Capítulo 8 - Grand Finale

— Cada um de vocês receberá uma chave que será usada para abrir a única porta de saída que está localizada na rocha central da arena. Mas atenção tributos, são necessárias no mínimo duas chaves para abrí-la. O Massacre Quaternário não terá um vencedor caso o último tributo vivo tenha apenas uma chave em mãos e não encontre a segunda em pelo menos uma hora após a morte do último tributo. — Há uma pausa amedrontadora na mensagem. — Bons Jogos Vorazes e que a sorte esteja sempre ao seu favor — conclui pausadamente o idealizador chefe.

— Filho da puta! — Bufo irritado.

Ouço um barulho e vejo que o miniparaquedas se aproxima. Dentro dele, um objeto arredondado, como se fosse uma pedra dessas ovais que costumamos jogar na água pra ver se quica. Essa é a chave.

E eu preciso de mais uma.

Quando começou a anunciar a proposta das chaves, até pensei em me esconder e esperar os outros dois tributos morrerem. Mas, tendo que ter duas... Fodeu!

Mesmo se eu esperar os dois morrerem, digamos que eu dê o azar de não encontra-los a tempo... Não quero passar o resto da minha vida preso nessa arena.

— Mãe, ore por mim! — digo olhando para o céu. — Eu nunca fui muito bom com isso.

Minha mãe sempre frequentou a igreja e consequentemente me levava junto. Mas eu não conseguia me adaptar. Eu era criança, queria brincar e não ficar assistindo aquele homem falando por horas lá na frente. Por isso, sempre dormia. Quando cresci, até que passei a gostar de ir. Depois que me apaixonei por uma garota que frequentava os cultos, passei a não faltar nenhuma semana! Mesmo assim, nunca tentei falar com o Deus que eles tanto comentavam.

Talvez isso tenha sido um erro.

Um Deus seria de grande ajuda em uma hora como essa!

— Se você estiver mesmo aí em cima, me ajude. Por favor!

Me desprendo da árvore para poder descer. Infelizmente, preciso encontrar a outra chave. Porém, surgem algumas questões.

- Da mesma maneira que eu surpreendi Jonas, eu posso ser surpreendido ao andar por aí.
- Provavelmente os outros vão ficar nos arredores da rocha central da arena e ir pra lá pode ser perigoso. Contudo, preciso me aproximar.
- E se eu fizer armadilhas por lá?

Merda...

Mais uma vez não sei o que fazer.

Peter seria de grande ajuda, afinal, duas mentes pensam melhor que uma!

— Sinto sua falta, seu fodido!

Caminho vagarosamente por entre os obstáculos. Não posso pisar em nenhuma folha seca, não posso pisar em nenhum galho seco, não posso tropeçar em nenhuma pedra... Talvez nem devesse respirar tanto! Ainda bem que consigo me movimentar com cautela.

Lembro de antigos jogos os quais alguns tributos morriam simplesmente por não conseguirem ficar quietos. Ano passado mesmo uma garota se assustou com uma borboleta, gritou e teve o azar de estarem perto nesse momento. Uma outra garota passou a seguí-la e esperar o melhor momento de por fim a sua vida. Não demorou muito até ter uma pedra esmagando seu crânio.

E tudo por ter se assustado com uma borboleta.

— Quem se assusta com uma borboleta, porra?!

Não posso nem chamá-la de louca já que estou falando sozinho.

Todo o país deve estar paralisado assistindo ao Jogo agora. Sempre há uma paralisação no último dia e sendo assim ninguém trabalha e nem estuda. Feriado geral para assistir os últimos instantes do massacre sanguinolento. Um feriado geral para nos ver morrer.

Que país é esse?

Minha mãe, meus amigos, meus vizinhos... Todos estão em frente a uma tela e torcendo para que meus sinais vitais não cessem.

Travo ao ouvir um barulho.

Alguns passos parecem vir em minha direção.

Olho ao meu redor e não vejo nada. Me movimento até a árvore mais próxima e subo rapidamente. Do alto eu consigo ver melhor.

Por entre algumas folhas, observo uma dúzia de tributos se aproximar.

— Mas que porra é essa?

Peter, os dois do meu distrito, os ruivos, o garoto morto pelos ruivos, o índio, o foiceiro, Jonas, o garoto morto por Jonas, e mais outros dois que eu não reconheço.

— 1, 2, 3... Os tributos vão te matar — cantam em uníssono.

— Seus filhos da puta — balbucio para alguma câmera que deve ter próxima a mim.

Me jogo no chão e corro. Além de lidar com os tributos vivos, também tenho que lidar com os que já matei. Isso está mais sinistro do que os filmes de zumbis que eu costumo assistir.

Já é a terceira vez que Peter ressurge. Pior ainda, o tributo que os ruivos mataram está vindo sem cabeça atrás de mim.

Se eu sair vivo daqui e esbarrar com algum idealizador... Não respondo pelos meus atos.

Grito enraivecido. Foda-se. Eles vão vir atrás de mim de qualquer jeito e só há uma forma de acabar logo com isso: achar a outra chave.

O pior é que deve ter mais uma dúzia de bestantes atrás dos dois que restaram, fazendo com que isso fique mais difícil.

Só me resta correr. Os idealizadores controlam eles, sendo assim não adiantaria eu tentar me esconder. Eles veem tudo.

— 1, 2, 3... Os tributos vão te matar.

Essa musiquinha aciona algum botão de fúria dentro de mim a cada vez que é entoada.

Meus pés já não estão mais sabendo para onde ir. Passo por um riacho, viro a esquerda passando por algumas bananeiras e subo um morro com muita dificuldade, rastejando pelo chão. Olho para baixo e vejo que alcançaram a subida do morro. Pego algumas pedras no chão e os acerto com todas as minhas forças. O objeto bate no corpo deles, mas não faz o efeito que eu esperava. O máximo que consigo é que rolem de volta ao pé do morro, só que sobem novamente. Pego mais pedras e tocos de madeira e continuo tentando acertá-los.

— 1, 2, 3... Os tributos vão te matar.

— Calem a boca, desgraçados — digo arremessando uma pedra na cabeça do ruivo.

O objeto bate em sua testa, arranca sangue, mas não o impede de continuar a subida. O último toco que encontro perto de mim é arremessado nas pernas do índio, mas dessa vez meu ataque os incomoda. O índio pega o toco que joguei e arremessa em minha direção. Consigo desviar, porém todos pegam os tocos e pedras que arremessei e contra-atacam.

— 1, 2, 3... Os tributos vão te matar.

Me jogo no chão protegendo minha cabeça com a mochila e rastejo. Alguns ataques foram certeiro e ao contrário dos oponentes, não sou um zumbi que não sente dor.

Está doendo pra caralho.

Consigo me deitar ao lado de um tronco caído até que os ataques cessam. Preciso correr novamente, só que agora estou debilitado. Percebo que minha perna está ensanguentada, mas isso não pode me parar. Mesmo mancando eu disparo para algum lugar. Quando consigo uma distância segura, paro atrás de uma árvore, abro a mochila e pego minha garrafa de água. Bebo uns goles e molho o ferimento em minha perna.

— Porra!

Ardeu.

Felizmente não é um ferimento grande. Corto um pedaço do pano e amarro para estancar o sangue.

Por puro reflexo, abaixo ao ver um punho vindo na direção de meu rosto. Reconheço o foiceiro e ainda abaixado, uso a lâmina arredondada para rasgar sua barriga.

— Merda. Me alcançaram.

Corro para a esquerda e dou de cara com o índio. Escorrego ao parar a corrida, levanto e corro para o outro lado. Contudo, dou de cara com a ruiva. Mudo de direção novamente e Jonas entra no meu caminho, me jogando no chão com uma banda. Levando rapidamente.

Eu estou ficando cercado.

Tento fugir em todas as direções, mas não consigo muito além do que alguns passos, pois alguém sempre me impede. Quando me dou conta, já estão ao meu redor em um círculo perfeito e eu no centro.

— 1, 2, 3... Os tributos vão te matar — cantam em uníssono ao se aproximarem a passos lentos.

Fico perdido, com um olhar desesperado e não encontro nenhuma brecha. Meu cérebro parece que congela ao perceber que estou fodido.

— Porra...

Ouço um barulho de água, vejo algumas pedras a uns cinco passos à esquerda; bastante próximo ao garoto morto pelos ruivos e ao garoto morto por Jonas. Antes que eles se aproximem mais, corro até as pedras e vejo a pequena cascata de água formando uma pequena piscina. Parece ter algum escape para essa água. O círculo está ficando cada vez menor.

— 1...

Preciso sair daqui.

— 2...

Antes que eu morra.

— 3...

Os tributos mais próximos estão a dois passos de me capturar.

— Os tributos vão te ma...

Não ouço mais suas vozes ao mergulhar. Prendi todo o ar que pude, retirei a mochila das costas com medo de o espaço entre as rochas no fundo ser curto e me joguei nesse buraco apenas com a lâmina arredondada em mãos. Espero que tenha uma saída próxima. Está claustrofóbico aqui. Não consigo nadar corretamente, pois tem muitas rochas fechando um estreito túnel.

Estou ficando sem fôlego.

Começo a soltar parte do ar em intervalos de cinco segundos. Quando tudo começa a ficar turvo, caio em uma caverna. Tusso tanto que parece que meus pulmões vão sair pela minha boca.

Olho ao meu redor e não vejo saída. A água está parada. Cuspo e percebo que há uma pequena ondulação para a esquerda. É quando encontro um buraco, mas parece ser ainda mais apertado que o último o qual entrei.

Preciso arriscar.

Prendo novamente todo o ar e rastejo pelo buraco, submergindo nessa água fria. Após uns segundos entre rochas, sinto que saí; que estou em um lugar mais aberto. Nado para cima e avisto as árvores. Estou em um riacho. Dou braçadas em direção a margem, porém algo prende meus pés e me puxa para baixo.

Puta que pariu. De novo não.

O tentáculo dessa vez não comete o mesmo erro. Sinto uma batida forte no meu braço, fazendo com que eu não consiga segurar minha arma.

Esperto.

Se você acha que vai me vencer, está enganado - mentalizo.

Mergulho mais profundo, na direção do tentáculo e o ataco com dentadas. Ele se agita porém não paro. Sinto um líquido amargo invadir minha boca após eu arrancar sua carne escamosa.

Que nojo!

Saio da água e sento na borda, esfregando a mão incompulsivamente em minha língua. Esse gosto não sai.

Os bestantes devem estar muito perto e eu preciso encontrar uma brecha para recuperar minhas coisas.

Caminho agachado ao lado das rochas que formam a caverna a qual eu estava. Me aproximo do local que mergulhei e os tributos bestantes ainda estão lá. Não sei se posso ficar os vigiando ou se os idealizadores os colocarão novamente atrás de mim. Preciso esperar um pouco para ter certeza.

Parecem estar perdidos. De vez enquanto, um ou outro age como Peter da outra vez que veio atrás de mim: como se estivesse brigando consigo mesmo e batendo na cabeça ou batendo a cabeça nas árvores. Claro que com a exceção do garoto morto pelos ruivos, já que não tem cabeça!

Tremo só em observá-los novamente.

Parece que eu estou em um filme de terror.

— Não parece. Eu estou mesmo em um puta filme de terror.

Só espero não ter o final que normalmente todos os personagens têm: a morte.


Acho que se passou quase uma hora e eles não saíram de perto da minha mochila. A boa notícia é que não vieram atrás de mim. Mesmo assim, preciso de uma arma. Não quero me arriscar tentando recuperar minhas coisas tendo que enfrentar doze tributos bestantes zumbis. Só me restam duas opções: Continuar apenas com a minifaca escondida em meu tênis ou mergulhar no riacho para tentar encontrar minha lâmina arredondada. Prefiro a segunda opção. Só espero que não tenha outro bestante na água.

Pego a minifaca e mergulho. Se algum tentáculo atacar, tenho como me defender.

A água é clara, facilitando a visibilidade. Perco o fôlego, subo pra recuperar e volto às profundezas. Apalpo as rochas e isso é apenas o que sinto, até que algo escamoso me assusta. Antes que consiga se enrolar em meu corpo, o furo várias vezes. A água fica meio turva ao meu redor, com um amargor repulsivo. Mesmo assim eu não desisto de procurar minha arma. Volto a superfície, recupero o fôlego e sou puxado por outro tentáculo. Também me livro desse e novamente apalpo as rochas do fundo. Quando estou quase desistindo, sinto algo quase cortar meu dedo indicador após eu encostar.

Encontrei.

Pego minha arma e dois tentáculos me enrolam novamente. Um de meus braços está solto e quando tento usá-lo para me livrar, um terceiro tentáculo o prende. Olho para cima e vejo que a superfície está longe.

Não me resta muito fôlego.

Curvo a cabeça para baixo tentando soltar a dentadas o terceiro tentáculo que prende meu braço; exatamente como fiz da outra vez.

Não consigo usar minha arma.

Não consigo me mexer.

Me debato como um peixe fora da água. Continuo mordendo o bestante enquanto a água começa a invadir o meu pulmão. Consigo uma última mordida e o bicho me solta. Com o braço livre, consigo cortar os outros dois e quando minha cabeça sai da água, um sopro revigorante invade minha garganta. Com a lâmina arredondada e a mini faca em mãos, saio da água.

Me jogo sobre uma rocha na beirada do riacho, tentando controlar as tossidas.

Eu não posso ser ouvido, porra!

Curvo a cabeça para o lado e muita água sai de minha boca. Tento segurar a tosse, o que causa mais dor em meu peito.

Que puta sensação horrível!

Volto ao meu posto de observação para ter certeza de que os bestantes estão no mesmo lugar antes de eu sair em busca de outra chave. Porém, não estão.

Merda.

— Quase morri afogado por esse polvo desgraçado porque vocês não saiam de perto das minhas coisas e de repente mudaram de ideia? Legal!

Onde eles se meteram?

Olho ao meu redor e nenhuma movimentação suspeita me incomoda.

Caminho atentamente por entre as árvores em direção a mochila e consigo recuperá-la. Agora, preciso encontrar os outros tributos, antes que eu seja encontrado.


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