flor para salvar-te, mamãe — a voz do garoto saiu fraca e assustada. — Nós estávamos a pensar que partiu para sempre.

Linden sorriu. Em seguida, passou a mão nos olhos enchendo-se de lágrimas.

— Esteve morta por alguns segundos, Ethiena — falou o rapaz, fungando. — Perdeste o pulso, e esteve fria. Precisei usar uma pétala para salvar-te, pois tu não estavas a respirar.

Sentindo um frio descer por suas costas, Ethiena ergueu os olhos até o vidro onde a flor parecia flutuar em seu interior. Por alguma razão, recordou a ela uma Bobina de Tesla, que vira uma vez em seu tempo de escola básica em uma excursão para o Museu da Eletricidade. A luz que bruxuleava ao entrar naquela cela-gaiola vinha da flor mágica.

Ethiena não sentia nada especial, apesar de tudo. Ainda estava com dor no abdômen, e com muita dor de cabeça. Não sabia nem sequer se conseguiu entender o que Linden havia dito. Contudo, pode ser um pouco agradecida e assentiu com um gosto adocicado na ponta de sua língua. Gosto de vida.

— Eu devo agradecer? — ela perguntou, olhando para a flor acima de sua cabeça. Ainda estava sentada no pé do pedestal, sentindo cada sentido humano retorna para seu corpo.

Linden mordeu o lábio com um risinho para ela. Assentiu, levando a mão até seu rosto. Aproximou sua boca até a dela, suspirando de alívio.

— Estou feliz que esteja viva! — sussurrou, a abraçando. Uma das mãos dele se afastou, e puxou a roupa de Mariano para um abraço em família. — Vamos ficar bem e sair de cá, deste lugar, apesar de nunca ter visto o jardim se comportar dessa maneira.

Ficaram os três abraçados, sentindo o calor um do outro, até Linden suspirar.

— Minha posição traz muitas responsabilidades — ele falou, tenso novamente. — Antes cá vir, Elias disse-me que sou a esperança e o futuro do Império, e não deveria arriscar minha vida sem pensar nas consequências. Mas não vim por teimosia, sim pela certeza de que nunca mais haveria de ser o mesmo se perdeste a ti, Ethiena. E vendo vosmecê esfriar, tive mais certeza dessa minha nova realidade. Antes não tinha nada a perder, agora, tu és tudo que posso perder e hei de fazer o impossível para protegê-la.

Ele beijou o topo de sua cabeça, apertando Ethiena e Mariano com mais força.

— Sempre desejei uma família tradicional e unida — falou, a voz ainda muito tensa. — Há algo mais importante do que o Império, o trono ou dever... Até mais que minha vida. E esse algo é tu e nossos filhos, Thiena.

Ethiena ficou comprimida contra seu peito pelo que pareceu uma eternidade, prendendo a respiração e ouvindo, em meio ao barulho das batidas dos monstros lá fora, o coração de seu esposo. Batia rápido forte.

Ela nunca tinha entendido aquilo, mal teve tempo para deixar madurar: amara Pedro; ainda o amava. E amava Linden, como a sua própria vida. Amava a ideia da família linda que estava criando com ele.

Beijou no topo da cabeça de Mariano, que fazia uma careta para os adultos emocionados. O garotinho apertou o lábio, e começou a chorar silenciosamente, apertando-se em Ethiena.

— E-eu sempre quis ter um pai e uma mãe — confessou Mariano. — O Imperador me obrigou a te chamar de mãe e a ele de pai, mas quero muito que não me levem para Casa da Criança depois que voltarmos... Quero continuar chamando a ti de mãe, Thi... quer dizer, mãe.

Ethiena olhou para Linden, prendendo o ar. Ela havia escutado que os meninos foram levados para muitos orfanatos, fugindo do último e passaram a mendigar nas ruas de Lisbona.

Mariano sempre estivera tão quieto, observando de longe como se estivesse pronto a fugir junto de seus irmãos. Ela não tinha ideia que sentia aquele medo.

Desejou empacotar o menino em um mundo seguro e livre de toda aquela tensão.

Estava feliz que pudesse estar perto do garoto, mas ao ver seu rosto amedrontado, o coração de Ethiena se contraiu e ela se recordou, com tristeza, da separação do grupo. Não tinha certeza se Elmo e Lauro estava com Kiwe. Tampouco se eles estavam bem ou pior do que eles.

— Mari, não vou te mandar de volta — Ethiena tinha a voz empoada ainda, precisou tossir para sair com mais consistência. — Você é meu filho para sempre. E seus irmãos também são meus filhos. Nós somos uma família agora.

O rosto do garoto ficou avermelhado, e um sorriso grande tomou todo seu rosto.

— Não se preocupe, tu és meu filho também, garoto — o Imperador bufou. — Não hei de levá-lo ao orfanato.

Esfregou a mão nos cabelos suados e bagunçado do menino. Em seguida, olhou ao redor. Estavam cercados por barras de ferros grossas e pesadas, cercada de plantas trepadeiras que floriam coloridas. Algumas flores caiam, conforme os monstros do lado de fora batiam nas grades, chamando por "mamãe".

— Devemos descansar um pouco, e depois, encontrar um caminho para fora do jardim — Linden sussurrou. — Penso que não estamos longe da saída...

Ethiena fixou o olhar na grade, sentindo o coração balançar com a sensação de medo. Se perguntava o que aconteceria se as coisas entrassem. E por que diabos continuavam a gritar como bebês chamando por "mãe".

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