Capítulo XIII

No dia seguinte, Ava acordou na cama do quarto. Continuava com as roupas do dia anterior e o corpo estava bastante suado. Precisava de tomar um duche, urgentemente.

- Bom dia, Bela Adormecida. Já é quase meio-dia.- cumprimentou David.

- Estou tão esgotada.

- Bem que deves estar. Chegaste cá quase às duas da manhã e parecia que tinhas corrido a maratona. Alguma coisa correu mal?

E assim a rapariga contou tudo o que se sucedeu na noite anterior.

- Onde se meteu Daniel?

- Ele foi buscar o pequeno-almoço. É melhor esperarmos que ele chegue para abrir o arquivo.

Ava anuiu e foi tomar um duche. Aquela casa de banho estava a precisar desesperadamente de uma limpeza, todavia a água fria na sua pele era rejuvenescedora. Quando acabou de tomar banho e de se vestir, voltou para o quarto. Na pequena mesinha encontravam-se cafés e sandes para cada um. Em cima da cama estava a pasta com as folhas e fotografias, para além do livro sobre a seita.

- Por onde começamos?- perguntou ela.

- Talvez devêssemos ver o arquivo da polícia, primeiro.- sugeriu Daniel.

A rapariga distribuiu o seu conteúdo entre eles.

- A mim parece-me que aquilo que fizeram a Tom é idêntico ao que fizeram a Isaac.- constatou David.

- Tens razão, podemos observar nas fotografias que a livraria foi alvo de uma busca minuciosa. Para além de que ele estava atado a uma cadeira com sinais de ter sido torturado e esfaqueado na barriga.

- Mas quem é que é esta gente e o que querem eles de pessoas como Isaac e Tom?- questionou Ava.

- Talvez as respostas estejam aqui.

Abriu o livro e todos olharam para ele. As folhas, amarelecidas e bastante frágeis, eram adornadas com gravuras. Em algumas páginas parecia haver uma espécie de orações, enquanto que noutras havia texto corrido.

- Muito bem, alguém aqui sabe latim?- interrogou a rapariga. Os rapazes ficaram a olhar para ela.

- Temos de procurar alguma coisa que entendamos, por exemplo as imagens.

O trio olhou para elas à procura de alguma pista, mas sem sucesso.

- Não vale a pena olhar para este livro se não conseguimos encontrar nada. Vamos fazer outra coisa.- sugeriu Daniel.

- Não, espera!- exclamou Ava.

- O que foi?

- Aqui mesmo!- apontou.- Nesta gravura parece que estão a fazer um tipo de ritual, mas reparem no local. Faz-me lembrar aquelas catacumbas que os cristãos usavam para enterrar os mortos na Roma Antiga. E observem aqui, parece ser o desenho de uma cidade da Antiguidade Clássica.

- Pois, mas pode ser qualquer cidade... Não, está aqui uma legenda: "Amiternum".

- Deixa-me pesquisar na internet.- retorquiu David.- Aqui diz que Amiterno é uma antiga cidade do Império Romano que foi abandonada no início da Idade Média. Hoje em dia podem-se visitar as suas ruínas.

- Onde é que fica?

- A 135 quilómetros de Roma.

- Até fica bastante perto. Devíamos ir lá.- sugeriu Daniel.

- Espera! Tu não estás mesmo a sugerir ir até Roma, pois não?- questionou a rapariga.

- E porque não?

Após ela respirar fundo, disse:

- Talvez porque Roma fica em Itália, no outro lado da Europa. Nós não podemos ir embora assim sem mais nem menos.

- Claro, contudo quando viemos "assim sem mais nem menos" para Edimburgo não houve problema.

- Isso foi diferente, nós não saímos do Reino Unido. E como esperas arranjar dinheiro para comprar três bilhetes de avião e arranjar lá um sítio para ficar? E nem vou falar do facto de sermos menores de idade.

- Tu deves estar esquecida de que a nossa família é rica! Para além do mais, quando fomos tomar chá com a tia Ellen, ela referiu que Roma era bastante quente nesta altura do ano e que ia passar uma semana na casa que lá tem. A tia até nos convidou para ir, mas nós recusámos. No entanto, ela disse que o convite ainda estava de pé.

- Eu não me vou armar em pedinte, nem fazer-me de convidada. Havemos de encontrar outra pista.

- Tu não vais fazer nenhuma dessas coisas. Esta é a melhor pista que temos e a tia Ellen quer-nos levar. Ouve, nós estamos a convidar-te para ires connosco "de férias", ou seja, não te estás a intrometer.

- Pronto, está bem.- assentiu Ava, contudo ainda não estava convencida.

- Eu vou-lhe ligar a dizer que vamos aparecer para tomar chá.

*  **  *

A meio da tarde, um carro parou em frente ao motel. Ava tinha-se vestido o melhor que podia tendo em conta o que trouxera de Brighton.

O carro foi até uma zona da cidade com casas enormes e lindíssimas. Aquele era sem-dúvida um bairro de pessoas bastantes ricas. O automóvel parou em frente a uma grande casa bem arranjada e deixou-os lá. Foi uma empregada que lhes abriu a porta e os encaminhou para a sala onde estava a tia dos gémeos. A senhora era igual a Mrs. Harris, apenas uns anos mais velha, mas não menos bonita por isso.

- Prazer em conhecê-la.- cumprimentou a rapariga.

- E tu deves ser Ava, o prazer é todo meu. Por favor trata-me por Ellen. Jurava que me tinham dito que tinhas cabelo ruivo.

- Decidi fazer uma pequena mudança de visual. A casa é bastante bonita.

- Isto? Oh, isto não é nada. Venham que o chá está a arrefecer.

Os quatro dirigiram-se para a sala onde estava o chá com os bolos e os biscoitos. De repente, a rapariga sentiu bastante fome. Só esperava que a barriga não começasse a fazer barulhos estranhos.

- Contem-me, como tem sido a vossa estadia em Edimburgo?

- Tem sido maravilhosa, a tia tem razão devíamos ter vindo cá há mais tempo.- respondeu David.

- Eu percebo. A vossa mãe tem tantas probabilidades de cá vir quanto eu de ir a Brighton. Vocês repensaram no meu convite, não foi?

- Sim, como não vemos a tia tanto quanto desejaríamos, percebemos que afinal não podíamos recusar.- explicou Daniel.

- Ainda bem que mudaram de ideias. E a Ava estaria interessada em juntar-se a nós?

- Com certeza, obrigada pelo convite.- agradeceu ela um pouco corada.

- Agora só falta tratar dos pormenores. Partimos amanhã por volta das nove da manhã, um carro irá levar-vos até à estação de comboios.

*  **  *

Após uma longa viagem de vários dias, acabaram por chegar à villa da tia Ellen, a poucos quilómetros de Roma. Ava não conseguia acreditar no que via, há sua frente estava a maior e mais bela propriedade que alguma vez observara.

- Antonella irá mostrar-vos os vossos quartos. Se precisarem de algo é só pedirem-lhe.

A empregada levou-os aos quartos e a rapariga ficou deslumbrada. Aquele não era o quarto "dos seus sonhos", aquele era o quarto que estava "além dos seus sonhos". De repente percebeu que Daniel estava a olhar para ela:

- O que foi?

- Nada, é só que pareces uma criança na Hamleys. Também não é preciso corares.

- Eu não estou corada!

- Como queiras. Queres vir visitar a cidade ou vais passar o dia a apreciar a casa? Porque se assim for há uma piscina e com este calor é mais agradável ficarmos lá.

- Claro que eu prefiro visitar a cidade. Deem-me uns minutos, eu já vou.

*  **  *

A rapariga sempre ouvira dizer que o tempo no Reino Unido era terrível, contudo só agora percebera a veracidade dessa afirmação. Passara do tempo chuvoso e frio do norte da Europa para o sol abrasador da Europa Meridional. Todavia não era só aí que ficavam as diferenças, a arquitetura, a comida e a língua davam-lhe a impressão de ter sido transportada para outra realidade.

- Já está a ficar tarde, não devemos conseguir ir ao Coliseu.- constatou David.

- E se ficássemos neste jardim aqui?- sugeriu Ava.

- Por mim, tudo bem.

Quando lá chegaram, abancaram à frente do lago e ficaram na relva. Ava ficou deitada a ler um livro, enquanto que os rapazes puseram os phones nos ouvidos e ouviam música. A rapariga estava a aproveitar o tranquilo pôr-de-sol quando uma bola aterrou ao seu lado. Levantou os olhos e reparou que um rapazinho lha pedia. A pontaria nunca fora o seu forte por isso levantou-se e foi entregar a bola. Ia-se a voltar quando viu uma senhora sentada sozinha numa esplanada. O cabelo ruivo estava apanhado num rabo-de-cavalo e um par de óculos de sol tapava a sua cara. Ava ficou petrificada. Seria ela ou seria apenas a sua imaginação? Começou-se a aproximar, todavia a mulher pagou a conta e levantou-se. Ela dirigiu-se para a saída do parque e Ava seguiu-a, com alguns metros de distância para não ser vista. A senhora virou à direita e entrou numa paragem do metro. A rapariga desceu também as escadas, sem nunca tirar os olhos de quem estava a seguir. No entanto, parou no meio da estação pois lembrou-se que não tinha possibilidade de comprar um bilhete do metro. Sendo assim, retornou à superfície e voltou ao jardim. À porta do mesmo estavam os gémeos.

- O que é que te deu? Pensávamos que alguém da Altum te tinha apanhado. Não podes desaparecer assim!- reclamou Daniel.

- Desculpem, eu pensava que tinha visto alguém que conhecia... Esqueçam, não foi nada. Querem chamar o motorista?

- Sim, é melhor.

O trânsito de Roma era insuportável e o trio sentia que há horas que não saia do mesmo sítio. Aborrecida, Ava ficou a olhar para o restaurante que se encontrava do outro lado passeio. O espaço parecia acolhedor e iluminado com todo o tipo de clientes. A rapariga começou a olhar para cada mesa tentando decifrar cada pessoa e dando-lhes histórias. Numa mesa ao pé da janela encontrava-se uma rapariga bonita num vestido roxo sentada à frente de um rapaz da mesma idade. Ambos não falavam muito e pareciam envergonhados ao olhar um para o outro, por isso ela assumiu que fosse o seu primeiro encontro. Noutra mesa mais distante, encontrava-se um homem por volta dos quarenta anos. Ele não estava sozinho, ao seu lado encontrava-se um bebé de dois anos. «Um pai solteiro», pensou ela. Contudo, quando o semáforo passou a verde, uma mulher ruiva entrou no restaurante e sentou-se na mesa deles. A única diferença é que agora não tinha os óculos de sol a tapar a cara.

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