Capítulo 1: A Mudança
O sol brilhava com uma intensidade tão forte que parecia querer nos convencer de que o dia seria perfeito para uma mudança. E, no começo, tudo parecia ser exatamente isso: perfeito. Eu, Miguel, e meus amigos — Clara, Lucas, Maria e Guilherme — estávamos cheios de expectativas enquanto dirigíamos para São Francisco, uma cidade universitária que nos prometia uma nova vida, novas aventuras e, claro, novos medos (a gente só não sabia disso ainda).
Nossa nova casa, no entanto, parecia ter saído diretamente de um filme de terror dos anos 80. Ou de um daqueles comerciais de "precisando de reformas", com uma fachada antiga e quase... suspeita. O tipo de lugar que faria qualquer um duvidar das escolhas que fez na vida.
— Aaaaah, eu não consigo acreditar! — exclamou Clara, saltando do carro com um sorriso radiante. Ela estava tão animada que parecia estar entrando em um castelo, e não em um casarão com janelas quebradas e uma porta que rangia como se estivesse gemendo de dor.
— Eu também não consigo acreditar... — murmurei, observando a casa. — Acho que a única coisa que vai se levantar aqui é o espírito de algum morador passado. Se não for, temos um problema.
Lucas, que não perde a chance de ser o cético do grupo, levantou uma sobrancelha enquanto olhava ao redor. — Sério, gente, o que é isso? Olha a aparência dessa casa. Eu não sou arquiteto, mas isso aqui está longe de ser um lugar "charmoso". Mais parece um abrigo de filmes de terror. O que vem depois? Um serial killer mascarado que oferece café?
— Ah, para! Não é tão ruim assim, — respondeu Maria, sempre a otimista. Ela olhava para a casa como se tivesse acabado de encontrar uma relíquia histórica. — Tem algo... aconchegante nela, sabe? Parece um lugar com história. E história é o que mais precisamos agora. Faculdade nova, cidade nova, vida nova!
— Concordo com a Maria! Vai ser uma grande aventura! — Clara disse com um brilho nos olhos. Ela parecia estar mais encantada com a ideia de mudar do que com a realidade da casa. — E, olha, pessoal, "velhice" é sinônimo de "personalidade", não é?
Guilherme, por sua vez, estava mais preocupado com a logística da mudança:
— A única coisa que me preocupa é se vamos precisar de um mapa para andar de um cômodo para o outro. Olha as escadas ali... você acha que tem gente que morre e vira espírito só porque perdeu o caminho no corredor?
Enquanto os outros começavam a descarregar as caixas, eu não conseguia parar de observar a casa. A sensação de que algo não estava certo era forte. O ar estava abafado e, à medida que entrávamos, o cheiro de mofo se misturava ao da madeira envelhecida. Era como se estivéssemos invadindo algo que deveria estar ali para sempre, guardando segredos que não estávamos prontos para descobrir.
— E aí, Miguel, você vai ficar só olhando ou vai ajudar a tirar essas caixas do carro? — perguntou Lucas, com um sorriso zombeteiro.
Fui até o carro, mas ainda estava distraído demais para focar nas caixas. Algo me dizia que aquela casa não era apenas velha. Ela tinha vida própria. Eu sei que parecia loucura, mas era impossível ignorar a sensação de que, de alguma forma, estávamos sendo observados.
— Miguel, vai ser tipo... nossa casa de férias, só que permanente, — disse Clara, tentando puxar conversa enquanto organizávamos as coisas. — E se houver fantasmas, eles vão ser nossos amigos! Vamos pedir para eles nos ajudar a fazer os trabalhos de casa, né?
Todos riram, até Lucas, que, embora fosse o mais cético, não conseguia resistir à energia do grupo. O que mais podia fazer? Rir também era uma forma de manter o medo sob controle.
Quando entramos de vez, a porta rangia como se estivesse tentando nos impedir de entrar. Fechei os olhos por um segundo, esperando que fosse só impressão minha, mas quando olhei para trás, vi Lucas dar um passo à frente.
— Olha só! A casa está até brincando com a gente. — Ele fez uma careta enquanto se afastava rapidamente da porta, como se temesse que ela fechasse de repente.
— Gente, vocês estão sendo dramáticos demais! — Clara bateu palmas, tentando diminuir o clima. — Essa casa só precisa de um pouco de amor. Uma vassoura aqui, um pouco de decoração ali, e vai ficar maravilhosa.
Maria, enquanto isso, já estava empoleirada em uma escada, tentando olhar para o sótão. — Eu beto que, se procurarmos bem, encontramos uma biblioteca secreta ou uma passagem escondida. Pode ser até uma entrada para um mundo mágico! Eu sou fã de histórias assim.
Guilherme balançou a cabeça, se aproximando de mim e de Lucas:
— Eu só não vejo muito "mágico" aqui, além das manchas de mofo no chão. Se for alguma coisa, o máximo que a casa pode ter é uma porta secreta para o submundo, onde são armazenados os documentos fiscais perdidos da antiga administração.
Enquanto os outros exploravam, fui até a sala de estar. As paredes estavam repletas de quadros de rostos envelhecidos e algumas tapeçarias que pareciam desbotadas, mas com um charme meio sombrio. Na parede, perto da lareira, havia um grande espelho emoldurado, mas algo parecia estranho nele. O vidro estava um pouco embaçado, como se alguém tivesse tentado limpar sem sucesso.
— Esse espelho, pelo menos, está... elegante, — disse Lucas, vindo até mim, com o olhar crítico. — Só acho que o reflexo de quem olha aqui é mais um "susto" do que uma reflexão. Não acha, Miguel?
Eu ri nervosamente, tentando esconder a sensação crescente de que a casa estava nos observando tanto quanto nós a observávamos. Como se estivesse se preparando para nos engolir aos poucos.
— Claro, Lucas. Elegante. Definitivamente elegante, — respondi, sem muito entusiasmo. Olhei ao redor, tentando desviar o olhar do espelho, mas a impressão de estar sendo vigiado aumentava. Eu não estava paranoico... estava só... cauteloso. Não havia como negar. Algo não estava certo ali.
De repente, o som de uma porta rangendo novamente ecoou pela casa, fazendo todos pararem no que estavam fazendo e se virarem para olhar. Mas, quando fomos investigar, não havia nada. Nenhuma corrente de ar, nada. O som simplesmente parou.
— Pronto. Agora é o vento. Ou talvez um fantasma entediado, — disse Guilherme, tentando descontrair a situação. — Como eu disse antes, um pouco de "humor paranormal". A melhor parte de se mudar para um lugar assim, né?
Clara deu de ombros e sorriu. — Olha, o que importa é que estamos todos juntos, não é? Vamos fazer desta casa a melhor do campus! Eu aposto que logo vamos olhar para ela e pensar: "Como não percebemos o quanto ela é incrível?"
Enquanto ela falava, a luz do corredor piscou uma vez. Então, de novo. E, como que respondendo aos nossos pensamentos, uma lâmpada da sala se apagou, apenas para acender novamente no instante seguinte.
A atmosfera na casa começou a mudar. Um vento gelado se levantou de repente, e as portas, que antes estavam perfeitamente caladas, agora pareciam tremer com o que quer que estivesse em sua estrutura. Uma sensação estranha permeava o ar.
— Ok, vou ser sincero: quem ligou para o "serviço de iluminação fantasmal"? — Lucas disse, com a voz mais tensa agora, embora tentando disfarçar.
Olhei para ele, ainda sentindo o arrepio da situação, e dei um sorriso nervoso. — Ah, você é sempre o cético, mas você percebeu que, para uma casa "normal", ela está bem fora do comum, né?
Clara colocou as mãos nos quadris. — A gente vai rir disso tudo no futuro. Ou, quem sabe, vai escrever um livro de mistério baseado na nossa vida de universitários. O título? "A Casa dos Espíritos: Como Sobreviver em São Francisco."
Eu não sabia se rir ou correr, mas, por enquanto, o que eu sentia mesmo era que a casa estava apenas começando a se revelar para nós. E aquilo, bem, não era nada bom.
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