Capítulo 1.5
OS PRIMEIROS sinais do fim da tarde agora se destacavam no céu alaranjado.
Miguel caminhava a passos largos pela rua.
O garoto agora usava uma blusa de moletom preta com bolso na frente, alguns pequenos detalhes brancos completavam o enfeite da roupa.
O submundo estava vazio.
Apenas alguns poucos moradores caminhavam apreensivos ali por perto, a maioria já se dirigia para suas casas por conta do toque de recolher.
Miguel passou por um bar próximo a tempo de assistir a uma reportagem que passava na televisão.
Uma mulher de aparência jovem segurava o microfone com uma expressão de nervosismo no rosto.
Os cabelos avermelhados da repórter estavam presos em um rabo de cavalo bem-feito. Ela usava um blazer preto por cima de sua blusa de gola alta da mesma cor. Seus olhos escuros estavam levemente desfocados.
"Estamos agora no centro da cidade de AllterValley, vizinha próxima da cidade de Sunlane, onde anda ocorrendo uma série de desaparecimentos inexplicáveis e de teor extremamente duvidosos. Alguns dos habitantes locais protestam energicamente contra a chegada de pessoas nativas de Sunlane"
A imagem mudou. Uma multidão muito maior do que as de protestantes locais marchava decidida na direção da passagem que gerencia a fronteira da cidade.
"Não deixe esses amaldiçoados entrarem em nossas terras!" gritou um idoso branquelo que possuía uma feição de poucos amigos no rosto.
"Isso mesmo! Fiquem longe da nossa cidade, seus porcos!" esbravejou uma segunda voz.
A imagem trocou novamente.
Dessa vez se tratava de uma confusão generalizada. Fumaça, garrafas e muitos outros objetos estavam visíveis no meio da confusão.
Um homem charmoso, bem-vestido e de meia idade apareceu. Seus cabelos castanhos estavam levemente esbranquiçados nas têmporas. O seu olho de cor marrom estampava um semblante desanimado e apreensivo, ele usava um terno preto caro.
"As imagens são chocantes, os feridos foram tratados pelas autoridades locais, felizmente nenhuma morte foi confirmada" disse o apresentador.
O estômago de Miguel se embrulhou.
"É lamentável ver isso" disse uma voz masculina e grave ao seu lado.
O garoto deu um salto com o susto.
Seus dedos imediatamente procuraram algo dentro de suas vestes.
Um homem idoso de estatura média estava parado de pé. Seus olhos profundos estavam paralisados na televisão.
"É... desculpe?" disse o garoto.
O senhor encarou o menino brevemente.
"Ver a cidade passar por isso é de partir o coração" disse o homem.
Miguel franziu a testa e observou o idoso mais atentamente. A pele do homem era enrugada, ele possuía alguns poucos fios de cabelo branco em sua cabeça, sua vestimenta, porém era chique. Ele usava um casaco tweed e uma cartola longa.
O garoto se apressou para responder.
"Você tem razão" ele engoliu em seco e pressionou os punhos - "Queria poder fazer alguma coisa".
O idoso lançou um breve olhar penetrante para o menino.
"Todos nós temos um papel a desenrolar na trama da vida meu filho" explicou o homem.
Miguel franziu a testa. O garoto não estava muito interessado em lição de moral de um velho.
"Acho que é o que todos dizem, não?" perguntou.
O idoso possuía um estranho brilho no olhar.
"Essa cidade esconde personalidades terríveis, garoto".
Miguel estreitou os olhos.
"O que você quer dizer com isso?" questionou.
O idoso, porém ficou novamente imerso na reportagem que passava na televisão.
O silêncio ensurdecedor continuou por mais alguns longos minutos.
"Quem você acha que forma uma vida?" indagou o idoso novamente puxando assunto.
O garoto não soube o que responder.
"Essa pergunta possui resposta?".
O idoso mediu o menino com os olhos e fechou a cara, visivelmente decepcionado.
"Talvez eu tenha superestimado isso tudo, me desculpe" e dito isso partiu embora.
Miguel estava confuso demais para falar alguma coisa.
"Ei!" ele chamou.
Mas o idoso havia sumido entre as poucas pessoas que passavam pela rua. O garoto ainda contrariado voltou sua atenção para a televisão.
A repórter ainda com o semblante sério voltava a falar. As imagens mostravam um conflito no centro da cidade.
"Uma manifestação violenta marcou a tarde da quinta-feira de hoje, cinco manifestantes e um policial acabaram feridos, sendo uma das vítimas uma criança de apenas onze anos de idade que infelizmente se encontra em estado grave".
Um gosto estranho surgiu na boca de Miguel.
"O inspetor Harris, figura máxima da polícia de Sunlane chegou ao local apenas próximo ao fim do conflito, em seu breve discurso o policial prometeu que seus homens estão obtendo progresso na investigação, outros detalhes, porém ainda não foram apresentados pelo menos. A população segue com evidente raiva, principalmente após os recentes acontecimentos ligados ao prefe- "
Inesperadamente a televisão desligou.
"Já chega de tragédias por hoje" disse um homem adulto sentado próximo ao balcão principal.
Ele segurava um pano e um copo nas mãos.
Miguel exagera na reclamação.
"Ei! Mais respeito!" pediu o dono do bar.
O garoto revirou os olhos e começou a se afastar. O homem se levantou e disse.
"Você deveria estar em casa agora, sabia?" alertou.
"Junto de sua família" terminou de dizer.
Miguel parou.
"Por que não pensei nisso antes?" disse sorrindo ironicamente.
O dono do bar franziu a testa. Miguel saiu apressado do lugar.
Sunlane faz fronteira com duas outras cidades: AllterValley e Listwood.
Apreensivos com os desaparecimentos, muitos habitantes tentaram se esgueirar pelas fronteiras locais para escapulir do perigo.
O que os refugiados não contavam é que teriam que lidar com um dos mais reais perigos existentes.
A maldade do ser humano
03 Dias
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